Talina

19-12-2007
marcar artigo

Não comento a estultícia da afirmação. Recupero-a e remeto-a, por inteiro, para José Sócrates e seu conjunto, certamente alvoroçados pela publicação de duas sondagens que os coloca em queda, não direi livre, mas consideravelmente acentuada. Nem um ministro tem nota positiva. Sócrates, esse, então, é alvo de sério aviso, e, pelos indícios, começa a ser o princípio de uma recordação inquietante.

Alarmado com os resultados, Vítor Ramalho declarou à Imprensa: É necessário dar mais atenção ao partido, ao ideário, à luta por valores e princípios, aos que sofrem. É preciso reencontrar causas que motivem as pessoas. A matriz socialista é indispensável como o pão para a boca”. Ramalho é homem de bem, cauto e cortês, mas convém que não empurre para o olvido o pequeno pormenor histórico de que foi Mário Soares o primeiro a colocar o socialismo na gaveta. A matriz do PS qual é? A que foi fundada na Alemanha? Aquela cuja voz ecoava nas ruas de todo o País, numa palavra de ordem insistente e lírica: “Partido Socialista, Partido Marxista”? O “socialismo moderno” de Sócrates está associado ao “socialismo com turíbulo” de Guterres, tem semelhanças com o de Vítor Constâncio ou parecenças com o de - de quem?, já pouco recordamos dos líderes de percurso.

Ferro Rodrigues tentou inflectir a trajectória do PS e fixá-lo num nível de exigência ideológica adequado ao nome político. Ambicionou fazer pedagogia política, e dizer que não se governa por estatísticas. Ferro procedia do antifascismo, opção por uma luta pela liberdade que parece, hoje, incomodar certa miuçalha. Homem honrado, sereno, culto e sério, o seu comportamento fundava-se nas evidências da verdade. Perante as derivas do partido, cuja actuação parcial, limitada e descaracterizada, apenas visava a conquista do poder, Ferro Rodrigues opunha o rigor dos princípios e a necessidade da batalha ideológica. Foi rapidamente armadilhado. Estão por esclarecer as calúnias de que foi objecto e as infâmias com que tentaram enlamear-lhe o nome. O resto é história: história nebulosa e sinistra.

A relativização do “socialismo” atingiu, com José Sócrates, uma violência social sem precedentes depois de Abril. Beliscou a liberdade de Imprensa; amolgou o Serviço Nacional de Saúde; reduziu a zero o subsistema de saúde dos jornalistas mas manteve os da Polícia e do Exército; cometeu o inacreditável quando aplicou impostos a reformados com pouco mais de 600 euros (120 contos) mensais; provocou uma trapalhada inextricável na Educação; aumentou o desemprego; impôs a delação como forma e método; promoveu inconcebíveis pressões sobre sindicatos e sindicalistas, e converteu em banalidade a insegurança em que vivemos. Se estão interessados, posso aumentar o rol até expressões quase intermináveis.

Surge Luís Filipe Menezes e, em três semanas, faz ruir o PS nas sondagens, segundo a interpretação das quais tudo o que há de pior habita no Executivo Sócrates. Este, de facto, havia conquistado o hoje, o agora, a actualidade, o presente; acenava-nos com o futuro, espargia sobre nós a água santa da esperança e da fé - e, caridosamente, dava cabo de nós, entremeando a loquacidade convicta, de que é capaz, com os tratos de polé ao nosso quotidiano, aplicados com gelada mestria.

O “socialismo moderno” de Sócrates era e é uma fraude. Escrevi-o e disse-o numerosas vezes. Precisávamos, realmente, de uma nova modernidade, fundamentada numa crítica ao capitalismo neoliberal, cuja acção predadora começou a sobressaltar, até, muitos empresários norte-americanos, tolhidos com o avanço larvar de um processo que já não dominam. Basta ler os artigos sobre economia, finanças e política do “New York Times”. Por exemplo.

