Venda da Compal é mesmo natural

24-02-2008
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Edição 1837

Bebidas

Venda da Compal é mesmo natural

Se a CGD comprasse hoje a empresa de bebidas, pagaria menos 100 milhões de euros que em 2005 A Caixa Geral de Depósitos não foi feliz na sua primeira grande operação de «private equity» na indústria: comprou a Compal há pouco mais de dois anos por um valor da ordem dos 365 milhões de euros e se a vendesse agora, pelos mesmos critérios com que orientou a compra, dificilmente realizaria o dinheiro investido. A Caixa Geral de Depósitos não foi feliz na sua primeira grande operação de «private equity» na indústria: comprou a Compal há pouco mais de dois anos por um valor da ordem dos 365 milhões de euros e se a vendesse agora, pelos mesmos critérios com que orientou a compra, dificilmente realizaria o dinheiro investido. Tudo porque a facturação da empresa caiu e o «cash-flow» operacional (EBITDA) diminui em perto de 40%, afectando inevitavelmente os resultados. A lógica de que a empresa teria de se pagar a ela própria levou a que tenha assumido uma dívida de 250 milhões de euros, com um serviço de dívida de cerca de 15 milhões, que condiciona as disponibilidades para novos investimentos. O sonho de não deixar sair para mãos estrangeiras uma grande marca nacional levou a CGD a pagar pela Compal 16 vezes o seu EBITDA, transformando a operação num excelente negócio para o vendedor, a Nutrinveste. A ideia era fazer uma parceria com o grupo português Sumolis, que ficou com 20% do capital, e num prazo mais ou menos curto sair da empresa, com a venda da parcela restante. A realidade é que o parceiro português se viu incapacitado para assumir a operação, tanto pela falta de músculo financeiro como pelas suas dificuldades internas de gestão, que obrigariam a uma reestruturação mais funda do que foi possível até agora. Pelo meio, alguns factos inexplicáveis na vida da Compal, como a saída de João Cotrim de Figueiredo, apenas alguns meses após a sua nomeação pela CGD, ou apenas a presença não-executiva de um gestor da Sumolis - José Tomás - no conselho de administração da empresa, apesar dos seus 20% do capital. Mas, e acima de tudo, a indefinição permanente, tanto quanto a objectivos de gestão como estratégicos. Um impasse fatal.

