Expresso: PS e AD de acordo sobre a nomeação dos chefes militares

26-10-2008
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Verão de 1982. Freitas do Amaral, então ministro da Defesa num Governo da Aliança Democrática (AD) janta a sós com Mário Soares, líder da oposição, na casa do Campo Grande, em Lisboa, que é propriedade do fundador do PS. Em cima da mesa, a nomeação das chefias militares numa altura em que a extinção do Conselho da Revolução estava também na ordem do dia.

Este é um dos vários episódios, nunca divulgados, que Freitas do Amaral conta no segundo volume das suas memórias políticas, intitulado "A transição para a democracia".

Freitas terá então lembrado a Soares que em matéria de nomeação de Chefes de Estado-Maior "a solução que vigora em todos os países democráticos e da NATO é que quem propõe os nomes é o Governo (o qual tem, pois, um amplo poder de escolha) e quem nomeia ou recusa nomear é o Chefe de Estado, Rei ou Presidente da República (que, por isso, tem apenas um direito de veto)".

Segundo Freitas, Soares terá concordado com este modelo. "Não pode deixar de ser assim. Isto é que é democrático", afirmou o então líder do Partido Socialista (PS), acrescentando: "Bem, não vamos tão depressa. O que eu lhe expus foi a minha posição pessoal. Se ela é também a posição do Grupo Parlamentar do PS, é o que estamos para ver".

Recorde-se que à época, lembra ainda Freitas do Amaral, "na concepção perfilhada pelo Presidente Eanes, pelos Conselheiros da Revolução e pelo PCP, o poder de livre escolha deve caber ao Presidente da República, não sendo o Governo tido nem achado nessa matéria ou podendo ser, quando muito, ouvido a título meramente consultivo."

Ainda a propósito da revisão constitucional de 1982, Freitas revela uma conversa então mantida com o Presidente da República, Ramalho Eanes, na qual o Chefe de Estado admitiu ter errado ao ameaçar demitir-se, caso os deputados fossem colocados à margem do processo de revisão da Lei Fundamental.

Com o primeiro-ministro fora do país em visita oficial, coube a Freitas representar o Governo na habitual reunião das quintas-feiras. O então vice-primeiro-ministro terá perguntado a Eanes:

"Não lhe parece, Sr. Presidente, que foi longe de mais ao ameaçar demitir-se, sobretudo se não tem a intenção firme de se demitir mesmo?" Ao que Ramalho Eanes terá respondido: "Tem Razão. Eu acho que, em política, é possível usar a ameaça como arma, quando se trata de uma ameaça legítima, como era o caso. Mas é como diz: não tendo eu a intenção de me demitir, ninguém levou a ameaça a sério. Foi um erro."

'O que fazer sobre Camarate'

Na obra, Freitas do Amaral revela ainda uma conversa a sós com o então primeiro-ministro, Francisco Pinto Balsemão, em 9 de Outubro de 1981. Objectivo: "encontrar a melhor resposta à questão 'o que fazer sobre Camarate'", o acidente aéreo de que resultaram as mortes do então primeiro-ministro, Francisco Sá Carneiro, e do ministro da Defesa, Adelino Amaro da Costa.

Para Freitas do Amaral eram públicos e notórios os "erros na condução do inquérito técnico e da investigação policial", como por exemplo: "a total contradição entre as conclusões do primeiro e as da segunda [Comissão Parlamentar de Inquérito ao acidente]"; o facto de a Polícia Judiciária não ter junto o telegrama de Londres ao processo (ver texto relacionado) e de não ter ouvido até então "o principal suspeito, Lee Rodrigues".

"Por tudo isto - recomendou Freitas a Balsemão - "é indispensável entregar já o caso ao Ministério Público e, logo a seguir, levar o assunto a julgamento em tribunal. Só desse modo teremos paz. Sem isso, o caso nunca mais ficará encerrado".

Segundo Freitas, o então primeiro-ministro deu-lhe razão. "É exactamente o que penso", afirmou então Pinto Balsemão, acrescentando: "Não tenho, é claro, nenhuma razão concreta para desconfiar, nem da Polícia Judiciária, nem da comissão de Inquérito. Mas, se as duas principais autoridades do Estado Português que estudaram o caso não concordam entre si, e se uma delas admite que possa ter havido roubo de gasolina - e portanto um atentado -, não podemos descartar essa hipótese. Nem deve ser o Poder Executivo a dizer a última palavra sobre o que começa a parecer um grande mistério. É o Poder Judicial que tem de decidir o assunto".

