Abaixo de Cão

29-09-2009
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E O CORAÇÃO ESTÁ SECO OS OMBROS SUPORTAM O MUNDO
Chega um tempo em que não se diz mais: meu iDeus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.
Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem ienormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha a velhice, que é a ivelhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma icriança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro idos edifícios
provam apenas que a vida prossege
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.
Carlos Drummond de Andrade
© Graña Drummond
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E O CORAÇÃO ESTÁ SECO OS OMBROS SUPORTAM O MUNDO
Chega um tempo em que não se diz mais: meu iDeus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.
Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem ienormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha a velhice, que é a ivelhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma icriança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro idos edifícios
provam apenas que a vida prossege
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.
Carlos Drummond de Andrade
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