"Mamaaa...goto de ti!": Ao João,

28-05-2005
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Há seis anos atrás (e mais 2 dias) deste-me a pior noite de todas. Tínhamos regressado a casa, já contigo ao colo muito embrulhado na manta que hoje só se lava às tuas escondidas. Nas horas em que choramingavas muito baixinho dava-te de mamar e nas restantes, enquanto dormias profundamente, tinhas dois pares de olhos vidrados nos teus 49cm de gente que nos aqueciam o coração. Nenhum dos dois conseguiu entregar-se ao sono. Eu muito preocupada com tudo e mais alguma coisa, inclusivé o teu choro manso que tantas mães deveriam invejar, e o pai muito preocupado em me acalmar. Foi assim. Até amanhecer.

Depois desataste a crescer. Crescias todos os dias. O pai dizia até que crescias durante o dia porque ele notava diferença ao final da tarde, quando chegava. E a cada dia de crescimento teu havia também um crescimento nosso como mãe e pai. Contigo aprendemos quase tudo. Aprendemos, por exemplo, que os choros mansos que nem chegam bem a ser choros, não têm necessariamente a ver com algo de mau. Tu eras o típico bebé que todas as mães-estreantes desejam. Comias muito bem, dormiste desde cedo a noite toda e a única coisa que te fazia chorar eram as pessoas desconhecidas. Eram uma coisa que te fazia ficar realmente aborrecido. Detestavas que te entrassem pelo teu quarto dentro, e que sem pedir licença, te apertassem as bochechas e dissessem que eras bebé de revista. Só gostavas de vozinhas doces. E por isso percebemos logo que só podias ser muito exigente. A par desta timidez aliou-se sempre uma capacidade grande, mas grande, de observar tudo e mais alguma coisa, de querer aprender muito e de ouvir o pai falar. Eram conversas adultas, masculinas, que me deixavam totalmente de lado. De futebol, marcas de carros, de política, até de trabalho. Não percebias mas rias-te sempre e ouvias com imensa atenção. Estes estímulos, e mais alguns, resultaram numa criança precoce na fala e no entendimento, na perspicácia e compreensão e ainda numa memória de invejar. Mas sempre foste muito independente. Sempre tentaste fazer tudo antes de pedir ajuda. Só depois de todas as hipóteses exploradas é que pensavas em auxílio. E daí (do pensar) a fazê-lo efectivamente havia um caminho a percorrer. Esta segurança-teimosia deu-nos alguns problemas que hoje tentamos contornar o melhor que pudemos. Hoje continua essa independência, essa timidez atrevida, que aparece de quando em vez, e portanto mimos exclusivos para a mãe, pai e manos. Por isso, têm sabor especial. Não és nada de os andar por aí a desperdiçar. Cada beijinho teu faz-me sentir uma mãe melhor, priveligiada. Só o recebo porque o mereci mesmo o que me faz sentir muitíssimo bem.

Há pouco estive a ver-te jogar no brinquedo novo. Deu gosto ver-te abri-lo na tua festa. Acho que não foi impressão minha o brilho dos teus olhos. E ainda há tão pouco cabias num dos meus braços. Há tão pouco chorávamos os dois com as tuas cólicas. Ainda há tão pouco te aconcheguei pela primeira vez e murmurei quase sem forças que eras bonito. Hoje fazes contas. Conheces as letras todas e escreves palavras. Sabes contar até 500 dizes-me muito sério para que eu acredite mais depressa. Ontem perguntavas-me o que é que o coelho da Páscoa tinha em comum com a história do Jesus. E hoje, ao jantar, anunciaste que querias sair daquela escola porque não queres trabalhos de casa no próximo ano e ao que parece conheces uma em que não os fazem. É o novo desafio, a primária. Estás com medo que as novas responsabilidades cubram dias inteiros de malandrice e maroteira. Mas sabemos nós que o vais enfrentar como melhor souberes. E se por acaso fraquejares por algum momento, sabes bem que tens duas mãos ( uma da mãe, outra do pai) e um colo (o da mãe) sempre pronto a ajudar a prosseguir caminho. O colo esse, por mais crescido que estejas, nunca será suficientemente pequeno para que não caibas nele. Foi por isso que hoje, quando me despedia de ti com um beijinho nos cabelos encaracolados, consegui sentir o cheirinho intenso e eterno a bebé.

