Açores 2010

20-05-2009
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O arrozal do artista tailandês Sakarin Krue-OnNotas sobre a 12ª Documenta de KasselA pequena e pacata cidade alemã de Kassel recebe novamente um dos mais afamados encontros de arte contemporânea que, na sua 12ª edição, decorre entre 16 de Junho e 23 de Setembro de 2007.A Documenta de Kassel, desta vez dirigida por Roger Buergel, assenta em três questões que agora lança a público. É a arte o veículo para um reconhecimento comum, para além de todas as diferenças? É a adesão ao espírito global um problema de natureza estética e cultural? Permite a arte um olhar dirigido á essência das coisas? Neste sentido, ensaiando uma possível resposta a estas questões, privilegiam-se as intervenções que questionam o binómio sociedade – natureza e que se vêem afectas ao tema da migração da forma e da educação pela arte.Longe do registo eminentemente comercial das feiras de Madrid (Arco) ou de Basileia (ArtBasel), a Documenta tem um perfil de descoberta, divulgação e afirmação que espelha, quer pelas opções do director / curador convidado, quer pelo perfil dos artistas seleccionados, quer ainda pela natureza das obras expostas, uma análise crítica sobre o mundo da arte e da sociedade.Mais restrita e acertiva que a Bienal de Veneza, a Documenta, mais do que um lugar de confirmações, é um lugar de questões e descobertas. Mais do que uma apresentação, é um acontecimento na cidade e no país. Um acontecimento que reúne o que de mais importante se passa no mundo da arte contemporânea e que, de 5 em 5 anos, aponta as directrizes para um desenvolvimento futuro.À semelhança do que se passa em Veneza, as intervenções espalham-se por vários locais, mas com maior ambição. As obras não se limitam aos diferentes museus ou pavilhões e ocupam Kassel nas suas ruas, praças, edifícios e transportes. Somos então envolvidos por um dinâmica omnipresente, que durante os 100 dias do evento, transforma uma provinciana cidade alemã num importante centro da cultura contemporânea.É claro que este é um trabalho que nasce de uma vontade conjunta. De quem produz, de quem organiza, de quem divulga, de quem promove, de quem financia, e também de quem assiste. Um exemplo curioso prende-se com a permanência de alguns trabalhos adquiridos pela própria população, como a escultura “Men walking to the sky” de Jonathan Borofsky, que ainda hoje marca o local onde surgiu.Kassel, que tem hoje um espólio invejável de arte urbana e que é conhecida como a cidade da Documenta, assume-se agora como uma plataforma de discussão internacional onde surgem e permanecem as mais variadas intervenções. Numa época em que as fronteiras se esbatem cada vez mais, é notável perceber a visão, a inteligência e a vontade que há em projectar a pequena cidade para um mapa global, fazendo-a crescer não em tamanho, mas em valor.A 12ªDocumenta divide-se por vários locais, desta vez dentro e fora do país. Neste contexto, um dos artistas convidados mais notados, o criador / cozinheiro catalão Ferran Adrià, vê o seu restaurante “El Bulli”, em Roses – Espanha, associado ao evento. Todos os outros locais espalham-se por Kassel – Alemanha e posicionam-se estrategicamente em diferentes zonas da cidade.O museu Schloss-Wilhelmshohe, no parque de Berg, o pavilhão Aue, anexo à Orangerie e à zona ribeirinha, o museu Fridericianum, em Friedrichsplatz no centro da cidade e, na sua proximidade, o museu Neue Gallerie e o centro documental da Documenta, são os locais que recebem algumas das intervenções. Porém, e esta é uma das especificidades da Documenta, o espaço público que os medeia recebe também ele, nas praças, ruas, edifícios, placards e transportes, alguns das peças especificamente pensadas para este evento.Assim, todos os elementos de arte pública, bem como alguns dos existentes no museu Schloss Wilhelmshohe, celebram uma relação única com o tempo e o lugar que ocupam e afirmam-se como projectos “site-specific” que questionam o contexto (urbano e expositivo) em que surgem.A maioria das obras escolhidas apoia-se numa leitura social e espelha o vincado