Os objectivos para 2010

A anterior administração da Compal deixou pronto um plano estratégico, o ‘Compal 2010’, que apontava Espanha, Angola e Magrebe como os três principais mercados de internacionalização da empresa e previa atingir em três anos um EBITDA de 100 milhões de euros. No final de 2007, este indicador terá rondado os 17 milhões de euros, abaixo dos quase 23 milhões de 2005 que levaram a Caixa Geral de Depósitos a pagar 365 milhões de euros pela empresa. O projecto, elaborado pelo anterior presidente, João Cotrim de Figueiredo, e a sua administração, que incluía Otto Teixeira da Cruz e Rui Fade - o único que ainda se mantém no actual conselho de administração -, nunca foi aprovado pelo accionista. A CGD não aprovou este nem nenhum plano alternativo. A falta de expectativas foi minando o terreno e, pouco a pouco, a equipa que integrava a Compal foi saindo. A primeira baixa depois da entrada da Caixa e da Sumolis - sem contar com o anterior presidente, António Pires de Lima, “que os novos accionistas não quiseram reter”, como o próprio afirma - foi o responsável pelo gabinete de inovação, Nuno Ferreira Pires, o pai do Compal Essencial. Esta vaga nunca veio a ser preenchida e a partir de Janeiro de 2006 o gabinete de inovação desapareceu, ficando José Jordão responsável pelo «marketing». João Cotrim de Figueiredo foi a primeira saída comentada, tendo em conta tratar-se do presidente escolhido pelos novos accionistas. Esteve oito meses à frente da empresa e em Julho de 2006 alegou “impossibilidade de garantir junto dos actuais accionistas as condições ( ) essenciais ao sucesso do projecto da Compal”. Vasco d’Orey foi nomeado para o seu lugar. Em Março de 2007, é a vez de o administrador Otto Teixeira da Cruz anunciar a sua saída: “Pediram-me para esperar, que algo iria acontecer. Mas não havia ordens ou directivas vindas de lado algum”. Três meses depois sai o director financeiro, Pedro Paiva Couceiro, “em parte porque a equipa com que sempre trabalhei estava a desaparecer, em parte porque não existiam perspectivas”. A Compal viveu 13 anos com hábitos agressivos e o plano estratégico da empresa reflectia isso mesmo: crescimento orgânico e comprar e crescer fora de Portugal. Só no final de 2006 a Caixa começou a mostrar alguma apreensão face aos resultados da empresa, mas mesmo essa preocupação não era traduzida na fixação de objectivos nas reuniões de administração. Na Compal, havia uma figura muito usada internamente, que era a de um barco à vela, topo de gama, posto na água mas sem vento. O barco, sem vento e sem rumo, apenas continuava a andar porque um barco assim não pára de repente. A pergunta que fica é quais as consequências para o futuro. É do entendimento geral que uma fusão, ou equivalente, entre a Sumolis e a Compal seria benéfica para todas as instituições envolvidas, a acontecer num curto espaço de tempo. A situação do sector das bebidas de alta rotação tem vindo a piorar e, com ela, as condições das empresas que operam no mercado, como a Sumolis e a Compal, a deteriorar-se. Em conjunto, as duas empresas ganhariam nova dinâmica, mesmo com decisões difíceis a terem de ser tomadas. Quanto à CGD, o FMI (Fundo Monetário Internacional) recomenda que a banca reduza a sua exposição financeira às participações industriais, não só pela volatilidade que essas posições podem trazer às contas das instituições bancárias, mas também pelos conflitos de interesses que existem como resultado da presença de administradores dos bancos nas empresas em que estes são accionistas. As novas regras internacionais que estão a ser introduzidas (IAS e Basileia II) vão trazer mais desvantagens ao investimento em participações industriais. A Sumolis em conjunto com a Compal pode alterar o cenário das bebidas em Portugal. Com a sua base de negócios centrada nos refrigerantes e sumos, uma quota próxima dos 50% e um volume de negócios superior a 3o0 milhões de euros, as empresas podem voltar a dar cartas.

Isabel Tavares

“Venda é corrida contra o tempo” “Quanto mais tempo passar, menos se concretiza o valor que poderá ser criado com uma fusão entre a Sumolis e a Compal”. Quem o diz é António Bernardo, membro do comité mundial da Roland Berger e seu responsável para Portugal, Espanha, Itália e América do Sul. António Bernardo acredita que esta é uma boa operação, com sinergias importantes para as duas empresas. “Analisámos a fusão e a optimização de custos era da ordem das várias centenas de milhões de euros. Com a integração existem sinergias de custos, comerciais, de distribuição e logística”. Mas os exemplos de fusão neste sector, a nível nacional e internacional, apontam para integrações feitas rapidamente, embora com grande rigor. “O mais importante é o pós-fusão”, diz. Se é verdade que diversos estudos internacionais mostram que apenas 30% dos objectivos são atingidos em casos de fusão, também é verdade que “neste mercado conta muito ter um amplo portefólio de produtos, com distribuição e logística, para poder ser competitivo junto do ponto de venda”. Para este responsável, o acordo não tem sido possível mais por questões accionistas do que por motivos operacionais. De uma coisa António Bernardo não tem dúvidas: “A Compal é um valor seguro e está num mercado maduro, em que o crescimento já só é possível por aquisição. Quem compra quer marca, produto e quota”. E isso, a Compal tem. A Compal é a empresa portuguesa com melhor reputação, segundo o Reputation Institute, que pela primeira vez fez uma lista das 50 empresas portuguesas mais reputadas. Teve 82,53 pontos: Excelente. O responsável da Roland Berger aponta ainda as inúmeras possibilidades que têm produtos como o Compal Essencial - uma invenção de Nuno Ferreira Pires, que está agora na concorrente Central de Cervejas, onde já lançou as águas Luso Formas. António Bernardo considera que mesmo que o potencial da empresa não esteja a ser explorado, nomeadamente ao nível da inovação e lançamento de novos produtos, o valor está lá e pode ser explorado, o que só por si torna a empresa apetecível. No entanto, e mesmo que outros se interessem pela Compal, neste negócio a CGD terá que dar direito de preferência à Sumolis, que tem a opção de compra da maioria do capital.