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Há seis anos atrás (e mais 2 dias) deste-me a pior noite de todas. Tínhamos regressado a casa, já contigo ao colo muito embrulhado na manta que hoje só se lava às tuas escondidas. Nas horas em que choramingavas muito baixinho dava-te de mamar e nas restantes, enquanto dormias profundamente, tinhas dois pares de olhos vidrados nos teus 49cm de gente que nos aqueciam o coração. Nenhum dos dois conseguiu entregar-se ao sono. Eu muito preocupada com tudo e mais alguma coisa, inclusivé o teu choro manso que tantas mães deveriam invejar, e o pai muito preocupado em me acalmar. Foi assim. Até amanhecer.

Depois desataste a crescer. Crescias todos os dias. O pai dizia até que crescias durante o dia porque ele notava diferença ao final da tarde, quando chegava. E a cada dia de crescimento teu havia também um crescimento nosso como mãe e pai. Contigo aprendemos quase tudo. Aprendemos, por exemplo, que os choros mansos que nem chegam bem a ser choros, não têm necessariamente a ver com algo de mau. Tu eras o típico bebé que todas as mães-estreantes desejam. Comias muito bem, dormiste desde cedo a noite toda e a única coisa que te fazia chorar eram as pessoas desconhecidas. Eram uma coisa que te fazia ficar realmente aborrecido. Detestavas que te entrassem pelo teu quarto dentro, e que sem pedir licença, te apertassem as bochechas e dissessem que eras bebé de revista. Só gostavas de vozinhas doces. E por isso percebemos logo que só podias ser muito exigente. A par desta timidez aliou-se sempre uma capacidade grande, mas grande, de observar tudo e mais alguma coisa, de querer aprender muito e de ouvir o pai falar. Eram conversas adultas, masculinas, que me deixavam totalmente de lado. De futebol, marcas de carros, de política, até de trabalho. Não percebias mas rias-te sempre e ouvias com imensa atenção. Estes estímulos, e mais alguns, resultaram numa criança precoce na fala e no entendimento, na perspicácia e compreensão e ainda numa memória de invejar. Mas sempre foste muito independente. Sempre tentaste fazer tudo antes de pedir ajuda. Só depois de todas as hipóteses exploradas é que pensavas em auxílio. E daí (do pensar) a fazê-lo efectivamente havia um caminho a percorrer. Esta segurança-teimosia deu-nos alguns problemas que hoje tentamos contornar o melhor que pudemos. Hoje continua essa independência, essa timidez atrevida, que aparece de quando em vez, e portanto mimos exclusivos para a mãe, pai e manos. Por isso, têm sabor especial. Não és nada de os andar por aí a desperdiçar. Cada beijinho teu faz-me sentir uma mãe melhor, priveligiada. Só o recebo porque o mereci mesmo o que me faz sentir muitíssimo bem.

Há pouco estive a ver-te jogar no brinquedo novo. Deu gosto ver-te abri-lo na tua festa. Acho que não foi impressão minha o brilho dos teus olhos. E ainda há tão pouco cabias num dos meus braços. Há tão pouco chorávamos os dois com as tuas cólicas. Ainda há tão pouco te aconcheguei pela primeira vez e murmurei quase sem forças que eras bonito. Hoje fazes contas. Conheces as letras todas e escreves palavras. Sabes contar até 500 dizes-me muito sério para que eu acredite mais depressa. Ontem perguntavas-me o que é que o coelho da Páscoa tinha em comum com a história do Jesus. E hoje, ao jantar, anunciaste que querias sair daquela escola porque não queres trabalhos de casa no próximo ano e ao que parece conheces uma em que não os fazem. É o novo desafio, a primária. Estás com medo que as novas responsabilidades cubram dias inteiros de malandrice e maroteira. Mas sabemos nós que o vais enfrentar como melhor souberes. E se por acaso fraquejares por algum momento, sabes bem que tens duas mãos ( uma da mãe, outra do pai) e um colo (o da mãe) sempre pronto a ajudar a prosseguir caminho. O colo esse, por mais crescido que estejas, nunca será suficientemente pequeno para que não caibas nele. Foi por isso que hoje, quando me despedia de ti com um beijinho nos cabelos encaracolados, consegui sentir o cheirinho intenso e eterno a bebé.

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