Via PdP, foi estimulante ler isto, com o que não poderia estar mais de acordo, sobretudo tendo em conta a minha própria releitura fresca e deleitosa de A Relíquia:, recuperando na narrativa em primeira pessoa o faceto Raposão femeeiro, a sua inenterrável titi e toda a grande anedota religiosa ali inscrita ousada e admiravelmente: «— Até aqui tens sido apropositado, não tens faltado aos preceitos, nem te tens dado a relaxações... Por isso te vais regalar de ver as oliveiras onde Nosso Senhor suou sangue, e de beber no Jordãozinho... Mas se eu soubesse que nesta passeata tinhas tido maus pensamentos, e praticado uma relaxação, ou andado atrás de saias, fica certo que, apesar de seres a única pessoa do meu sangue, e teres visitado Jerusalém, e gozar indulgências, havias de ir para a rua, sem uma côdea, como um cão!Curvei a cabeça, apavorado. E a titi, depois de roçar o lenço de rendas pelos beiços sumidos, prosseguiu com mais autoridade, e com uma emoção crescente que lhe punha, sob o corpete raso, como o fugitivo arfar de um peito humano:— E agora quero dizer-te, para teu governo, uma só coisa!...Todos de pé, e reverentes, logo percebemos que a titi se preparava a proferir uma palavra suprema. Nessa hora de separação, rodeada dos seus sacerdotes, rodeada dos seus magistrados, D. Patrocínio das Neves ia decerto revelar qual fora o seu íntimo motivo em me mandar, como sobrinho e como romeiro, à cidade de Jerusalém. Eu ia saber enfim, e tão indubitavelmente como se ela mo escrevesse num pergaminho, qual deveria ser o mais precioso dos meus cuidados, velando ou dormindo, nas terras do Evangelho!» Eça de Queiroz, A Relíquia, p. 65, Edição Livros do Brasil, Lisboa
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Via PdP, foi estimulante ler isto, com o que não poderia estar mais de acordo, sobretudo tendo em conta a minha própria releitura fresca e deleitosa de A Relíquia:, recuperando na narrativa em primeira pessoa o faceto Raposão femeeiro, a sua inenterrável titi e toda a grande anedota religiosa ali inscrita ousada e admiravelmente: «— Até aqui tens sido apropositado, não tens faltado aos preceitos, nem te tens dado a relaxações... Por isso te vais regalar de ver as oliveiras onde Nosso Senhor suou sangue, e de beber no Jordãozinho... Mas se eu soubesse que nesta passeata tinhas tido maus pensamentos, e praticado uma relaxação, ou andado atrás de saias, fica certo que, apesar de seres a única pessoa do meu sangue, e teres visitado Jerusalém, e gozar indulgências, havias de ir para a rua, sem uma côdea, como um cão!Curvei a cabeça, apavorado. E a titi, depois de roçar o lenço de rendas pelos beiços sumidos, prosseguiu com mais autoridade, e com uma emoção crescente que lhe punha, sob o corpete raso, como o fugitivo arfar de um peito humano:— E agora quero dizer-te, para teu governo, uma só coisa!...Todos de pé, e reverentes, logo percebemos que a titi se preparava a proferir uma palavra suprema. Nessa hora de separação, rodeada dos seus sacerdotes, rodeada dos seus magistrados, D. Patrocínio das Neves ia decerto revelar qual fora o seu íntimo motivo em me mandar, como sobrinho e como romeiro, à cidade de Jerusalém. Eu ia saber enfim, e tão indubitavelmente como se ela mo escrevesse num pergaminho, qual deveria ser o mais precioso dos meus cuidados, velando ou dormindo, nas terras do Evangelho!» Eça de Queiroz, A Relíquia, p. 65, Edição Livros do Brasil, Lisboa