Para encontrar este, mais valia não terem saído de casa Os Descobrimentos. Todos nós já ouvimos falar deles. Aliás, não ouvimos falar de outra coisa toda a nossa vida. Se bem me recordo, no meu jardim de infância ensinavam-nos a desenhar, a brincar e encontrar o caminho marítimo para a Índia. Mas de todas as ideias feitas com que nos bombardeiam sobre essa época de ouro da História de Portugal, nenhuma me espanta tanto como o mito – ou a teoria da conspiração, para usar linguagem mais actual – das extraordinárias capacidades negociais de D. João I. Todos nós já ouvimos essa lenga-lenga. Aparentemente, D. João I tinha em seu poder informações confidenciais que fizeram com que insistisse para que a linha que separaria os territórios a descobrir pelos portugueses e pelos espanhóis fosse alargada algumas centenas de milhas para leste, no Tratado de Tordesilhas. Apesar disso, os Ingleses ficaram com a maior parte do que é hoje os EUA e com a Austrália, os Espanhóis ficaram com o México, a Califórnia, o Texas e quase toda a América Latina. Nós ficámos com Cabo Verde e a Guiné-Bissau. Imaginem se D. João I não tivesse informações confidenciais. Para além do mais, se tivermos em consideração que os marinheiros não faziam a mínima ideia daquilo que tinham na frente, tecnicamente não descobriram coisa nenhuma. Se eu estiver a caminhar num jardim e tropeçar numa moeda, eu não descobri a moeda, eu encontrei-a. Os menos rigorosos podem dizer que é apenas uma questão de semântica, mas não é (aos cépticos, lembro o exemplo de um amigo meu, que insistiu com os pais que a diferença entre ser homossexual ou heterossexual era apenas uma questão de semântica). Na realidade, os descobrimentos deviam chamar-se os encontramentos. Mas talvez devido à semelhança com a palavra afrontamentos, essa denominação tenha sido preterida a favor de uma menos rigorosa, porém menos embaraçosa. Mas tudo isto começou, claro está, no início do século XIV, quando os portugueses decidiram ir para Marrocos. Os europeus davam à costa africana em barcos frágeis e os africanos diziam, uns para os outros, Pelas barbas do Profeta, mais imigrantes ilegais!
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Para encontrar este, mais valia não terem saído de casa Os Descobrimentos. Todos nós já ouvimos falar deles. Aliás, não ouvimos falar de outra coisa toda a nossa vida. Se bem me recordo, no meu jardim de infância ensinavam-nos a desenhar, a brincar e encontrar o caminho marítimo para a Índia. Mas de todas as ideias feitas com que nos bombardeiam sobre essa época de ouro da História de Portugal, nenhuma me espanta tanto como o mito – ou a teoria da conspiração, para usar linguagem mais actual – das extraordinárias capacidades negociais de D. João I. Todos nós já ouvimos essa lenga-lenga. Aparentemente, D. João I tinha em seu poder informações confidenciais que fizeram com que insistisse para que a linha que separaria os territórios a descobrir pelos portugueses e pelos espanhóis fosse alargada algumas centenas de milhas para leste, no Tratado de Tordesilhas. Apesar disso, os Ingleses ficaram com a maior parte do que é hoje os EUA e com a Austrália, os Espanhóis ficaram com o México, a Califórnia, o Texas e quase toda a América Latina. Nós ficámos com Cabo Verde e a Guiné-Bissau. Imaginem se D. João I não tivesse informações confidenciais. Para além do mais, se tivermos em consideração que os marinheiros não faziam a mínima ideia daquilo que tinham na frente, tecnicamente não descobriram coisa nenhuma. Se eu estiver a caminhar num jardim e tropeçar numa moeda, eu não descobri a moeda, eu encontrei-a. Os menos rigorosos podem dizer que é apenas uma questão de semântica, mas não é (aos cépticos, lembro o exemplo de um amigo meu, que insistiu com os pais que a diferença entre ser homossexual ou heterossexual era apenas uma questão de semântica). Na realidade, os descobrimentos deviam chamar-se os encontramentos. Mas talvez devido à semelhança com a palavra afrontamentos, essa denominação tenha sido preterida a favor de uma menos rigorosa, porém menos embaraçosa. Mas tudo isto começou, claro está, no início do século XIV, quando os portugueses decidiram ir para Marrocos. Os europeus davam à costa africana em barcos frágeis e os africanos diziam, uns para os outros, Pelas barbas do Profeta, mais imigrantes ilegais!