AS DUAS CONCORRENTES COMPAL Nasceu em 1952. Está em 39 países, entre os quais África do Sul, Angola, Estados Unidos, e tem forte presença no continente europeu. Possui cerca de 500 efectivos. Os últimos indicadores oficiais referem-se a 2004 e apontam para um volume de negócios de 145,2 milhões de euros e lucros de 25,2 milhões. A gestão está organizada por áreas de negócio, mas a empresa está ainda excessivamente dependente do mercado português. As principais marcas são a Compal, Essencial, Um Bongo, Frize e B! Além das águas, néctares e sumos, está no segmento dos vegetais preparados e dos derivados de tomate. SUMOLIS Nasceu em 1945. Está em mais de 20 mercados, entre os quais Moçambique, Brasil, Macau e Venezuela (as vendas no estrangeiro cresceram 31%). Tem perto de 1000 trabalhadores. Até Setembro de 2007, o volume de negócios atingiu 133,6 milhões de euros, menos 1,3% que em igual período do ano anterior. O EBITDA foi de 13,9 milhões de euros, menos 5,8% que nos mesmos nove meses de 2006, e o lucro caiu 16,2%, para 2,1 milhões de euros, com previsões de agravamento até final do ano. As principais marcas são a Sumol, Sucol, Seven-up, Pepsi, Lipton Ice Tea, Guaraná, Água Serra da Estrela e Tagus.

AS CARAS DO CASO

Carlos Santos Ferreira (CGD)

Tem tratado pessoalmente desta operação. Aceitou formar consórcio com a Sumolis para comprar a Compal, dizendo acreditar na sua gestão, mas nunca deixou que fosse ela a conduzir o negócio. Começou por afirmar que os 80% da Compal ficariam na CGD entre quatro a cinco anos e, pouco depois, admitiu que pudessem ser vendidos à Sumolis ainda no primeiro semestre de 2006. No final desse ano, chegou a dizer a diversos membros da administração que não iria haver fusão com a Sumolis e que a Compal teria um projecto próprio, sem mais orientações. Em 2007, a fusão voltou a ser dada como certa mas não se concretizou. Santos Ferreira garante: “Entrámos no concurso para ganhar dinheiro”. Tem tratado pessoalmente desta operação. Aceitou formar consórcio com a Sumolis para comprar a Compal, dizendo acreditar na sua gestão, mas nunca deixou que fosse ela a conduzir o negócio. Começou por afirmar que os 80% da Compal ficariam na CGD entre quatro a cinco anos e, pouco depois, admitiu que pudessem ser vendidos à Sumolis ainda no primeiro semestre de 2006. No final desse ano, chegou a dizer a diversos membros da administração que não iria haver fusão com a Sumolis e que a Compal teria um projecto próprio, sem mais orientações. Em 2007, a fusão voltou a ser dada como certa mas não se concretizou. Santos Ferreira garante: “Entrámos no concurso para ganhar dinheiro”. António Eusébio (Sumolis)

