Jazzseen: Fiel acompanhante

24-07-2009
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As cadeiras foram colocadas em sentido inverso sobre as mesas. O barman enxuga meticulosamente os copos lavados, reposicionando-os no seu lugar de origem. Os músicos repousam seus instrumentos nos estojos e aguardam o pagamento - retirado do faturamento da noite pelo gerente da casa. Os últimos clientes de um jazzclub em Manhattan prolongam, na medida exata do necessário, o instante de ir embora pra casa consumindo a mistura da água do gelo derretido com o que resta da bebida no copo. Para quem foi "autenticado" como o pianista de todas as horas essa era, para Ellis Larkins, a sua. Ambiente tranqüilo, platéia reduzida, atenta e um pequeno "set" de canções - de no máximo 25 minutos, onde dedilhava seu piano de forma sensível, de intensidade moderada e com profunda elegância. Ellis Larkins "conduzia climas" nas casas onde trabalhou: Michael´s Pub, Gregory´s e o Carnegie Tavern - ao lado do Carnegie Hall. Transformava as demonstrações de solenitude e respeito de seu público numa reduzida amostra do que acontecia no célebre palco vizinho. Filho de uma pianista amadora e de um violinista que sustentava sua família trabalhando como zelador, Ellis Lane Larkis nasceu em 15 de maio de 1923 em Baltimore. Quando tinha seis anos, seus pais o iniciaram nos estudo da música, identificando rapidamente sua prodigiosa capacidade de aprendizado. Com 13 anos fazia recitais tocando Mozart, Chopin e Rachmaninoff. Entra, aos 15 anos, no Peabody Conservatory recebendo, dois anos mais tarde, uma bolsa pra Juilliard School of Music (grandioso feito para um negro pobre) onde estuda por três anos. No trabalho prático de conclusão de curso examina as semelhanças entre as linhas melódicas de Bach e as do boogie-woogie. Após graduar-se, indeciso entre a carreira de concertista clássico e a de músico popular, arranja trabalho no trio do guitarrista Billy Moore. "Era um bom dinheiro para um rapaz de 19 anos e a carreira erudita talvez não me encaixasse"(numa alusão ao racismo). Observado por John Hammond, descobridor de Count Basie e Billie Holliday, teve providenciada sua sindicalização, gravando com Coleman Hawkins, Edmond Hall (clarineta) e as cantoras Mildred Bailey e Hellen Humes. Nos anos 40, absorve as influências de Earl Hines, Teddy Wilson, Count Basie e Fatts Waller. No início dos 50 desperta atenção pela suavidade na digitação, geralmente em tempo médio e no domínio completo da extensão do piano com absoluta fidelidade à melodia e à dinâmica harmônica. Além disso, conhecia, como poucos, o luxuoso repertório do American Songbook (consagrado almanaque de belas canções). Traquejado nesse domínio, acompanha em duo (voz e piano) Ella Fitzgerald em 1950 nos discos "Ella Sings Gershwin" - que precedeu a entrada da cantora nos célebres trabalhos dedicados aos compositores e, em 54, no "Sings in a Mellow Mood". Larkins registra com isso a reputação, pra maioria dos críticos, de maior acompanhante da história do jazz. Esses dois álbuns, reunidos no cd "Pure Ella" (Decca), estabeleceram padrão até hoje considerado referencial. E a concorrência entre seus pares à época era de: Teddy Wilson, Hank Jones, Eddie Heywood, Oscar Peterson e John Lewis entre outros mestres. De discografia pequena, Larkins recebeu destaque também por suas gravações com o trompetista Ruby Braff, com a mesma estrutura de duo, nos anos de 55, 72 e 94. Dos anos 60 em diante, Larkins concentrou-se ao ensino e à atividade de músico de estúdio e de locais sofisticados. Esteve no Brasil em 1978, tocando no São Paulo Montreux Jazz Festival. Nos final dos anos 80, mudou-se pra Los Angeles, para aproximar-se da comunidade fonográfica. Em 1992, grava pra série de piano solo da Maybeck Recital Hall (Concord) seu último registro importante. Aposenta-se no final da década de 90, vindo a falecer em 03 de outubro de 2002. Não pretendeu nada mais em vida. Apenas atendia uma obrigação pessoal. Jamais abrir mão da elegância. Para os amigos fica a faixa Rose Room , retirada do álbum A Smoth One, gravado em 1977 para a Black & Blue, com George Duvivier (b) e J. C. Heard (d).


