O Comércio do Porto

08-04-2005
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Afinal, temos presidente! .

ROGÉRIO GOMES

Editorial de 16/03/2005

Rui Rio foi eleito presidente da Câmara do Porto e, desde o primeiro minuto, declarou que era "diferente do outros": Distância do futebol, não ao populismo, controle rigoroso das contas, opção clara pelo social, não à política do espectáculo, crítica cerrada a decisões tomadas por executivos em hora de saída, escrupuloso respeito pelos procedimentos legais administrativos ..., estes e outros princípios foram muitas vezes evocados e jurados como traves-mestras de um mandato que, entre questiúnculas e debates com uma frágil oposição, foi correndo na modorra dos meses (já fez três anos) e que até agora tinha como "bandeiras" para agitar intervenção esparsa nos bairros, a recuperação das contas da Câmara e a implementação da SRU - Sociedade de Reabilitação Urbana.

Mas, eis que entramos na recta final do mandato... Algo se começou a agitar ali nos Paços do Concelho, ao alto da Avenida dos Aliados:

- vamos ter a encenação dos Grandes Prémios automóveis que no início da segunda metade do século passado deram ao Porto um dos momentos mais cosmopolitas da sua história... Boa ideia! Anima-se a cidade durante uma semana, atrai-se umas dezenas de milhar de pessoas para as bermas da Circunvalação e da Avenida da Boavista. É um bom espectáculo!

- requalificação da Avenida da Boavista aí está ela, à boleia do simulacro de Grande Prémio... novo pavimento, tenta-se resolver as inundações do parque de estacionamento do Castelo do Queijo e prepara-se o terreno para a linha do metro na Boavista; são só seis milhões de euros adiantados que a empresa do Metro há-de devolver à edilidade... Pareceres de quem? Do Instituto do Ambiente? Para quê? Ou os assessores do presidente não sabem o que andam a fazer ou é o presidente que faz valer a sua proverbial teimosia? Aí estão os desmancha-prazeres da Administração a fazer valer normas legais, a adiar festas, inaugurações ou primeiras-pedras... E os seis milhões? Pois vá-se lá saber quando e se voltarão a entrar nos cofres do município...

- parece que se vai terminar o túnel de Ceuta; e como era pouco acabar uma obra iniciada em mandatos anteriores, dá-se-lhe um toque pessoal e acrescenta-se-lhe uma nova saída... e até há um bom pretexto, o de proteger a entrada poente do Hospital de Santo António. Alegremente ignora-se o Museu Soares dos Reis e dispensa-se o parecer do IPPAR - vão lá estes, agora, recusar este enorme melhoramento para a cidade e atrapalhar o momento de glória do presidente?!

- junte-se a "espontânea e significativa" manifestação dos comerciantes chefiados pela D. Laura - eram seguramente mais de 20... Eles querem lá saber do museu, do Desterrado, das colecções de pintura e de joalharia, do antigo Paço Real , do dinheiro gasto pela Porto 2001 na sua recuperação, eles querem lá saber da Cultura! Eles estão com o sr. presidente contra os que querem preservar a entrada do museu e "contra a cidade"... Eles, os tais 20, querem é continuar a vender as meias-de-leite, os pratinhos para os almoços, a fazer duplicados de chaves...

- tenta-se tudo, com a muleta do vereador da CDU, até convencer uma ministra da Cultura no último dia do seu exercício a revogar o parecer do IPPAR; como esta não respondia, o próprio primeiro-ministro foi instado a ser ele a tomar esta posição... Felizmente, os governantes tiveram mais juízo do que os autarcas... Acenou-se com o fantasma da perda de fundos comunitários, coisa que obviamente o Executivo resolveu na hora junto das instâncias competentes. Lá se foi o argumento... O IPPAR manteve a sua posição e o estranho será que a obra não pare. Porquê? Pura e simplesmente por ilegalidade...

