A Arte da Fuga: Desabafo I

04-06-2005
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Filiei-me na Juventude Centrista em 1994. Tinha 16 anos. Apesar de discordar do rumo que Manuel Monteiro imprimia ao partido, sentia que o CDS era, programática e historicamente, o partido com o qual mais me identificava. Filiei-me no CDS em 1997, no exacto dia em que Manuel Monteiro pediu a sua demissão.Acreditei sempre que a vocação histórica do CDS era a de ser um partido de governo, estável, previsível, credível e moderado. A liderança de Manuel Monteiro foi o oposto dessa vocação, rapidamente transformando o partido em partido de protesto. Tentou mesmo descolar-se do passado, culminando essa estratégia com a mudança de nome do partido. Ainda hoje guardo na memória o Congresso em que muito poucos se opuseram à mudança definitiva de nome. Fui um deles. No entanto, a orientação de Manuel Monteiro era legítima, com o acordo das bases e dos dirigentes. A verdade é que foi essa estratégia que fez o CDS crescer pela primeira vez desde 1976.Em 1998, Paulo Portas defendeu uma inflexão da viragem à direita do partido e pretendeu, em sintonia com o PSD de Marcelo Rebelo de Sousa, uma frente de direita, que congregasse as diversas sensibilidades que vão desde os sociais democratas, aos liberais, aos conservadores e aos democratas cristãos. Defendia uma inflexão no discurso acerca da Europa, e mostrou-se receptivo ao Tratado de Amesterdão e à União Económica e Monetária. Propôs uma reconciliação com o passado do CDS e chamou nomes históricos do partido.Paulo Portas defendia que os eleitores que o partido tinha de cativar eram os eleitores da “Zona AD”. Para isso propôs-se abrir o partido ao exterior, promovendo uma reconciliação natural do partido “com os seus vários passados”. Portas chamou a atenção para a necessidade de o partido moderar certas posições e credibilizar as suas actuações. Para conseguir estes objectivos, Paulo Portas defendeu a reafirmação do partido como democrata cristão, ainda que “estando aberto às correntes do liberalismo responsável e do conservadorismo moderado”. Propôs-se “crescer no centro-direita”, pois “mais para a direita não devemos ir”.Assim, o que Paulo Portas veio defender foi o regresso do CDS ao arco da governabilidade, o regresso aos tempos de “partido moderado, responsável e credível”, cuja vocação “é a de ser um partido de Governo”, e o regresso aos tempos de partido de quadros, “a melhor via para ser, duradouramente, um partido de eleitores”.Apoiei esta estratégia sem hesitar um segundo. Ela ia de encontro a tudo o que sempre pensei do CDS. É conhecida a história seguinte. Com a AD de Marcelo desfeita, Paulo Portas desviou-se da estratégia e lutou pela sobrevivência do CDS. Disse sempre, para o quem quis ouvir, que o CDS iria voltar ao governo para cumprir a sua história. Cumpriu. Posso discordar da estratégia de Paulo Portas até 2002, apesar de a compreender e de a ter aceite. O que não compreenderia é que, chegado ao governo, o CDS não se assumisse como um partido responsável. O CDS apresentou-se no governo, e depois nesta campanha eleitoral, respeitando integralmente os seus compromissos e orgulhando a sua história. Foi um partido competente, leal, estável, reformista, activo, imaginativo. Congregou novos valores, chamou velhos valores e, como qualquer outro, cometeu os seus erros ou fez más escolhas.Mas, o que me parecia mais importante, era que o CDS se afirmasse como uma alternativa de governo. Que o voto no CDS fosse encarado como um voto útil para uma solução de governo e não como um voto de protesto.Todos sabemos o resultado: o CDS voltou a descer. Mesmo no cenário eleitoral mais favorável das últimas décadas, o CDS tal qual o entendo, perdeu. Pode não ter perdido muitos votos nem muitos deputados, mas perdeu na sua afirmação. A verdade, aliás, é que o único crescimento em décadas do partido foi quando se assumiu como partido de causas, de nichos eleitorais, anti-sistémico e de protesto.O meu CDS perdeu as eleições. A minha maior tristeza é precisamente de considerar que aquilo por que sempre me bati não resultou. Porventura, o CDS tal qual o entendo não tem espaço, não cabe neste sistema. Os eleitores desviados do PSD preferiram votar no PS a votar no CDS. Não podemos ser indiferentes a isto. Não é possível continuar a lutar por um partido moderado que, provavelmente não tem espaço para existir, sem atentarmos bem no que aconteceu nestas eleições.Considero legitimo que os militantes do CDS requeiram o regresso ao partido de protesto, em prol de subidas eleitorais. Não será essa a minha opção, e se essa opção se consumar, afastar-me-ei. Num momento como este, sei que só quero pertencer a um CDS que mantenha este rumo, mesmo que decresça. E espero que Paulo Portas reconsidere a sua decisão, porque ele é o líder da oposição que Portugal necessita. Porque há toda uma nova geração, liberal, reformista, arejada, disponível para dar a cara pela direita sem perder um pingo de honestidade intelectual a defender a banha da cobra.Mas uma coisa mudou. Antes, tinha a certeza que esse era o melhor caminho. Agora sei apenas que é o meu.

