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12-02-2008
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A transformação do real Ao ser difundido, o material trabalhado pelos Media encontra-se formatado de acordo com o media em questão, ou seja, em virtude do aparato tecnológico utilizado. As mensagens da imprensa são escritas e fixadas em papel (ou em suporte informático, de distribuição na Internet), as da rádio são electrónicas, voláteis, apelando ao efémero, as da televisão, sendo da mesma natureza comportam contudo imagem, o que lhes confere especificidades diferentes e o estatuto da maior difusão. Cada mensagem difundida sofre transformações diferentes de acordo com o meio em questão (lembrar critérios relativos ao meio/formato): uma notícia tendo o mesmo referente mas sendo difundida por diferentes meios acaba por ser não uma coisa, mas antes diferentes coisas. Lembremos que a expressão utilizada por cada meio é diferente, bem como o programa que garante a cadeia de representação também funcionou de forma diferente. Forçosamente, o entendimento conseguido também é diferente. Não é do nosso interesse neste trabalho firmar diferenças entre os vários meios. Basta assumirmos que elas existem e perceber porquê, se reconhecemos nas diferentes notícias de cada meio um acontecimento comum é devido à capacidade de referencialidade, ao sentido transitivo para um referente (objecto) que a informação mediática promove na sua aspiração factual. Os Media, na sua vertente informativa, promovem uma comunicação indicial, como que um dedo estendido que aponta para o real. Esta característica é conseguida de uma forma comum aos vários meios: o género discursivo - a narração. A questão do referente na narração não é contudo pacífica. A narrativa não é um advento actual, é tão velha como a linguagem. Todas as escatologias (mitos fundadores, profecias) foram veiculados por narrativas, constituem uma grande narrativa, as utopias também o foram, bem como as ideologias. Uma diferença existe porém: todas prometem e apontam para um mundo melhor, situado algures no paraíso, num nenhures imaginário ou num futuro realizável. O referente destas narrativas não é um lugar no real presente. Estas grandes narrativas modalizaram-se, isto é, transformaram-se em grandes códigos. A cultura judaico-cristã, por exemplo, devedora de grandes narrativas proféticas, acabou por sedimentar lentamente uma noção de tempo que linearizou de acordo com uma articulação entre o presente e o futuro perfectivelmente realizável. Formou-se assim um grande código, que legitimou simbolicamente o nascimento de linguagens à sombra desta cultura: arte, música, literatura, enfim, um imaginário colectivo. Cada grande código funcionou como uma grande forma central onde diversas linguagens se instituíram. No momento, dominada pela epistéme da medição tecnológica, depois da diluição dos grandes códigos, a sociedade vive um momento de impaciência enunciativa, querendo ver realizadas aqui e agora as promessas e garantias dos grandes códigos. Esta impaciência sempre existiu, “... ao longo dos sucessivos grandes códigos totalizantes, a instantaneidade foi um elemento modalizador (na sua conflitualidade com aqueles), na actual era da mediação tecnológica passou a ser, para além de um elemento modalizador, sobretudo um elemento estruturante (e pacificamente funcional) da nova cultura.” (L. Carmelo, s/d. 62). Esta é a grande diferença (excluindo as morfológicas), o referente da narrativa dos Media é presente, situado no real actual. Mercê de dispositivos tecnológicos de enunciação que permitem uma monitorização do real de uma forma quase mundial, e a difusão instantânea ou quase na mesma escala, criaram-se as condições tecnológicas para a massificação da impaciência enunciativa. A par desta visão transformacionista da cultura social, temos uma visão de solidificação desta transformação na proposta de N. Luhmann. Este propõe uma visão conservadora, os Media cumprem uma função, e é no desempenho desta função que eles mantêm o seu efeito, uma vez que atribuindo um papel de redução aos Media, e interpretando a opinião pública como uma estrutura temática, os primeiros desempenharão o seu papel, tendencialmente fazendo aquilo que já fazem: equilibrando por redução a comunicação de experiências intersubjectivas, permitem uma “discussão” mínima tematizada. Até este ponto vimos a transformação estruturante que os Media desempenharam sobre a forma de interpretar e de representar o real. Contudo, a transformação que os Media operam após a selecção também é de nosso interesse. Falta-nos ainda caracterizar a anatomia da narrativa jornalística. Qualquer jornal assume-se como