Não é inédito uma empresa mais pequena comprar outra mais poderosa, mas a operação não deixou de surpreender o mercado. A Sumolis, maioritariamente detida pela Refrigor, da família Eusébio, tem vindo desde o início a reiterar que "o sólido racional estratégico e económico da integração entre a Sumolis e a Compal foi a única razão subjacente à aquisição - (de 20%) - da Compal”. A empresa, com uma gestão com forte interferência da família accionista, tem vindo a reestruturar-se e os custos da mudança têm penalizado o seu desempenho económico-financeiro. Analistas acreditam que a empresa precisa de continuar a cura de emagrecimento para se tornar mais eficiente. Não é inédito uma empresa mais pequena comprar outra mais poderosa, mas a operação não deixou de surpreender o mercado. A Sumolis, maioritariamente detida pela Refrigor, da família Eusébio, tem vindo desde o início a reiterar que "o sólido racional estratégico e económico da integração entre a Sumolis e a Compal foi a única razão subjacente à aquisição - (de 20%) - da Compal”. A empresa, com uma gestão com forte interferência da família accionista, tem vindo a reestruturar-se e os custos da mudança têm penalizado o seu desempenho económico-financeiro. Analistas acreditam que a empresa precisa de continuar a cura de emagrecimento para se tornar mais eficiente. Manuel Alfredo de Mello (Nutrinveste)

Abriu, no final de 2005, um concurso para vender a Compal e a Nutricafés - entretanto vendida pela CGD ao «private equity» Explorer Investments por cerca de 70 milhões de euros - e o «timing» não podia ter sido mais perfeito. Os valores do leilão iniciavam-se nos 380 milhões de euros e os candidatos fizeram fila: Refrige (Coca-cola), Central de Cervejas, Unicer e os fundos de investimento Brige Point e Explorer Investments. O consórcio formado pela CGD e Sumolis ofereceu 426 milhões de euros e ganhou. Foi a partir da data da venda que o mercado em que a Compal se insere entrou em declínio ou, pelo menos, deixou de apresentar os níveis de crescimento tidos até então. Os pressupostos com base nos quais foi feita a venda nunca foram contestados. Abriu, no final de 2005, um concurso para vender a Compal e a Nutricafés - entretanto vendida pela CGD ao «private equity» Explorer Investments por cerca de 70 milhões de euros - e o «timing» não podia ter sido mais perfeito. Os valores do leilão iniciavam-se nos 380 milhões de euros e os candidatos fizeram fila: Refrige (Coca-cola), Central de Cervejas, Unicer e os fundos de investimento Brige Point e Explorer Investments. O consórcio formado pela CGD e Sumolis ofereceu 426 milhões de euros e ganhou. Foi a partir da data da venda que o mercado em que a Compal se insere entrou em declínio ou, pelo menos, deixou de apresentar os níveis de crescimento tidos até então. Os pressupostos com base nos quais foi feita a venda nunca foram contestados. Pires de Lima (Unicer)

Esteve perto de treze anos à frente dos destinos da Compal e fez a empresa crescer cinco vezes em pouco mais de uma década. Até à data da sua saída continuou a fazer planos para a empresa e a internacionalização era um dos pontos-chave. Liderou uma das propostas candidatas à compra da Compal, um MBO («management buy out») apoiado pelo fundo de investimento britânico 3i. Em valor, a sua proposta ficou 20% abaixo da vencedora e António Pires de Lima garante que por mais dinheiro “teria tido dificuldade em rentabilizar o capital investido”. Esteve perto de treze anos à frente dos destinos da Compal e fez a empresa crescer cinco vezes em pouco mais de uma década. Até à data da sua saída continuou a fazer planos para a empresa e a internacionalização era um dos pontos-chave. Liderou uma das propostas candidatas à compra da Compal, um MBO («management buy out») apoiado pelo fundo de investimento britânico 3i. Em valor, a sua proposta ficou 20% abaixo da vencedora e António Pires de Lima garante que por mais dinheiro “teria tido dificuldade em rentabilizar o capital investido”.

