Assertivo: ADVOCACIA E MERCADO (1)

20-05-2009
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Houve um tempo em que o advogado era um profissional independente que zelava tenazmente pelos interesses do cliente, trabalhava nos articulados em frente ao computador (ou máquina de escrever) na solidão do seu escritório, se esmerava por produzir boas alegações orais e, no final do pleito, cobrava os seus honorários de acordo com a complexidade do processo, as possibilidades do cliente e os usos da comarca.Este tempo já passou. O advogado singular, profissional liberal que trabalhava arduamente e construía sozinho o seu prestígio, morreu. Os seus algozes foram a Assembleia da República e a Ordem dos Advogados.A Assembleia da República porque, na legislatura anterior, e já depois do anúncio da sua dissolução pelo Presidente da República, fez aprovar, à pressa, o novo Estatuto da Ordem dos Advogados. Sem debate, sem discussão e sem esclarecimentos. E que traz o novo Estatuto à advocacia – essa profissão outrora respeitável a que muitos, iluminados por ideais de justiça, aspiravam aceder? Traz o mercantilismo, o empresarialismo e o monetarismo. É um Estatuto que apenas beneficia as grandes sociedades de advogados. Liberaliza-se a publicidade que dantes era vedada, a tal ponto que agora é permitido divulgar publicamente nomes de clientes. Permite-se que os honorários sejam previamente fixados, mesmo que seja em percentagem do valor económico do processo. Já não importa o resultado da actividade – o advogado (ou a sociedade de advogados) pode agora fixar previamente os honorários, independentemente da complexidade do processo, das posses do cliente ou do resultado do processo.Isto é um duplo corolário do neo-liberalismo. A advocacia torna-se uma actividade concorrencial, onde só os poderosos podem singrar; e, do mesmo passo, introduz-se o critério do mercado. O advogado é só para quem pode. Foi para isto que a Ordem dos Advogados e a maioria anterior arrastaram a advocacia.Ordem dos Advogados que, por seu turno, parece transformada numa instância de luta política. Tem um Bastonário eleito graças à sua promoção pela televisão, e que não se coíbe de fazer o discurso descer ao terreiro da política partidária. Os únicos interesses que a Ordem acautela são os das grandes sociedades de advogados. É sintomático que o Dr. Rogério Alves só se faça ouvir quando surgem notícias de medidas reformadoras da justiça, e sempre para estremar a sua posição, afrontando o Governo mesmo para além dos limites do razoável. Com o actual Bastonário – e já antes, com essa espécie de émulo de Alberto João Jardim que era o Bastonário António Pires de Lima –, a Ordem tornou-se numa central de lobbying a favor das grandes sociedades de advogados e numa entidade corporativista, que apenas serve para cobrar quotas e para estrebuchar quando os interesses corporativos das sociedades de advogados estão na iminência de serem ameaçados. É uma pena que seja assim. Quando era jovem, acabado de sair da faculdade, costumava pensar que a advocacia estava ao abrigo da lei da selva. Não está. E a tendência é para piorar.

Houve um tempo em que o advogado era um profissional independente que zelava tenazmente pelos interesses do cliente, trabalhava nos articulados em frente ao computador (ou máquina de escrever) na solidão do seu escritório, se esmerava por produzir boas alegações orais e, no final do pleito, cobrava os seus honorários de acordo com a complexidade do processo, as possibilidades do cliente e os usos da comarca.Este tempo já passou. O advogado singular, profissional liberal que trabalhava arduamente e construía sozinho o seu prestígio, morreu. Os seus algozes foram a Assembleia da República e a Ordem dos Advogados.A Assembleia da República porque, na legislatura anterior, e já depois do anúncio da sua dissolução pelo Presidente da República, fez aprovar, à pressa, o novo Estatuto da Ordem dos Advogados. Sem debate, sem discussão e sem esclarecimentos. E que traz o novo Estatuto à advocacia – essa profissão outrora respeitável a que muitos, iluminados por ideais de justiça, aspiravam aceder? Traz o mercantilismo, o empresarialismo e o monetarismo. É um Estatuto que apenas beneficia as grandes sociedades de advogados. Liberaliza-se a publicidade que dantes era vedada, a tal ponto que agora é permitido divulgar publicamente nomes de clientes. Permite-se que os honorários sejam previamente fixados, mesmo que seja em percentagem do valor económico do processo. Já não importa o resultado da actividade – o advogado (ou a sociedade de advogados) pode agora fixar previamente os honorários, independentemente da complexidade do processo, das posses do cliente ou do resultado do processo.Isto é um duplo corolário do neo-liberalismo. A advocacia torna-se uma actividade concorrencial, onde só os poderosos podem singrar; e, do mesmo passo, introduz-se o critério do mercado. O advogado é só para quem pode. Foi para isto que a Ordem dos Advogados e a maioria anterior arrastaram a advocacia.Ordem dos Advogados que, por seu turno, parece transformada numa instância de luta política. Tem um Bastonário eleito graças à sua promoção pela televisão, e que não se coíbe de fazer o discurso descer ao terreiro da política partidária. Os únicos interesses que a Ordem acautela são os das grandes sociedades de advogados. É sintomático que o Dr. Rogério Alves só se faça ouvir quando surgem notícias de medidas reformadoras da justiça, e sempre para estremar a sua posição, afrontando o Governo mesmo para além dos limites do razoável. Com o actual Bastonário – e já antes, com essa espécie de émulo de Alberto João Jardim que era o Bastonário António Pires de Lima –, a Ordem tornou-se numa central de lobbying a favor das grandes sociedades de advogados e numa entidade corporativista, que apenas serve para cobrar quotas e para estrebuchar quando os interesses corporativos das sociedades de advogados estão na iminência de serem ameaçados. É uma pena que seja assim. Quando era jovem, acabado de sair da faculdade, costumava pensar que a advocacia estava ao abrigo da lei da selva. Não está. E a tendência é para piorar.

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