Ao contrário dos japoneses que, numa situação de conflito ou de crise preocupam-se primeiro em encontrar respostas e só de seguida procurar responsabilidades, nós, nem bons numas e péssimos noutras, desenvolvemos uma particularidade social, que não sendo exclusivamente nossa, é por cá sabiamente cultivada: a resposta ao conflito ou à crise está em acusar o outro.E não podemos ser acusados de discriminação no exercício. Não há ninguém que não apanhe por tabela, o que parece, arrisco, ser uma expressão genuinamente nossa. Anonimamente a suspeição é suficiente para uma acusação. E se o fazemos publicamente, como raramente a realidade age de acordo com as nossas convicções, generalizamos.É assim na nossa vida privada e é assim na nossa vida pública.Uma sociedade corroída com a suspeição.Um professor lembrava recentemente que tal comportamento foi herdado de duas épocas não assim tão distantes da nossa história: a instituição da delação nos tempos negros da inquisição (onde o delator recebia uma parte da propriedade do acusado) e, mais recentemente, a prática da denúncia nos tempos do Estado Novo (onde o delator acreditava que, pelo menos ganharia a liberdade, apesar das poucas garantias).Todas as sociedades possuem no seu âmago o que chamou Francisco Ferraz de peculiar combinação entre conflito e consenso. Para resolver as divergências internas as democracias construíram os meios institucionais, como os processos eleitorais, onde as diferentes visões sobre governo e coisa pública se dirimem. A decisão final cabe ao eleitor. As eleições são assim um instrumento que resolve o conflito pela decisão dos cidadãos. Ferraz chama-lhe livre, eu penso que nem sempre. Normalmente e digo normalmente em democracia, os derrotados acatam a decisão das eleições e o ganhador institucionaliza-se produzindo consenso.Ora o problema não reside na simples existência do conflito mas no tipo de conflito. Qualquer tipo de conflito que se incompatibilize com a democracia e cuja dinâmica corroa os fundamentos do nosso Estado é um conflito que põe em causa o livre pensamento e a escolha clarividente das pessoas, quando não a governabilidade. Uma campanha negra alimenta este género de conflito. Que é desigual.Não serei o único a achar que o que esta a acontecer ao país me ultrapassa. E nem vale a pena tentar o mundo. Muito lamentavelmente o resultado de toda esta agitação nacional terá a mesma conclusão provável que todas as outras nossas agitações públicas, uma página interna de um jornal, sem o colorido que mereceram as acusações. Um limbo portanto.O mundo agita-se com os problemas e é preciso calma para os enfrentarmos. Já o conseguimos outras vezes, nada impede que o façamos de novo.
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Ao contrário dos japoneses que, numa situação de conflito ou de crise preocupam-se primeiro em encontrar respostas e só de seguida procurar responsabilidades, nós, nem bons numas e péssimos noutras, desenvolvemos uma particularidade social, que não sendo exclusivamente nossa, é por cá sabiamente cultivada: a resposta ao conflito ou à crise está em acusar o outro.E não podemos ser acusados de discriminação no exercício. Não há ninguém que não apanhe por tabela, o que parece, arrisco, ser uma expressão genuinamente nossa. Anonimamente a suspeição é suficiente para uma acusação. E se o fazemos publicamente, como raramente a realidade age de acordo com as nossas convicções, generalizamos.É assim na nossa vida privada e é assim na nossa vida pública.Uma sociedade corroída com a suspeição.Um professor lembrava recentemente que tal comportamento foi herdado de duas épocas não assim tão distantes da nossa história: a instituição da delação nos tempos negros da inquisição (onde o delator recebia uma parte da propriedade do acusado) e, mais recentemente, a prática da denúncia nos tempos do Estado Novo (onde o delator acreditava que, pelo menos ganharia a liberdade, apesar das poucas garantias).Todas as sociedades possuem no seu âmago o que chamou Francisco Ferraz de peculiar combinação entre conflito e consenso. Para resolver as divergências internas as democracias construíram os meios institucionais, como os processos eleitorais, onde as diferentes visões sobre governo e coisa pública se dirimem. A decisão final cabe ao eleitor. As eleições são assim um instrumento que resolve o conflito pela decisão dos cidadãos. Ferraz chama-lhe livre, eu penso que nem sempre. Normalmente e digo normalmente em democracia, os derrotados acatam a decisão das eleições e o ganhador institucionaliza-se produzindo consenso.Ora o problema não reside na simples existência do conflito mas no tipo de conflito. Qualquer tipo de conflito que se incompatibilize com a democracia e cuja dinâmica corroa os fundamentos do nosso Estado é um conflito que põe em causa o livre pensamento e a escolha clarividente das pessoas, quando não a governabilidade. Uma campanha negra alimenta este género de conflito. Que é desigual.Não serei o único a achar que o que esta a acontecer ao país me ultrapassa. E nem vale a pena tentar o mundo. Muito lamentavelmente o resultado de toda esta agitação nacional terá a mesma conclusão provável que todas as outras nossas agitações públicas, uma página interna de um jornal, sem o colorido que mereceram as acusações. Um limbo portanto.O mundo agita-se com os problemas e é preciso calma para os enfrentarmos. Já o conseguimos outras vezes, nada impede que o façamos de novo.