Limite: História da Canção de Resistência em Portugal

21-06-2005
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-História da Canção de Resistência... ou "Música de Intervenção, ou "Canto Livre", nos Anos 60 e 70.Manuel Freire nasceu em Vagos ( Aveiro), no dia 25 de Abril de 1942.Técnico de computadores, Manuel Freire nunca se profissionalizou na música.O seu primeiro trabalho discográfico foi um EP com 4 temas, entre os quais o famoso "Livre" ( Não há machado que corte a raiz ao pensamento, porque é livre como o vento...).Editado em 1968, este disco contém ainda "Dedicatória" , "Pedro Soldado" e "Eles".O cantor começa a relacionar-se com outros da mesma área, tais como Adriano Correia de Oliveira, José Afonso ou Padre Fanhais. Após uma participação no programa "Zip Zip" na RTP, em que interpreta uma canção com o poema de António Gedeão "Pedra Filosofal" , obtém um êxito quase imediato.Começa a musicar poetas de grandes poetas portugueses e edita um álbum homónimo com 11 canções. Os poetas deste disco são Gedeão, José Gomes Ferreira, Fernando Assis Pacheco, Eduardo Olímpio, Sidónio Muralha e José Saramago.As músicas são quase todas de Freire , à excepção de duas que são de M. Jorge Veloso. Com este disco ganha o Prémio da Casa da Imprensa e o Prémio Pozal Domingues. É neste LP que estão os temas " Abaixo D. Quixote", "A Menina Bexigosa", ou "Poema da Malta das Naus".Como ele contou recentemente no programa de televisão "Miguel Ângelo Ao Vivo", tinha um irmão que era oficial do Exército e lhe telefonou no dia 25 de Abril de 1974,dando-lhe os parabéns pelo aniversário e perguntando-lhe se tinha gostado da prenda. A prenda era a Revolução dos Cravos.A seguir ao 25 de Abril de 74, Manuel Freire dedica-se aos recitais, um pouco por todo o país, actuando sobretudo em Associações Recreativas e Culturais , onde mantém um público fiel. A limpidez da sua voz , a pronúncia correcta e o facto das suas músicas serem acompanhadas por excelentes poemas contribuem para o seu reconhecimento público.O último trabalho do autor é o CD " As Canções Possíveis", onde Manuel Freire canta poemas de José Saramago , numa edição da Editorial Caminho ( editora de Saramago ). Neste disco , com 12 canções, Manuel Freire é acompanhado por um grupo de músicos tocando violino, piano, contrabaixo, clarinete e violoncelo. Este álbum, recentemente editado, pertence à colecção Caminho de Abril ; que a editora lançou para comemorar os 25 anos do 25 de Abril.Manuel Freire é um cantor que, ainda há pouco tempo, era convidado com frequência para sessões nas Universidades portuguesas. Hoje, a cultura estudantil está noutra onda...Como já toda a gente conhece a Pedra Filosofal, "a cantiga por eccelência" do Manuel, escolhi uma outra menos(?) conhecida, intitulada: "Pequenos Deuses Caseiros", poema da autoria de Sidónio Muralha e música de Manuel Freire. Pequenos deuses caseirosque brincais aos temporais,passam-se os dias, semanas,os meses e os anos e vós jogais, jogais o jogo dos tiranos.Pequenos deuses caseiroscantai cantigas maciastomai vossa morfina,perdulai vossos dinheirosderramai a vossa raivagozai vossas tiranias,pequenos deuses caseiros.Erguei vossos casteloselegei vossos senhoresespancai vossos criados,violai vossas criadas,e bebei,o vinho dos traidoresservido em taças roubadasDormi em colchões de pena,dançai dias inteiros,comprai os que se vendem,alteai vossas janelas,e trancai as vossas portas,pequenos deuses caseiros,e reforçai, reforçai as sentinelas.====================================== Francisco Fanhais nasceu na Praia do Ribatejo a 17 de Maio de 1941.Com dez anos vai para os seminários de Almada e Olivais, onde termina o curso de Teologia.Em 1964 é ordenado padre e em 1969, como professor de Moral começa a interessar-se sobre a realidade à sua volta. As aulas eram no Barreiro, terra onde ele conhece José Afonso que o incentivará a cantar contra o regime.Participa no programa de Televisão " Zip-Zip" e grava o seu primeiro disco intitulado " Cantilenas".Em 1970 grava e edita o seu disco " Canções da Cidade Nova" , com arranjos de Thilo Krassman. As músicas deste disco são de sua autoria e as letras de consagrados poetas , como Sophia de Mello Breyner, Manuel Alegre e António Aleixo." Cantata de Paz" , com letra de Sophia e o famoso refrão " Vemos, Ouvimos e Lemos, Não Podemos Ignorar", torna-se um dos hinos de resistência ao regime derrubado em Abril de 74.Deste disco fazem ainda parte outros temas, tais como " Quadras do Poeta Aleixo", "Porque" , " Canto do Ceifeiro" e " Canção da Cidade Nova". Esta última canção ,com poema de Francisco Melro, é inspirada num tema bíblico. A música de Fanhais é uma música simples, mas eficaz , na senda dos "baladeiros", movimento a que ficaram associados muitos dos cantores que usavam a canção para denunciar as injustiças.José Afonso escreve uma " Dedicatória" na contracapa do LP, que reza assim: " Tu que cantas, Defronte ,De faces atentas, e Seguras, Faz do teu Canto, Uma funda, Nesse lugar, Entre outras mãos mais fortes, E mais duras, Te estenderei , A Minha mão fraterna. Canta Amigo".Este disco seria reeditado em CD, no ano de 1998 e o seu título seria alterado para " Dedicatória" , com o manuscrito da dedicatória de José Afonso a servir de capa.Em 1971 , Fanhais parte para França , porque estava proibido de cantar, de exercer o sacerdócio e de leccionar nas escolas oficiais. Torna-se militante da LUAR e só regressa a Portugal após o 25 de Abril de 74.Em 1975 colabora nas campanhas de dinamização cultural do MFA, juntamente com José Afonso e outros cantores e participa na gravação do disco " República", gravado ao vivo por José Afonso, na Itália, disco esse que é uma das maiores raridades no panorama discográfico português.Em 1984 vai viver para Alvito, no Baixo Alentejo e dedica-se ao ensino de Educação Musical em escolas oficiais.Participa , como convidado, no disco "Ao Vivo no Coliseu" de José Afonso, onde faz coros na bonita canção " Natal dos Simples".Em 1993 regressa ao palco para, conjuntamente com Manuel e Pedro Barroso, apresentar o espectáculo " Encontro" , efectuados em Portugal e em França.No dia 10 de Junho de 1995 é agraciado com a Ordem da Liberdade pelo Presidente da República, Mário Soares.Continua a cantar, sempre que lhe pedem , em escolas e ,sobretudo, em Festas do 25 de Abril ou em homenagens a José Afonso.Quando lhe perguntam pela vida responde que tem " dois filhos, dois discos, muitas árvores e muitos amigos". Fanhais, tornou-se o expoente máximo dos católicos progressistas, que desde a célebre carta do bispo do Porto a Salazar em 1958, se vinham progressivamente demarcando do regime. Com Francisco Fanhais a postura oposicionista é clara e radical, e os discos Canções da Cidade Nova e Cantilena que grava em 1969 e 1970 são disso prova, representando trabalhos marcantes no movimento dos cantores de intervenção.Para finalizar, aqui fica uma das cantigas dele, talvez a que "marca" efectivamente o autor.CANTATA DA PAZ Letra de Sophia de Mello Breyner Andresen Música de Francisco FanhaisVemos, ouvimos e lemosNão podemos ignorarVemos, ouvimos e lemos ( Refrão )Não podemos ignorar Vemos, ouvimos e lemosRelatórios da fomeO caminho da injustiçaA linguagem do terror A bomba de HiroshimaVergonha de nós todosReduziu a cinzasA carne das crianças D'África e VietnameSobe a lamentaçãoDos povos destruídosDos povos destroçados Nada pode apagarO concerto dos gritosO nosso tempo éPecado organizado=============================================Fausto"...Dez álbuns de originais num total de 12 discos publicados em 30 anos são a face palpável da carreira daquele que é hoje, possivelmente, o compositor e intérprete mais carismático da Música Popular Portuguesa."