A outra Varinha Mágica: Os apoios do Estado ao sector automóvel

20-05-2009
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Tive grande parte da minha vida profissional ligada ao sector automóvel. Primeiro como jornalista, depois como responsável de comunicação e marketing de um grande concessionário. Há cerca de dez anos, lembro-me de ter estado como jornalista numa apresentação de uma nova motorização de um pequeno carro citadino. Fui para essa apresentação, como jornalista, num avião charter com cerca de 200 lugares, onde apenas 30 estavam ocupados pelos jornalistas portugueses convidados. À entrada, fomos presenteados com champanhe e marisco e, à chegada ao aeroporto de destino tivemos idêntico tratamento. O destino era uma ilha turística onde havia dois aeroportos internacionais. Um deles estava, naqueles dias, praticamente reservado para aquela marca de automóveis. De tal forma, que se dispensaram as habituais formalidades de chegada e saímos do avião para uma sala VIP onde nos foram entregues as chaves dos novos carros, que esperavam lá fora, por nós. Já no carro, cada um de nós, dispunha de um telemóvel, para fazermos as chamadas que entendêssemos enquanto ali estivéssemos. Chegados ao hotel, onde estivemos cinco dias, verificámos que se tratava de uma unidade de luxo, onde a diária ultrapassava, na altura, os 100 contos diários. No quarto de cada jornalista, havia várias ofertas de valor bastante elevado, que o jornalista poderia levar para casa. Durante os cinco dias e as cinco noites que ali estivemos pudemos passear bastante de carro, visitamos os locais mais turísticos e comemos nos melhores restaurantes. Fomos à praia e passamos muitas horas nas piscinas. Além do interesse no motor do pequeno carro e do teste que me permitiria escrever para o meu jornal sobre aquela novidade, permiti-me ter curiosidade jornalística, sobre quanto teria custado aquela operação de comunicação com os jornalistas. A comitiva portuguesa não sabia bem, mas por extrapolação, o director de relações públicas acabou por calcular que teria custado à marca cerca de dois milhões de contos (10 milhões de euros), contando com viagens, estadias, prendinha, refeições, transporte dos carros e toda a logística e transporte para staff. No total, seriam oito semanas, para receber as comitivas de jornalistas de todo o Mundo. Mais tarde, como responsável pelo marketing e comunicação de um concessionário, fui testemunha da forma profissional e exigente como as marcas tratam estas questões da comunicação e da imagem. Gastam-se milhões a reconverter reclames e sinalética numa marca, sempre que o designer entende que, agora, o azul passou a ser mais claro ou o tipo de letra muda. É, na verdade, um negócio de milhões. Milhões de investimento, milhões de facturação e milhões de lucros. E é também um negócio com algumas flutuações, decorrentes dos gostos e preferências e da existência de produto actualizados. Custa-me, por isso, muito a entender que um Governo como o português, que recusou apoio a agricultores, transportadores, camionistas, pescadores, taxistas e outros sectores fustigados há meses pela especulação dos preços dos produtos petrolíferos, dizendo que o mercado tem que funcionar sem intervenção do Estado, corra agora a ajudar a indústria automóvel com milhares de milhões de euros, apenas porque as vendas caíram 10 ou 15%. Mais me custa a aceitar que esses apoios se dirijam apenas à produção, quando, precisamente, o problema é não se vender. A produção de automóveis em Portugal é residual, e resume-se a pouco mais do que a AutoEuropa, controlada pela VW, marca que mais vendeu na Europa na última década. Achar que um gigante destes não consegue aguentar uma quebra de 10% nas vendas, sem que o Estado português venha a acudir-lhe. De facto, o Governo, segura a produção destes gigantes esbanjadores que distribuíram lucros pelos seus multimilionários accionistas durante décadas, mas esqueceu-se de acudir aos concessionários, controlados por portugueses, que vendem carros com margens mínimas há muitos anos e onde a crise de consumo nacional já provoca falências e desemprego há muito tempo. Não acode o Governo e não acodem as próprias marcas, cada vez mais exigentes e mais cáusticos com os seus representantes junto do consumidor. A imoralidade como este Governo tem tratado o sector bancário é largamente ultrapassada por este apoio absolutamente inexplicado e inexplicável.