Edição 1837

Bebidas

Venda da Compal é mesmo natural

Se a CGD comprasse hoje a empresa de bebidas, pagaria menos 100 milhões de euros que em 2005 A Caixa Geral de Depósitos não foi feliz na sua primeira grande operação de «private equity» na indústria: comprou a Compal há pouco mais de dois anos por um valor da ordem dos 365 milhões de euros e se a vendesse agora, pelos mesmos critérios com que orientou a compra, dificilmente realizaria o dinheiro investido. A Caixa Geral de Depósitos não foi feliz na sua primeira grande operação de «private equity» na indústria: comprou a Compal há pouco mais de dois anos por um valor da ordem dos 365 milhões de euros e se a vendesse agora, pelos mesmos critérios com que orientou a compra, dificilmente realizaria o dinheiro investido. Tudo porque a facturação da empresa caiu e o «cash-flow» operacional (EBITDA) diminui em perto de 40%, afectando inevitavelmente os resultados. A lógica de que a empresa teria de se pagar a ela própria levou a que tenha assumido uma dívida de 250 milhões de euros, com um serviço de dívida de cerca de 15 milhões, que condiciona as disponibilidades para novos investimentos. O sonho de não deixar sair para mãos estrangeiras uma grande marca nacional levou a CGD a pagar pela Compal 16 vezes o seu EBITDA, transformando a operação num excelente negócio para o vendedor, a Nutrinveste. A ideia era fazer uma parceria com o grupo português Sumolis, que ficou com 20% do capital, e num prazo mais ou menos curto sair da empresa, com a venda da parcela restante. A realidade é que o parceiro português se viu incapacitado para assumir a operação, tanto pela falta de músculo financeiro como pelas suas dificuldades internas de gestão, que obrigariam a uma reestruturação mais funda do que foi possível até agora. Pelo meio, alguns factos inexplicáveis na vida da Compal, como a saída de João Cotrim de Figueiredo, apenas alguns meses após a sua nomeação pela CGD, ou apenas a presença não-executiva de um gestor da Sumolis - José Tomás - no conselho de administração da empresa, apesar dos seus 20% do capital. Mas, e acima de tudo, a indefinição permanente, tanto quanto a objectivos de gestão como estratégicos. Um impasse fatal.