...Assim dizia um dia o crítico Viriato Teles sobre o genial músico/poeta/cantor, e que melhor forma de começar a dizer alguma coisa sobre Fausto?BiografiaCarlos Fausto Bordalo Gomes Dias, nascido em Novembro de 1948 em pleno Oceano Atlântico, a bordo do navio Pátria que navegava entre Portugal e Angola.Fausto, por muitos considerado o mais importante compositor vivo da música popular portuguesa, teve um início de carreira recheado de indecisões. Estudante do Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina (ISCSPU), é em plena vida académica que grava o primeiro 45 rotações, a que se segue o álbum homónimo, Fausto.O primeiro grupo de que fez parte chamava-se Os Rebeldes e cultivava, naturalmente, a música pop da altura. Em 1968, com 20 anos, fixou-se em Lisboa para iniciar os estudos universitários (é licenciado em Ciências Sócio-Políticas e frequentou um mestrado de Relações Internacionais) e foi no âmbito do movimento associativo que se revelou como cantor, aproximando-se rapidamente do movimento que já integrava então nomes como José Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Manuel Freire ou Vieira da Silva – juntamente com José Mário Branco ou Luís Cília, que viviam no exílio – e que teve um importante papel político e cultural na resistência aos últimos anos do fascismo e no processo revolucionário iniciado com o 25 de Abril de 1974.Em declarações proferidas à revista Flama em 1970, Fausto hesita ainda na continuidade do trabalho musical: "nunca acreditei muito na minha voz, nem ainda hoje acredito. Já pensei várias vezes na data em que vou largar "isto". (...) Dizem-me que devo continuar, mas não sei bem se será até no próximo mês de Junho que porei o ponto final. Depois, cantarei apenas para os amigos e para mim próprio".A realidade dos factos (e dos anos entretanto passados) encarregou-se de desfazer as dúvidas do então jovem estudante. Eleito presidente da direcção da Associação dos Estudantes do ISCSPU, Fausto viu o seu nome não ser homologado no cargo pelo Ministério da Educação, em consequência de um certo comprometimento político da sua actividade musical. E, como castigo, é chamado a cumprir o serviço militar, embora possuísse todas as condições para ter um adiamento. Em resultado, Fausto recusa-se a comparecer no quartel e é considerado refractário.Vivendo quase clandestino, Fausto faz grande parte das gravações do seu segundo LP, P'ró Que Der e Vier, em Madrid. Nele, inclui letras de Eugênio de Andrade e Mário Henrique Leiria, num todo de características políticas muito acentuadas.(…) Para finalizar, lá está o "martírio" de sempre: Que poesia do autor vou escolher?... Elas são todas tão...Mas como tenho que escolher uma... escolho a poesia que deu nome a um dos seus albuns mais conhecidos; Atrás dos Tempos(letra e música de Fausto Bordalo Dias) Eu pego na minha violaE canto assimEsta vidaA correrEu sei que é pouco e não consolaNem cozido à portuguesa há sequerQuem canta sempre se levantaCalados é que podemos cairCom o vinho molha-se a gargantaSe a lua nova está para subirQue atrás dos tempos vêm temposE outros tempos hão-de virEu sei de histórias verdadeirasUmas belasOutras tristes de assombrarDo marinheiro morto em terraEm luta por melhor vida no marDa velha criada despedidaQue enlouqueceu e se pôs a cantarE do trapeiro da avenidaMal dormido se pôs a ouvirQue atrás dos tempos vêm temposE outros tempos hão-de virSei de vitórias e derrotasNesta luta que se há-de vencerSe quem trabalha não esgostaNo seu salário sempre a descerOlha a políciaOlha o talherOlha o preço da vida a subirMas quem mal fazPor mal espereSe o tirano fez a festaP'ra fugirQue atrás dos tempos vêm temposE outros tempos hão-de virMas esse tempo que há-de virNão se espera como a noiteEspera o diaNasce da força que transpiraDe braços e pernas em harmoniaJá basta tanta desgraçaQue a gente tem no peitoA cairNão é do povoNem da raçaMas do modo como vês o porvirQue atrás dos tempos vêm temposE outros tempos hão-de vir=========================================="...Eu hoje venho aqui falar..."Assim começa uma das cantigas do poeta/compositor/cantor que eu hoje queroreferenciar. Já adivinharam, claro, que estou a falar de SÉRGIO GODINHO.Sérgio Godinho nasceu em 1945 na cidade do Porto. O seu percurso como escritor de canções ( como ele gosta que o chamem ) foi este:1963 - Para evitar cumprir o serviço militar obrigatório e ser enviado para a guerra colonial, parte para o estrangeiro. Começa por viver na Suíça, onde estuda Psicologia, em Genebra, durante dois anos com Jean Piaget, antes de passar para França, onde vive o Maio de 68. 1969 - Actua, durante dois anos, na produção francesa do musical «Hair» onde conhece Shila. Em Paris toma contacto com outros músicos exilados, como Luís Cília e José Mário Branco. Embora já compusesse música, fazia-o em francês, e será o contacto com os seus conterrâneos exilados que o desperta para a língua portuguesa.1971 - Participa no álbum de estreia a solo de José Mário Branco, Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vontades, para o qual escreve quatro letras e participa como músico acompanhante. Grava o seu primeiro álbum, em Strawberry Studio do Chateau d'Hérouville, em França, com músicos locais, para a companhia Sassetti, mas a sua edição é adiada para 1972.Nov. (26) - O seu EP de estreia, Romance de Um Dia na Estrada, é editado pela Sassetti e apresentado à imprensa numa sessão realizada no cinema Roma, em Lisboa, onde é igualmente lançado o álbum de José Mário Branco.Parte para o Brasil com Shila, e a companhia de teatro Living Theater. É preso e expulso do Brasil. Vai viver para Amsterdão, onde passa seis meses a preparar o novo disco.1972 - É editado Os Sobreviventes, álbum de estreia, que é muito bem recebido pela crítica e pelo público. O álbum receberá o Prémio da Casa da Imprensa para Melhor Disco Português do Ano, mas é interditado três dias depois da edição, sendo sucessivamente autorizado e novamente proibido.Regista o seu segundo álbum Pré-Histórias, também gravado em França, e colabora com duas letras para Margem de Certa Maneira, de José Mário Branco.Out. - Casa-se com Shila, em Montreal.1973 - Junta-se à companhia de teatro Genesis. Estabelece-se em Vancouver, numa comunidade hippie. Em Portugal, a Sassetti edita Pré-Histórias, do qual se destaca imediatamente um dos grandes hinos da carreira do cantor e compositor, «A Noite Passada». É no Canadá que o 25 de Abril o apanha, regressando a Portugal pouco depois da Revolução.Finalizo destacando um poema/cantiga deste notável "cantor/resistente". Como sempre, a dificuldade da escolha foi grande. O seu vasto e rico repertório deixou-me novamente " à nora", mas... como tenho que escolher um, recorri ao seu primeiro trabalho em L.P. chamado " Sobreviventes ", gravado em 1971 e posto a circular em 1972, e que se chama:QUE FORÇA É ESSA AMIGO?Vi-te trabalhar o dia inteiroconstruir as cidades para os outroscarregar pedras, desperdiçarmuita força por pouco dinheiroQue força é essa que trazes nos braçosque só te serve para obedecerque só te manda obedecer?que força é essa amigoque te põe de bem com os outrose de mal contigo?Não me digas que não me compreendesquando os dias se tornam azedosnão me digas que nunca sentisteuma força a crescer-te nos dedose uma raiva a nascer-te nos dentesnão me digas que não me compreendes==========================================Hoje venho aqui falar de uma figura "de peso" na Canção Livre; Hoje vou falar de LUÍS CÍLIALuis Cília nasceu no Huambo ( Angola ), em 1943. Veio para Portugal em 1959,para prosseguir os seus estudos. Em 1962 conheceu o poeta Daniel Filipe que o incentivou a musicar poesia. Datam desse ano as suas primeiras experiências nesse campo ( "Meu país", " O menino negro não entrou na roda" ,etc.),mais tarde incluidos no seu primeirodisco,gravado em França, para a editora Chant du Monde. Em abril de 1964 partiu para Paris,onde viveu até 1974.Em França estudou guitarra clássica com António Membrado e composição comMichel Puig.Entre 1964 e 1974 realizou recitais em quase todos os países da Europa. Depois do seu regresso a Portugal continuou a gravar discos, como compositor e intérprete e a realizar recitais.Como intérprete, gravou dezoito discos, alguns dos quais dedicados a poetas ,tais como, Eugénio de Andrade ("O peso da sombra") Jorge de Sena ("Sinais de Sena"), ou David Mourão Ferreira ("Penumbra").Nos últimos anos tem-se dedicado apenas à composição, nomeadamente para Teatro, Bailado e Cinema.Cronologicamente ....1943Luís Fernando Castelo Branco Cília, nasce em Huambo, Angola. Vive parte da sua vida de estudante em colégios internos, por ser filho de pais separados. Trava conhecimento no internato com o poeta Daniel Filipe que lhe mostra discos de Leo Ferré e George Brassens o que o leva a inflectir de tipo de opção musical. Participa nas lutas académicas de Coimbra, ou como ele refere com modéstia "era mais um que estava na cantina… sem que tivesse participação de realce", mas o que é certo é que foi nesta data aberto o seu processo na PIDE.Frequenta económicas mas sem ligar muito às aulas. Integra as equipas de futebol e de basquetebol. Decide abandonar o país. Sai de Portugal no ano seguinte, acompanhado por um militar desertor e a esposa deste a "bordo" de um Fiat 500.Vai para Paris onde chega a 1 