Filiei-me na Juventude Centrista em 1994. Tinha 16 anos. Apesar de discordar do rumo que Manuel Monteiro imprimia ao partido, sentia que o CDS era, programática e historicamente, o partido com o qual mais me identificava. Filiei-me no CDS em 1997, no exacto dia em que Manuel Monteiro pediu a sua demissão.Acreditei sempre que a vocação histórica do CDS era a de ser um partido de governo, estável, previsível, credível e moderado. A liderança de Manuel Monteiro foi o oposto dessa vocação, rapidamente transformando o partido em partido de protesto. Tentou mesmo descolar-se do passado, culminando essa estratégia com a mudança de nome do partido. Ainda hoje guardo na memória o Congresso em que muito poucos se opuseram à mudança definitiva de nome. Fui um deles. No entanto, a orientação de Manuel Monteiro era legítima, com o acordo das bases e dos dirigentes. A verdade é que foi essa estratégia que fez o CDS crescer pela primeira vez desde 1976.Em 1998, Paulo Portas defendeu uma inflexão da viragem à direita do partido e pretendeu, em sintonia com o PSD de Marcelo Rebelo de Sousa, uma frente de direita, que congregasse as diversas sensibilidades que vão desde os sociais democratas, aos liberais, aos conservadores e aos democratas cristãos. Defendia uma inflexão no discurso acerca da Europa, e mostrou-se receptivo ao Tratado de Amesterdão e à União Económica e Monetária. Propôs uma reconciliação com o passado do CDS e chamou nomes históricos do partido.Paulo Portas defendia que os eleitores que o partido tinha de cativar eram os eleitores da “Zona AD”. Para isso propôs-se abrir o partido ao exterior, promovendo uma reconciliação natural do partido “com os seus vários passados”. Portas chamou a atenção para a necessidade de o partido moderar certas posições e credibilizar as suas actuações. Para conseguir estes objectivos, Paulo Portas defendeu a reafirmação do partido como democrata cristão, ainda que “estando aberto às correntes do liberalismo responsável e do conservadorismo moderado”. Propôs-se “crescer no centro-direita”, pois “mais para a direita não devemos ir”.Assim, o que Paulo Portas veio defender foi o regresso do CDS ao arco da governabilidade, o regresso aos tempos de “partido moderado, responsável e credível”, cuja vocação “é a de ser um partido de Governo”, e o regresso aos tempos de partido de quadros, “a melhor via para ser, duradouramente, um partido de eleitores”.Apoiei esta estratégia sem hesitar um segundo. Ela ia de encontro a tudo o que sempre pensei do CDS. É conhecida a história seguinte. Com a AD de Marcelo desfeita, Paulo Portas desviou-se da estratégia e lutou pela sobrevivência do CDS. Disse sempre, para o quem quis ouvir, que o CDS iria voltar ao governo para cumprir a sua história. Cumpriu. Posso discordar da estratégia de Paulo Portas até 2002, apesar de a compreender e de a ter aceite. O que não compreenderia é que, chegado ao governo, o CDS não se assumisse como um partido responsável. O CDS apresentou-se no governo, e depois nesta campanha eleitoral, respeitando integralmente os seus compromissos e orgulhando a sua história. Foi um partido competente, leal, estável, reformista, activo, imaginativo. Congregou novos valores, chamou velhos valores e, como qualquer outro, cometeu os seus erros ou fez más escolhas.Mas, o que me parecia mais importante, era que o CDS se afirmasse como uma alternativa de governo. Que o voto no CDS fosse encarado como um voto útil para uma solução de governo e não como um voto de protesto.Todos sabemos o resultado: o CDS voltou a descer. Mesmo no cenário eleitoral mais favorável das últimas décadas, o CDS tal qual o entendo, perdeu. Pode não ter perdido muitos votos nem muitos deputados, mas perdeu na sua afirmação. A verdade, aliás, é que o único crescimento em décadas do partido foi quando se assumiu como partido de causas, de nichos eleitorais, anti-sistémico e de protesto.O meu CDS perdeu as eleições. A minha maior tristeza é precisamente de considerar que aquilo por que sempre me bati não resultou. Porventura, o CDS tal qual o entendo não tem espaço, não cabe neste sistema. Os eleitores desviados do PSD preferiram votar no PS a votar no CDS. Não podemos ser indiferentes a isto. Não é possível continuar a lutar por um partido moderado que, provavelmente não tem espaço para existir, sem atentarmos bem no que aconteceu nestas eleições.Considero legitimo que os militantes do CDS requeiram o regresso ao partido de protesto, em prol de subidas eleitorais. Não será essa a minha opção, e se essa opção se consumar, afastar-me-ei. Num momento como este, sei que só quero pertencer a um CDS que mantenha este rumo, mesmo que decresça. E espero que Paulo Portas reconsidere a sua decisão, porque ele é o líder da oposição que Portugal necessita. Porque há toda uma nova geração, liberal, reformista, arejada, disponível para dar a cara pela direita sem perder um pingo de honestidade intelectual a defender a banha da cobra.Mas uma coisa mudou. Antes, tinha a certeza que esse era o melhor caminho. Agora sei apenas que é o meu.

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