um sujeito semiótico, tem um título, que designará um projecto de acção, tem um estilo próprio, enfim, uma imagem que é reconhecida pelos leitores. Isto importa também conotações do uso do objecto jornal. Um jornal não é apenas um veículo de informação, é também um objecto portador de um determinado status, é um espaço onde o leitor se revê ou se pretende rever. O espaço de convivência entre o jornal e o leitor é dialógico: o leitor supõem que o jornal fala daquilo que ele quer que fale, o jornal supõe falar daquilo que o leitor quer que se fale. Por outras palavras, o leitor e o jornal prevêem-se. É neste espaço que se escreve e lê uma notícia. As condições de produção da narrativa interessam-nos apenas do ponto de vista de uma inferência, o jornal já contém a notícia escrita e esta é inalterável para o seu produtor. Esta narrativa desenrola-se numa distanciação interlocutória. Referimos antes que a actualidade é condição necessária do jornalismo. Este é uma narrativa célere e resumida. O texto jornalístico contém apenas o fundamental, sendo regra geral o da imprensa o mais completo. Esta narrativa, ao contrário das outras não tem um discurso linear do ponto de vista temporal. A marca da impaciência enunciativa e das tecnologias de produção é visível na discursividade jornalística. A sua disposição deve proporcionar uma leitura breve e fragmentada, bem como uma identificação temática imediata. A segunda consegue-se através do localização no espaço do jornal (caderno, secção temática), bem como na continuidade do acompanhamento de um acontecimento, colocada sempre no mesmo espaço durante algum tempo, o que cria no leitor um hábito e uma expectativa (caso da investigação da morte de Diana, da colisão de dois aviões ao largo de Angola, etc.); bem como através da área do título (que pode também compreender pós título ou ante título). A primeira é conseguida mediante uma técnica de escrita, que em certas áreas condensa e resume narrativa, para uma leitura breve e abrangente, e noutras áreas expande narrativa , pormenoriza e explica, possibilitando uma leitura mais demorada e mais esclarecida. Trata-se pois de um programa da estrutura de produção de notícias. Esclareceremos de seguida algumas características fundamentais desse programa. O início de uma notícia condensa quase toda a informação fundamental. O texto retoma depois explicações, pormenores e flash-backs se for caso disso. Este começo, numa notícia denomina-se lead e deve responder a quatro questões: Quem, o quê, onde, quando? O porquê fica para o corpo na notícia. Se o artigo for longo, o lead pode estar disperso no texto, nesse caso teremos uma abertura. Esta pode resumir em traços genéricos o artigo e contém factos curiosos ou sugestivos que prendam a atenção. Um artigo longo tem em principio subtítulos dispersos pelo seu corpo, organizando os factos em blocos temáticos. Contudo, antes temos ainda o título. Este é o elemento mais condensado de uma notícia. Apenas uma frase deve exprimir a ideia chave para a identificação e expectativas do conteúdo. Do ponto de vista cognitivo o título cruza três saberes: o anterior, o novo e o não saber. O primeiro contextualiza o segundo e este inscreve-se no terceiro antes de ser actualizado. O primeiro é do domínio da pressuposto, o segundo é do domínio do posto. Uma notícia pode ser acompanhada de fotografias, figuras e legendas das anteriores. A legenda promove uma ancoragem do sentido, mais flutuante no caso das imagens. Pode ainda acrescentar algo á notícia, ou precisar concretamente um acontecimento no tempo e no espaço. Regra geral o grafismo prepondera sobre a escrita. A configuração do espaço e da quantidade de texto disponível é determinado pelo primeiro. Estas características prefiguram o formato jornalístico, transformando o material já seleccionado, dando-lhe uma forma. Para N. Luhmann o notícia é uma forma (tal como um preço), a informação é um meio, que é formado mercê de um programa (regras do estilo jornalístico e critérios de noticiabilidade). O valor informativo de uma notícia depende da sua novidade, uma notícia repetida, relembrada como enquadramento tem sentido, mas não tem valor informativo. A construção de uma notícia vive deste equilíbrio. A base reprodutiva dos Media é justamente o sentido. A função dos Media não é a acumulação de informação, é justamente a memória, o esquecimento, só assim o sistema se auto-alimenta. Os Media auto reproduzem-se, criam rotinas que lhes são próprias, fabricando o tempo de que necessitam, ao qual os consumidores se adaptam: noticiários às vinte horas, notícias de hora a hora, um jornal de manhã e outro á tarde. Os Media prefiguram as nossas representações do