Verão de 1982. Freitas do Amaral, então ministro da Defesa num Governo da Aliança Democrática (AD) janta a sós com Mário Soares, líder da oposição, na casa do Campo Grande, em Lisboa, que é propriedade do fundador do PS. Em cima da mesa, a nomeação das chefias militares numa altura em que a extinção do Conselho da Revolução estava também na ordem do dia.

Este é um dos vários episódios, nunca divulgados, que Freitas do Amaral conta no segundo volume das suas memórias políticas, intitulado "A transição para a democracia".

Freitas terá então lembrado a Soares que em matéria de nomeação de Chefes de Estado-Maior "a solução que vigora em todos os países democráticos e da NATO é que quem propõe os nomes é o Governo (o qual tem, pois, um amplo poder de escolha) e quem nomeia ou recusa nomear é o Chefe de Estado, Rei ou Presidente da República (que, por isso, tem apenas um direito de veto)".

Segundo Freitas, Soares terá concordado com este modelo. "Não pode deixar de ser assim. Isto é que é democrático", afirmou o então líder do Partido Socialista (PS), acrescentando: "Bem, não vamos tão depressa. O que eu lhe expus foi a minha posição pessoal. Se ela é também a posição do Grupo Parlamentar do PS, é o que estamos para ver".

Recorde-se que à época, lembra ainda Freitas do Amaral, "na concepção perfilhada pelo Presidente Eanes, pelos Conselheiros da Revolução e pelo PCP, o poder de livre escolha deve caber ao Presidente da República, não sendo o Governo tido nem achado nessa matéria ou podendo ser, quando muito, ouvido a título meramente consultivo."

Ainda a propósito da revisão constitucional de 1982, Freitas revela uma conversa então mantida com o Presidente da República, Ramalho Eanes, na qual o Chefe de Estado admitiu ter errado ao ameaçar demitir-se, caso os deputados fossem colocados à margem do processo de revisão da Lei Fundamental.

Com o primeiro-ministro fora do país em visita oficial, coube a Freitas representar o Governo na habitual reunião das quintas-feiras. O então vice-primeiro-ministro terá perguntado a Eanes:

"Não lhe parece, Sr. Presidente, que foi longe de mais ao ameaçar demitir-se, sobretudo se não tem a intenção firme de se demitir mesmo?" Ao que Ramalho Eanes terá respondido: "Tem Razão. Eu acho que, em política, é possível usar a ameaça como arma, quando se trata de uma ameaça legítima, como era o caso. Mas é como diz: não tendo eu a intenção de me demitir, ninguém levou a ameaça a sério. Foi um erro."

'O que fazer sobre Camarate'

Na obra, Freitas do Amaral revela ainda uma conversa a sós com o então primeiro-ministro, Francisco Pinto Balsemão, em 9 de Outubro de 1981. Objectivo: "encontrar a melhor resposta à questão 'o que fazer sobre Camarate'", o acidente aéreo de que resultaram as mortes do então primeiro-ministro, Francisco Sá Carneiro, e do ministro da Defesa, Adelino Amaro da Costa.

Para Freitas do Amaral eram públicos e notórios os "erros na condução do inquérito técnico e da investigação policial", como por exemplo: "a total contradição entre as conclusões do primeiro e as da segunda [Comissão Parlamentar de Inquérito ao acidente]"; o facto de a Polícia Judiciária não ter junto o telegrama de Londres ao processo (ver texto relacionado) e de não ter ouvido até então "o principal suspeito, Lee Rodrigues".

"Por tudo isto - recomendou Freitas a Balsemão - "é indispensável entregar já o caso ao Ministério Público e, logo a seguir, levar o assunto a julgamento em tribunal. Só desse modo teremos paz. Sem isso, o caso nunca mais ficará encerrado".

Segundo Freitas, o então primeiro-ministro deu-lhe razão. "É exactamente o que penso", afirmou então Pinto Balsemão, acrescentando: "Não tenho, é claro, nenhuma razão concreta para desconfiar, nem da Polícia Judiciária, nem da comissão de Inquérito. Mas, se as duas principais autoridades do Estado Português que estudaram o caso não concordam entre si, e se uma delas admite que possa ter havido roubo de gasolina - e portanto um atentado -, não podemos descartar essa hipótese. Nem deve ser o Poder Executivo a dizer a última palavra sobre o que começa a parecer um grande mistério. É o Poder Judicial que tem de decidir o assunto".

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