- última hora: a remodelação da Avenida dos Aliados está aí e para ser inaugurada ainda a tempo das autárquicas... Vão desaparecer os jardins? A calçada portuguesa evapora-se? Pormenores... Os nomes dos arquitectos esmagam qualquer raciocínio e não temos mais do que nos curvar perante os génios que, depois de meses de intensos estudos e considerações sobre alternativas, chegaram à fabulosa solução de cobrir a avenida de lajes de granito liso e cinzento (!?) - desculpem lá o leigo que vos pergunta: esta não é, no essencial, a repetição do que se fez na Cordoaria pela "Porto 2001" e que toda a cidade critica e abomina? Não ouvi eu já desta Câmara intensos reparos ao que ali foi feito? Terá sido Ricardo Figueiredo? Vamos a ver que ele afinal tinha razão ao não querer o projecto de Siza Vieira? Esperemos para ver o que nos dizem os especialistas...

"Obstáculos e contrariedades", diz Rui Rio, certamente muito incomodado com as formalidades legais que não cumpriu, com o adiantamento dos tais seis milhões de euros sem quaisquer garantias de ressarcimento e com a polémica que o projecto para a Avenida dos Aliados não deixará de provocar.

Afinal temos presidente da Câmara. E não é diferente dos outros.

Editorial 15/03/2005

A ausência do Norte

Já se falou da escassez de mulheres no novo Governo e foram várias as notáveis socialistas a estranharem a "quota minimalista" que o novo primeiro-ministro cumpriu na escolha dos governantes; também já houve quem aflorasse o peso de quadros oriundos do ISCTE de Lisboa ou do ex-Ministério do Ambiente do tempo em que José Sócrates era seu titular; o que ainda muito pouca gente disse é que este Governo é certamente um dos mais centralistas desde o 25 de Abril.

Isabel Pires de Lima e Augusto Santos Silva são os ministros do Norte, - raio de coincidência! - os últimos na nomenclatura executiva e praticamente sem orçamentos. Secretários de Estado, nem vê-los... Que preocupação é esta? Estarão já neste momento a clamar os defensores cegos de José Sócrates ou todos os que não vêem, nunca viram e nunca vão ver qual é o problema de deixar "o Norte de fora". Afinal na formação de um Governo é obrigatório ter em conta critérios como a presença de mulheres, de governantes a Norte ou, por exemplo, de engenheiros e advogados? Não são as competências política e técnica os vectores essenciais na escolha dos governantes?

É verdade que os primeiros critérios na escolha de ministros e outros governantes devem ser aqueles, mas não pode deixar de se considerar estranho que as valências necessárias a pertencer a um Goveno só se encontrem em Lisboa ou por ali perto; não pode deixar de se questionar porque é que entre os mais de três milhões de eleitores que habitam do Rio Vouga para Norte não de identifiquem quadros suficientemente interessantes para integrarem o Governo do país; não pode deixar de se estranhar que praticamente metade dos 2,5 milhões de votantes no PS vejam a sua representação no Governo reduzida a dois ministros menores e três ou quatro secretários de Estado; ver universidades como a do Porto - a maior de Portugal -, Aveiro, Braga, Vila Real ou mesmo Coimbra sem capacidade (ou força política?) de gerar governantes só pode ser profundamente desanimador; por último: para uma distrital partidária com a dimensão da do Porto ver-se no Governo reduzida a um ministro dos Assuntos Parlamentares não pode ser mobilizador...

Comparando a presença do Norte em governos anteriores e em contas rápidas, António Guterres teve dois ministros e sete secretários de Estado no seu primeiro Governo e sete ministros e três secretários de Estado no segundo Executivo, enquanto Durão Barroso teve três ministros e três secretários de Estado... E não será preciso lembrar nomes como Miguel Cadilhe, Eurico de Melo, Valente de Oliveira, Arlindo Cunha ou Silva Peneda para mostrar a presença do Norte nos consulados de Cavaco Silva...

Para já, dentro das estruturas nortenhas do PS ninguém dá a cara por este mal estar e muito menos se atreve a criticar o recém primeiro-ministro. Mas a verdade é que a falta de figuras nortenhas de peso em lugares executivos no Governo e o já assumido adiamento "sine die" do processo de Regionalização justifica o pouco entusiasmo com que os portuenses (não só socialistas) se referem ao novo Governo.

