Sobre o tempo que passa: Quem verbera governantes pratica actos de indisciplina, com irreverente e grave conduta, revelando impossibilidade de adaptação às funções docentes

19-12-2009
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Tenho muito orgulho em ser funcionário público, ter um "ofício", ser "vicarium", estar integrado numa instituição e servir uma ideia. Começo a ter vergonha de estar na função pública deste Estado a que chegámos. E quase todos os dias me apetece ir ao meu aforro e publicar, do meu bolso, um grande anúncio num jornal de grande circulação, pedindo que me dêem emprego para aquilo que sei fazer, longe destas castas capitaleiras e partidocráticas que assaltaram os aparelhos, onde o lastro inquisitorial e pidesco nos asfixia, especialmente com o recente regresso às denunciações de ouvida, com colegas e com chefezinhos a aceitarem as vilanias e a difundirem bufarias.Por hoje não falo no caso do funcionário que fez comentários jocosos sobre o senhor primeiro-ministro. Nem de mais recentes actos de persiganga noutros locais. Nem sequer temo que, do Partido Socialista, tenham desaparecido os liberdadeiros. Esses que andam distraídos com tanta azáfama e nem reparam nos estalinistas não reciclados que se infiltraram nos meandros dessa velha e fundamental casa da resistência à opressão.Apenas recordo o ano de 1962, quando 47 professores universitários de Lisboa apoiaram formalmente a posição dos estudantes, em revolta, através de uma carta enviada ao Presidente da República. Um deles, socialista e liberdadeiro de sempre, até é então demitido de professor de uma dessas unidades orgânicas pelo governo. O ministro e director da escola, que o convidara para regressar a Portugal, não subscreve formalmente tal acto de saneamento, obedecendo plenamente à hipócrita legalidade, dado que deixa a subscrição de tal violência para um dos seus ajudantes. O corajoso professor é demitido em 16 de Agosto, porque, em 13 de Maio, pondo em prática o seu feito de homem livre, escreve uma carta ao director da escola em que verberava a maneira como o Ministério tem conduzido a questão estudantil. O alto hierarca ministerial conclui pela indisciplina, irreverente e grave conduta, que revela, de facto, impossibilidade de adaptação às exigências da função que exerce. O corajoso professor há-se voltar a demitir-se como ministro em pleno gonçalvismo, para transformar-se num dos semeadores da resistência ao novo totalitarismo. Não consta que tenha praticado vindictas, mesmo contra o ministro salazarista que o demitira, tão vermicamente.Apesar de defendido, entre outros, por um futuro ministro do mesmo Salazar, acaba formalmente demitido da função pública e o Supremo Tribunal Administrativo, entre cujos juízes se inclui um futuro provedor de justiça da democracia, dá servil razão ao governo. O supremo responsável ministerial pelo processo, menos de meio século volvido, há-de vir a ser elevado a paradigma de professor e de pensador político, graças aos modelos de revisionismo histórico em que costuma ser hábil.O processo em causa está integralmente reproduzido em José Magalhães Godinho, Causas que Foram Casos. Eu pensava que tais peças faziam parte do pretérito imperfeito e não do presente incerto que nos asfixia e nos começa a proibir as necessárias saudades de futuro. Os vermes regressaram em força, carimbados com a categoria de especialistas em contra-subversão e análise de informação, reclamando até o legado do tal ministro salazarento e saneador, por interposto ajudante. A democracia dos homens livres vai apodrecendo e não convém que o PS se deixe cabralizar pelos novos zés dos cónegos que nele pedem tachos. Pela Santa Liberdade, pelejar até morrer!


Tenho muito orgulho em ser funcionário público, ter um "ofício", ser "vicarium", estar integrado numa instituição e servir uma ideia. Começo a ter vergonha de estar na função pública deste Estado a que chegámos. E quase todos os dias me apetece ir ao meu aforro e publicar, do meu bolso, um grande anúncio num jornal de grande circulação, pedindo que me dêem emprego para aquilo que sei fazer, longe destas castas capitaleiras e partidocráticas que assaltaram os aparelhos, onde o lastro inquisitorial e pidesco nos asfixia, especialmente com o recente regresso às denunciações de ouvida, com colegas e com chefezinhos a aceitarem as vilanias e a difundirem bufarias.Por hoje não falo no caso do funcionário que fez comentários jocosos sobre o senhor primeiro-ministro. Nem de mais recentes actos de persiganga noutros locais. Nem sequer temo que, do Partido Socialista, tenham desaparecido os liberdadeiros. Esses que andam distraídos com tanta azáfama e nem reparam nos estalinistas não reciclados que se infiltraram nos meandros dessa velha e fundamental casa da resistência à opressão.Apenas recordo o ano de 1962, quando 47 professores universitários de Lisboa apoiaram formalmente a posição dos estudantes, em revolta, através de uma carta enviada ao Presidente da República. Um deles, socialista e liberdadeiro de sempre, até é então demitido de professor de uma dessas unidades orgânicas pelo governo. O ministro e director da escola, que o convidara para regressar a Portugal, não subscreve formalmente tal acto de saneamento, obedecendo plenamente à hipócrita legalidade, dado que deixa a subscrição de tal violência para um dos seus ajudantes. O corajoso professor é demitido em 16 de Agosto, porque, em 13 de Maio, pondo em prática o seu feito de homem livre, escreve uma carta ao director da escola em que verberava a maneira como o Ministério tem conduzido a questão estudantil. O alto hierarca ministerial conclui pela indisciplina, irreverente e grave conduta, que revela, de facto, impossibilidade de adaptação às exigências da função que exerce. O corajoso professor há-se voltar a demitir-se como ministro em pleno gonçalvismo, para transformar-se num dos semeadores da resistência ao novo totalitarismo. Não consta que tenha praticado vindictas, mesmo contra o ministro salazarista que o demitira, tão vermicamente.Apesar de defendido, entre outros, por um futuro ministro do mesmo Salazar, acaba formalmente demitido da função pública e o Supremo Tribunal Administrativo, entre cujos juízes se inclui um futuro provedor de justiça da democracia, dá servil razão ao governo. O supremo responsável ministerial pelo processo, menos de meio século volvido, há-de vir a ser elevado a paradigma de professor e de pensador político, graças aos modelos de revisionismo histórico em que costuma ser hábil.O processo em causa está integralmente reproduzido em José Magalhães Godinho, Causas que Foram Casos. Eu pensava que tais peças faziam parte do pretérito imperfeito e não do presente incerto que nos asfixia e nos começa a proibir as necessárias saudades de futuro. Os vermes regressaram em força, carimbados com a categoria de especialistas em contra-subversão e análise de informação, reclamando até o legado do tal ministro salazarento e saneador, por interposto ajudante. A democracia dos homens livres vai apodrecendo e não convém que o PS se deixe cabralizar pelos novos zés dos cónegos que nele pedem tachos. Pela Santa Liberdade, pelejar até morrer!

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