Luís Graça & Camaradas da Guiné: Guiné 63/74

01-10-2009
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Guiné > Região de Tombali > Cufar > CART 1687 / BART 1913 (1967/1969) > Álbum fotográfico de Vitor Condeço > Foto 12> "Pista de Cufar, avião T6-Harvard em reabastecimento. (Operação Ciclone I, efectuada pelo BCP 12 em Caboxanque no dia 15 de Fevereiro de 1967, tendo por base de apoio a pista de Cufar).Guiné > Região de Tombali > Cufar > CART 1687 / BART 1913 (1967/1969) > Álbum fotográfico de Vitor Condeço > Foto 6 > 15 de Fevereiro de 1967 > Meios aéreos na pista de Cufar, no âmbito da Operação Ciclone I.Fotos e legendas: © Victor Condeço (2008). Direitos reservados.1. Em 14 de Junho último recebemos do António Graça de Abreu um nexo com quadras de um militar açoriano, seu amigo: recorde-se que, depois de Teixeira Pinto e Mansoa, o António foi colocado em Cufar, no CAOP1, na última parte da sua comissão, de 25 de Junho de 1973 até quase às vésperas do 25 de Abril de 1974. Voltou nos TAM (Transportes Aéreos Militares) a 20 de Abril. Em Cufar, conviveu com, entre outros, os militares (na sua maioria açorianos) da CCAÇ 4740. O pessoal desta companhia reuniu-se recentemente em Fátima, notícia de que foi feito um poste, a pedido do António (1). Estes versos que agora se publica, em forma de quadras populares, alguns de pé quebrado, já constavam do livro Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura, do António Graça de Abreu (Edição: Guerra & Paz, 2007), pp. 151-156.Este tipo de material tem interesse documental, tem valor socio-antropológuico, se não mesmo literário: é uma espécie de romanceiro, em que se relata a pobre vida de um militar que vai para a guerra. É um género literário que tem uma larga tradição na nossa poesia popular (veja-se, por exemplo, A Nau Catrineta). Vou-lhe chamar Cancioneiro de Cufar (1), admitindo que outras recolhas possam ainda aparecer, relacionadas com Cufar e o sul da Guiné.O autor é um militar de São Miguel, Açores, o Eduardo Manuel Simas, de que infelizmente não temos nenhuma foto. É de sublinhar a importância que as saudades da família e das ilhas e a fé cristã tinham na capacidade de sofrimento e de resiliência da generalidade dos nossos camaradas açorianos, sobretudo nos momentos de maior provação e dor, numa terra que lhes é completamente estranha e hostil:Quando a manhã nasceu,/ Cercámos o inimigo,/ Foi a Fé que me valeu / Porque Deus vinha comigo.Querem homens para a guerra, /A padecer fel e dores, / Queremos sair desta terra, /Queremos ir para os Açores.Assim fui tendo Fé, / Pedindo a Deus que me ajude / Pr’a que ao sair da Guiné /Leve a vida e a saúde.De qualquer modo, o nosso muito obrigado ao António, que é ele próprio um poeta de grande talento, sensibilidade e cultura, com vários livros publicados, um obrigado dizíamos, pela recolha e divulgação destes versos que agora podem mais facilmente chegar aos Açores, quiçá ao Cantanhez, seguramente a toda a blogosfera... LG2. Eduardo Manuel Simas, um poeta popular açorianoCufar, 3 de Novembro de 1974Entre os soldados açorianos meus vizinhos, o Eduardo Manuel Simas é poeta. Descobrimos afinidades e o rapaz veio mostrar-me uns versos da sua autoria, bem melhores do que os meus. Como acha que eu sou mais entendido nas coisas da arte poética, pediu-me que lhe corrigisse os erros do português e melhorasse as quadras. Elas aqui estão:É escrito com sangue e dorAquilo que vou falarE com o maior fervorAgora vou começar.Com licença, meus senhores,Minha história eu vou contar,Quando eu saí dos AçoresPara ir pr’ó Ultramar.Quando à Terceira chegueiE segui para o quartel,Logo em mim recordeiA ilha de São Miguel.Sentia uma coisa estranhaSem saber compreender,Coisa esquisita e tamanha,Difícil de entender.O tempo se foi passando,Dias bem, dias mal,E fomos continuando,Soldados de Portugal.Passados dois meses,Lá fomos jurar bandeira.Sofremos, mas às vezesParecia uma brincadeira.Quando um dia na parada,À noite, a silêncio tocou,Veio a notícia desamparadaQue o comandante contou.Com umas folhas na mão,Más notícias veio darO nosso capitão:- Vão para o Ultramar.Dez dias maisE fui a São Miguel,Despedir-me de meus pais,Eu, Eduardo Manuel.