Vamos a ver que efeito é que isto terá nos apoios ao Executivo e especialmente nas eleições autárquicas, sufrágio em que as grandes figuras do PS que agora ficaram à margem não parecem muito dispostas a arriscar a pele por quem por eles até agora pouco fez.

Editorial 05/03/2005

Sem entusiasmos

O anúncio do Governo de José Sócrates não trouxe verdadeiras novidades - Freitas do Amaral já tinha sido notícia como possível titular dos Negócios Estrangeiros, ver O COMÉRCIO de 23 de Fevereiro, e o novo ministro das Finanças também foi anunciado pelo nosso jornal dois dias depois -, não surpreende pela excepcional qualidade ou peso político dos nomeados, deixa "pesos pesados" socialistas de fora e está longe de gerar qualquer entusiasmo particular.

O XVII Governo constitucional parece cinzento. Nem foi à sociedade civil buscar nomes sonantes nem tem um "núcleo político" com o peso que seria de esperar. António Vitorino, Jaime Gama, Jorge Coelho, João Cravinho, José Lello, Manuel Alegre, Luís Braga da Cruz, António José Seguro, Francisco Assis, Fernando Gomes e tantos outros estão de fora.

Sendo verdade que não cabiam todos no Executivo, era expectável que um ou outro fizessem parte do elenco e pudessem ser o "seguro político" que todos os governos precisam. Por muito bom tecnicamente que um gabinete seja, a sua tarefa não fica facilitada sem gente suficientemente capaz para o defender dos ataques da oposição e olear a relação com o próprio partido que sustenta o Governo.

Diz-se nos bastidores que a António Vitorino está reservada a hipótese de ser candidato a Presidente da República e a Jaime Gama a de ser presidente da Assembleia da República. No segundo caso, parece-me verdadeiramente uma boa opção que, só pela curiosidade, prolongaria a presença açoriana no papel de segunda figura do Estado, depois de Mota Amaral. Sobre António Vitorino, começa a ser irritante a tendência deste dirigente socialista para ser hipótese para muito e terminar em nada - como António Borges, no PSD...

O que nos mesmos bastidores não se prevê é se os nomes que ficaram de fora vão resignar-se a fazer parte de um grupo parlamentar, este sim forte, se estará reservada uma série compensatória de nomeações para grandes empresas públicas ou se iremos ter os "pesos pesados" na luta política autárquica.

Falta ainda conhecer a equipa de secretários de Estado que, necessariamente, acabará por dar retoques quiçá inesperados ao novo Governo. Só depois de conhecidos quantos e quem serão os responsáveis no terreno por muitas das políticas será possível ter uma noção completa da valia do Executivo. Aguardemos, portanto.

Feitas as primeiras críticas, é no entanto necessário e justo dar o benefício da dúvida a quem ainda nem sequer iniciou a sua actividade, sinceramente esperar que José Sócrates venha a liderar um excelente Governo e que os nomes mais desconhecidos se revelem bons ministros. Afinal, é disto que Portugal precisa.

Editorial de 03/03/2005

Autárquicas já mexem

Enquanto se mantém um surpreendente manto de silêncio sobre o que vai ser e quem será quem no Governo de José Sócrates, os políticos distritais e concelhios vão-se afadigando em análises dos resultados eleitorais e mandando uns palpites sobre o que poderão ser as guerras autárquicas lá para o Outono.

Aqui pelo distrito do Porto, os socialistas pela voz de Francisco Assis lançam a ideia de uma possível "grande coligação à esquerda" direccionada no objectivo de derrubar Rui Rio, enquanto a estrutura distrital do PSD se dispõe a reavaliar as coligações com o CDS/PP como quem lança avisos à navegação de que o que hoje existe não pode ser dado como certo para futuro, o que também tem particular incidência no município do Porto.