de Abril. Aí trava conhecimento de imediato com políticos, poetas e músicos, com realce para a cantora Collete Magny a qual o irá apresentar à editora do seu primeiro disco: a "Chant du Monde". Grava o LP "Portugal-Angola: Chants de Lutte." Neste mesmo ano conhece Adriano Correia de Oliveira e Manuel Alegre (quando este vai para Paris).As suas primeiras músicas são feitas com total desconhecimento da obra de José Afonso ou de Adriano. Trabalha na União dos Estudantes Franceses, "(…) era o tipo que tirava lá cópias (…)".Trava conhecimento com grandes expoentes da música francesa como George Brassens, o qual é o seu "padrinho" quando se inscreve na Sociedade dos Autores, em França. Posteriormente conhece o músico espanhol Paço Ibañez, de quem se tornou muito amigo e companheiro nos espectáculos profissionais e nos de pura militância, para sindicatos, associações e partidos. Edita o EP "Portugal Resiste" e faz a música do filme "O Salto".Vai a Cuba. Actua no festival ( tocando em frente de Fidel Castro). Conhece Carlos Puebla e traz clandestinamente de Cuba as bobines da canção de Carlos Puebla "Hasta Siempre", as quais possibilitarão a divulgação desta canção na Europa. Edita a trilogia de discos para editora EMEN, "La poesie portugaise de nos jours e de toujours 1, 2, e 3".São discos posteriormente reeditados em CD em 1996, em França.Participa activamente no Maio de 68, realizando espectáculos de apoio ao lado de Paco Ibañez e de Collete Magny. Durante finais dos anos sessenta e início da década de setenta, realiza espectáculos por toda a Europa: Inglaterra, Itália, Suíça, Espanha, etc. Neste país quase que é "apanhado" pois realizou um espectáculo em Santiago de Compostela e o Cônsul Português solicitou a sua detenção. Paga uma multa e são suspensos os espectáculos seguintes. Em 1969 é expulso do PCP clandestino em França, pois recebia em casa amigos de outras convicções políticas. O que ele nunca deixará de fazer porque eram seus amigos.Em 1971 o núcleo do PCP de Paris, verificando o erro cometido, pede-lhe desculpas pelo incidente de dois anos antes. Em 1972 actua no primeiro comício do PS em França ao lado de José Mário Branco, não sem antes colocar certas condições tendo em conta que era militante de um outro partido. Em 1973 o "Avante", canção de Luís Cília, é hino oficial do PCP, em Aveiro.Em entrevista à rádio Portugal Livre, Luís Cília explica " … o Avante não começou por ser hino coisa nenhuma" - diz-nos - "foi de resto o Carlos Antunes que me pediu para fazer uma música para passar na rádio. E eu fiz, escrevi essa música, dei a partitura e a letra e nunca mais pensei nisso, não gravei e nem sequer era cantada por mim…"Actua neste ano no Festival Mundial da Juventude na ex-RDA.Edita "Contra a Ideia da Violência a Violência da Ideia" em clara homenagem a Amílcar Cabral, então assassinado. Reedita o seu primeiro disco mas agora acompanhado por contrabaixo, com o novo título de " Meu País". No 25 de Abril de 1974 regressa a Portugal, no mesmo avião em que também regressam Álvaro Cunhal e José Mário Branco. Luís Cília ainda irá assegurar por algum tempo compromissos profissionais em França, não se estabelecendo completamente em Portugal.Luís Cília compôs e cantou belos trexos. Já sabem da minha dificuldade de escolher um entre tantos tão maravilhosos, mas como tenho que escolher um, escolho um que vai pôr alguns de nós a cantar recordando:Erguer a voz e cantaré força de quem é novoviver sempre a esperarfraqueza de quem é povoNão vás ao sabor do ventoaprende a canção da esperançavem semear tempestadesse queres colher a bonançaCanta, canta amigo, cantavem cantar a nossa cançãotu sozinho não és nadajuntos temos o mundo na mãoJá que me chamas amigoprova-me lá que o ésvem para a ceifa comigona terra sujar teus pésEu vou contigo para o campoeu vou colher o teu pãotu dás-me a força da vidae eu dou-te a minha canção===========================================É outra das figuras de proa da música da Resistência; JOSÉ MÁRIO BRANCOMúsico, compositor e cantor, nasceu no Porto em 1942. Estudou História na Faculdade de Letras de Coimbra, e aos 21 anos vai para o exílio em França, onde permanecerá até ao 25 de Abril de 1974.Em Paris, desenvolve intensa actividade em grupos culturais, participando em vários espectáculos para emigrantes portugueses. Em 1967, lança o seu primeiro com um E.P. intitulado " Seis Cantigas de Amigo ".É também em Paris que o cantor trabalha com José Afonso, fazendo os arranjos e a direcção musical do disco " Cantigas do Maio ", em 1971. " Foi a experiência mais conseguida que tive com o Zeca. Tenho uma grande admiração pelo seu génio e foi com ele que realmente formei o melhor de mim como arranjador e director musical ".O ano de 1971 seria decisivo para a carreira do próprio José Mário Branco, pois é o ano de " Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades ", o disco com que se tornou conhecido e que representa uma viragem no panorama da música portuguesa.José Mário Branco viria a trabalhar mais vezes com José Afonso, nomeadamente em " Venham mais cinco " ( 1973 ).Depois da revolução, o cantor volta a Portugal. É fundador dos GAC ( Grupo de Acção Cultural ) e percorre o país fazendo espectáculos e participando em dinamizações culturais. Faz música para teatro e para cinema e colabora em diversas iniciativas.Os anos 80 são os da catarse, a descida aos infernos da desilusão, o ajuste de contas com uma geração e os seus fantasmas. " Ser Solidário " e "F.M.I." são os testemunhos gravados disso mesmo.É difícil também com o Zé, escolher uma letra que possa pôr em destaque. Mais uma vez escolhi uma das menos trauteadas mas muito, muito bela; Chama-se Fado da Tristeza, com letra e música da sua autoria, que podem apreciar no Álbum " Ser Solidário ". Porque a escolhi? Vocês compreenderão.FADO DA TRISTEZALetra e Música de José Mário BrancoIn: " Ser Solidário " 1982Não cantes alegrias a fingirse alguma dor existira roer dentro da tocadeixa a tristeza sairpois só se aprende a sorrircom a verdade na bocaQuem canta uma alegria que não temnão conta nada a ninguémfala verdade a mentircada alegria que inventasmata a verdade que tentaspois é tentar a fingirNão cantes alegrias de encomendaque a vida não se remendacom morte que não morreucanta da cabeça aos péscanta com aquilo que éssó podes dar o que é teu==========================================É o símbolo mais vivo da canção contestatária, O ZECA, ou ainda JOSÉ AFONSO.Eis o retrato de um dos maiores ( senão o maior ) humanista português do século XX.José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos nasceu a 2 de Agosto de 1929, em Aveiro, "na parte da cidade voltada para o realismo e para o mar".Quando o pai, José Nepomuceno Afonso, foi colocado em Angola, em 1930, como delegado do Procurador da República, Zeca Afonso permaneceu em Aveiro por razões de saúde, confiado aos cuidados da tia Gigé e do tio Xico, um "republicano anticlerigal, anti-sidonista. Um homem impoluto". Tinha então um ano e meio e cresceu numa casa situada na Fonte das sete Bicas, rodeado da ternura fraterna das primas e dos tios. De 1932 a 1937 José Afonso viveu com os pais e irmãos em Angola, deslumbrando-se com a imensidão africana. A relação física com a natureza causou-lhe uma profunda ligação ao continente africano que se refletirá pela sua vida fora. As trovoadas, os grandes rios atravessados em jangadas, a floresta esconderam-lhe a realidade colonial. Só anos mais tarde, ao exercer a docência em Moçambique, conhecerá a fotografia amarga da sociedade colonial moldada ao estilo do "apartheid" de Pretória.Em 1937 volta para Aveiro, onde é recebido por tias do lado materno, e no mesmo ano parte para Moçambique. Em Lourenço Marques reencontra-se com os pais e irmãos, com quem viverá pela última vez em conjunto até 1938.Quando voltou para o continente, em 1938, José Afonso foi para casa do tio Filomeno, então presidente da Câmara, em Belmonte. No ano seguinte os pais já estavam em Timor, onde seriam cativos dos ocupantes japoneses durante três anos, até 1945. Foram três anos sem notícias dos pais.Em Belmonte, Zeca Afonso completou a instrução primária e viveu o ambiente mais profundo do salazarismo, de que seu tio era fervoroso admirador. "Foi o ano mais desgraçdo da minha vida", confidenciou. Pró-franquista e pró-hitleriano, o tio de José Afonso levou-o a envergar a farda da Mocidade Portuguesa. Mas com a chegada a Coimbra em 1940, instalado em casa de uma tia devota, as suas pulsões mais íntimas sobrepuseram-se às influências familiares. José Afonso começa a cantar por volta do quinto ano do Liceu D. João III e a sua voz ecoa pela cidade velha. Os tradicionalistas reconheciam-no como um bicho que canta bem.Em Coimbra passa pelas Repúblicas, onde conheceu a amizade e a farra académica. Seduzido pela cidade, tem os primeiros cantactos com clubes recreativos, joga futebol na Académica ("Entreguei-me completamente à mística da chamada Briosa") e acompanha a equipa um pouco por toda a parte.Nas colectividades conhece "gajos populares", entre os quais Flávio Rodrigues, que admira como exímio tocador de guitarra, para si superior a Artur Paredes. Inicia-se em serenatas e canta em "festarolas de aldeia. Um sujeito qualquer queria convidar uns tantos estudantes de Coimbra, enchia-lhes a barriga e a malta cantava...". Como estudante integrou várias comitivas do Orfeão Académico de Coimbra e da Tuna Académica da Universidade de Coimbra, nomeadamente em digressões pelo Continente e por Angola e Moçambique. O fado de Coimbra lírico e tradicional era superiormente interpretado por si. A praxe académica e a boémia encheu-lhe tardes e noites gloriosamente Coimbrãs.