Ó meu Deus, eu vou partirSem saber se isto é justo,Qual o dia em que hei-de vir,Vou viver com tanto custo.Quanto à nossa viagemMelhor não podia ser,Com espanto e coragemVendo o que tinha que ver.Corrido cerca de um mêsPartimos para o mato,Lá fomos para o CantanhezOnde não parava um rato.Na LDG embarqueiE belezas eu não vi,Aquilo em que eu penseiFoi na terra onde nasci.Os dias se vão passandoDão vontade de chorar,As horas vou recordandoPasso a vida a disfarçar.Na primeira operaçãoQue nós fomos fazer,Deu-me um baque o coração,O que veio a acontecer.Quando os homens voltaram,Três grupos da operação,Logo as minas rebentaram,Meu Deus, grande traição.Passou palavra o primeiro,Diz-me lá o que é que queres,Vai chamar o enfermeiroPr’a vir tratar os alferes.Ó meu Deus, o que seria,Quem serão os desgraçados?Foram para a enfermariaTrês alferes estilhaçados.Lá ficaram mutiladosOs infelizes sem sorte,Turras serão apanhadosE todos irão à morte.Que tristeza e amarguraTanta vez aconteceu,Morrer uma criaturaP’las mão de um irmão seu.Meus versos não levam cunhoDo que eu amo ou adoro,Eles são o testemunhoDo que canto, do que choro.Assim se passa esta vida,Horas tristes a chorar,Se a dor fosse esquecidaEu poderia cantar.Sofrer vinte e quatro meses,Um soldado nada tem,Agonias, tantas vezes,Só Deus sabe, mais ninguém.Eu sei que estes versos sãoUma coisa escrita ao leve,São pobres, sem perfeição,Como a pena que os escreve.Estive quase a dar um tiro,Primeiro dia de Agosto,Ó que noite de martírio,Passei a noite no posto.Meus olhos no firmamentoHoras e horas, ou mais,Vieram-me ao pensamentoOs meus queridos pais.No dia 9 de AgostoFomos pró mato arreados,Vamos voltar com o gostoDe não sermos apanhados.À saída do quartelEu pensei na minha camaE pensando em São MiguelCaí enterrado em lama.Que será preciso mais,Estamos aqui como uns parvos,Tiram-se os filhos aos paisE fazem deles escravos.Quando a manhã nasceu,Cercámos o inimigo,Foi a Fé que me valeuPorque Deus vinha comigo.Lá por fora o dia inteiro,Sem qualquer resultado,Perdidos num cativeiroEntre capim alteado.Ao quartel quando chegámosSem forças e cheios de fome,Quase não falámos,Fogo dentro nos consome.Querem homens para a guerra,A padecer fel e dores,Queremos sair desta terra,Queremos ir para os Açores.Dia 7 de SetembroSaímos ao anoitecer,Eu não quero que me lembreTantos homens a sofrer.Era tanta a nossa mágoaE com tantos embaraçosApanhámos forte águaQue pareciam estilhaços.A 23 de Dezembro,Ó mãezinha muito querida,Eu nem quero que me lembroParecia o fim da vida.À noite dois pelotõesSaíram todos armadosE com nove foguetõesLá fomos nós atacados.O fogo acabouSem nos causar mal,Nossa Senhora salvouOs soldados de Portugal.Isto foi acontecido,Queiram todos acreditar,Quanto se tem sofridoNesta vida militar.Que vida tão rigorosaQue até nos faz pasmar,Que vida tão perigosa,Soldados do Ultramar.Assim fui tendo Fé,Pedindo a Deus que me ajudePr’a que ao sair da GuinéLeve a vida e a saúde.____________Notas de L.G.(1) 14 de Junho de 2008 >Guiné 63/74 - P2943: Convívios (65): Pessoal da CCAÇ 4740, dia 21 de Junho em Fátima (António Graça de Abreu)(2) Sobre os vários Cancioneiros, até agora recolhidos e divulgados no nosso blogue, vd.Bafatá:31 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCLXV: Cancioneiro da Cavalaria de Bafatá (Radiotelegrafista Tavares) (1): Obras em Piche 31 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCLXVI: Cancioneiro da Cavalaria de Bafatá (Radiotelegrafista Tavares) (2): Piche, BART 285711 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCXCII: Cancioneiro da Cavalaria de Bafatá (Radiotelegrafista Tavares) (3): O Hotel do RC 8 11 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCXCV: Cancioneiro da Cavalaria de Bafatá (Radiotelegrafista Tavares) (4): Lavantamento de ranchoBambadinca:24 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1695: Cancioneiro de Bambadinca: Isto é tão bera (Gabriel Gonçalves)Bissau:19 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2557: Cancioneiro de Bissau (1): Uma estância de turismo (Florêncio Oliveira da Silva / Abreu dos Santos)Canjadude:28 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXCIII: Cancioneiro de Canjadude (CCAÇ 5, Gatos Pretos) Cuntima:6 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2245: Cancioneiro de Cuntima (Vitor Silva, CART 3331, 1970/72) Empada:1 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P828: Cancioneiro de Empada (Xico Allen)Gandembel:30 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CDII: O Hino de Gandembel (Zé Teixeira)Mansoa (autor: Eduardo Magalhães Ribeiro, ex-furriel miliciano de operações especiais, da CCS do BCAÇ 4612, 1974)1 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXVI: Cancioneiro de Mansoa (1): o esplendor de Portugal1 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXVII: Cancioneiro de Mansoa (2): Guiné, do Cumeré a Brá 7 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXLVI: Cancioneiro de Mansoa (3): um mosquiteiro barato para um pira... 10 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLIV: Cancioneiro de Mansoa (4): a arte de ser 'ranger'1 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDIX: Cancioneiro de Mansoa (5): Para além do paludismo 19 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLIX: Cancioneiro de Mansoa (6): O pesadelo das minas15 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXVIII: Cancioneiro de Mansoa (7): Os periquitos do pós-guerra31 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCCXXI: Cancioneiro de Mansoa (8): a amizade e a camaradagem ou o comando da 38ª3 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P837: Cancioneiro de Mansoa (9): A mais alta de todas as traições25 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1698: Cancioneiro de Mansoa (10): O 25 de Abril, a Barragem de Castelo de Bode e a descoberta da palavra solidariedadeNiassa (Moçambique):11 de Maio de 2004 > Blogantologia(s) - XI: Guerra Colonial: Cancioneiro do Niassa (1) (Luís Graça) Xime:31 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1009: Cancioneiro do Xime (1): A canção da fome (Manuel Moreira, CART 1746)


Guiné > Região de Tombali > Cufar > CART 1687 / BART 1913 (1967/1969) > Álbum fotográfico de Vitor Condeço > Foto 12> "Pista de Cufar, avião T6-Harvard em reabastecimento. (Operação Ciclone I, efectuada pelo BCP 12 em Caboxanque no dia 15 de Fevereiro de 1967, tendo por base de apoio a pista de Cufar).Guiné > Região de Tombali > Cufar > CART 1687 / BART 1913 (1967/1969) > Álbum fotográfico de Vitor Condeço > Foto 6 > 15 de Fevereiro de 1967 > Meios aéreos na pista de Cufar, no âmbito da Operação Ciclone I.Fotos e legendas: © Victor Condeço (2008). Direitos reservados.1. Em 14 de Junho último recebemos do António Graça de Abreu um nexo com quadras de um militar açoriano, seu amigo: recorde-se que, depois de Teixeira Pinto e Mansoa, o António foi colocado em Cufar, no CAOP1, na última parte da sua comissão, de 25 de Junho de 1973 até quase às vésperas do 25 de Abril de 1974. Voltou nos TAM (Transportes Aéreos Militares) a 20 de Abril. Em Cufar, conviveu com, entre outros, os militares (na sua maioria açorianos) da CCAÇ 4740. O pessoal desta companhia reuniu-se recentemente em Fátima, notícia de que foi feito um poste, a pedido do António (1). Estes versos que agora se publica, em forma de quadras populares, alguns de pé quebrado, já constavam do livro Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura, do António Graça de Abreu (Edição: Guerra & Paz, 2007), pp. 151-156.Este tipo de material tem interesse documental, tem valor socio-antropológuico, se não mesmo literário: é uma espécie de romanceiro, em que se relata a pobre vida de um militar que vai para a guerra. É um género literário que tem uma larga tradição na nossa poesia popular (veja-se, por exemplo, A Nau Catrineta). Vou-lhe chamar Cancioneiro de Cufar (1), admitindo que outras recolhas possam ainda aparecer, relacionadas com Cufar e o sul da Guiné.O autor é um militar de São Miguel, Açores, o Eduardo Manuel Simas, de que infelizmente não temos nenhuma foto. É de sublinhar a importância que as saudades da família e das ilhas e a fé