Os objectivos para 2010

A anterior administração da Compal deixou pronto um plano estratégico, o ‘Compal 2010’, que apontava Espanha, Angola e Magrebe como os três principais mercados de internacionalização da empresa e previa atingir em três anos um EBITDA de 100 milhões de euros. No final de 2007, este indicador terá rondado os 17 milhões de euros, abaixo dos quase 23 milhões de 2005 que levaram a Caixa Geral de Depósitos a pagar 365 milhões de euros pela empresa. O projecto, elaborado pelo anterior presidente, João Cotrim de Figueiredo, e a sua administração, que incluía Otto Teixeira da Cruz e Rui Fade - o único que ainda se mantém no actual conselho de administração -, nunca foi aprovado pelo accionista. A CGD não aprovou este nem nenhum plano alternativo. A falta de expectativas foi minando o terreno e, pouco a pouco, a equipa que integrava a Compal foi saindo. A primeira baixa depois da entrada da Caixa e da Sumolis - sem contar com o anterior presidente, António Pires de Lima, “que os novos accionistas não quiseram reter”, como o próprio afirma - foi o responsável pelo gabinete de inovação, Nuno Ferreira Pires, o pai do Compal Essencial. Esta vaga nunca veio a ser preenchida e a partir de Janeiro de 2006 o gabinete de inovação desapareceu, ficando José Jordão responsável pelo «marketing». João Cotrim de Figueiredo foi a primeira saída comentada, tendo em conta tratar-se do presidente escolhido pelos novos accionistas. Esteve oito meses à frente da empresa e em Julho de 2006 alegou “impossibilidade de garantir junto dos actuais accionistas as condições ( ) essenciais ao sucesso do projecto da Compal”. Vasco d’Orey foi nomeado para o seu lugar. Em Março de 2007, é a vez de o administrador Otto Teixeira da Cruz anunciar a sua saída: “Pediram-me para esperar, que algo iria acontecer. Mas não havia ordens ou directivas vindas de lado algum”. Três meses depois sai o director financeiro, Pedro Paiva Couceiro, “em parte porque a equipa com que sempre trabalhei estava a desaparecer, em parte porque não existiam perspectivas”. A Compal viveu 13 anos com hábitos agressivos e o plano estratégico da empresa reflectia isso mesmo: crescimento orgânico e comprar e crescer fora de Portugal. Só no final de 2006 a Caixa começou a mostrar alguma apreensão face aos resultados da empresa, mas mesmo essa preocupação não era traduzida na fixação de objectivos nas reuniões de administração. Na Compal, havia uma figura muito usada internamente, que era a de um barco à vela, topo de gama, posto na água mas sem vento. O barco, sem vento e sem rumo, apenas continuava a andar porque um barco assim não pára de repente. A pergunta que fica é quais as consequências para o futuro. É do entendimento geral que uma fusão, ou equivalente, entre a Sumolis e a Compal seria benéfica para todas as instituições envolvidas, a acontecer num curto espaço de tempo. A situação do sector das bebidas de alta rotação tem vindo a piorar e, com ela, as condições das empresas que operam no mercado, como a Sumolis e a Compal, a deteriorar-se. Em conjunto, as duas empresas ganhariam nova dinâmica, mesmo com decisões difíceis a terem de ser tomadas. Quanto à CGD, o FMI (Fundo Monetário Internacional) recomenda que a banca reduza a sua exposição financeira às participações industriais, não só pela volatilidade que essas posições podem trazer às contas das instituições bancárias, mas também pelos conflitos de interesses que existem como resultado da presença de administradores dos bancos nas empresas em que estes são accionistas. As novas regras internacionais que estão a ser introduzidas (IAS e Basileia II) vão trazer mais desvantagens ao investimento em participações industriais. A Sumolis em conjunto com a Compal pode alterar o cenário das bebidas em Portugal. Com a sua base de negócios centrada nos refrigerantes e sumos, uma quota próxima dos 50% e um volume de negócios superior a 3o0 milhões de euros, as empresas podem voltar a dar cartas.

Isabel Tavares

“Venda é corrida contra o tempo” “Quanto mais tempo passar, menos se concretiza o valor que poderá ser criado com uma fusão entre a Sumolis e a Compal”. Quem o diz é António Bernardo, membro do comité mundial da Roland Berger e seu responsável para Portugal, Espanha, Itália e América do Sul. António Bernardo acredita que esta é uma boa operação, com sinergias importantes para as duas empresas. “Analisámos a fusão e a optimização de custos era da ordem das várias centenas de milhões de euros. Com a integração existem sinergias de custos, comerciais, de distribuição e logística”. Mas os exemplos de fusão neste sector, a nível nacional e internacional, apontam para integrações feitas rapidamente, embora com grande rigor. “O mais importante é o pós-fusão”, diz. Se é verdade que diversos estudos internacionais mostram que apenas 30% dos objectivos são atingidos em casos de fusão, também é verdade que “neste mercado conta muito ter um amplo portefólio de produtos, com distribuição e logística, para poder ser competitivo junto do ponto de venda”. Para este responsável, o acordo não tem sido possível mais por questões accionistas do que por motivos operacionais. De uma coisa António Bernardo não tem dúvidas: “A Compal é um valor seguro e está num mercado maduro, em que o crescimento já só é possível por aquisição. Quem compra quer marca, produto e quota”. E isso, a Compal tem. A Compal é a empresa portuguesa com melhor reputação, segundo o Reputation Institute, que pela primeira vez fez uma lista das 50 empresas portuguesas mais reputadas. Teve 82,53 pontos: Excelente. O responsável da Roland Berger aponta ainda as inúmeras possibilidades que têm produtos como o Compal Essencial - uma invenção de Nuno Ferreira Pires, que está agora na concorrente Central de Cervejas, onde já lançou as águas Luso Formas. António Bernardo considera que mesmo que o potencial da empresa não esteja a ser explorado, nomeadamente ao nível da inovação e lançamento de novos produtos, o valor está lá e pode ser explorado, o que só por si torna a empresa apetecível. No entanto, e mesmo que outros se interessem pela Compal, neste negócio a CGD terá que dar direito de preferência à Sumolis, que tem a opção de compra da maioria do capital.

