Um conto do meu pai. Em memória do pai mais sábio do mundo. Este conto é dedicado ao Carlos Freitas, confrade blogueiro do prosas vadias e à sua mulher. Porque de facto o mundo é pequeno... O Severino Gonçalves mais conhecido por Severino EspanholNaquele tempo, a Vide não tinha acesso fácil aos lugares ou lugarejos da sua freguesia. Não tinha estradas, mesmo de terra batida, mas sim, caminhos, entre urgueiras e barrancos. Por isso, as deslocações humanas, por transportes, eram feitas por mulas ou machos, como se estes animais fossem mula-táxi ou macho-táxi.O médico Dr. Vasco de Campos, de Avô, médico da minha família e com fortes laços de amizade, visitava, frequentemente, os seus doentes ou quando, por chamadas urgentes, em Vide ou na sua freguesia. Numa entrevista que me concedeu na Ponte das Três Entradas, aliás publicada no jornal “A Comarca de Arganil”, contou-me um episódio numa das suas visitas médicas, a uma aldeia escondida na freguesia de Vide. - Eu: - Recorde-me, Dr. Vasco, um episódio da sua vida de médico, que ficou bem gravado nas suas recordações, durante as suas caminhadas por terras do Alva e por terras serranas.- Dr. Vasco: - Por coincidência, conto ao meu bom amigo um episódio, precisamente na freguesia de Vide. Como sabe, estudo e observo com interesse, os comportamentos humanos necessários aos diagnósticos que suportam a minha vida de médico. Vou contar: fui chamado, com urgência, para acudir a um doente na sua freguesia. O Severino Espanhol era o melhor arreeiro que topei nas minhas andanças, por vezes sem descanso. Parti de Vide, montando a mula do Severino. Percorrido já um longo percurso, aliás muito mau e agreste, o Severino, bruscamente e com um forte esticão, parou a mula. Surpreendido, perguntei-lhe: - O que se passa? Justificou: Sr. Doutor estamos por cima de um barranco fundo e a pique e, por isso, a mula não pode continuar a ser montada. Agora, Sr. Doutor Vasco, daqui para adiante, só passam e andam neste caminho bestas com dois pés. Mas não esteja com essa cara, porque vai beber uma golada de vinho tinto da garrafa que aqui trago. Olhe, a minha mulher não quer que beba vinho branco, porque, diz ela, que faz mijar muito e obriga a ter muitas paragens pelo caminho. Para me acalmar da situação e ter mais coragem para continuar o caminho a pé, como se fosse a besta do Severino, bebi uma golada de vinho tinto: Ó Severino, esta palha é da melhor. Foram os agradecimentos da besta. - Eu: - Dedicado amigo Dr. Vasco, as nossas recordações nunca morrem, eternizam-se.C.N.PS: por falar em confrade, o próximo conto será sobre a confraria do carolo.
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Um conto do meu pai. Em memória do pai mais sábio do mundo. Este conto é dedicado ao Carlos Freitas, confrade blogueiro do prosas vadias e à sua mulher. Porque de facto o mundo é pequeno... O Severino Gonçalves mais conhecido por Severino EspanholNaquele tempo, a Vide não tinha acesso fácil aos lugares ou lugarejos da sua freguesia. Não tinha estradas, mesmo de terra batida, mas sim, caminhos, entre urgueiras e barrancos. Por isso, as deslocações humanas, por transportes, eram feitas por mulas ou machos, como se estes animais fossem mula-táxi ou macho-táxi.O médico Dr. Vasco de Campos, de Avô, médico da minha família e com fortes laços de amizade, visitava, frequentemente, os seus doentes ou quando, por chamadas urgentes, em Vide ou na sua freguesia. Numa entrevista que me concedeu na Ponte das Três Entradas, aliás publicada no jornal “A Comarca de Arganil”, contou-me um episódio numa das suas visitas médicas, a uma aldeia escondida na freguesia de Vide. - Eu: - Recorde-me, Dr. Vasco, um episódio da sua vida de médico, que ficou bem gravado nas suas recordações, durante as suas caminhadas por terras do Alva e por terras serranas.- Dr. Vasco: - Por coincidência, conto ao meu bom amigo um episódio, precisamente na freguesia de Vide. Como sabe, estudo e observo com interesse, os comportamentos humanos necessários aos diagnósticos que suportam a minha vida de médico. Vou contar: fui chamado, com urgência, para acudir a um doente na sua freguesia. O Severino Espanhol era o melhor arreeiro que topei nas minhas andanças, por vezes sem descanso. Parti de Vide, montando a mula do Severino. Percorrido já um longo percurso, aliás muito mau e agreste, o Severino, bruscamente e com um forte esticão, parou a mula. Surpreendido, perguntei-lhe: - O que se passa? Justificou: Sr. Doutor estamos por cima de um barranco fundo e a pique e, por isso, a mula não pode continuar a ser montada. Agora, Sr. Doutor Vasco, daqui para adiante, só passam e andam neste caminho bestas com dois pés. Mas não esteja com essa cara, porque vai beber uma golada de vinho tinto da garrafa que aqui trago. Olhe, a minha mulher não quer que beba vinho branco, porque, diz ela, que faz mijar muito e obriga a ter muitas paragens pelo caminho. Para me acalmar da situação e ter mais coragem para continuar o caminho a pé, como se fosse a besta do Severino, bebi uma golada de vinho tinto: Ó Severino, esta palha é da melhor. Foram os agradecimentos da besta. - Eu: - Dedicado amigo Dr. Vasco, as nossas recordações nunca morrem, eternizam-se.C.N.PS: por falar em confrade, o próximo conto será sobre a confraria do carolo.