desencontro do homem com o outro e com o mundo. Recorrendo ao exercício documental ou a mais “tradicionais” métodos de expressão, há quase sempre uma acção de confronto e denuncia que faz da transformação e da desigualdade um novo palco de interesses. A tal não é alheia a decisão do curador em acentuar a predominância de artistas da China, América Latina e Leste Europeu.No discurso e na forma, a ideia da desigualdade é ainda acentuada pela diversificada selecção dos trabalhos. De épocas e meios distintos, do século XVI ao século XXI, do Ocidente ao Oriente, as peças expostas registam a diferença como provocação para o encontro de algo comum. Algo comum, que apesar da transformação (ou migração) da sua forma, deixa perceber a universalidade da prática artística e a sua legitimação como veículo de educação e conhecimento.Nos trabalhos apresentados percebe-se a grande vontade em construir ambientes, recorrendo tendencialmente a outros suportes e disciplinas (quase sempre de natureza plástica, arquitectónica, sociológica e urbana). Nesse sentido há um grande predomínio da instalação. O vídeo e a fotografia são suportes amplamente utilizados, que tal como a pintura, a escultura ou o desenho, mas talvez de forma menos constrangida, continuam a encontrar lugar em si próprios. No entanto, poucas são as obras que não se tornam híbridas.Na verdade, uma das conclusões que a Documenta nos traz é que cada vez mais há menos fronteiras. Menos fronteiras entre expressões, entre autorias e legitimidades. Há cada vez mais uma maior contaminação entre o que se faz (se é desenho, pintura, escultura, vídeo, ou instalação), entre quem o faz (quem e quando se é o autor), e onde se faz (se são os circuitos e os locais - feiras, museus, galerias, etc. - que identificam e legitimam a produção artística).Um exemplo notável é a intervenção do artista tailandês Sakarin Krue-On, que numa encosta do BergPark, à frente do afamado museu Schloss Wilhelmshohe e à escala da paisagem envolvente, plantou um gigantesco arrozal.S.F.R.Publicado_Açoriano Oriental_12.08.2007


O arrozal do artista tailandês Sakarin Krue-OnNotas sobre a 12ª Documenta de KasselA pequena e pacata cidade alemã de Kassel recebe novamente um dos mais afamados encontros de arte contemporânea que, na sua 12ª edição, decorre entre 16 de Junho e 23 de Setembro de 2007.A Documenta de Kassel, desta vez dirigida por Roger Buergel, assenta em três questões que agora lança a público. É a arte o veículo para um reconhecimento comum, para além de todas as diferenças? É a adesão ao espírito global um problema de natureza estética e cultural? Permite a arte um olhar dirigido á essência das coisas? Neste sentido, ensaiando uma possível resposta a estas questões, privilegiam-se as intervenções que questionam o binómio sociedade – natureza e que se vêem afectas ao tema da migração da forma e da educação pela arte.Longe do registo eminentemente comercial das feiras de Madrid (Arco) ou de Basileia (ArtBasel), a Documenta tem um perfil de descoberta, divulgação e afirmação que espelha, quer pelas opções do director / curador convidado, quer pelo perfil dos artistas seleccionados, quer ainda pela natureza das obras expostas, uma análise crítica sobre o mundo da arte e da sociedade.Mais restrita e acertiva que a Bienal de Veneza, a Documenta, mais do que um lugar de confirmações, é um lugar de questões e descobertas. Mais do que uma apresentação, é um acontecimento na cidade e no país. Um acontecimento que reúne o que de mais importante se passa no mundo da arte contemporânea e que, de 5 em 5 anos, aponta as directrizes para um desenvolvimento futuro.À semelhança do que se passa em Veneza, as intervenções espalham-se por vários locais, mas com maior ambição. As obras não se limitam aos diferentes museus ou pavilhões e ocupam Kassel nas suas ruas, praças, edifícios e transportes. Somos então envolvidos por um dinâmica omnipresente, que durante os 100 dias do evento, transforma uma provinciana cidade alemã num importante centro da cultura contemporânea.