AS DUAS CONCORRENTES COMPAL Nasceu em 1952. Está em 39 países, entre os quais África do Sul, Angola, Estados Unidos, e tem forte presença no continente europeu. Possui cerca de 500 efectivos. Os últimos indicadores oficiais referem-se a 2004 e apontam para um volume de negócios de 145,2 milhões de euros e lucros de 25,2 milhões. A gestão está organizada por áreas de negócio, mas a empresa está ainda excessivamente dependente do mercado português. As principais marcas são a Compal, Essencial, Um Bongo, Frize e B! Além das águas, néctares e sumos, está no segmento dos vegetais preparados e dos derivados de tomate. SUMOLIS Nasceu em 1945. Está em mais de 20 mercados, entre os quais Moçambique, Brasil, Macau e Venezuela (as vendas no estrangeiro cresceram 31%). Tem perto de 1000 trabalhadores. Até Setembro de 2007, o volume de negócios atingiu 133,6 milhões de euros, menos 1,3% que em igual período do ano anterior. O EBITDA foi de 13,9 milhões de euros, menos 5,8% que nos mesmos nove meses de 2006, e o lucro caiu 16,2%, para 2,1 milhões de euros, com previsões de agravamento até final do ano. As principais marcas são a Sumol, Sucol, Seven-up, Pepsi, Lipton Ice Tea, Guaraná, Água Serra da Estrela e Tagus.

AS CARAS DO CASO

Carlos Santos Ferreira (CGD)

Tem tratado pessoalmente desta operação. Aceitou formar consórcio com a Sumolis para comprar a Compal, dizendo acreditar na sua gestão, mas nunca deixou que fosse ela a conduzir o negócio. Começou por afirmar que os 80% da Compal ficariam na CGD entre quatro a cinco anos e, pouco depois, admitiu que pudessem ser vendidos à Sumolis ainda no primeiro semestre de 2006. No final desse ano, chegou a dizer a diversos membros da administração que não iria haver fusão com a Sumolis e que a Compal teria um projecto próprio, sem mais orientações. Em 2007, a fusão voltou a ser dada como certa mas não se concretizou. Santos Ferreira garante: “Entrámos no concurso para ganhar dinheiro”. Tem tratado pessoalmente desta operação. Aceitou formar consórcio com a Sumolis para comprar a Compal, dizendo acreditar na sua gestão, mas nunca deixou que fosse ela a conduzir o negócio. Começou por afirmar que os 80% da Compal ficariam na CGD entre quatro a cinco anos e, pouco depois, admitiu que pudessem ser vendidos à Sumolis ainda no primeiro semestre de 2006. No final desse ano, chegou a dizer a diversos membros da administração que não iria haver fusão com a Sumolis e que a Compal teria um projecto próprio, sem mais orientações. Em 2007, a fusão voltou a ser dada como certa mas não se concretizou. Santos Ferreira garante: “Entrámos no concurso para ganhar dinheiro”. António Eusébio (Sumolis)