real mas vão mais além: emergem-nos no seu ritmo, na sua dinâmica, circunscrevem-nos no seu tempo. Os Media são o real. Como os circunscrever então enquanto entidade própria, autónoma? A resposta foi sendo dada ao longo desta exposição, através da teorização de N. Luhmann, encarando-os como sistema. A diferenciação funcional entre sistema e ambiente, mercê do código, um código binário, o sistema obriga-se a si a uma bifurcação, permitindo destinguir o que é unidade de Media e o que não é. Um facto pode ser simultaneamente unidade de mais do que um sistema, “Igual ao “jardim de los senderos que se bifurcam”, é.. possível andar sobre ambas as trilhas ramificadas simultaneamente” (N. Luhmann, 1994: 3). O caso de Duarte Lima abordado no nosso corpus é tanto unidade para o Sistema Jurídico como para os Media. Em suma, podemos afirmar que o real representado é um real transformado (já explicámos quais os processos de selecção e de narrativização), em ordem ao funcionamento dos media. Esta representação assume-se como o próprio real, pelo menos sob o ponto de vista da cognição social, que é este que realmente importa numa sociedade complexa. O que não é acontecimento mediático vive na sombra da inexistência para a cognição social, em termos prático não existe. Mas estes processos de transformação de acontecimentos em notícias (programas) são inevitavelmente processos de construção de sentido e de elaboração simbólica, dependendo de estruturas de compreensão e memorização da função continuamente desempenhada pelos Media. Assim, o mundo real tornou-se uma fábula, contada em tempo real, aqui e agora.

Foi U. Eco quem criou o conceito de duplo signo do objecto. Os objectos têm um signo de uso, e um de uso do uso (um Ferrari é muito mais que um veículo de transporte, umas calças Benetton são mais que uma peça de vestuário, são um programa de um estilo de vida). O segundo signo é sempre portador de conotações sociais. Um jornal também é algo que serve para se mostrar aos vizinhos e ao patrão, é um signo de status. É o caso do jornal que veicula o nosso corpus, “O Expresso” tem justamente este perfil, raramente acabando como invólucro de castanhas assadas como acontece a tantos outros jornais no Inverno. Acreditamos que, se fosse vendido à Sexta-feira e não ao Sábado, acabaria por ter mais compradores entre os empregados de escritório, por exemplo.

A transformação do real Ao ser difundido, o material trabalhado pelos Media encontra-se formatado de acordo com o media em questão, ou seja, em virtude do aparato tecnológico utilizado. As mensagens da imprensa são escritas e fixadas em papel (ou em suporte informático, de distribuição na Internet), as da rádio são electrónicas, voláteis, apelando ao efémero, as da televisão, sendo da mesma natureza comportam contudo imagem, o que lhes confere especificidades diferentes e o estatuto da maior difusão. Cada mensagem difundida sofre transformações diferentes de acordo com o meio em questão (lembrar critérios relativos ao meio/formato): uma notícia tendo o mesmo referente mas sendo difundida por diferentes meios acaba por ser não uma coisa, mas antes diferentes coisas. Lembremos que a expressão utilizada por cada meio é diferente, bem como o programa que garante a cadeia de representação também funcionou de forma diferente. Forçosamente, o entendimento conseguido também é diferente. Não é do nosso interesse neste trabalho firmar diferenças entre os vários meios. Basta assumirmos que elas existem e perceber porquê, se reconhecemos nas diferentes notícias de cada meio um acontecimento comum é devido à capacidade de referencialidade, ao sentido transitivo para um referente (objecto) que a informação mediática promove na sua aspiração factual. Os Media, na sua vertente informativa, promovem uma comunicação indicial, como que um dedo estendido que aponta para o real. Esta característica é conseguida de uma forma comum aos vários meios: o género discursivo - a narração. A questão do referente na narração não é contudo pacífica. A narrativa não é um advento actual, é tão velha como a linguagem. Todas as escatologias (mitos fundadores, profecias) foram veiculados por narrativas, constituem uma grande narrativa, as utopias também o foram, bem como as ideologias. Uma diferença existe porém: todas prometem e apontam para um mundo melhor, situado algures no paraíso, num nenhures imaginário ou num futuro realizável. O referente destas narrativas não é um lugar no real presente. Estas grandes narrativas modalizaram-se, isto é, transformaram-se em grandes códigos. A cultura judaico-cristã, por exemplo, devedora de grandes narrativas proféticas, acabou por sedimentar lentamente uma noção de tempo