É claro que este é um trabalho que nasce de uma vontade conjunta. De quem produz, de quem organiza, de quem divulga, de quem promove, de quem financia, e também de quem assiste. Um exemplo curioso prende-se com a permanência de alguns trabalhos adquiridos pela própria população, como a escultura “Men walking to the sky” de Jonathan Borofsky, que ainda hoje marca o local onde surgiu.Kassel, que tem hoje um espólio invejável de arte urbana e que é conhecida como a cidade da Documenta, assume-se agora como uma plataforma de discussão internacional onde surgem e permanecem as mais variadas intervenções. Numa época em que as fronteiras se esbatem cada vez mais, é notável perceber a visão, a inteligência e a vontade que há em projectar a pequena cidade para um mapa global, fazendo-a crescer não em tamanho, mas em valor.A 12ªDocumenta divide-se por vários locais, desta vez dentro e fora do país. Neste contexto, um dos artistas convidados mais notados, o criador / cozinheiro catalão Ferran Adrià, vê o seu restaurante “El Bulli”, em Roses – Espanha, associado ao evento. Todos os outros locais espalham-se por Kassel – Alemanha e posicionam-se estrategicamente em diferentes zonas da cidade.O museu Schloss-Wilhelmshohe, no parque de Berg, o pavilhão Aue, anexo à Orangerie e à zona ribeirinha, o museu Fridericianum, em Friedrichsplatz no centro da cidade e, na sua proximidade, o museu Neue Gallerie e o centro documental da Documenta, são os locais que recebem algumas das intervenções. Porém, e esta é uma das especificidades da Documenta, o espaço público que os medeia recebe também ele, nas praças, ruas, edifícios, placards e transportes, alguns das peças especificamente pensadas para este evento.Assim, todos os elementos de arte pública, bem como alguns dos existentes no museu Schloss Wilhelmshohe, celebram uma relação única com o tempo e o lugar que ocupam e afirmam-se como projectos “site-specific” que questionam o contexto (urbano e expositivo) em que surgem.A maioria das obras escolhidas apoia-se numa leitura social e espelha o vincado desencontro do homem com o outro e com o mundo. Recorrendo ao exercício documental ou a mais “tradicionais” métodos de expressão, há quase sempre uma acção de confronto e denuncia que faz da transformação e da desigualdade um novo palco de interesses. A tal não é alheia a decisão do curador em acentuar a predominância de artistas da China, América Latina e Leste Europeu.No discurso e na forma, a ideia da desigualdade é ainda acentuada pela diversificada selecção dos trabalhos. De épocas e meios distintos, do século XVI ao século XXI, do Ocidente ao Oriente, as peças expostas registam a diferença como provocação para o encontro de algo comum. Algo comum, que apesar da transformação (ou migração) da sua forma, deixa perceber a universalidade da prática artística e a sua legitimação como veículo de educação e conhecimento.Nos trabalhos apresentados percebe-se a grande vontade em construir ambientes, recorrendo tendencialmente a outros suportes e disciplinas (quase sempre de natureza plástica, arquitectónica, sociológica e urbana). Nesse sentido há um grande predomínio da instalação. O vídeo e a fotografia são suportes amplamente utilizados, que tal como a pintura, a escultura ou o desenho, mas talvez de forma menos constrangida, continuam a encontrar lugar em si próprios. No entanto, poucas são as obras que não se tornam híbridas.Na verdade, uma das conclusões que a Documenta nos traz é que cada vez mais há menos fronteiras. Menos fronteiras entre expressões, entre autorias e legitimidades. Há cada vez mais uma maior contaminação entre o que se faz (se é desenho, pintura, escultura, vídeo, ou instalação), entre quem o faz (quem e quando se é o autor), e onde se faz (se são os circuitos e os locais - feiras, museus, galerias, etc. - que identificam e legitimam a produção artística).Um exemplo notável é a intervenção do artista tailandês Sakarin Krue-On, que numa encosta do BergPark, à frente do afamado museu Schloss Wilhelmshohe e à escala da paisagem envolvente, plantou um gigantesco arrozal.S.F.R.Publicado_Açoriano Oriental_12.08.2007

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