Não é inédito uma empresa mais pequena comprar outra mais poderosa, mas a operação não deixou de surpreender o mercado. A Sumolis, maioritariamente detida pela Refrigor, da família Eusébio, tem vindo desde o início a reiterar que "o sólido racional estratégico e económico da integração entre a Sumolis e a Compal foi a única razão subjacente à aquisição - (de 20%) - da Compal”. A empresa, com uma gestão com forte interferência da família accionista, tem vindo a reestruturar-se e os custos da mudança têm penalizado o seu desempenho económico-financeiro. Analistas acreditam que a empresa precisa de continuar a cura de emagrecimento para se tornar mais eficiente. Não é inédito uma empresa mais pequena comprar outra mais poderosa, mas a operação não deixou de surpreender o mercado. A Sumolis, maioritariamente detida pela Refrigor, da família Eusébio, tem vindo desde o início a reiterar que "o sólido racional estratégico e económico da integração entre a Sumolis e a Compal foi a única razão subjacente à aquisição - (de 20%) - da Compal”. A empresa, com uma gestão com forte interferência da família accionista, tem vindo a reestruturar-se e os custos da mudança têm penalizado o seu desempenho económico-financeiro. Analistas acreditam que a empresa precisa de continuar a cura de emagrecimento para se tornar mais eficiente. Manuel Alfredo de Mello (Nutrinveste)

Abriu, no final de 2005, um concurso para vender a Compal e a Nutricafés - entretanto vendida pela CGD ao «private equity» Explorer Investments por cerca de 70 milhões de euros - e o «timing» não podia ter sido mais perfeito. Os valores do leilão iniciavam-se nos 380 milhões de euros e os candidatos fizeram fila: Refrige (Coca-cola), Central de Cervejas, Unicer e os fundos de investimento Brige Point e Explorer Investments. O consórcio formado pela CGD e Sumolis ofereceu 426 milhões de euros e ganhou. Foi a partir da data da venda que o mercado em que a Compal se insere entrou em declínio ou, pelo menos, deixou de apresentar os níveis de crescimento tidos até então. Os pressupostos com base nos quais foi feita a venda nunca foram contestados. Abriu, no final de 2005, um concurso para vender a Compal e a Nutricafés - entretanto vendida pela CGD ao «private equity» Explorer Investments por cerca de 70 milhões de euros - e o «timing» não podia ter sido mais perfeito. Os valores do leilão iniciavam-se nos 380 milhões de euros e os candidatos fizeram fila: Refrige (Coca-cola), Central de Cervejas, Unicer e os fundos de investimento Brige Point e Explorer Investments. O consórcio formado pela CGD e Sumolis ofereceu 426 milhões de euros e ganhou. Foi a partir da data da venda que o mercado em que a Compal se insere entrou em declínio ou, pelo menos, deixou de apresentar os níveis de crescimento tidos até então. Os pressupostos com base nos quais foi feita a venda nunca foram contestados. Pires de Lima (Unicer)

Esteve perto de treze anos à frente dos destinos da Compal e fez a empresa crescer cinco vezes em pouco mais de uma década. Até à data da sua saída continuou a fazer planos para a empresa e a internacionalização era um dos pontos-chave. Liderou uma das propostas candidatas à compra da Compal, um MBO («management buy out») apoiado pelo fundo de investimento britânico 3i. Em valor, a sua proposta ficou 20% abaixo da vencedora e António Pires de Lima garante que por mais dinheiro “teria tido dificuldade em rentabilizar o capital investido”. Esteve perto de treze anos à frente dos destinos da Compal e fez a empresa crescer cinco vezes em pouco mais de uma década. Até à data da sua saída continuou a fazer planos para a empresa e a internacionalização era um dos pontos-chave. Liderou uma das propostas candidatas à compra da Compal, um MBO («management buy out») apoiado pelo fundo de investimento britânico 3i. Em valor, a sua proposta ficou 20% abaixo da vencedora e António Pires de Lima garante que por mais dinheiro “teria tido dificuldade em rentabilizar o capital investido”.

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