É o tempo das boleias e da capa e batina ("Porque um tipo de capa e batina é rei das estradas"), que lhe permite os primeiros contactos com os meios sociais miseráveis do Porto, no Bairro do Barredo, fonte de inspiração para a sua balada "Menino do Bairro Negro".José Afonso foi envolvido pela lenda coimbrã, com o encantamento das suas tradições, que simultaneamente o atraiam e causam repulsa.Em 1958 José Afonso grava o seu primeiro disco "Baladas de Coimbra" enquanto acompanha o movimento em torno da candidatura presidencial de Humberto Delgado. Mais tarde grava "Os Vampiros" que, juntamente com "Trova do Vento que Passa", escrita por Manuel Alegre e cantada por Adriano Correia de Oliveira, constituem um marco fundamental da canção de intervenção e de resistência antifascista.Em 1964 parte para Moçambique. Professor de liceu, desenvolve uma intensa actividade política contra o colonialismo, o que lhe traz problemas com a PIDE e com a administração colonial. Mais tarde regressa a Portugal onde é colocado como professor em Setúbal, mas posteriormente é expulso do ensino. Para sobreviver dá explicações e grava o seu primeiro LP, "Baladas e Canções".Em 1967-70, Zeca protagoniza uma intervenção política e musical ímpar, convertendo-se num símbolo da resistência. Várias vezes detido pla PIDE, mantém contactos com a Luar, PCP e esquerda radical. Em 69 participa no 1o Encontro da "Chanson Portugaise de Combat" em Paris e empenha-se fortemente na eleição de deputados à Assembleia Nacional da CDE de Setúbal, gravando tambem o LP "Cantares do Andarilho", recebendo o prémio da Casa da Imprensa pelo melhor disco do ano, e o prémio da melhor interpretação. Alvo de sensura José Afonso passa a ser tratado nos jornais por Esoj Osnofa!Com os arranjos de José Mário Branco, em 1971, edita "Cantigas do Maio", Neste álbum surge "Grândola Vila Morena" que se tornará um símbolo da revolução de Abril. Desde então Zeca participa em vários festivais. É publicado o livro "José Afonso", coordenado por Viale Moutinho. É lançado o LP "Eu vou ser como a toupeira". Em 1973 canta no III Congresso da Oposição Democrática e grava "Venham mais cinco". Após a Revolução de Abril, participa em numerosos "cantos livres" e grava o LP "Coro dos Tribunais", onde conta com a colaboração de Fausto, Adriano Correia de Oliveira, Vitorino e José Niza, entre outros. Em 1975 canta em inúmeros espectáculos de dança e lança "Com as minhas tamanquinhas".Em 1976 apoia Otelo Saraiva de Carvalho na candidatura à presidência da república. Em 1981 Actua no Theatre De La Ville de Paris, compõe a música de "Fernão Mendes" para a "Barraca"( Peça a qual tive um prazer imenso de fazer ) e grava "Enquanto há força" e "Fura fura".Em 1985 José Afonso já se encontra doente. O Coliseu de Lisboa é o palco do seu último espectáculo. As homenagens multiplicam-se e é condecorado com a Ordem da Liberdade. Já muito enfermo, em 1985, apoia a candidaduta de Lourdes Pintassilgo à presidência da república. É editado o seu último disco, Galinhas do Mato.A 23 de Fevereiro de 1987 morre no Hospital de Setúbalin- José Afonso 8 Biografia do Humanista, Poeta e Cantor )Que felicidade a minha quando tive a honra de cantar em palco temas feitos por ele prepositadamente para a peça " Fernão, Mentes?"!Que tristeza profunda aquando do seu desaparecimento.Fica para sempre a memória do grande companheiro que foi o Zeca. A exemplo do Adriano, escolhi uma composição das menos divulgadas da obra antológica do amigo; Quem conhece recorda, quem não conhece... fica a conhecer."TERESA TORGA"No centro da AvenidaNo cruzamento da ruaÀs quatro em ponto perdidaDançava uma mulher nuaA gente que via a cenaCorreu para junto delaNo intuito de vesti-laMas surge António CapelaQue aproveitando a barbudaSó pensa em fotografá-laMulher na democraciaNão é biombo de salaDizem que se chama TeresaSeu nome é Teresa TorgaMuda o pick-up em BenficaAtura a malta da borgaAluga quartos de casaMas já foi primeira estrelaAgora é modelo à forçaQue a diga António CapelaTeresa Torga Teresa TorgaVencida numa fornalhaNão há bandeira sem lutaNão há luta sem batalha===========================================...Surge então um jovem que com apenas 17 anos de idade ingressa na Universidade de Direito ( Curso que nunca chegou a concluir ). Era ADRIANO CORREIA DE OLIVEIRA Tornou-se membro do Orfeão Académico e colaborou em múltiplas demonstrações culturais e, activamente, nos movimentos estudantis dos anos sessenta.Colaborou em inúmeras serenatas, em manifestações musicais e cultivou,por gosto e com muita qualidade, a balada (um género de música que José Afonso traz para o campo artístico, de que é, porventura, o melhor intérprete). Ao mesmo tempo, embrenha-se na recolha, na selecção e gravação de canções populares,desde as ilhas a todos os cantos do continente, onde sobressaem trechos do riquíssimo folclore minhoto, beirão e açoreano.Gravou variadíssimos álbuns, cantando poemas dos mais variados autores portugueses e melodias que encantaram e prevaleceram como baluartes da canção de intervenção.No seu repertório aparecem diversas trovas, (esse tipo de música quena Idade Média os aventureiros da cultura, percorrendo a Europa levavam, de terra em terra, as melodias de origem, vindas, muitas vezes, não se sabia deonde, mas que era uma forma de dar a outras pessoas as tradições, a cultura,as lendas, os costumes, os romances, o estilo de vida, que, desta forma, eram apresentados nas localidades a que chegavam e, posteriormente, também daqui transportados para outras terras).Gravações feitas no antigo regime são um testemunho do seu profundoamor à causa da Liberdade, para a qual sempre deu o seu melhor, no sentido de levar mensagens e um pouco de conforto aos companheiros exilados, presos ou que tinham de sufocar as ideias democráticas. Ao lado de José Afonso, Manuel Freire, Luísa Bastos, José Jorge Letria, padre Fanhais, José Mário Branco - e outros tan-tos -, foi, repito, um baluarte na defesa da Liberdade e na implementação da chamada "canção de intervenção, com a tal finalidade de reconfortar e animar os companheiros da vanguarda e da retaguarda e manter bem viva a chama da Esperança e da tão ambicionada Liberdade.Muito cedo nos deixou, quando estava no auge da sua carreira. Viveuum pouco da música e do seu posto de trabalho na Embaixada de Angola no Porto. Estava ainda a terminar o curso de Direito. A morte, porém, a 16 de Maio de 1982, com apenas 40 anos, devido a uma doença súbita.De Adriano-BiografiaPor Mário CorreiaUm sério problema escolher uma canção deste companheiro.A "Trova do Vento Que Passa" é o seu "ex-libris" e por demais conhecida de toda a gente, por isso quase a escolhi automáticamente, no entanto... pensando melhor, decidi escolher uma outra, se calhar não tão conhecida de todos, que dará à gente mais jovem uma melhor ideia do homem/cantor/.MARGEM SUL ( Canção Patuleia )Letra: Urbano Tavares RodriguesMúsica: Adriano Correia de OliveiraÓ Alentejo dos pobresReino da desolaçãoNão sirvas quem te desprezaÉ tua a tua naçãoNão vás a terras alheiasLançar sementes de morteÉ na terra do teu pãoQue se joga a tua sorteTerra sangrenta de SerpaTerra morena de MouraVilas de angústia em botãoDor cerrada em BaleizãoÓ margem esquerda de verãoMais quente de PortugalMargem esquerda deste amorTanto de fome e de salA foice dos teus ceifeirostrago no peito gravadaÓ minha terra morenaComo bandeira sonhada