que linearizou de acordo com uma articulação entre o presente e o futuro perfectivelmente realizável. Formou-se assim um grande código, que legitimou simbolicamente o nascimento de linguagens à sombra desta cultura: arte, música, literatura, enfim, um imaginário colectivo. Cada grande código funcionou como uma grande forma central onde diversas linguagens se instituíram. No momento, dominada pela epistéme da medição tecnológica, depois da diluição dos grandes códigos, a sociedade vive um momento de impaciência enunciativa, querendo ver realizadas aqui e agora as promessas e garantias dos grandes códigos. Esta impaciência sempre existiu, “... ao longo dos sucessivos grandes códigos totalizantes, a instantaneidade foi um elemento modalizador (na sua conflitualidade com aqueles), na actual era da mediação tecnológica passou a ser, para além de um elemento modalizador, sobretudo um elemento estruturante (e pacificamente funcional) da nova cultura.” (L. Carmelo, s/d. 62). Esta é a grande diferença (excluindo as morfológicas), o referente da narrativa dos Media é presente, situado no real actual. Mercê de dispositivos tecnológicos de enunciação que permitem uma monitorização do real de uma forma quase mundial, e a difusão instantânea ou quase na mesma escala, criaram-se as condições tecnológicas para a massificação da impaciência enunciativa. A par desta visão transformacionista da cultura social, temos uma visão de solidificação desta transformação na proposta de N. Luhmann. Este propõe uma visão conservadora, os Media cumprem uma função, e é no desempenho desta função que eles mantêm o seu efeito, uma vez que atribuindo um papel de redução aos Media, e interpretando a opinião pública como uma estrutura temática, os primeiros desempenharão o seu papel, tendencialmente fazendo aquilo que já fazem: equilibrando por redução a comunicação de experiências intersubjectivas, permitem uma “discussão” mínima tematizada. Até este ponto vimos a transformação estruturante que os Media desempenharam sobre a forma de interpretar e de representar o real. Contudo, a transformação que os Media operam após a selecção também é de nosso interesse. Falta-nos ainda caracterizar a anatomia da narrativa jornalística. Qualquer jornal assume-se como um sujeito semiótico, tem um título, que designará um projecto de acção, tem um estilo próprio, enfim, uma imagem que é reconhecida pelos leitores. Isto importa também conotações do uso do objecto jornal. Um jornal não é apenas um veículo de informação, é também um objecto portador de um determinado status, é um espaço onde o leitor se revê ou se pretende rever. O espaço de convivência entre o jornal e o leitor é dialógico: o leitor supõem que o jornal fala daquilo que ele quer que fale, o jornal supõe falar daquilo que o leitor quer que se fale. Por outras palavras, o leitor e o jornal prevêem-se. É neste espaço que se escreve e lê uma notícia. As condições de produção da narrativa interessam-nos apenas do ponto de vista de uma inferência, o jornal já contém a notícia escrita e esta é inalterável para o seu produtor. Esta narrativa desenrola-se numa distanciação interlocutória. Referimos antes que a actualidade é condição necessária do jornalismo. Este é uma narrativa célere e resumida. O texto jornalístico contém apenas o fundamental, sendo regra geral o da imprensa o mais completo. Esta narrativa, ao contrário das outras não tem um discurso linear do ponto de vista temporal. A marca da impaciência enunciativa e das tecnologias de produção é visível na discursividade jornalística. A sua disposição deve proporcionar uma leitura breve e fragmentada, bem como uma identificação temática imediata. A segunda consegue-se através do localização no espaço do jornal (caderno, secção temática), bem como na continuidade do acompanhamento de um acontecimento, colocada sempre no mesmo espaço durante algum tempo, o que cria no leitor um hábito e uma expectativa (caso da investigação da morte de Diana, da colisão de dois aviões ao largo de Angola, etc.); bem como através da área do título (que pode também compreender pós título ou ante título). A primeira é conseguida mediante uma técnica de escrita, que em certas áreas condensa e resume narrativa, para uma leitura breve e abrangente, e noutras áreas expande narrativa , pormenoriza e explica, possibilitando uma leitura mais demorada e mais esclarecida. Trata-se pois de um programa da estrutura de produção de notícias. Esclareceremos de seguida algumas características fundamentais desse programa. O início de uma notícia condensa quase toda a informação fundamental. O texto retoma depois explicações, pormenores e flash-backs se for caso disso. Este começo, numa