É claro que estas tomadas de posição só podem deixar nervosas concelhias e pré-candidatos autárquicos, principalmente porque nenhuma delas terá sido previamente concertada com os implicados - mais complicado ainda no caso de Assis, que disse o que disse sem sequer ter sido aprovada uma estratégia no órgão a que preside. Não admira, assim, que Nuno Cardoso reaja e o faça de modo firme e ruidoso.

Há, no entanto, nas palavras de Assis algo de táctico e que, na minha opinião, pretende antes de mais nada forçar tomadas de posição no Bloco de Esquerda e na CDU. E estes fizeram-lhe prontamente a vontade e na direcção esperada, ou seja, na da recusa da "mão estendida" pelos socialistas.

A soma da votação da CDU e do Bloco é mais do que suficiente para um papel decisivo na eleição do futuro presidente da Câmara do Porto, o que ainda é mais verdade se PSD e CDS/PP continuarem coligados. Ao falar em eventual aliança no Porto, Assis não está a fazer mais do que chamara a atenção para esse facto e a tentar passar o odioso de uma não-aliança à esquerda para o arco à sua esquerda, jogando então os socialistas, na campanha do Outono, na percepção de um voto útil no PS, a única força política capaz de derrotar Rui Rio.

Nuno Cardoso reagiu talvez cedo de mais. Não percebe que ao hostilizar o leque político à sua esquerda com a arrogância de uma vitória folgada no passado dia 20 está a legitimar enquistamentos e entricheiramentos de quem só pode balançar entre o desejo da afirmação (BE) e o evitar um triunfo socialista (CDU). Na essência, Nuno Cardoso tem razão e o PS tem oportunidade de ganhar sozinho as próximas autárquicas, talvez não com a vantagem que Cardoso imagina, mas com alguma clareza.

Entretanto, no CDS/PP, o comunicado da distrital social-democrata não deve ser encarado com ligeireza e está na hora de pôr o jogo na mesa e não esperar que seja o PSD sozinho a definir a qualidade do bolo, a partir e a distribuir as fatias. E muito menos deixar que tal seja feito na mesa da Distrital.

O Comércio do Porto é um produto da Editorial Prensa Ibérica.

Fica expressamente proibida a reprodução total ou parcial dos conteúdos oferecidos através deste meio, salvo autorização expressa de O Comércio do Porto

Afinal, temos presidente! .

ROGÉRIO GOMES

Editorial de 16/03/2005

Rui Rio foi eleito presidente da Câmara do Porto e, desde o primeiro minuto, declarou que era "diferente do outros": Distância do futebol, não ao populismo, controle rigoroso das contas, opção clara pelo social, não à política do espectáculo, crítica cerrada a decisões tomadas por executivos em hora de saída, escrupuloso respeito pelos procedimentos legais administrativos ..., estes e outros princípios foram muitas vezes evocados e jurados como traves-mestras de um mandato que, entre questiúnculas e debates com uma frágil oposição, foi correndo na modorra dos meses (já fez três anos) e que até agora tinha como "bandeiras" para agitar intervenção esparsa nos bairros, a recuperação das contas da Câmara e a implementação da SRU - Sociedade de Reabilitação Urbana.

Mas, eis que entramos na recta final do mandato... Algo se começou a agitar ali nos Paços do Concelho, ao alto da Avenida dos Aliados:

- vamos ter a encenação dos Grandes Prémios automóveis que no início da segunda metade do século passado deram ao Porto um dos momentos mais cosmopolitas da sua história... Boa ideia! Anima-se a cidade durante uma semana, atrai-se umas dezenas de milhar de pessoas para as bermas da Circunvalação e da Avenida da Boavista. É um bom espectáculo!

- requalificação da Avenida da Boavista aí está ela, à boleia do simulacro de Grande Prémio... novo pavimento, tenta-se resolver as inundações do parque de estacionamento do Castelo do Queijo e prepara-se o terreno para a linha do metro na Boavista; são só seis milhões de euros adiantados que a empresa do Metro há-de devolver à edilidade... Pareceres de quem? Do Instituto do Ambiente? Para quê? Ou os assessores do presidente não sabem o que andam a fazer ou é o presidente que faz valer a sua proverbial teimosia? Aí estão os desmancha-prazeres da Administração a fazer valer normas legais, a adiar festas, inaugurações ou primeiras-pedras... E os seis milhões? Pois vá-se lá saber quando e se voltarão a entrar nos cofres do município...

