o tempo das cerejas*: Arsénico e rendas velhas

06-08-2010
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Há quase 20 anos ! Era fatal como o destino: anteontem, no habitual frente-a-frente na SIC Notícias, lá apanhei o dr. José Luís Arnaut, do PSD, a explicar com generoso desprendimento e incomparável sentido de justiça social que não fazia sentido nenhum que uma pessoa como ele pagasse pelo recurso ao Serviço Nacional da Saúde o mesmo que portugueses claramente carenciados e com um baixo nível de rendimentos.
Entretanto, antes mesmo de entrar no fundo da questão que aqui me traz, quero explicar caridosamente ao dr. José Luis Arnaut e a tantos outros que dizem querer pagar mais que os desfavorecidos que hospitais públicos não estão proibidos de receber donativos ou ofertas e que eu conheço mesmo uma pessoa amiga que, sendo rica, e grata pela qualidade dos delicados serviços que recebeu num deles, ofereceu a uma unidade hospitalar um equipamento no valor de cerca de 20 mil euros. Portanto, José Luís Arnaut e tutti quanti andam atormentados com os benefícios que usufruem no SNS podem sempre adoptar uma atitude similar.
Por outro lado, acontece certamente que, hoje em dia, haverá muitos cidadãos que, por razões da sua idade, podem pensar que propostas como a do PSD e respectivas discussões são coisa de há poucos anos. Ora, a verdade é que são velhas e relhas e só a congénita hipocrisia e falta de vergonha da direita lhe pode permitir que, alegadamente para enfrentar os tempos actuais, acabem sempre por ir buscar ao baú propostas que estão cheias de bafio pela passagem do tempo.
Como é sabido, escrever ao longo dos anos, ajuda muito à memória. E é por isso que aqui posso contar que, para não ir mais atrás, para aí na recta final do cavaquismo, ou mais precisamente talvez em 1992, escrevi um artigo para um número da revista POLÍTIKA que já não chegou a sair e que era precisamente dedicado a este tema da diferenciação de rendimentos em termos de pagamento por serviços públicos, já então lançado pela direita. E desse artigo, de que não conservei cópia, há três coisas de que me lembro perfeitamente.
Por ordem decrescente de importância e de seriedade, a primeira é que salientava naturalmente que é em sede de impostos e da sua progressividade que se obtém a equidade social nesta matéria. Se há pessoas que se dizem chocadas por pagarem o mesmo que os pobres no SNS então façam favor de não fugir tanto ao fisco e mostrem-se abertas a aceitar taxas de IRS mais elevadas, se necessário for.
A segunda é que eu lembrava que a questão não podia ser limitada ao SNS porque, pela lógica destes «queixosos», também devia então ser aplicada à frequência da escola pública, designadamente no básico e no secundário, e também já agora a esse escândalo monumental constituído por até os milionários, se quiserem, poderem comparar passes sociais para os transportes públicos. E, por fim, a terceira era que, para fazer a vontade aos proponentes deste critério de diferenciação de rendimentos no acesso e pagamento de serviços públicos, como não seria adequado andarmos com estrelas de diversas cores cozidas na roupa, seria pelo menos indispensável que a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos passasse a emitir anualmente para cada contribuinte um prático e corrente cartão plastificado onde estivesse bem visível a letra (A, B, C, D, E, etc.) correspondente ao escalão de rendimentos de cada um.


Há quase 20 anos ! Era fatal como o destino: anteontem, no habitual frente-a-frente na SIC Notícias, lá apanhei o dr. José Luís Arnaut, do PSD, a explicar com generoso desprendimento e incomparável sentido de justiça social que não fazia sentido nenhum que uma pessoa como ele pagasse pelo recurso ao Serviço Nacional da Saúde o mesmo que portugueses claramente carenciados e com um baixo nível de rendimentos.
Entretanto, antes mesmo de entrar no fundo da questão que aqui me traz, quero explicar caridosamente ao dr. José Luis Arnaut e a tantos outros que dizem querer pagar mais que os desfavorecidos que hospitais públicos não estão proibidos de receber donativos ou ofertas e que eu conheço mesmo uma pessoa amiga que, sendo rica, e grata pela qualidade dos delicados serviços que recebeu num deles, ofereceu a uma unidade hospitalar um equipamento no valor de cerca de 20 mil euros. Portanto, José Luís Arnaut e tutti quanti andam atormentados com os benefícios que usufruem no SNS podem sempre adoptar uma atitude similar.
Por outro lado, acontece certamente que, hoje em dia, haverá muitos cidadãos que, por razões da sua idade, podem pensar que propostas como a do PSD e respectivas discussões são coisa de há poucos anos. Ora, a verdade é que são velhas e relhas e só a congénita hipocrisia e falta de vergonha da direita lhe pode permitir que, alegadamente para enfrentar os tempos actuais, acabem sempre por ir buscar ao baú propostas que estão cheias de bafio pela passagem do tempo.
Como é sabido, escrever ao longo dos anos, ajuda muito à memória. E é por isso que aqui posso contar que, para não ir mais atrás, para aí na recta final do cavaquismo, ou mais precisamente talvez em 1992, escrevi um artigo para um número da revista POLÍTIKA que já não chegou a sair e que era precisamente dedicado a este tema da diferenciação de rendimentos em termos de pagamento por serviços públicos, já então lançado pela direita. E desse artigo, de que não conservei cópia, há três coisas de que me lembro perfeitamente.
Por ordem decrescente de importância e de seriedade, a primeira é que salientava naturalmente que é em sede de impostos e da sua progressividade que se obtém a equidade social nesta matéria. Se há pessoas que se dizem chocadas por pagarem o mesmo que os pobres no SNS então façam favor de não fugir tanto ao fisco e mostrem-se abertas a aceitar taxas de IRS mais elevadas, se necessário for.
A segunda é que eu lembrava que a questão não podia ser limitada ao SNS porque, pela lógica destes «queixosos», também devia então ser aplicada à frequência da escola pública, designadamente no básico e no secundário, e também já agora a esse escândalo monumental constituído por até os milionários, se quiserem, poderem comparar passes sociais para os transportes públicos. E, por fim, a terceira era que, para fazer a vontade aos proponentes deste critério de diferenciação de rendimentos no acesso e pagamento de serviços públicos, como não seria adequado andarmos com estrelas de diversas cores cozidas na roupa, seria pelo menos indispensável que a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos passasse a emitir anualmente para cada contribuinte um prático e corrente cartão plastificado onde estivesse bem visível a letra (A, B, C, D, E, etc.) correspondente ao escalão de rendimentos de cada um.

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