As cadeiras foram colocadas em sentido inverso sobre as mesas. O barman enxuga meticulosamente os copos lavados, reposicionando-os no seu lugar de origem. Os músicos repousam seus instrumentos nos estojos e aguardam o pagamento - retirado do faturamento da noite pelo gerente da casa. Os últimos clientes de um jazzclub em Manhattan prolongam, na medida exata do necessário, o instante de ir embora pra casa consumindo a mistura da água do gelo derretido com o que resta da bebida no copo. Para quem foi "autenticado" como o pianista de todas as horas essa era, para Ellis Larkins, a sua. Ambiente tranqüilo, platéia reduzida, atenta e um pequeno "set" de canções - de no máximo 25 minutos, onde dedilhava seu piano de forma sensível, de intensidade moderada e com profunda elegância. Ellis Larkins "conduzia climas" nas casas onde trabalhou: Michael´s Pub, Gregory´s e o Carnegie Tavern - ao lado do Carnegie Hall. Transformava as demonstrações de solenitude e respeito de seu público numa reduzida amostra do que acontecia no célebre palco vizinho. Filho de uma pianista amadora e de um violinista que sustentava sua família trabalhando como zelador, Ellis Lane Larkis nasceu em 15 de maio de 1923 em Baltimore. Quando tinha seis anos, seus pais o iniciaram nos estudo da música, identificando rapidamente sua prodigiosa capacidade de aprendizado. Com 13 anos fazia recitais tocando Mozart, Chopin e Rachmaninoff. Entra, aos 15 anos, no Peabody Conservatory recebendo, dois anos mais tarde, uma bolsa pra Juilliard School of Music (grandioso feito para um negro pobre) onde estuda por três anos. No trabalho prático de conclusão de curso examina as semelhanças entre as linhas melódicas de Bach e as do boogie-woogie. Após graduar-se, indeciso entre a carreira de concertista clássico e a de músico popular, arranja trabalho no trio do guitarrista Billy Moore. "Era um bom dinheiro para um rapaz de 19 anos e a carreira erudita talvez não me encaixasse"(numa alusão ao racismo). Observado por John Hammond, descobridor de Count Basie e Billie Holliday, teve providenciada sua sindicalização, gravando com Coleman Hawkins, Edmond Hall (clarineta) e as cantoras Mildred Bailey e Hellen Humes. Nos anos 40, absorve as influências de Earl Hines, Teddy Wilson, Count Basie e Fatts Waller. No início dos 50 desperta atenção pela suavidade na digitação, geralmente em tempo médio e no domínio completo da extensão do piano com absoluta fidelidade à melodia e à dinâmica harmônica. Além disso, conhecia, como poucos, o luxuoso repertório do American Songbook (consagrado almanaque de belas canções). Traquejado nesse domínio, acompanha em duo (voz e piano) Ella Fitzgerald em 1950 nos discos "Ella Sings Gershwin" - que precedeu a entrada da cantora nos célebres trabalhos dedicados aos compositores e, em 54, no "Sings in a Mellow Mood". Larkins registra com isso a reputação, pra maioria dos críticos, de maior acompanhante da história do jazz. Esses dois álbuns, reunidos no cd "Pure Ella" (Decca), estabeleceram padrão até hoje considerado referencial. E a concorrência entre seus pares à época era de: Teddy Wilson, Hank Jones, Eddie Heywood, Oscar Peterson e John Lewis entre outros mestres. De discografia pequena, Larkins recebeu destaque também por suas gravações com o trompetista Ruby Braff, com a mesma estrutura de duo, nos anos de 55, 72 e 94. Dos anos 60 em diante, Larkins concentrou-se ao ensino e à atividade de músico de estúdio e de locais sofisticados. Esteve no Brasil em 1978, tocando no São Paulo Montreux Jazz Festival. Nos final dos anos 80, mudou-se pra Los Angeles, para aproximar-se da comunidade fonográfica. Em 1992, grava pra série de piano solo da Maybeck Recital Hall (Concord) seu último registro importante. Aposenta-se no final da década de 90, vindo a falecer em 03 de outubro de 2002. Não pretendeu nada mais em vida. Apenas atendia uma obrigação pessoal. Jamais abrir mão da elegância. Para os amigos fica a faixa Rose Room , retirada do álbum A Smoth One, gravado em 1977 para a Black & Blue, com George Duvivier (b) e J. C. Heard (d).

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