Menezes tem manifestado, com alguma prudência e uma dose de sensatez, não ser o desarvorado com que o pretenderam apodar, num exercício de perversidades concertado a partir do interior do próprio PSD. Quando afirmou: “Os comunistas não são meus inimigos, são meus adversários”, desencadeou a ira de uma trupe de reaccionários, cujo entendimento da democracia não está associado à tolerância e à compreensão dos que pensam e agem de forma e modo diferentes. Cindir a sociedade entre bons e maus portugueses, falar de nós como quem fala de “outros”, corresponde a uma interpretação deformada, por irreal, do universo em que nos movemos. A sociedade livre funda-se numa longa série de razões a que chamamos ideias.

A ascensão de Luís Filipe Menezes não se deve, somente, às ambiguidades de Sócrates e à avançada antisocial que empreendeu. O presidente do PSD realizou importante obra em Gaia, desenvolveu as actividades económicas, apoiou as artes e a cultura, e não caiu na tentação da intolerância e do ostracismo políticos. A Imprensa oculta o que lhe convém. E Menezes não é conveniente. Há um mês era zurzido por comentadores do óbvio, “historiadores” de rés-do-chão, estipendiados a soldo e com ausência de sentido, numa espécie de charneira paradigmática. Agora, até Marcelo Rebelo de Sousa declara que se enganou, adiantando que Menezes pode muito bem vir a ser o vencedor das eleições em 2009!

Escrevi que o homem possui vigor na discussão, e é muito mais lido e informado do que a esmagadora maioria dos seus detractores - sobretudo os de o seu partido. Ademais, note-se que, no elenco político dos seus conselheiros figuram Ângelo Correia, Luís Fontoura e Domingos Duarte Lima, cuja percepção, inteligência e cultura sobrelevam a média dos actuais “agentes políticos” portugueses.

As afirmações de Vítor Ramalho soam como uma grave advertência àqueles que, em nome do poder pelo poder, revolveram os padrões que, desde a Revolução Francesa, separam a Direita da Esquerda - e exerceram a mais tenebrosa das trapaças, enganando meio mundo. Mas há sempre a outra metade que sobressalta, alvoroça e pode determinar as coisas.

Baptista Bastos

b.bastos@netcabo.pt

Não comento a estultícia da afirmação. Recupero-a e remeto-a, por inteiro, para José Sócrates e seu conjunto, certamente alvoroçados pela publicação de duas sondagens que os coloca em queda, não direi livre, mas consideravelmente acentuada. Nem um ministro tem nota positiva. Sócrates, esse, então, é alvo de sério aviso, e, pelos indícios, começa a ser o princípio de uma recordação inquietante.

Alarmado com os resultados, Vítor Ramalho declarou à Imprensa: É necessário dar mais atenção ao partido, ao ideário, à luta por valores e princípios, aos que sofrem. É preciso reencontrar causas que motivem as pessoas. A matriz socialista é indispensável como o pão para a boca”. Ramalho é homem de bem, cauto e cortês, mas convém que não empurre para o olvido o pequeno pormenor histórico de que foi Mário Soares o primeiro a colocar o socialismo na gaveta. A matriz do PS qual é? A que foi fundada na Alemanha? Aquela cuja voz ecoava nas ruas de todo o País, numa palavra de ordem insistente e lírica: “Partido Socialista, Partido Marxista”? O “socialismo moderno” de Sócrates está associado ao “socialismo com turíbulo” de Guterres, tem semelhanças com o de Vítor Constâncio ou parecenças com o de - de quem?, já pouco recordamos dos líderes de percurso.

Ferro Rodrigues tentou inflectir a trajectória do PS e fixá-lo num nível de exigência ideológica adequado ao nome político. Ambicionou fazer pedagogia política, e dizer que não se governa por estatísticas. Ferro procedia do antifascismo, opção por uma luta pela liberdade que parece, hoje, incomodar certa miuçalha. Homem honrado, sereno, culto e sério, o seu comportamento fundava-se nas evidências da verdade. Perante as derivas do partido, cuja actuação parcial, limitada e descaracterizada, apenas visava a conquista do poder, Ferro Rodrigues opunha o rigor dos princípios e a necessidade da batalha ideológica. Foi rapidamente armadilhado. Estão por esclarecer as calúnias de que foi objecto e as infâmias com que tentaram enlamear-lhe o nome. O resto é história: história nebulosa e sinistra.