cristã tinham na capacidade de sofrimento e de resiliência da generalidade dos nossos camaradas açorianos, sobretudo nos momentos de maior provação e dor, numa terra que lhes é completamente estranha e hostil:Quando a manhã nasceu,/ Cercámos o inimigo,/ Foi a Fé que me valeu / Porque Deus vinha comigo.Querem homens para a guerra, /A padecer fel e dores, / Queremos sair desta terra, /Queremos ir para os Açores.Assim fui tendo Fé, / Pedindo a Deus que me ajude / Pr’a que ao sair da Guiné /Leve a vida e a saúde.De qualquer modo, o nosso muito obrigado ao António, que é ele próprio um poeta de grande talento, sensibilidade e cultura, com vários livros publicados, um obrigado dizíamos, pela recolha e divulgação destes versos que agora podem mais facilmente chegar aos Açores, quiçá ao Cantanhez, seguramente a toda a blogosfera... LG2. Eduardo Manuel Simas, um poeta popular açorianoCufar, 3 de Novembro de 1974Entre os soldados açorianos meus vizinhos, o Eduardo Manuel Simas é poeta. Descobrimos afinidades e o rapaz veio mostrar-me uns versos da sua autoria, bem melhores do que os meus. Como acha que eu sou mais entendido nas coisas da arte poética, pediu-me que lhe corrigisse os erros do português e melhorasse as quadras. Elas aqui estão:É escrito com sangue e dorAquilo que vou falarE com o maior fervorAgora vou começar.Com licença, meus senhores,Minha história eu vou contar,Quando eu saí dos AçoresPara ir pr’ó Ultramar.Quando à Terceira chegueiE segui para o quartel,Logo em mim recordeiA ilha de São Miguel.Sentia uma coisa estranhaSem saber compreender,Coisa esquisita e tamanha,Difícil de entender.O tempo se foi passando,Dias bem, dias mal,E fomos continuando,Soldados de Portugal.Passados dois meses,Lá fomos jurar bandeira.Sofremos, mas às vezesParecia uma brincadeira.Quando um dia na parada,À noite, a silêncio tocou,Veio a notícia desamparadaQue o comandante contou.Com umas folhas na mão,Más notícias veio darO nosso capitão:- Vão para o Ultramar.Dez dias maisE fui a São Miguel,Despedir-me de meus pais,Eu, Eduardo Manuel.Ó meu Deus, eu vou partirSem saber se isto é justo,Qual o dia em que hei-de vir,Vou viver com tanto custo.Quanto à nossa viagemMelhor não podia ser,Com espanto e coragemVendo o que tinha que ver.Corrido cerca de um mêsPartimos para o mato,Lá fomos para o CantanhezOnde não parava um rato.Na LDG embarqueiE belezas eu não vi,Aquilo em que eu penseiFoi na terra onde nasci.Os dias se vão passandoDão vontade de chorar,As horas vou recordandoPasso a vida a disfarçar.Na primeira operaçãoQue nós fomos fazer,Deu-me um baque o coração,O que veio a acontecer.Quando os homens voltaram,Três grupos da operação,Logo as minas rebentaram,Meu Deus, grande traição.Passou palavra o primeiro,Diz-me lá o que é que queres,Vai chamar o enfermeiroPr’a vir tratar os alferes.Ó meu Deus, o que seria,Quem serão os desgraçados?Foram para a enfermariaTrês alferes estilhaçados.Lá ficaram mutiladosOs infelizes sem sorte,Turras serão apanhadosE todos irão à morte.Que tristeza e amarguraTanta vez aconteceu,Morrer uma criaturaP’las mão de um irmão seu.Meus versos não levam cunhoDo que eu amo ou adoro,Eles são o testemunhoDo que canto, do que choro.Assim se passa esta vida,Horas tristes a chorar,Se a dor fosse esquecidaEu poderia cantar.Sofrer vinte e quatro meses,Um soldado nada tem,Agonias, tantas vezes,Só Deus sabe, mais ninguém.Eu sei que estes versos sãoUma coisa escrita ao leve,São pobres, sem perfeição,Como a pena que os escreve.Estive quase a dar um tiro,Primeiro dia de Agosto,Ó que noite de martírio,Passei a noite no posto.Meus olhos no firmamentoHoras e horas, ou mais,Vieram-me ao pensamentoOs meus queridos pais.No dia 9 de AgostoFomos pró mato arreados,Vamos voltar com o gostoDe não sermos apanhados.