LIVROS & LITERATURA: ANTÓNIO TORRADO

13-10-2009
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LIVRO FECHADO - ANTÓNIO TORRADO Era uma vez um livro. Um livro fechado. Tristemente fechado. Irremediavelmente fechado.Nunca ninguém o abrira nem sequer para ler as primeiras linhas da primeira página das muitas que o livro tinha para oferecer.Quem o comprara trouxera-o para casa e, provavelmente insensível ao que o livro valia, ao que o livro continha, enfiara-o numa prateleira, ao lado de muitos outros.Ali estava. Ali ficou.Um dia, mais não podendo, queixou-se:— Ninguém me leu. Ninguém me liga.Ao lado, um colega disse:— Desconfio que, nesta estante, haverá muitos outros como tu.— É o teu caso? — perguntou, ansiosamente, o livro que nunca tinha sido aberto.— Por sinal, não — esclareceu o colega, um respeitável calhamaço. — Estou todo sublinhado. Fui lido e relido. Sou um livro de estudo.— Quem me dera essa sorte — disse outro livro ao lado, a entrar na conversa. — Por mim só me passaram os olhos. Página sim, página não… Mas, enfim, já prestei para alguma coisa.— Eu também — falou, perto deles, um livrinho estreito. — Durante muito tempo, servi de calço a uma mesa que tinha um pé mais curto.— Isso não é trabalho para livro — estranhou o calhamaço.— À falta de outro… — conformou-se o livro estreitinho.Escutando os seus companheiros de estante, o livro que nunca fora aberto sentiu uma secreta inveja. Ao menos, tinham para contar, ao passo que ele… Suspirou.Não chegou ao fim do suspiro, porque duas mãos o foram buscar, ao aperto da prateleira. As mãos pegaram nele e poisaram-no sobre uns joelhos.— Tem bonecos esse livro? — perguntou a voz de uma menina, debruçada para o livro, ainda por abrir.— Se tem! Muitos bonecos, muitas histórias que eu vou ler-te — disse uma voz mais grave, a quem pertenciam as mãos que escolheram o livro da estante.Começou a folheá-lo, e enquanto lhe alisava as primeiras páginas, foi dizendo:— Este livro tem uma história. Comprei-o no dia em que tu nasceste. Guardei-o para ti, até hoje. É um livro muito especial.— Lê — pediu a voz da menina.E o pai da menina leu. E o livro aberto deixou que o lessem, de ponta a ponta.Às vezes vale a pena esperar.(António Torrado - Mensagem Nacional para o Dia Internacional do Livro Infantil - 2 de Abril de 1997).BiografiaAntónio Torrado (Lisboa, 1939) é um escritor português voltado para a literatura infanto-juvenil. António Torrado licenciou-se em filosofia pela Universidade de Coimbra. Dedicou-se a escrita desde muito novo, tendo começado a publicar aos 28 anos. A sua atividade profissional é diversa: escritor, pedagogo, jornalista, editor, produtor e argumentista para televisão.Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B3nio_Torrado


LIVRO FECHADO - ANTÓNIO TORRADO Era uma vez um livro. Um livro fechado. Tristemente fechado. Irremediavelmente fechado.Nunca ninguém o abrira nem sequer para ler as primeiras linhas da primeira página das muitas que o livro tinha para oferecer.Quem o comprara trouxera-o para casa e, provavelmente insensível ao que o livro valia, ao que o livro continha, enfiara-o numa prateleira, ao lado de muitos outros.Ali estava. Ali ficou.Um dia, mais não podendo, queixou-se:— Ninguém me leu. Ninguém me liga.Ao lado, um colega disse:— Desconfio que, nesta estante, haverá muitos outros como tu.— É o teu caso? — perguntou, ansiosamente, o livro que nunca tinha sido aberto.— Por sinal, não — esclareceu o colega, um respeitável calhamaço. — Estou todo sublinhado. Fui lido e relido. Sou um livro de estudo.— Quem me dera essa sorte — disse outro livro ao lado, a entrar na conversa. — Por mim só me passaram os olhos. Página sim, página não… Mas, enfim, já prestei para alguma coisa.— Eu também — falou, perto deles, um livrinho estreito. — Durante muito tempo, servi de calço a uma mesa que tinha um pé mais curto.— Isso não é trabalho para livro — estranhou o calhamaço.— À falta de outro… — conformou-se o livro estreitinho.Escutando os seus companheiros de estante, o livro que nunca fora aberto sentiu uma secreta inveja. Ao menos, tinham para contar, ao passo que ele… Suspirou.Não chegou ao fim do suspiro, porque duas mãos o foram buscar, ao aperto da prateleira. As mãos pegaram nele e poisaram-no sobre uns joelhos.— Tem bonecos esse livro? — perguntou a voz de uma menina, debruçada para o livro, ainda por abrir.— Se tem! Muitos bonecos, muitas histórias que eu vou ler-te — disse uma voz mais grave, a quem pertenciam as mãos que escolheram o livro da estante.Começou a folheá-lo, e enquanto lhe alisava as primeiras páginas, foi dizendo:— Este livro tem uma história. Comprei-o no dia em que tu nasceste. Guardei-o para ti, até hoje. É um livro muito especial.— Lê — pediu a voz da menina.E o pai da menina leu. E o livro aberto deixou que o lessem, de ponta a ponta.Às vezes vale a pena esperar.(António Torrado - Mensagem Nacional para o Dia Internacional do Livro Infantil - 2 de Abril de 1997).BiografiaAntónio Torrado (Lisboa, 1939) é um escritor português voltado para a literatura infanto-juvenil. António Torrado licenciou-se em filosofia pela Universidade de Coimbra. Dedicou-se a escrita desde muito novo, tendo começado a publicar aos 28 anos. A sua atividade profissional é diversa: escritor, pedagogo, jornalista, editor, produtor e argumentista para televisão.Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B3nio_Torrado

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