A relativização do “socialismo” atingiu, com José Sócrates, uma violência social sem precedentes depois de Abril. Beliscou a liberdade de Imprensa; amolgou o Serviço Nacional de Saúde; reduziu a zero o subsistema de saúde dos jornalistas mas manteve os da Polícia e do Exército; cometeu o inacreditável quando aplicou impostos a reformados com pouco mais de 600 euros (120 contos) mensais; provocou uma trapalhada inextricável na Educação; aumentou o desemprego; impôs a delação como forma e método; promoveu inconcebíveis pressões sobre sindicatos e sindicalistas, e converteu em banalidade a insegurança em que vivemos. Se estão interessados, posso aumentar o rol até expressões quase intermináveis.

Surge Luís Filipe Menezes e, em três semanas, faz ruir o PS nas sondagens, segundo a interpretação das quais tudo o que há de pior habita no Executivo Sócrates. Este, de facto, havia conquistado o hoje, o agora, a actualidade, o presente; acenava-nos com o futuro, espargia sobre nós a água santa da esperança e da fé - e, caridosamente, dava cabo de nós, entremeando a loquacidade convicta, de que é capaz, com os tratos de polé ao nosso quotidiano, aplicados com gelada mestria.

O “socialismo moderno” de Sócrates era e é uma fraude. Escrevi-o e disse-o numerosas vezes. Precisávamos, realmente, de uma nova modernidade, fundamentada numa crítica ao capitalismo neoliberal, cuja acção predadora começou a sobressaltar, até, muitos empresários norte-americanos, tolhidos com o avanço larvar de um processo que já não dominam. Basta ler os artigos sobre economia, finanças e política do “New York Times”. Por exemplo.

Menezes tem manifestado, com alguma prudência e uma dose de sensatez, não ser o desarvorado com que o pretenderam apodar, num exercício de perversidades concertado a partir do interior do próprio PSD. Quando afirmou: “Os comunistas não são meus inimigos, são meus adversários”, desencadeou a ira de uma trupe de reaccionários, cujo entendimento da democracia não está associado à tolerância e à compreensão dos que pensam e agem de forma e modo diferentes. Cindir a sociedade entre bons e maus portugueses, falar de nós como quem fala de “outros”, corresponde a uma interpretação deformada, por irreal, do universo em que nos movemos. A sociedade livre funda-se numa longa série de razões a que chamamos ideias.

A ascensão de Luís Filipe Menezes não se deve, somente, às ambiguidades de Sócrates e à avançada antisocial que empreendeu. O presidente do PSD realizou importante obra em Gaia, desenvolveu as actividades económicas, apoiou as artes e a cultura, e não caiu na tentação da intolerância e do ostracismo políticos. A Imprensa oculta o que lhe convém. E Menezes não é conveniente. Há um mês era zurzido por comentadores do óbvio, “historiadores” de rés-do-chão, estipendiados a soldo e com ausência de sentido, numa espécie de charneira paradigmática. Agora, até Marcelo Rebelo de Sousa declara que se enganou, adiantando que Menezes pode muito bem vir a ser o vencedor das eleições em 2009!

Escrevi que o homem possui vigor na discussão, e é muito mais lido e informado do que a esmagadora maioria dos seus detractores - sobretudo os de o seu partido. Ademais, note-se que, no elenco político dos seus conselheiros figuram Ângelo Correia, Luís Fontoura e Domingos Duarte Lima, cuja percepção, inteligência e cultura sobrelevam a média dos actuais “agentes políticos” portugueses.

As afirmações de Vítor Ramalho soam como uma grave advertência àqueles que, em nome do poder pelo poder, revolveram os padrões que, desde a Revolução Francesa, separam a Direita da Esquerda - e exerceram a mais tenebrosa das trapaças, enganando meio mundo. Mas há sempre a outra metade que sobressalta, alvoroça e pode determinar as coisas.

Baptista Bastos

b.bastos@netcabo.pt

marcar artigo