Comissão de Defesa da Escola Pública: Recado ao PS, por Ana Benavente

27-06-2009
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1.Não sou certamente a única socialista descontente comos tempos que vivemos e com o actual governo. Nãopertenço a qualquer estrutura nacional e, na secção emque estou inscrita, não reconheço competência à suapresidência para aí debater, discutir, reflectir,apresentar propostas. Seria um mero ritual.Em política não há divórcios. Há afastamentos. Não merevejo neste partido calado e reverente que não tem,segundo os jornais, uma única pergunta a fazer aosecretário-geral na última comissão política. Umaparte dos seus actuais dirigentes são tão socialistascomo qualquer neoliberal; outra parte outrora ocupadacom o debate político e com a acção, ficou esmagadapor mais de um milhão de votos nas últimaspresidenciais e, sem saber que fazer com talabundância, continuou na sua individualidadeprivilegiada. Outra parte, enfim, recebendo mais oumenos migalhas do poder, sente que ganhou uma maioriaabsoluta e considera, portanto, que só tem que ouviros cidadãos (perdão, os eleitores ou os consumidores,como queiram) no final do mandato.Umas raríssimas vozes (raras, mesmo) vão ocasionandocríticas ocasionais.2.Para resolver o défice das contas públicas teria sidonecessário adoptar as políticas económicas e sociais ea atitude governativa fechada e arrogante que temosvivido? Teria sido necessário pôr os professores dejoelhos num pelourinho? Impor um estatuto baseadoapenas nos últimos sete anos de carreira? Foi o queaconteceu com os "titulares" e "não titulares", umanova casta que ainda não tinha sido inventada atéhoje. E premiar "o melhor" professor ou professora?Não é verdade que "ninguém é professor sozinho" e quesão necessárias equipas de docentes coesas ecompetentes, com metas claras, com estratégias bemdefinidas para alcançar o sucesso (a saber, aaprendizagem efectiva dos alunos)?Teria sido necessário aumentar as diferenças entrericos e pobres? Criar mais desemprego? Enviar a GNRcontra grevistas no seu direito constitucional?Penalizar as pequenas reformas com impostos? Criartanto desacerto na justiça? Confirmar aqueles velhosmitos de que "quem paga é sempre o mais pequeno"?Continuar a ser preciso "apanhar" uma consulta e, não,"marcar" uma consulta? Ouvir o senhor ministro dasFinanças (os exemplos são tantos que é difícilescolher um, de um homem reservado, aliás) afirmar que"nós não entramos nesses jogos", sendo os tais "jogos"as negociações salariais e de condições de trabalhoentre Governo e sindicatos. Um "jogo"? Pensava eu queera um mecanismo de regulação que fazia parte dosregimes democráticos.3.Na sua presidência europeia (são seis meses, não seesqueça), o senhor primeiro-ministro mostra-seeufórico e diz que somos um país feliz. Será? Será quevivemos a Europa como um assunto para especialistaseuropeus ou como uma questão que nos diz respeito atodos? Que sabemos nós desta presidência? Que se fazemmuitas reuniões, conferências e declarações, cujosvagos conteúdos escapam ao comum dos mortais. O que éafinal o Tratado de Lisboa? Como se estrutura o poderna Europa? Quais os centros de decisão? Que novascidadanias? Porque nos continuamos a afastar dosrecém-chegados e dos antigos membros da Europa? Porqueocupamos sempre (nas estatísticas de salários, depoder de compra, na qualidade das prestações dosserviços públicos, no pessimismo quanto ao futuro,etc., etc.) os piores lugares?Porque temos tantos milhares de portugueses a viver nolimiar da pobreza? Que bom seria se o senhorprimeiro-ministro pudesse explicar, com palavrassimples, a importância do Tratado de Lisboa para obem-estar individual e colectivo dos cidadãosportugueses, económica, social e civicamente.4.Quando os debates da Assembleia da República sãotraduzidos em termos futebolísticos, fico muitopreocupada. A propósito do Orçamento do Estado para2008, ouviu-se: "Quem ganha? Quem perde? queespectáculo!". "No primeiro debate perdi", dizia oactual líder do grupo parlamentar do PSD "mas nosegundo ganhei" (mais ou menos assim). "Devolvam osbilhetes...", acrescentava