- parece que se vai terminar o túnel de Ceuta; e como era pouco acabar uma obra iniciada em mandatos anteriores, dá-se-lhe um toque pessoal e acrescenta-se-lhe uma nova saída... e até há um bom pretexto, o de proteger a entrada poente do Hospital de Santo António. Alegremente ignora-se o Museu Soares dos Reis e dispensa-se o parecer do IPPAR - vão lá estes, agora, recusar este enorme melhoramento para a cidade e atrapalhar o momento de glória do presidente?!

- junte-se a "espontânea e significativa" manifestação dos comerciantes chefiados pela D. Laura - eram seguramente mais de 20... Eles querem lá saber do museu, do Desterrado, das colecções de pintura e de joalharia, do antigo Paço Real , do dinheiro gasto pela Porto 2001 na sua recuperação, eles querem lá saber da Cultura! Eles estão com o sr. presidente contra os que querem preservar a entrada do museu e "contra a cidade"... Eles, os tais 20, querem é continuar a vender as meias-de-leite, os pratinhos para os almoços, a fazer duplicados de chaves...

- tenta-se tudo, com a muleta do vereador da CDU, até convencer uma ministra da Cultura no último dia do seu exercício a revogar o parecer do IPPAR; como esta não respondia, o próprio primeiro-ministro foi instado a ser ele a tomar esta posição... Felizmente, os governantes tiveram mais juízo do que os autarcas... Acenou-se com o fantasma da perda de fundos comunitários, coisa que obviamente o Executivo resolveu na hora junto das instâncias competentes. Lá se foi o argumento... O IPPAR manteve a sua posição e o estranho será que a obra não pare. Porquê? Pura e simplesmente por ilegalidade...

- última hora: a remodelação da Avenida dos Aliados está aí e para ser inaugurada ainda a tempo das autárquicas... Vão desaparecer os jardins? A calçada portuguesa evapora-se? Pormenores... Os nomes dos arquitectos esmagam qualquer raciocínio e não temos mais do que nos curvar perante os génios que, depois de meses de intensos estudos e considerações sobre alternativas, chegaram à fabulosa solução de cobrir a avenida de lajes de granito liso e cinzento (!?) - desculpem lá o leigo que vos pergunta: esta não é, no essencial, a repetição do que se fez na Cordoaria pela "Porto 2001" e que toda a cidade critica e abomina? Não ouvi eu já desta Câmara intensos reparos ao que ali foi feito? Terá sido Ricardo Figueiredo? Vamos a ver que ele afinal tinha razão ao não querer o projecto de Siza Vieira? Esperemos para ver o que nos dizem os especialistas...

"Obstáculos e contrariedades", diz Rui Rio, certamente muito incomodado com as formalidades legais que não cumpriu, com o adiantamento dos tais seis milhões de euros sem quaisquer garantias de ressarcimento e com a polémica que o projecto para a Avenida dos Aliados não deixará de provocar.

Afinal temos presidente da Câmara. E não é diferente dos outros.

Editorial 15/03/2005

A ausência do Norte

Já se falou da escassez de mulheres no novo Governo e foram várias as notáveis socialistas a estranharem a "quota minimalista" que o novo primeiro-ministro cumpriu na escolha dos governantes; também já houve quem aflorasse o peso de quadros oriundos do ISCTE de Lisboa ou do ex-Ministério do Ambiente do tempo em que José Sócrates era seu titular; o que ainda muito pouca gente disse é que este Governo é certamente um dos mais centralistas desde o 25 de Abril.