-História da Canção de Resistência... ou "Música de Intervenção, ou "Canto Livre", nos Anos 60 e 70.Manuel Freire nasceu em Vagos ( Aveiro), no dia 25 de Abril de 1942.Técnico de computadores, Manuel Freire nunca se profissionalizou na música.O seu primeiro trabalho discográfico foi um EP com 4 temas, entre os quais o famoso "Livre" ( Não há machado que corte a raiz ao pensamento, porque é livre como o vento...).Editado em 1968, este disco contém ainda "Dedicatória" , "Pedro Soldado" e "Eles".O cantor começa a relacionar-se com outros da mesma área, tais como Adriano Correia de Oliveira, José Afonso ou Padre Fanhais. Após uma participação no programa "Zip Zip" na RTP, em que interpreta uma canção com o poema de António Gedeão "Pedra Filosofal" , obtém um êxito quase imediato.Começa a musicar poetas de grandes poetas portugueses e edita um álbum homónimo com 11 canções. Os poetas deste disco são Gedeão, José Gomes Ferreira, Fernando Assis Pacheco, Eduardo Olímpio, Sidónio Muralha e José Saramago.As músicas são quase todas de Freire , à excepção de duas que são de M. Jorge Veloso. Com este disco ganha o Prémio da Casa da Imprensa e o Prémio Pozal Domingues. É neste LP que estão os temas " Abaixo D. Quixote", "A Menina Bexigosa", ou "Poema da Malta das Naus".Como ele contou recentemente no programa de televisão "Miguel Ângelo Ao Vivo", tinha um irmão que era oficial do Exército e lhe telefonou no dia 25 de Abril de 1974,dando-lhe os parabéns pelo aniversário e perguntando-lhe se tinha gostado da prenda. A prenda era a Revolução dos Cravos.A seguir ao 25 de Abril de 74, Manuel Freire dedica-se aos recitais, um pouco por todo o país, actuando sobretudo em Associações Recreativas e Culturais , onde mantém um público fiel. A limpidez da sua voz , a pronúncia correcta e o facto das suas músicas serem acompanhadas por excelentes poemas contribuem para o seu reconhecimento público.O último trabalho do autor é o CD " As Canções Possíveis", onde Manuel Freire canta poemas de José Saramago , numa edição da Editorial Caminho ( editora de Saramago ). Neste disco , com 12 canções, Manuel Freire é acompanhado por um grupo de músicos tocando violino, piano, contrabaixo, clarinete e violoncelo. Este álbum, recentemente editado, pertence à colecção Caminho de Abril ; que a editora lançou para comemorar os 25 anos do 25 de Abril.Manuel Freire é um cantor que, ainda há pouco tempo, era convidado com frequência para sessões nas Universidades portuguesas. Hoje, a cultura estudantil está noutra onda...Como já toda a gente conhece a Pedra Filosofal, "a cantiga por eccelência" do Manuel, escolhi uma outra menos(?) conhecida, intitulada: "Pequenos Deuses Caseiros", poema da autoria de Sidónio Muralha e música de Manuel Freire. Pequenos deuses caseirosque brincais aos temporais,passam-se os dias, semanas,os meses e os anos e vós jogais, jogais o jogo dos tiranos.Pequenos deuses caseiroscantai cantigas maciastomai vossa morfina,perdulai vossos dinheirosderramai a vossa raivagozai vossas tiranias,pequenos deuses caseiros.Erguei vossos casteloselegei vossos senhoresespancai vossos criados,violai vossas criadas,e bebei,o vinho dos traidoresservido em taças roubadasDormi em colchões de pena,dançai dias inteiros,comprai os que se vendem,alteai vossas janelas,e trancai as vossas portas,pequenos deuses caseiros,e reforçai, reforçai as sentinelas.====================================== Francisco Fanhais nasceu na Praia do Ribatejo a 17 de Maio de 1941.Com dez anos vai para os seminários de Almada e Olivais, onde termina o curso de Teologia.Em 1964 é ordenado padre e em 1969, como professor de Moral começa a interessar-se sobre a realidade à sua volta. As aulas eram no Barreiro, terra onde ele conhece José Afonso que o incentivará a cantar contra o regime.Participa no programa de Televisão " Zip-Zip" e grava o seu primeiro disco intitulado " Cantilenas".Em 1970 grava e edita o seu disco " Canções da Cidade Nova" , com arranjos de Thilo Krassman. As músicas deste disco são de sua autoria e as letras de consagrados poetas , como Sophia de Mello Breyner, Manuel Alegre e António Aleixo." Cantata de Paz" , com letra de Sophia e o famoso refrão " Vemos, Ouvimos e Lemos, Não Podemos Ignorar", torna-se um dos hinos de resistência ao regime derrubado em Abril de 74.Deste disco fazem ainda parte outros temas, tais como " Quadras do Poeta Aleixo", "Porque" , " Canto do Ceifeiro" e " Canção da Cidade Nova". Esta última canção ,com poema de Francisco Melro, é inspirada num tema bíblico. A música de Fanhais é uma música simples, mas eficaz , na senda dos "baladeiros", movimento a que ficaram associados muitos dos cantores que usavam a canção para denunciar as injustiças.José Afonso escreve uma " Dedicatória" na contracapa do LP, que reza assim: " Tu que cantas, Defronte ,De faces atentas, e Seguras, Faz do teu Canto, Uma funda, Nesse lugar, Entre outras mãos mais fortes, E mais duras, Te estenderei , A Minha mão fraterna. Canta Amigo".Este disco seria reeditado em CD, no ano de 1998 e o seu título seria alterado para " Dedicatória" , com o manuscrito da dedicatória de José Afonso a servir de capa.Em 1971 , Fanhais parte para França , porque estava proibido de cantar, de exercer o sacerdócio e de leccionar nas escolas oficiais. Torna-se militante da LUAR e só regressa a Portugal após o 25 de Abril de 74.Em 1975 colabora nas campanhas de dinamização cultural do MFA, juntamente com José Afonso e outros cantores e participa na gravação do disco " República", gravado ao vivo por José Afonso, na Itália, disco esse que é uma das maiores raridades no panorama discográfico português.Em 1984 vai viver para Alvito, no Baixo Alentejo e dedica-se ao ensino de Educação Musical em escolas oficiais.Participa , como convidado, no disco "Ao Vivo no Coliseu" de José Afonso, onde faz coros na bonita canção " Natal dos Simples".Em 1993 regressa ao palco para, conjuntamente com Manuel e Pedro Barroso, apresentar o espectáculo " Encontro" , efectuados em Portugal e em França.No dia 10 de Junho de 1995 é agraciado com a Ordem da Liberdade pelo Presidente da República, Mário Soares.Continua a cantar, sempre que lhe pedem , em escolas e ,sobretudo, em Festas do 25 de Abril ou em homenagens a José Afonso.Quando lhe perguntam pela vida responde que tem " dois filhos, dois discos, muitas árvores e muitos amigos". Fanhais, tornou-se o expoente máximo dos católicos progressistas, que desde a célebre carta do bispo do Porto a Salazar em 1958, se vinham progressivamente demarcando do regime. Com Francisco Fanhais a postura oposicionista é clara e radical, e os discos Canções da Cidade Nova e Cantilena que grava em 1969 e 1970 são disso prova, representando trabalhos marcantes no movimento dos cantores de intervenção.Para finalizar, aqui fica uma das cantigas dele, talvez a que "marca" efectivamente o autor.CANTATA DA PAZ Letra de Sophia de Mello Breyner Andresen Música de Francisco FanhaisVemos, ouvimos e lemosNão podemos ignorarVemos, ouvimos e lemos ( Refrão )Não podemos ignorar Vemos, ouvimos e lemosRelatórios da fomeO caminho da injustiçaA linguagem do terror A bomba de HiroshimaVergonha de nós todosReduziu a cinzasA carne das crianças D'África e VietnameSobe a lamentaçãoDos povos destruídosDos povos destroçados Nada pode apagarO concerto dos gritosO nosso tempo éPecado organizado=============================================Fausto"...Dez álbuns de originais num total de 12 discos publicados em 30 anos são a face palpável da carreira daquele que é hoje, possivelmente, o compositor e intérprete mais carismático da Música Popular Portuguesa."