Tive grande parte da minha vida profissional ligada ao sector automóvel. Primeiro como jornalista, depois como responsável de comunicação e marketing de um grande concessionário. Há cerca de dez anos, lembro-me de ter estado como jornalista numa apresentação de uma nova motorização de um pequeno carro citadino. Fui para essa apresentação, como jornalista, num avião charter com cerca de 200 lugares, onde apenas 30 estavam ocupados pelos jornalistas portugueses convidados. À entrada, fomos presenteados com champanhe e marisco e, à chegada ao aeroporto de destino tivemos idêntico tratamento. O destino era uma ilha turística onde havia dois aeroportos internacionais. Um deles estava, naqueles dias, praticamente reservado para aquela marca de automóveis. De tal forma, que se dispensaram as habituais formalidades de chegada e saímos do avião para uma sala VIP onde nos foram entregues as chaves dos novos carros, que esperavam lá fora, por nós. Já no carro, cada um de nós, dispunha de um telemóvel, para fazermos as chamadas que entendêssemos enquanto ali estivéssemos. Chegados ao hotel, onde estivemos cinco dias, verificámos que se tratava de uma unidade de luxo, onde a diária ultrapassava, na altura, os 100 contos diários. No quarto de cada jornalista, havia várias ofertas de valor bastante elevado, que o jornalista poderia levar para casa. Durante os cinco dias e as cinco noites que ali estivemos pudemos passear bastante de carro, visitamos os locais mais turísticos e comemos nos melhores restaurantes. Fomos à praia e passamos muitas horas nas piscinas. Além do interesse no motor do pequeno carro e do teste que me permitiria escrever para o meu jornal sobre aquela novidade, permiti-me ter curiosidade jornalística, sobre quanto teria custado aquela operação de comunicação com os jornalistas. A comitiva portuguesa não sabia bem, mas por extrapolação, o director de relações públicas acabou por calcular que teria custado à marca cerca de dois milhões de contos (10 milhões de euros), contando com viagens, estadias, prendinha, refeições, transporte dos carros e toda a logística e transporte para staff. No total, seriam oito semanas, para receber as comitivas de jornalistas de todo o Mundo. Mais tarde, como responsável pelo marketing e comunicação de um concessionário, fui testemunha da forma profissional e exigente como as marcas tratam estas questões da comunicação e da imagem. Gastam-se milhões a reconverter reclames e sinalética numa marca, sempre que o designer entende que, agora, o azul passou a ser mais claro ou o tipo de letra muda. É, na verdade, um negócio de milhões. Milhões de investimento, milhões de facturação e milhões de lucros. E é também um negócio com algumas flutuações, decorrentes dos gostos e preferências e da existência de produto actualizados. Custa-me, por isso, muito a entender que um Governo como o português, que recusou apoio a agricultores, transportadores, camionistas, pescadores, taxistas e outros sectores fustigados há meses pela especulação dos preços dos produtos petrolíferos, dizendo que o mercado tem que funcionar sem intervenção do Estado, corra agora a ajudar a indústria automóvel com milhares de milhões de euros, apenas porque as vendas caíram 10 ou 15%. Mais me custa a aceitar que esses apoios se dirijam apenas à produção, quando, precisamente, o problema é não se vender. A produção de automóveis em Portugal é residual, e resume-se a pouco mais do que a AutoEuropa, controlada pela VW, marca que mais vendeu na Europa na última década. Achar que um gigante destes não consegue aguentar uma quebra de 10% nas vendas, sem que o Estado português venha a acudir-lhe. De facto, o Governo, segura a produção destes gigantes esbanjadores que distribuíram lucros pelos seus multimilionários accionistas durante décadas, mas esqueceu-se de acudir aos concessionários, controlados por portugueses, que vendem carros com margens mínimas há muitos anos e onde a crise de consumo nacional já provoca falências e desemprego há muito tempo. Não acode o Governo e não acodem as próprias marcas, cada vez mais exigentes e mais cáusticos com os seus representantes junto do consumidor. A imoralidade como este Governo tem tratado o sector bancário é largamente ultrapassada por este apoio absolutamente inexplicado e inexplicável.

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