Isabel Pires de Lima e Augusto Santos Silva são os ministros do Norte, - raio de coincidência! - os últimos na nomenclatura executiva e praticamente sem orçamentos. Secretários de Estado, nem vê-los... Que preocupação é esta? Estarão já neste momento a clamar os defensores cegos de José Sócrates ou todos os que não vêem, nunca viram e nunca vão ver qual é o problema de deixar "o Norte de fora". Afinal na formação de um Governo é obrigatório ter em conta critérios como a presença de mulheres, de governantes a Norte ou, por exemplo, de engenheiros e advogados? Não são as competências política e técnica os vectores essenciais na escolha dos governantes?

É verdade que os primeiros critérios na escolha de ministros e outros governantes devem ser aqueles, mas não pode deixar de se considerar estranho que as valências necessárias a pertencer a um Goveno só se encontrem em Lisboa ou por ali perto; não pode deixar de se questionar porque é que entre os mais de três milhões de eleitores que habitam do Rio Vouga para Norte não de identifiquem quadros suficientemente interessantes para integrarem o Governo do país; não pode deixar de se estranhar que praticamente metade dos 2,5 milhões de votantes no PS vejam a sua representação no Governo reduzida a dois ministros menores e três ou quatro secretários de Estado; ver universidades como a do Porto - a maior de Portugal -, Aveiro, Braga, Vila Real ou mesmo Coimbra sem capacidade (ou força política?) de gerar governantes só pode ser profundamente desanimador; por último: para uma distrital partidária com a dimensão da do Porto ver-se no Governo reduzida a um ministro dos Assuntos Parlamentares não pode ser mobilizador...

Comparando a presença do Norte em governos anteriores e em contas rápidas, António Guterres teve dois ministros e sete secretários de Estado no seu primeiro Governo e sete ministros e três secretários de Estado no segundo Executivo, enquanto Durão Barroso teve três ministros e três secretários de Estado... E não será preciso lembrar nomes como Miguel Cadilhe, Eurico de Melo, Valente de Oliveira, Arlindo Cunha ou Silva Peneda para mostrar a presença do Norte nos consulados de Cavaco Silva...

Para já, dentro das estruturas nortenhas do PS ninguém dá a cara por este mal estar e muito menos se atreve a criticar o recém primeiro-ministro. Mas a verdade é que a falta de figuras nortenhas de peso em lugares executivos no Governo e o já assumido adiamento "sine die" do processo de Regionalização justifica o pouco entusiasmo com que os portuenses (não só socialistas) se referem ao novo Governo.

Vamos a ver que efeito é que isto terá nos apoios ao Executivo e especialmente nas eleições autárquicas, sufrágio em que as grandes figuras do PS que agora ficaram à margem não parecem muito dispostas a arriscar a pele por quem por eles até agora pouco fez.

Editorial 05/03/2005

Sem entusiasmos

O anúncio do Governo de José Sócrates não trouxe verdadeiras novidades - Freitas do Amaral já tinha sido notícia como possível titular dos Negócios Estrangeiros, ver O COMÉRCIO de 23 de Fevereiro, e o novo ministro das Finanças também foi anunciado pelo nosso jornal dois dias depois -, não surpreende pela excepcional qualidade ou peso político dos nomeados, deixa "pesos pesados" socialistas de fora e está longe de gerar qualquer entusiasmo particular.

O XVII Governo constitucional parece cinzento. Nem foi à sociedade civil buscar nomes sonantes nem tem um "núcleo político" com o peso que seria de esperar. António Vitorino, Jaime Gama, Jorge Coelho, João Cravinho, José Lello, Manuel Alegre, Luís Braga da Cruz, António José Seguro, Francisco Assis, Fernando Gomes e tantos outros estão de fora.

Sendo verdade que não cabiam todos no Executivo, era expectável que um ou outro fizessem parte do elenco e pudessem ser o "seguro político" que todos os governos precisam. Por muito bom tecnicamente que um gabinete seja, a sua tarefa não fica facilitada sem gente suficientemente capaz para o defender dos ataques da oposição e olear a relação com o próprio partido que sustenta o Governo.

Diz-se nos bastidores que a António Vitorino está reservada a hipótese de ser candidato a Presidente da República e a Jaime Gama a de ser presidente da Assembleia da República. No segundo caso, parece-me verdadeiramente uma boa opção que, só pela curiosidade, prolongaria a presença açoriana no papel de segunda figura do Estado, depois de Mota Amaral. Sobre António Vitorino, começa a ser irritante a tendência deste dirigente socialista para ser hipótese para muito e terminar em nada - como António Borges, no PSD...