À saída do quartelEu pensei na minha camaE pensando em São MiguelCaí enterrado em lama.Que será preciso mais,Estamos aqui como uns parvos,Tiram-se os filhos aos paisE fazem deles escravos.Quando a manhã nasceu,Cercámos o inimigo,Foi a Fé que me valeuPorque Deus vinha comigo.Lá por fora o dia inteiro,Sem qualquer resultado,Perdidos num cativeiroEntre capim alteado.Ao quartel quando chegámosSem forças e cheios de fome,Quase não falámos,Fogo dentro nos consome.Querem homens para a guerra,A padecer fel e dores,Queremos sair desta terra,Queremos ir para os Açores.Dia 7 de SetembroSaímos ao anoitecer,Eu não quero que me lembreTantos homens a sofrer.Era tanta a nossa mágoaE com tantos embaraçosApanhámos forte águaQue pareciam estilhaços.A 23 de Dezembro,Ó mãezinha muito querida,Eu nem quero que me lembroParecia o fim da vida.À noite dois pelotõesSaíram todos armadosE com nove foguetõesLá fomos nós atacados.O fogo acabouSem nos causar mal,Nossa Senhora salvouOs soldados de Portugal.Isto foi acontecido,Queiram todos acreditar,Quanto se tem sofridoNesta vida militar.Que vida tão rigorosaQue até nos faz pasmar,Que vida tão perigosa,Soldados do Ultramar.Assim fui tendo Fé,Pedindo a Deus que me ajudePr’a que ao sair da GuinéLeve a vida e a saúde.____________Notas de L.G.(1) 14 de Junho de 2008 >Guiné 63/74 - P2943: Convívios (65): Pessoal da CCAÇ 4740, dia 21 de Junho em Fátima (António Graça de Abreu)(2) Sobre os vários Cancioneiros, até agora recolhidos e divulgados no nosso blogue, vd.Bafatá:31 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCLXV: Cancioneiro da Cavalaria de Bafatá (Radiotelegrafista Tavares) (1): Obras em Piche 31 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCLXVI: Cancioneiro da Cavalaria de Bafatá (Radiotelegrafista Tavares) (2): Piche, BART 285711 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCXCII: Cancioneiro da Cavalaria de Bafatá (Radiotelegrafista Tavares) (3): O Hotel do RC 8 11 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCXCV: Cancioneiro da Cavalaria de Bafatá (Radiotelegrafista Tavares) (4): Lavantamento de ranchoBambadinca:24 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1695: Cancioneiro de Bambadinca: Isto é tão bera (Gabriel Gonçalves)Bissau:19 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2557: Cancioneiro de Bissau (1): Uma estância de turismo (Florêncio Oliveira da Silva / Abreu dos Santos)Canjadude:28 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXCIII: Cancioneiro de Canjadude (CCAÇ 5, Gatos Pretos) Cuntima:6 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2245: Cancioneiro de Cuntima (Vitor Silva, CART 3331, 1970/72) Empada:1 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P828: Cancioneiro de Empada (Xico Allen)Gandembel:30 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CDII: O Hino de Gandembel (Zé Teixeira)Mansoa (autor: Eduardo Magalhães Ribeiro, ex-furriel miliciano de operações especiais, da CCS do BCAÇ 4612, 1974)1 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXVI: Cancioneiro de Mansoa (1): o esplendor de Portugal1 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXVII: Cancioneiro de Mansoa (2): Guiné, do Cumeré a Brá 7 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXLVI: Cancioneiro de Mansoa (3): um mosquiteiro barato para um pira... 10 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLIV: Cancioneiro de Mansoa (4): a arte de ser 'ranger'1 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDIX: Cancioneiro de Mansoa (5): Para além do paludismo 19 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLIX: Cancioneiro de Mansoa (6): O pesadelo das minas15 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXVIII: Cancioneiro de Mansoa (7): Os periquitos do pós-guerra31 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCCXXI: Cancioneiro de Mansoa (8): a amizade e a camaradagem ou o comando da 38ª3 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P837: Cancioneiro de Mansoa (9): A mais alta de todas as traições25 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1698: Cancioneiro de Mansoa (10): O 25 de Abril, a Barragem de Castelo de Bode e a descoberta da palavra solidariedadeNiassa (Moçambique):11 de Maio de 2004 > Blogantologia(s) - XI: Guerra Colonial: Cancioneiro do Niassa (1) (Luís Graça) Xime:31 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1009: Cancioneiro do Xime (1): A canção da fome (Manuel Moreira, CART 1746)

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