...Assim dizia um dia o crítico Viriato Teles sobre o genial músico/poeta/cantor, e que melhor forma de começar a dizer alguma coisa sobre Fausto?BiografiaCarlos Fausto Bordalo Gomes Dias, nascido em Novembro de 1948 em pleno Oceano Atlântico, a bordo do navio Pátria que navegava entre Portugal e Angola.Fausto, por muitos considerado o mais importante compositor vivo da música popular portuguesa, teve um início de carreira recheado de indecisões. Estudante do Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina (ISCSPU), é em plena vida académica que grava o primeiro 45 rotações, a que se segue o álbum homónimo, Fausto.O primeiro grupo de que fez parte chamava-se Os Rebeldes e cultivava, naturalmente, a música pop da altura. Em 1968, com 20 anos, fixou-se em Lisboa para iniciar os estudos universitários (é licenciado em Ciências Sócio-Políticas e frequentou um mestrado de Relações Internacionais) e foi no âmbito do movimento associativo que se revelou como cantor, aproximando-se rapidamente do movimento que já integrava então nomes como José Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Manuel Freire ou Vieira da Silva – juntamente com José Mário Branco ou Luís Cília, que viviam no exílio – e que teve um importante papel político e cultural na resistência aos últimos anos do fascismo e no processo revolucionário iniciado com o 25 de Abril de 1974.Em declarações proferidas à revista Flama em 1970, Fausto hesita ainda na continuidade do trabalho musical: "nunca acreditei muito na minha voz, nem ainda hoje acredito. Já pensei várias vezes na data em que vou largar "isto". (...) Dizem-me que devo continuar, mas não sei bem se será até no próximo mês de Junho que porei o ponto final. Depois, cantarei apenas para os amigos e para mim próprio".A realidade dos factos (e dos anos entretanto passados) encarregou-se de desfazer as dúvidas do então jovem estudante. Eleito presidente da direcção da Associação dos Estudantes do ISCSPU, Fausto viu o seu nome não ser homologado no cargo pelo Ministério da Educação, em consequência de um certo comprometimento político da sua actividade musical. E, como castigo, é chamado a cumprir o serviço militar, embora possuísse todas as condições para ter um adiamento. Em resultado, Fausto recusa-se a comparecer no quartel e é considerado refractário.Vivendo quase clandestino, Fausto faz grande parte das gravações do seu segundo LP, P'ró Que Der e Vier, em Madrid. Nele, inclui letras de Eugênio de Andrade e Mário Henrique Leiria, num todo de características políticas muito acentuadas.(…) Para finalizar, lá está o "martírio" de sempre: Que poesia do autor vou escolher?... Elas são todas tão...Mas como tenho que escolher uma... escolho a poesia que deu nome a um dos seus albuns mais conhecidos; Atrás dos Tempos(letra e música de Fausto Bordalo Dias) Eu pego na minha violaE canto assimEsta vidaA correrEu sei que é pouco e não consolaNem cozido à portuguesa há sequerQuem canta sempre se levantaCalados é que podemos cairCom o vinho molha-se a gargantaSe a lua nova está para subirQue atrás dos tempos vêm temposE outros tempos hão-de virEu sei de histórias verdadeirasUmas belasOutras tristes de assombrarDo marinheiro morto em terraEm luta por melhor vida no marDa velha criada despedidaQue enlouqueceu e se pôs a cantarE do trapeiro da avenidaMal dormido se pôs a ouvirQue atrás dos tempos vêm temposE outros tempos hão-de virSei de vitórias e derrotasNesta luta que se há-de vencerSe quem trabalha não esgostaNo seu salário sempre a descerOlha a políciaOlha o talherOlha o preço da vida a subirMas quem mal fazPor mal espereSe o tirano fez a festaP'ra fugirQue atrás dos tempos vêm temposE outros tempos hão-de virMas esse tempo que há-de virNão se espera como a noiteEspera o diaNasce da força que transpiraDe braços e pernas em harmoniaJá basta tanta desgraçaQue a gente tem no peitoA cairNão é do povoNem da raçaMas do modo como vês o porvirQue atrás dos tempos vêm temposE outros tempos hão-de vir=========================================="...Eu hoje venho aqui falar..."Assim começa uma das cantigas do poeta/compositor/cantor que eu hoje queroreferenciar. Já adivinharam, claro, que estou a falar de SÉRGIO GODINHO.Sérgio Godinho nasceu em 1945 na cidade do Porto. O seu percurso como escritor de canções ( como ele gosta que o chamem ) foi este:1963 - Para evitar cumprir o serviço militar obrigatório e ser enviado para a guerra colonial, parte para o estrangeiro. Começa por viver na Suíça, onde estuda Psicologia, em Genebra, durante dois anos com Jean Piaget, antes de passar para França, onde vive o Maio de 68. 1969 - Actua, durante dois anos, na produção francesa do musical «Hair» onde conhece Shila. Em Paris toma contacto com outros músicos exilados, como Luís Cília e José Mário Branco. Embora já compusesse música, fazia-o em francês, e será o contacto com os seus conterrâneos exilados que o desperta para a língua portuguesa.1971 - Participa no álbum de estreia a solo de José Mário Branco, Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vontades, para o qual escreve quatro letras e participa como músico acompanhante. Grava o seu primeiro álbum, em Strawberry Studio do Chateau d'Hérouville, em França, com músicos locais, para a companhia Sassetti, mas a sua edição é adiada para 1972.Nov. (26) - O seu EP de estreia, Romance de Um Dia na Estrada, é editado pela Sassetti e apresentado à imprensa numa sessão realizada no cinema Roma, em Lisboa, onde é igualmente lançado o álbum de José Mário Branco.Parte para o Brasil com Shila, e a companhia de teatro Living Theater. É preso e expulso do Brasil. Vai viver para Amsterdão, onde passa seis meses a preparar o novo disco.1972 - É editado Os Sobreviventes, álbum de estreia, que é muito bem recebido pela crítica e pelo público. O álbum receberá o Prémio da Casa da Imprensa para Melhor Disco Português do Ano, mas é interditado três dias depois da edição, sendo sucessivamente autorizado e novamente proibido.Regista o seu segundo álbum Pré-Histórias, também gravado em França, e colabora com duas letras para Margem de Certa Maneira, de José Mário Branco.Out. - Casa-se com Shila, em Montreal.1973 - Junta-se à companhia de teatro Genesis. Estabelece-se em Vancouver, numa comunidade hippie. Em Portugal, a Sassetti edita Pré-Histórias, do qual se destaca imediatamente um dos grandes hinos da carreira do cantor e compositor, «A Noite Passada». É no Canadá que o 25 de Abril o apanha, regressando a Portugal pouco depois da Revolução.Finalizo destacando um poema/cantiga deste notável "cantor/resistente". Como sempre, a dificuldade da escolha foi grande. O seu vasto e rico repertório deixou-me novamente " à nora", mas... como tenho que escolher um, recorri ao seu primeiro trabalho em L.P. chamado " Sobreviventes ", gravado em 1971 e posto a circular em 1972, e que se chama:QUE FORÇA É ESSA AMIGO?Vi-te trabalhar o dia inteiroconstruir as cidades para os outroscarregar pedras, desperdiçarmuita força por pouco dinheiroQue força é essa que trazes nos braçosque só te serve para obedecerque só te manda obedecer?que força é essa amigoque te põe de bem com os outrose de mal contigo?Não me digas que não me compreendesquando os dias se tornam azedosnão me digas que nunca sentisteuma força a crescer-te nos dedose uma raiva a nascer-te nos dentesnão me digas que não me compreendes==========================================Hoje venho aqui falar de uma figura "de peso" na Canção Livre; Hoje vou falar de LUÍS CÍLIALuis Cília nasceu no Huambo ( Angola ), em 1943. Veio para Portugal em 1959,para prosseguir os seus estudos. Em 1962 conheceu o poeta Daniel Filipe que o incentivou a musicar poesia. Datam desse ano as suas primeiras experiências nesse campo ( "Meu país", " O menino negro não entrou na roda" ,etc.),mais tarde incluidos no seu primeirodisco,gravado em França, para a editora Chant du Monde. Em abril de 1964 partiu para Paris,onde viveu até 1974.Em França estudou guitarra clássica com António Membrado e composição comMichel Puig.Entre 1964 e 1974 realizou recitais em quase todos os países da Europa. Depois do seu regresso a Portugal continuou a gravar discos, como compositor e intérprete e a realizar recitais.Como intérprete, gravou dezoito discos, alguns dos quais dedicados a poetas ,tais como, Eugénio de Andrade ("O peso da sombra") Jorge de Sena ("Sinais de Sena"), ou David Mourão Ferreira ("Penumbra").Nos últimos anos tem-se dedicado apenas à composição, nomeadamente para Teatro, Bailado e Cinema.Cronologicamente ....1943Luís Fernando Castelo Branco Cília, nasce em Huambo, Angola. Vive parte da sua vida de estudante em colégios internos, por ser filho de pais separados. Trava conhecimento no internato com o poeta Daniel Filipe que lhe mostra discos de Leo Ferré e George Brassens o que o leva a inflectir de tipo de opção musical. Participa nas lutas académicas de Coimbra, ou como ele refere com modéstia "era mais um que estava na cantina… sem que tivesse participação de realce", mas o que é certo é que foi nesta data aberto o seu processo na PIDE.Frequenta económicas mas sem ligar muito às aulas. Integra as equipas de futebol e de basquetebol. Decide abandonar o país. Sai de Portugal no ano seguinte, acompanhado por um militar desertor e a esposa deste a "bordo" de um Fiat 500.Vai para Paris onde chega a 1 de Abril. Aí trava conhecimento de imediato com políticos, poetas e músicos, com realce