José Afonso morreu há 20 anos

04-10-2009
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Por ocasião dos 20 anos da morte de José Afonso, realizam-se hoje várias iniciativas, que decorrem em todo o país, desde colóquios a exposições, passando por vários espectáculos evocando o autor de “Grândola, Vila Morena”, música que foi a senha da revolução de 25 de Abril de 1974, base da queda da ditadura.

A 23 de Fevereiro de 1987, morreu o músico e cantor José Afonso, com 57 anos, após lhe ter sido diagnosticada em 1983, esclerose múltipla, da qual viria a falecer em Setúbal, na madrugada de 23 de Fevereiro de 1987.

Sobre a efeméride, Pedro Barroso, amigo pessoal e companheiro das lides das cantigas, enviou-me hoje esta bonita e singela homenagem:

Faz hoje 20 anos que o homem partiu deixando-nos o mundo. Ficámos mais pobres, mais órfãos do saber e do viver.

Hoje, reflectindo o espanto de tantas mortes progressivamente convividas, pergunto-me se não haveria mais do que o cantor no nosso peito. Claro que havia. O Homem, o Filósofo, o Poeta, o Amigo.

Havia seguramente o seu ar desleixado e non chalant, o seu sorriso maroto por detrás dos óculos grossos, a sua atenção desatenta, as suas gaffes proverbiais, a sua indiferença perante o bem parecer, a sua permanente preocupação pedagógica, a sua reflexão inteligente, imediata.

Eram e foram também vinte anos a mais que acumulámos em raiva comedida e erros e saudade. Saudade que passa também por nós próprios, companheiros que cantámos com ele por esses palcos fora talvez algumas horas de sol e ré ao som da chula da Póvoa, que pelo menos essa, todos nós sabíamos.

– Oh Pedro, tu que tens esse boieiro todo, ataca aí, que eu ando com pigarro… – dizia-me ele com humildade. Disparate! Alguém queria saber de mim? Era ele o desejado, a figura maior do nosso acreditar.

Zeca e outros, era assim que se anunciava:

Por vezes, mesmo sem ele próprio saber que tinha sido anunciada a sua presença naquele sitio e lugar.

E nós companheiros de palco, éramos os outros. Pacificamente e sem inveja. Com um orgulho imenso de o sermos.

Pois seremos nós, hoje, os outros todos, que lembramos. O povo que deixaste.

Mas o exemplo universal do homem probo e bom, do homem que nada quis para ele e mudou a paisagem sonora de tudo o que crescemos, de tudo o que aprendemos, esse exemplo fica.

Vinte anos já? Zeca?

Foi ontem que morremos todos um pouco contigo.

Se não acreditas, vê só até onde isto já veio parar. Ouve e vê.

E morramos outra vez de susto, neste choupal imenso de agonia e cupidez.

Deixa-me sonhar.

A catedral está ainda toda por fazer.

Pedro Barroso

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Por ocasião dos 20 anos da morte de José Afonso, realizam-se hoje várias iniciativas, que decorrem em todo o país, desde colóquios a exposições, passando por vários espectáculos evocando o autor de “Grândola, Vila Morena”, música que foi a senha da revolução de 25 de Abril de 1974, base da queda da ditadura.

A 23 de Fevereiro de 1987, morreu o músico e cantor José Afonso, com 57 anos, após lhe ter sido diagnosticada em 1983, esclerose múltipla, da qual viria a falecer em Setúbal, na madrugada de 23 de Fevereiro de 1987.

Sobre a efeméride, Pedro Barroso, amigo pessoal e companheiro das lides das cantigas, enviou-me hoje esta bonita e singela homenagem:

Faz hoje 20 anos que o homem partiu deixando-nos o mundo. Ficámos mais pobres, mais órfãos do saber e do viver.

Hoje, reflectindo o espanto de tantas mortes progressivamente convividas, pergunto-me se não haveria mais do que o cantor no nosso peito. Claro que havia. O Homem, o Filósofo, o Poeta, o Amigo.

Havia seguramente o seu ar desleixado e non chalant, o seu sorriso maroto por detrás dos óculos grossos, a sua atenção desatenta, as suas gaffes proverbiais, a sua indiferença perante o bem parecer, a sua permanente preocupação pedagógica, a sua reflexão inteligente, imediata.

Eram e foram também vinte anos a mais que acumulámos em raiva comedida e erros e saudade. Saudade que passa também por nós próprios, companheiros que cantámos com ele por esses palcos fora talvez algumas horas de sol e ré ao som da chula da Póvoa, que pelo menos essa, todos nós sabíamos.

– Oh Pedro, tu que tens esse boieiro todo, ataca aí, que eu ando com pigarro… – dizia-me ele com humildade. Disparate! Alguém queria saber de mim? Era ele o desejado, a figura maior do nosso acreditar.

Zeca e outros, era assim que se anunciava:

Por vezes, mesmo sem ele próprio saber que tinha sido anunciada a sua presença naquele sitio e lugar.

E nós companheiros de palco, éramos os outros. Pacificamente e sem inveja. Com um orgulho imenso de o sermos.

Pois seremos nós, hoje, os outros todos, que lembramos. O povo que deixaste.

Mas o exemplo universal do homem probo e bom, do homem que nada quis para ele e mudou a paisagem sonora de tudo o que crescemos, de tudo o que aprendemos, esse exemplo fica.

Vinte anos já? Zeca?

Foi ontem que morremos todos um pouco contigo.

Se não acreditas, vê só até onde isto já veio parar. Ouve e vê.

E morramos outra vez de susto, neste choupal imenso de agonia e cupidez.

Deixa-me sonhar.

A catedral está ainda toda por fazer.

Pedro Barroso

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