Há... mas são verdes!

28-10-2008
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Há... mas são verdes!

Bruno Ventura

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É verdade que o desemprego atinge níveis recorde. É verdade que não se vê um dos 150.000 novos empregos prometidos por José Sócrates nas últimas legislativas. É verdade que, em Portugal, dá muito trabalho ter emprego.

E entre o emprego que não há, poucos se lembram do emprego que há. É que há. Pouco... mas são verdes.

Existe um milhão de portugueses que trabalha quase como os outros. Tem local de trabalho, cumpre ordens e cumpre horários. A diferença é que no final do mês passa um recibo verde. Em rigor, um falso recibo verde.

Existe um milhão de portugueses que, por falta de alternativa, trabalha sem subsídio de desemprego. Sem assistência na saúde. Sem licença de maternidade. Sem subsídio de férias ou de natal. Sem perspectiva de reforma.

Existe um milhão de portugueses que trabalha sem direito a emprego. Com um horizonte de vida que acaba no dia 28 de cada mês.

O país vive tranquilamente esta mentira. O trabalhador finge que se deixa enganar, a empresa finge que engana o Estado e o Estado finge que anda enganado. Todos os outros fingem que não vêem.

A mentira, por ser tão costumeira, vai importando cada vez menos. Os recibos verdes, regime de excepção, tornaram-se a regra num mercado de trabalho que já não se guia pela legislação laboral que herdámos.

Os filhos da revolução de Abril são a geração mais qualificada de sempre. Nunca existiram tantos licenciados, pós-graduados, mestres ou doutores. A mesma revolução que lhes trouxe o livre acesso à educação rouba-lhes agora o direito à protecção social.

O país prefere não ver. Como não quer ver que a dogmática protecção aos ‘direitos adquiridos’ deixou um milhão de portugueses desprotegidos.

Desengane-se quem julga que este problema começa e acaba numa única geração. Em linguagem publicitária, que o eng. Sócrates compreenderá particularmente bem, dir-se-ia: se o modelo laboral é rígido, o mercado adapta-se. Logo, há mais recibos verdes. Logo, os jovens não têm segurança. Logo, têm medo de sair de casa. Logo, não se casam. Logo, não têm filhos. Logo, o sistema de segurança social torna-se insustentável. Logo, não há reformas para ninguém. Nem para os verdes nem para os outros. Simplex, não é?

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Bruno Ventura

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É verdade que o desemprego atinge níveis recorde. É verdade que não se vê um dos 150.000 novos empregos prometidos por José Sócrates nas últimas legislativas. É verdade que, em Portugal, dá muito trabalho ter emprego.

E entre o emprego que não há, poucos se lembram do emprego que há. É que há. Pouco... mas são verdes.

Existe um milhão de portugueses que trabalha quase como os outros. Tem local de trabalho, cumpre ordens e cumpre horários. A diferença é que no final do mês passa um recibo verde. Em rigor, um falso recibo verde.

Existe um milhão de portugueses que, por falta de alternativa, trabalha sem subsídio de desemprego. Sem assistência na saúde. Sem licença de maternidade. Sem subsídio de férias ou de natal. Sem perspectiva de reforma.

Existe um milhão de portugueses que trabalha sem direito a emprego. Com um horizonte de vida que acaba no dia 28 de cada mês.

O país vive tranquilamente esta mentira. O trabalhador finge que se deixa enganar, a empresa finge que engana o Estado e o Estado finge que anda enganado. Todos os outros fingem que não vêem.

A mentira, por ser tão costumeira, vai importando cada vez menos. Os recibos verdes, regime de excepção, tornaram-se a regra num mercado de trabalho que já não se guia pela legislação laboral que herdámos.

Os filhos da revolução de Abril são a geração mais qualificada de sempre. Nunca existiram tantos licenciados, pós-graduados, mestres ou doutores. A mesma revolução que lhes trouxe o livre acesso à educação rouba-lhes agora o direito à protecção social.

O país prefere não ver. Como não quer ver que a dogmática protecção aos ‘direitos adquiridos’ deixou um milhão de portugueses desprotegidos.

Desengane-se quem julga que este problema começa e acaba numa única geração. Em linguagem publicitária, que o eng. Sócrates compreenderá particularmente bem, dir-se-ia: se o modelo laboral é rígido, o mercado adapta-se. Logo, há mais recibos verdes. Logo, os jovens não têm segurança. Logo, têm medo de sair de casa. Logo, não se casam. Logo, não têm filhos. Logo, o sistema de segurança social torna-se insustentável. Logo, não há reformas para ninguém. Nem para os verdes nem para os outros. Simplex, não é?

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