outro líder, este deesquerda. E o país, onde fica? Que informaçãoasseguram os deputados aos seus eleitores? De todos ospartidos, aliás. Obrigada à TV Parlamento; só é penaser tão maçadora. Órgão cujo presidente é eleito naAssembleia, o Conselho Nacional de Educação festeja 20anos de existência. Criado como um órgão departicipação crítica quanto às políticas educativas,os seus pareceres têm-se tornado cada vez mais raros.Para mim, que trabalho em educação, parece-me cada vezmais o palácio da bela adormecida (a bela é aparticipação democrática, claro). E que dizer doorçamento para a cultura, que se torna ainda menosrelevante? É assim que se investe "nas pessoas" ou oPS já não considera que "as pessoas estão primeiro"?5.Sinto-me num país tristonho e cabisbaixo, com o PS asubstituir as políticas eventuais do PSD (que nãosabe, por isso, para que lado se virar). Quanto maiscirco, menos pão. Diante dos espectáculos oficiais bemorquestrados que a TV mostra, dos anúncios de umbem-estar sem fim que um dia virá (quantosebastianismo!), apetece-me muitas vezes dizer: "Aquihá palhaços". E os palhaços somos nós. As únicascríticas sistemáticas às agressões quotidianas àliberdade de expressão são as do Gato Fedorento. Jáagora, ficava tão bem a um governo do PS acabar com osabusos da EDP, empresa pública, que manda o "homem doalicate" cortar a luz se o cidadão se atrasa uns diasno seu pagamento, consumidor regular e cumpridor...Quando há avarias, nós cortamos-lhes o quê? Somoscidadãos castigados!O país cansa! Os partidos são necessários à democraciamas temos que ser mais exigentes.Movimentos cívicos...procuram-se (já há alguns, sãoprecisos mais). As anedotas e brincadeiras com o "olheque agora é perigoso criticar o primeiro-ministro" nãome fazem rir. Pela liberdade muitos deram a vida. Pelaliberdade muitos demos o nosso trabalho, a nossavontade, o nosso entusiasmo. Com certeza somos muitosos que não gostamos de brincar com coisas tão sérias,sobretudo com um governo do Partido Socialista.Ana BenaventeProfessora universitária, militante do PS (recebido por mail)


1.Não sou certamente a única socialista descontente comos tempos que vivemos e com o actual governo. Nãopertenço a qualquer estrutura nacional e, na secção emque estou inscrita, não reconheço competência à suapresidência para aí debater, discutir, reflectir,apresentar propostas. Seria um mero ritual.Em política não há divórcios. Há afastamentos. Não merevejo neste partido calado e reverente que não tem,segundo os jornais, uma única pergunta a fazer aosecretário-geral na última comissão política. Umaparte dos seus actuais dirigentes são tão socialistascomo qualquer neoliberal; outra parte outrora ocupadacom o debate político e com a acção, ficou esmagadapor mais de um milhão de votos nas últimaspresidenciais e, sem saber que fazer com talabundância, continuou na sua individualidadeprivilegiada. Outra parte, enfim, recebendo mais oumenos migalhas do poder, sente que ganhou uma maioriaabsoluta e considera, portanto, que só tem que ouviros cidadãos (perdão, os eleitores ou os consumidores,como queiram) no final do mandato.Umas raríssimas vozes (raras, mesmo) vão ocasionandocríticas ocasionais.2.Para resolver o défice das contas públicas teria sidonecessário adoptar as políticas económicas e sociais ea atitude governativa fechada e arrogante que temosvivido? Teria sido necessário pôr os professores dejoelhos num pelourinho? Impor um estatuto baseadoapenas nos últimos sete anos de carreira? Foi o queaconteceu com os "titulares" e "não titulares", umanova casta que ainda não tinha sido inventada atéhoje. E premiar "o melhor" professor ou professora?Não é verdade que "ninguém é professor sozinho" e quesão necessárias equipas de docentes coesas ecompetentes, com metas claras, com estratégias bemdefinidas para alcançar o sucesso (a saber, aaprendizagem efectiva dos alunos)?Teria sido necessário aumentar as diferenças entrericos e pobres? Criar mais desemprego? Enviar a GNRcontra grevistas no seu direito constitucional?Penalizar as pequenas reformas com impostos? Criartanto desacerto