para a cantora Collete Magny a qual o irá apresentar à editora do seu primeiro disco: a "Chant du Monde". Grava o LP "Portugal-Angola: Chants de Lutte." Neste mesmo ano conhece Adriano Correia de Oliveira e Manuel Alegre (quando este vai para Paris).As suas primeiras músicas são feitas com total desconhecimento da obra de José Afonso ou de Adriano. Trabalha na União dos Estudantes Franceses, "(…) era o tipo que tirava lá cópias (…)".Trava conhecimento com grandes expoentes da música francesa como George Brassens, o qual é o seu "padrinho" quando se inscreve na Sociedade dos Autores, em França. Posteriormente conhece o músico espanhol Paço Ibañez, de quem se tornou muito amigo e companheiro nos espectáculos profissionais e nos de pura militância, para sindicatos, associações e partidos. Edita o EP "Portugal Resiste" e faz a música do filme "O Salto".Vai a Cuba. Actua no festival ( tocando em frente de Fidel Castro). Conhece Carlos Puebla e traz clandestinamente de Cuba as bobines da canção de Carlos Puebla "Hasta Siempre", as quais possibilitarão a divulgação desta canção na Europa. Edita a trilogia de discos para editora EMEN, "La poesie portugaise de nos jours e de toujours 1, 2, e 3".São discos posteriormente reeditados em CD em 1996, em França.Participa activamente no Maio de 68, realizando espectáculos de apoio ao lado de Paco Ibañez e de Collete Magny. Durante finais dos anos sessenta e início da década de setenta, realiza espectáculos por toda a Europa: Inglaterra, Itália, Suíça, Espanha, etc. Neste país quase que é "apanhado" pois realizou um espectáculo em Santiago de Compostela e o Cônsul Português solicitou a sua detenção. Paga uma multa e são suspensos os espectáculos seguintes. Em 1969 é expulso do PCP clandestino em França, pois recebia em casa amigos de outras convicções políticas. O que ele nunca deixará de fazer porque eram seus amigos.Em 1971 o núcleo do PCP de Paris, verificando o erro cometido, pede-lhe desculpas pelo incidente de dois anos antes. Em 1972 actua no primeiro comício do PS em França ao lado de José Mário Branco, não sem antes colocar certas condições tendo em conta que era militante de um outro partido. Em 1973 o "Avante", canção de Luís Cília, é hino oficial do PCP, em Aveiro.Em entrevista à rádio Portugal Livre, Luís Cília explica " … o Avante não começou por ser hino coisa nenhuma" - diz-nos - "foi de resto o Carlos Antunes que me pediu para fazer uma música para passar na rádio. E eu fiz, escrevi essa música, dei a partitura e a letra e nunca mais pensei nisso, não gravei e nem sequer era cantada por mim…"Actua neste ano no Festival Mundial da Juventude na ex-RDA.Edita "Contra a Ideia da Violência a Violência da Ideia" em clara homenagem a Amílcar Cabral, então assassinado. Reedita o seu primeiro disco mas agora acompanhado por contrabaixo, com o novo título de " Meu País". No 25 de Abril de 1974 regressa a Portugal, no mesmo avião em que também regressam Álvaro Cunhal e José Mário Branco. Luís Cília ainda irá assegurar por algum tempo compromissos profissionais em França, não se estabelecendo completamente em Portugal.Luís Cília compôs e cantou belos trexos. Já sabem da minha dificuldade de escolher um entre tantos tão maravilhosos, mas como tenho que escolher um, escolho um que vai pôr alguns de nós a cantar recordando:Erguer a voz e cantaré força de quem é novoviver sempre a esperarfraqueza de quem é povoNão vás ao sabor do ventoaprende a canção da esperançavem semear tempestadesse queres colher a bonançaCanta, canta amigo, cantavem cantar a nossa cançãotu sozinho não és nadajuntos temos o mundo na mãoJá que me chamas amigoprova-me lá que o ésvem para a ceifa comigona terra sujar teus pésEu vou contigo para o campoeu vou colher o teu pãotu dás-me a força da vidae eu dou-te a minha canção===========================================É outra das figuras de proa da música da Resistência; JOSÉ MÁRIO BRANCOMúsico, compositor e cantor, nasceu no Porto em 1942. Estudou História na Faculdade de Letras de Coimbra, e aos 21 anos vai para o exílio em França, onde permanecerá até ao 25 de Abril de 1974.Em Paris, desenvolve intensa actividade em grupos culturais, participando em vários espectáculos para emigrantes portugueses. Em 1967, lança o seu primeiro com um E.P. intitulado " Seis Cantigas de Amigo ".É também em Paris que o cantor trabalha com José Afonso, fazendo os arranjos e a direcção musical do disco " Cantigas do Maio ", em 1971. " Foi a experiência mais conseguida que tive com o Zeca. Tenho uma grande admiração pelo seu génio e foi com ele que realmente formei o melhor de mim como arranjador e director musical ".O ano de 1971 seria decisivo para a carreira do próprio José Mário Branco, pois é o ano de " Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades ", o disco com que se tornou conhecido e que representa uma viragem no panorama da música portuguesa.José Mário Branco viria a trabalhar mais vezes com José Afonso, nomeadamente em " Venham mais cinco " ( 1973 ).Depois da revolução, o cantor volta a Portugal. É fundador dos GAC ( Grupo de Acção Cultural ) e percorre o país fazendo espectáculos e participando em dinamizações culturais. Faz música para teatro e para cinema e colabora em diversas iniciativas.Os anos 80 são os da catarse, a descida aos infernos da desilusão, o ajuste de contas com uma geração e os seus fantasmas. " Ser Solidário " e "F.M.I." são os testemunhos gravados disso mesmo.É difícil também com o Zé, escolher uma letra que possa pôr em destaque. Mais uma vez escolhi uma das menos trauteadas mas muito, muito bela; Chama-se Fado da Tristeza, com letra e música da sua autoria, que podem apreciar no Álbum " Ser Solidário ". Porque a escolhi? Vocês compreenderão.FADO DA TRISTEZALetra e Música de José Mário BrancoIn: " Ser Solidário " 1982Não cantes alegrias a fingirse alguma dor existira roer dentro da tocadeixa a tristeza sairpois só se aprende a sorrircom a verdade na bocaQuem canta uma alegria que não temnão conta nada a ninguémfala verdade a mentircada alegria que inventasmata a verdade que tentaspois é tentar a fingirNão cantes alegrias de encomendaque a vida não se remendacom morte que não morreucanta da cabeça aos péscanta com aquilo que éssó podes dar o que é teu==========================================É o símbolo mais vivo da canção contestatária, O ZECA, ou ainda JOSÉ AFONSO.Eis o retrato de um dos maiores ( senão o maior ) humanista português do século XX.José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos nasceu a 2 de Agosto de 1929, em Aveiro, "na parte da cidade voltada para o realismo e para o mar".Quando o pai, José Nepomuceno Afonso, foi colocado em Angola, em 1930, como delegado do Procurador da República, Zeca Afonso permaneceu em Aveiro por razões de saúde, confiado aos cuidados da tia Gigé e do tio Xico, um "republicano anticlerigal, anti-sidonista. Um homem impoluto". Tinha então um ano e meio e cresceu numa casa situada na Fonte das sete Bicas, rodeado da ternura fraterna das primas e dos tios. De 1932 a 1937 José Afonso viveu com os pais e irmãos em Angola, deslumbrando-se com a imensidão africana. A relação física com a natureza causou-lhe uma profunda ligação ao continente africano que se refletirá pela sua vida fora. As trovoadas, os grandes rios atravessados em jangadas, a floresta esconderam-lhe a realidade colonial. Só anos mais tarde, ao exercer a docência em Moçambique, conhecerá a fotografia amarga da sociedade colonial moldada ao estilo do "apartheid" de Pretória.Em 1937 volta para Aveiro, onde é recebido por tias do lado materno, e no mesmo ano parte para Moçambique. Em Lourenço Marques reencontra-se com os pais e irmãos, com quem viverá pela última vez em conjunto até 1938.Quando voltou para o continente, em 1938, José Afonso foi para casa do tio Filomeno, então presidente da Câmara, em Belmonte. No ano seguinte os pais já estavam em Timor, onde seriam cativos dos ocupantes japoneses durante três anos, até 1945. Foram três anos sem notícias dos pais.Em Belmonte, Zeca Afonso completou a instrução primária e viveu o ambiente mais profundo do salazarismo, de que seu tio era fervoroso admirador. "Foi o ano mais desgraçdo da minha vida", confidenciou. Pró-franquista e pró-hitleriano, o tio de José Afonso levou-o a envergar a farda da Mocidade Portuguesa. Mas com a chegada a Coimbra em 1940, instalado em casa de uma tia devota, as suas pulsões mais íntimas sobrepuseram-se às influências familiares. José Afonso começa a cantar por volta do quinto ano do Liceu D. João III e a sua voz ecoa pela cidade velha. Os tradicionalistas reconheciam-no como um bicho que canta bem.Em Coimbra passa pelas Repúblicas, onde conheceu a amizade e a farra académica. Seduzido pela cidade, tem os primeiros cantactos com clubes recreativos, joga futebol na Académica ("Entreguei-me completamente à mística da chamada Briosa") e acompanha a equipa um pouco por toda a parte.Nas colectividades conhece "gajos populares", entre os quais Flávio Rodrigues, que admira como exímio tocador de guitarra, para si superior a Artur Paredes. Inicia-se em serenatas e canta em "festarolas de aldeia. Um sujeito qualquer queria convidar uns tantos estudantes de Coimbra, enchia-lhes a barriga e a malta cantava...". Como estudante integrou várias comitivas do Orfeão Académico de Coimbra e da Tuna Académica da Universidade de Coimbra, nomeadamente em digressões pelo Continente e por Angola e Moçambique. O fado de Coimbra lírico e tradicional era superiormente interpretado por si. A praxe académica e a boémia encheu-lhe tardes e noites gloriosamente Coimbrãs.