notícia denomina-se lead e deve responder a quatro questões: Quem, o quê, onde, quando? O porquê fica para o corpo na notícia. Se o artigo for longo, o lead pode estar disperso no texto, nesse caso teremos uma abertura. Esta pode resumir em traços genéricos o artigo e contém factos curiosos ou sugestivos que prendam a atenção. Um artigo longo tem em principio subtítulos dispersos pelo seu corpo, organizando os factos em blocos temáticos. Contudo, antes temos ainda o título. Este é o elemento mais condensado de uma notícia. Apenas uma frase deve exprimir a ideia chave para a identificação e expectativas do conteúdo. Do ponto de vista cognitivo o título cruza três saberes: o anterior, o novo e o não saber. O primeiro contextualiza o segundo e este inscreve-se no terceiro antes de ser actualizado. O primeiro é do domínio da pressuposto, o segundo é do domínio do posto. Uma notícia pode ser acompanhada de fotografias, figuras e legendas das anteriores. A legenda promove uma ancoragem do sentido, mais flutuante no caso das imagens. Pode ainda acrescentar algo á notícia, ou precisar concretamente um acontecimento no tempo e no espaço. Regra geral o grafismo prepondera sobre a escrita. A configuração do espaço e da quantidade de texto disponível é determinado pelo primeiro. Estas características prefiguram o formato jornalístico, transformando o material já seleccionado, dando-lhe uma forma. Para N. Luhmann o notícia é uma forma (tal como um preço), a informação é um meio, que é formado mercê de um programa (regras do estilo jornalístico e critérios de noticiabilidade). O valor informativo de uma notícia depende da sua novidade, uma notícia repetida, relembrada como enquadramento tem sentido, mas não tem valor informativo. A construção de uma notícia vive deste equilíbrio. A base reprodutiva dos Media é justamente o sentido. A função dos Media não é a acumulação de informação, é justamente a memória, o esquecimento, só assim o sistema se auto-alimenta. Os Media auto reproduzem-se, criam rotinas que lhes são próprias, fabricando o tempo de que necessitam, ao qual os consumidores se adaptam: noticiários às vinte horas, notícias de hora a hora, um jornal de manhã e outro á tarde. Os Media prefiguram as nossas representações do real mas vão mais além: emergem-nos no seu ritmo, na sua dinâmica, circunscrevem-nos no seu tempo. Os Media são o real. Como os circunscrever então enquanto entidade própria, autónoma? A resposta foi sendo dada ao longo desta exposição, através da teorização de N. Luhmann, encarando-os como sistema. A diferenciação funcional entre sistema e ambiente, mercê do código, um código binário, o sistema obriga-se a si a uma bifurcação, permitindo destinguir o que é unidade de Media e o que não é. Um facto pode ser simultaneamente unidade de mais do que um sistema, “Igual ao “jardim de los senderos que se bifurcam”, é.. possível andar sobre ambas as trilhas ramificadas simultaneamente” (N. Luhmann, 1994: 3). O caso de Duarte Lima abordado no nosso corpus é tanto unidade para o Sistema Jurídico como para os Media. Em suma, podemos afirmar que o real representado é um real transformado (já explicámos quais os processos de selecção e de narrativização), em ordem ao funcionamento dos media. Esta representação assume-se como o próprio real, pelo menos sob o ponto de vista da cognição social, que é este que realmente importa numa sociedade complexa. O que não é acontecimento mediático vive na sombra da inexistência para a cognição social, em termos prático não existe. Mas estes processos de transformação de acontecimentos em notícias (programas) são inevitavelmente processos de construção de sentido e de elaboração simbólica, dependendo de estruturas de compreensão e memorização da função continuamente desempenhada pelos Media. Assim, o mundo real tornou-se uma fábula, contada em tempo real, aqui e agora.

Foi U. Eco quem criou o conceito de duplo signo do objecto. Os objectos têm um signo de uso, e um de uso do uso (um Ferrari é muito mais que um veículo de transporte, umas calças Benetton são mais que uma peça de vestuário, são um programa de um estilo de vida). O segundo signo é sempre portador de conotações sociais. Um jornal também é algo que serve para se mostrar aos vizinhos e ao patrão, é um signo de status. É o caso do jornal que veicula o nosso corpus, “O Expresso” tem justamente este perfil, raramente acabando como invólucro de castanhas assadas como acontece a tantos outros jornais no Inverno. Acreditamos que, se fosse vendido à Sexta-feira e não ao Sábado, acabaria por ter mais compradores entre os empregados de escritório, por exemplo.

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