na justiça? Confirmar aqueles velhosmitos de que "quem paga é sempre o mais pequeno"?Continuar a ser preciso "apanhar" uma consulta e, não,"marcar" uma consulta? Ouvir o senhor ministro dasFinanças (os exemplos são tantos que é difícilescolher um, de um homem reservado, aliás) afirmar que"nós não entramos nesses jogos", sendo os tais "jogos"as negociações salariais e de condições de trabalhoentre Governo e sindicatos. Um "jogo"? Pensava eu queera um mecanismo de regulação que fazia parte dosregimes democráticos.3.Na sua presidência europeia (são seis meses, não seesqueça), o senhor primeiro-ministro mostra-seeufórico e diz que somos um país feliz. Será? Será quevivemos a Europa como um assunto para especialistaseuropeus ou como uma questão que nos diz respeito atodos? Que sabemos nós desta presidência? Que se fazemmuitas reuniões, conferências e declarações, cujosvagos conteúdos escapam ao comum dos mortais. O que éafinal o Tratado de Lisboa? Como se estrutura o poderna Europa? Quais os centros de decisão? Que novascidadanias? Porque nos continuamos a afastar dosrecém-chegados e dos antigos membros da Europa? Porqueocupamos sempre (nas estatísticas de salários, depoder de compra, na qualidade das prestações dosserviços públicos, no pessimismo quanto ao futuro,etc., etc.) os piores lugares?Porque temos tantos milhares de portugueses a viver nolimiar da pobreza? Que bom seria se o senhorprimeiro-ministro pudesse explicar, com palavrassimples, a importância do Tratado de Lisboa para obem-estar individual e colectivo dos cidadãosportugueses, económica, social e civicamente.4.Quando os debates da Assembleia da República sãotraduzidos em termos futebolísticos, fico muitopreocupada. A propósito do Orçamento do Estado para2008, ouviu-se: "Quem ganha? Quem perde? queespectáculo!". "No primeiro debate perdi", dizia oactual líder do grupo parlamentar do PSD "mas nosegundo ganhei" (mais ou menos assim). "Devolvam osbilhetes...", acrescentava outro líder, este deesquerda. E o país, onde fica? Que informaçãoasseguram os deputados aos seus eleitores? De todos ospartidos, aliás. Obrigada à TV Parlamento; só é penaser tão maçadora. Órgão cujo presidente é eleito naAssembleia, o Conselho Nacional de Educação festeja 20anos de existência. Criado como um órgão departicipação crítica quanto às políticas educativas,os seus pareceres têm-se tornado cada vez mais raros.Para mim, que trabalho em educação, parece-me cada vezmais o palácio da bela adormecida (a bela é aparticipação democrática, claro). E que dizer doorçamento para a cultura, que se torna ainda menosrelevante? É assim que se investe "nas pessoas" ou oPS já não considera que "as pessoas estão primeiro"?5.Sinto-me num país tristonho e cabisbaixo, com o PS asubstituir as políticas eventuais do PSD (que nãosabe, por isso, para que lado se virar). Quanto maiscirco, menos pão. Diante dos espectáculos oficiais bemorquestrados que a TV mostra, dos anúncios de umbem-estar sem fim que um dia virá (quantosebastianismo!), apetece-me muitas vezes dizer: "Aquihá palhaços". E os palhaços somos nós. As únicascríticas sistemáticas às agressões quotidianas àliberdade de expressão são as do Gato Fedorento. Jáagora, ficava tão bem a um governo do PS acabar com osabusos da EDP, empresa pública, que manda o "homem doalicate" cortar a luz se o cidadão se atrasa uns diasno seu pagamento, consumidor regular e cumpridor...Quando há avarias, nós cortamos-lhes o quê? Somoscidadãos castigados!O país cansa! Os partidos são necessários à democraciamas temos que ser mais exigentes.Movimentos cívicos...procuram-se (já há alguns, sãoprecisos mais). As anedotas e brincadeiras com o "olheque agora é perigoso criticar o primeiro-ministro" nãome fazem rir. Pela liberdade muitos deram a vida. Pelaliberdade muitos demos o nosso trabalho, a nossavontade, o nosso entusiasmo. Com certeza somos muitosos que não gostamos de brincar com coisas tão sérias,sobretudo com um governo do Partido Socialista.Ana BenaventeProfessora universitária, militante do PS (recebido por mail)

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