O que nos mesmos bastidores não se prevê é se os nomes que ficaram de fora vão resignar-se a fazer parte de um grupo parlamentar, este sim forte, se estará reservada uma série compensatória de nomeações para grandes empresas públicas ou se iremos ter os "pesos pesados" na luta política autárquica.

Falta ainda conhecer a equipa de secretários de Estado que, necessariamente, acabará por dar retoques quiçá inesperados ao novo Governo. Só depois de conhecidos quantos e quem serão os responsáveis no terreno por muitas das políticas será possível ter uma noção completa da valia do Executivo. Aguardemos, portanto.

Feitas as primeiras críticas, é no entanto necessário e justo dar o benefício da dúvida a quem ainda nem sequer iniciou a sua actividade, sinceramente esperar que José Sócrates venha a liderar um excelente Governo e que os nomes mais desconhecidos se revelem bons ministros. Afinal, é disto que Portugal precisa.

Editorial de 03/03/2005

Autárquicas já mexem

Enquanto se mantém um surpreendente manto de silêncio sobre o que vai ser e quem será quem no Governo de José Sócrates, os políticos distritais e concelhios vão-se afadigando em análises dos resultados eleitorais e mandando uns palpites sobre o que poderão ser as guerras autárquicas lá para o Outono.

Aqui pelo distrito do Porto, os socialistas pela voz de Francisco Assis lançam a ideia de uma possível "grande coligação à esquerda" direccionada no objectivo de derrubar Rui Rio, enquanto a estrutura distrital do PSD se dispõe a reavaliar as coligações com o CDS/PP como quem lança avisos à navegação de que o que hoje existe não pode ser dado como certo para futuro, o que também tem particular incidência no município do Porto.

É claro que estas tomadas de posição só podem deixar nervosas concelhias e pré-candidatos autárquicos, principalmente porque nenhuma delas terá sido previamente concertada com os implicados - mais complicado ainda no caso de Assis, que disse o que disse sem sequer ter sido aprovada uma estratégia no órgão a que preside. Não admira, assim, que Nuno Cardoso reaja e o faça de modo firme e ruidoso.

Há, no entanto, nas palavras de Assis algo de táctico e que, na minha opinião, pretende antes de mais nada forçar tomadas de posição no Bloco de Esquerda e na CDU. E estes fizeram-lhe prontamente a vontade e na direcção esperada, ou seja, na da recusa da "mão estendida" pelos socialistas.

A soma da votação da CDU e do Bloco é mais do que suficiente para um papel decisivo na eleição do futuro presidente da Câmara do Porto, o que ainda é mais verdade se PSD e CDS/PP continuarem coligados. Ao falar em eventual aliança no Porto, Assis não está a fazer mais do que chamara a atenção para esse facto e a tentar passar o odioso de uma não-aliança à esquerda para o arco à sua esquerda, jogando então os socialistas, na campanha do Outono, na percepção de um voto útil no PS, a única força política capaz de derrotar Rui Rio.

Nuno Cardoso reagiu talvez cedo de mais. Não percebe que ao hostilizar o leque político à sua esquerda com a arrogância de uma vitória folgada no passado dia 20 está a legitimar enquistamentos e entricheiramentos de quem só pode balançar entre o desejo da afirmação (BE) e o evitar um triunfo socialista (CDU). Na essência, Nuno Cardoso tem razão e o PS tem oportunidade de ganhar sozinho as próximas autárquicas, talvez não com a vantagem que Cardoso imagina, mas com alguma clareza.

Entretanto, no CDS/PP, o comunicado da distrital social-democrata não deve ser encarado com ligeireza e está na hora de pôr o jogo na mesa e não esperar que seja o PSD sozinho a definir a qualidade do bolo, a partir e a distribuir as fatias. E muito menos deixar que tal seja feito na mesa da Distrital.

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