É o tempo das boleias e da capa e batina ("Porque um tipo de capa e batina é rei das estradas"), que lhe permite os primeiros contactos com os meios sociais miseráveis do Porto, no Bairro do Barredo, fonte de inspiração para a sua balada "Menino do Bairro Negro".José Afonso foi envolvido pela lenda coimbrã, com o encantamento das suas tradições, que simultaneamente o atraiam e causam repulsa.Em 1958 José Afonso grava o seu primeiro disco "Baladas de Coimbra" enquanto acompanha o movimento em torno da candidatura presidencial de Humberto Delgado. Mais tarde grava "Os Vampiros" que, juntamente com "Trova do Vento que Passa", escrita por Manuel Alegre e cantada por Adriano Correia de Oliveira, constituem um marco fundamental da canção de intervenção e de resistência antifascista.Em 1964 parte para Moçambique. Professor de liceu, desenvolve uma intensa actividade política contra o colonialismo, o que lhe traz problemas com a PIDE e com a administração colonial. Mais tarde regressa a Portugal onde é colocado como professor em Setúbal, mas posteriormente é expulso do ensino. Para sobreviver dá explicações e grava o seu primeiro LP, "Baladas e Canções".Em 1967-70, Zeca protagoniza uma intervenção política e musical ímpar, convertendo-se num símbolo da resistência. Várias vezes detido pla PIDE, mantém contactos com a Luar, PCP e esquerda radical. Em 69 participa no 1o Encontro da "Chanson Portugaise de Combat" em Paris e empenha-se fortemente na eleição de deputados à Assembleia Nacional da CDE de Setúbal, gravando tambem o LP "Cantares do Andarilho", recebendo o prémio da Casa da Imprensa pelo melhor disco do ano, e o prémio da melhor interpretação. Alvo de sensura José Afonso passa a ser tratado nos jornais por Esoj Osnofa!Com os arranjos de José Mário Branco, em 1971, edita "Cantigas do Maio", Neste álbum surge "Grândola Vila Morena" que se tornará um símbolo da revolução de Abril. Desde então Zeca participa em vários festivais. É publicado o livro "José Afonso", coordenado por Viale Moutinho. É lançado o LP "Eu vou ser como a toupeira". Em 1973 canta no III Congresso da Oposição Democrática e grava "Venham mais cinco". Após a Revolução de Abril, participa em numerosos "cantos livres" e grava o LP "Coro dos Tribunais", onde conta com a colaboração de Fausto, Adriano Correia de Oliveira, Vitorino e José Niza, entre outros. Em 1975 canta em inúmeros espectáculos de dança e lança "Com as minhas tamanquinhas".Em 1976 apoia Otelo Saraiva de Carvalho na candidatura à presidência da república. Em 1981 Actua no Theatre De La Ville de Paris, compõe a música de "Fernão Mendes" para a "Barraca"( Peça a qual tive um prazer imenso de fazer ) e grava "Enquanto há força" e "Fura fura".Em 1985 José Afonso já se encontra doente. O Coliseu de Lisboa é o palco do seu último espectáculo. As homenagens multiplicam-se e é condecorado com a Ordem da Liberdade. Já muito enfermo, em 1985, apoia a candidaduta de Lourdes Pintassilgo à presidência da república. É editado o seu último disco, Galinhas do Mato.A 23 de Fevereiro de 1987 morre no Hospital de Setúbalin- José Afonso 8 Biografia do Humanista, Poeta e Cantor )Que felicidade a minha quando tive a honra de cantar em palco temas feitos por ele prepositadamente para a peça " Fernão, Mentes?"!Que tristeza profunda aquando do seu desaparecimento.Fica para sempre a memória do grande companheiro que foi o Zeca. A exemplo do Adriano, escolhi uma composição das menos divulgadas da obra antológica do amigo; Quem conhece recorda, quem não conhece... fica a conhecer."TERESA TORGA"No centro da AvenidaNo cruzamento da ruaÀs quatro em ponto perdidaDançava uma mulher nuaA gente que via a cenaCorreu para junto delaNo intuito de vesti-laMas surge António CapelaQue aproveitando a barbudaSó pensa em fotografá-laMulher na democraciaNão é biombo de salaDizem que se chama TeresaSeu nome é Teresa TorgaMuda o pick-up em BenficaAtura a malta da borgaAluga quartos de casaMas já foi primeira estrelaAgora é modelo à forçaQue a diga António CapelaTeresa Torga Teresa TorgaVencida numa fornalhaNão há bandeira sem lutaNão há luta sem batalha===========================================...Surge então um jovem que com apenas 17 anos de idade ingressa na Universidade de Direito ( Curso que nunca chegou a concluir ). Era ADRIANO CORREIA DE OLIVEIRA Tornou-se membro do Orfeão Académico e colaborou em múltiplas demonstrações culturais e, activamente, nos movimentos estudantis dos anos sessenta.Colaborou em inúmeras serenatas, em manifestações musicais e cultivou,por gosto e com muita qualidade, a balada (um género de música que José Afonso traz para o campo artístico, de que é, porventura, o melhor intérprete). Ao mesmo tempo, embrenha-se na recolha, na selecção e gravação de canções populares,desde as ilhas a todos os cantos do continente, onde sobressaem trechos do riquíssimo folclore minhoto, beirão e açoreano.Gravou variadíssimos álbuns, cantando poemas dos mais variados autores portugueses e melodias que encantaram e prevaleceram como baluartes da canção de intervenção.No seu repertório aparecem diversas trovas, (esse tipo de música quena Idade Média os aventureiros da cultura, percorrendo a Europa levavam, de terra em terra, as melodias de origem, vindas, muitas vezes, não se sabia deonde, mas que era uma forma de dar a outras pessoas as tradições, a cultura,as lendas, os costumes, os romances, o estilo de vida, que, desta forma, eram apresentados nas localidades a que chegavam e, posteriormente, também daqui transportados para outras terras).Gravações feitas no antigo regime são um testemunho do seu profundoamor à causa da Liberdade, para a qual sempre deu o seu melhor, no sentido de levar mensagens e um pouco de conforto aos companheiros exilados, presos ou que tinham de sufocar as ideias democráticas. Ao lado de José Afonso, Manuel Freire, Luísa Bastos, José Jorge Letria, padre Fanhais, José Mário Branco - e outros tan-tos -, foi, repito, um baluarte na defesa da Liberdade e na implementação da chamada "canção de intervenção, com a tal finalidade de reconfortar e animar os companheiros da vanguarda e da retaguarda e manter bem viva a chama da Esperança e da tão ambicionada Liberdade.Muito cedo nos deixou, quando estava no auge da sua carreira. Viveuum pouco da música e do seu posto de trabalho na Embaixada de Angola no Porto. Estava ainda a terminar o curso de Direito. A morte, porém, a 16 de Maio de 1982, com apenas 40 anos, devido a uma doença súbita.De Adriano-BiografiaPor Mário CorreiaUm sério problema escolher uma canção deste companheiro.A "Trova do Vento Que Passa" é o seu "ex-libris" e por demais conhecida de toda a gente, por isso quase a escolhi automáticamente, no entanto... pensando melhor, decidi escolher uma outra, se calhar não tão conhecida de todos, que dará à gente mais jovem uma melhor ideia do homem/cantor/.MARGEM SUL ( Canção Patuleia )Letra: Urbano Tavares RodriguesMúsica: Adriano Correia de OliveiraÓ Alentejo dos pobresReino da desolaçãoNão sirvas quem te desprezaÉ tua a tua naçãoNão vás a terras alheiasLançar sementes de morteÉ na terra do teu pãoQue se joga a tua sorteTerra sangrenta de SerpaTerra morena de MouraVilas de angústia em botãoDor cerrada em BaleizãoÓ margem esquerda de verãoMais quente de PortugalMargem esquerda deste amorTanto de fome e de salA foice dos teus ceifeirostrago no peito gravadaÓ minha terra morenaComo bandeira sonhada

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