Manuel Alegre, o Dom Quixote socialista

08-01-2011
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Um outro episódio que é frequentemente contado como uma espécie de anedota prende-se com a utilização excessiva do automóvel e do motorista contratado pela AR, a que Alegre tinha direito enquanto vice-presidente. Não há quem não conheça o "cão de caça" do poeta - o seu motorista, a quem cabia também apanhar a caça no Alentejo - e recorde que, sem estar no exercício do seu cargo, o deputado abusava dos privilégios que lhe eram atribuídos. Nomeadamente do carro e do condutor: a utilização do veículo implicava que gasolina e portagens eram pagas pela AR, tal como as horas extraordinárias, sublinhou uma outra fonte do Parlamento.Contactado pelo P2, Manuel Alegre diz que o primeiro dos episódios relatados "é totalmente falso". Quanto à segunda das histórias, o candidato esclarece que o carro de que dispunha quando era vice-presidente da AR foi-lhe atribuído "a título pessoal": "Cheguei a prescindir do abono dado pela Assembleia para as deslocações, pelo que podia usar o carro à vontade." E a caça? "Posso ter ido uma ou outra vez..."

Ninguém me cala

Além dos funcionários da AR, há também muitos socialistas que não morrem de amores por Alegre. Ao longo de mais de três décadas no Parlamento, foi na sua bancada e no seu partido que ele originou mais ódios de estimação. Sobretudo durante os Governos de António Guterres, quando os casos Vizela, co-incineração e despenalização do aborto elevaram o candidato ao estatuto de rebelde com causas e de transgressor da disciplina partidária.

Nos tempos mais quentes da discussão sobre a interrupção voluntária da gravidez, cujo primeiro referendo aconteceu em 1998, tendo Guterres admitido votar "não", Alegre nem sequer participava nas reuniões do grupo parlamentar. Um dia, julgando que a bancada iria debater a despenalização do aborto, apareceu na reunião e foi surpreendido com uma mudança repentina de tema. Saiu-lhe a regionalização (que ele ainda hoje contesta). Mas não desarmou: displicentemente pôs-se a ler o Manifesto do Surrealismo, de André Breton, que trazia numa pasta, contou a revista Focus.

As críticas a Guterres e à tentativa do primeiro-ministro e secretário-geral de "governamentalizar" o PS, aproximando-se simultaneamente do chamado "centrão", provocaram a organização, entre socialistas, de verdadeiros esquadrões anti-Alegre. José Lello, socialista de serviço para o contra-ataque interno, chegou, em 1997, a avisá-lo de que seria melhor abandonar o partido se não silenciasse as críticas ao Governo. O poeta desvalorizou o recado, mas não deixou de acicatar o então secretário de Estado: "José Lello é um bobo do partido. É um bobo de Estado. E gosta sobretudo de ser bobo da corte."

Depois de Lello, apareceu um dos chamados pesos-pesados do partido: ainda em 97, António Costa, ministro dos Assuntos Parlamentares, afirmou que "deixou de haver liberdade no PS para os que pensam como Manuel Alegre e outros guardiões do templo". Em causa estavam não apenas as afirmações do escritor em diversas entrevistas - o Governo "não é de esquerda nem de direita", proclamava - mas também os artigos que, semanalmente, publicava no Expresso. Um deles, titulado Um pouco mais de esquerda, desafiou a paciência dos socialistas: escreveu sobre a "descaracterização e a diluição ideológica e política" do PS, alertando para o "risco" de o partido "cair na lógica que tanto se criticou ao PSD - a da governamentalização do partido". "O que não é bom", continuava, "nem para o PS, nem para o Governo, nem para a democracia. Muito menos para uma perspectiva de esquerda em Portugal".

Um outro episódio que é frequentemente contado como uma espécie de anedota prende-se com a utilização excessiva do automóvel e do motorista contratado pela AR, a que Alegre tinha direito enquanto vice-presidente. Não há quem não conheça o "cão de caça" do poeta - o seu motorista, a quem cabia também apanhar a caça no Alentejo - e recorde que, sem estar no exercício do seu cargo, o deputado abusava dos privilégios que lhe eram atribuídos. Nomeadamente do carro e do condutor: a utilização do veículo implicava que gasolina e portagens eram pagas pela AR, tal como as horas extraordinárias, sublinhou uma outra fonte do Parlamento.Contactado pelo P2, Manuel Alegre diz que o primeiro dos episódios relatados "é totalmente falso". Quanto à segunda das histórias, o candidato esclarece que o carro de que dispunha quando era vice-presidente da AR foi-lhe atribuído "a título pessoal": "Cheguei a prescindir do abono dado pela Assembleia para as deslocações, pelo que podia usar o carro à vontade." E a caça? "Posso ter ido uma ou outra vez..."

Ninguém me cala

Além dos funcionários da AR, há também muitos socialistas que não morrem de amores por Alegre. Ao longo de mais de três décadas no Parlamento, foi na sua bancada e no seu partido que ele originou mais ódios de estimação. Sobretudo durante os Governos de António Guterres, quando os casos Vizela, co-incineração e despenalização do aborto elevaram o candidato ao estatuto de rebelde com causas e de transgressor da disciplina partidária.

Nos tempos mais quentes da discussão sobre a interrupção voluntária da gravidez, cujo primeiro referendo aconteceu em 1998, tendo Guterres admitido votar "não", Alegre nem sequer participava nas reuniões do grupo parlamentar. Um dia, julgando que a bancada iria debater a despenalização do aborto, apareceu na reunião e foi surpreendido com uma mudança repentina de tema. Saiu-lhe a regionalização (que ele ainda hoje contesta). Mas não desarmou: displicentemente pôs-se a ler o Manifesto do Surrealismo, de André Breton, que trazia numa pasta, contou a revista Focus.

As críticas a Guterres e à tentativa do primeiro-ministro e secretário-geral de "governamentalizar" o PS, aproximando-se simultaneamente do chamado "centrão", provocaram a organização, entre socialistas, de verdadeiros esquadrões anti-Alegre. José Lello, socialista de serviço para o contra-ataque interno, chegou, em 1997, a avisá-lo de que seria melhor abandonar o partido se não silenciasse as críticas ao Governo. O poeta desvalorizou o recado, mas não deixou de acicatar o então secretário de Estado: "José Lello é um bobo do partido. É um bobo de Estado. E gosta sobretudo de ser bobo da corte."

Depois de Lello, apareceu um dos chamados pesos-pesados do partido: ainda em 97, António Costa, ministro dos Assuntos Parlamentares, afirmou que "deixou de haver liberdade no PS para os que pensam como Manuel Alegre e outros guardiões do templo". Em causa estavam não apenas as afirmações do escritor em diversas entrevistas - o Governo "não é de esquerda nem de direita", proclamava - mas também os artigos que, semanalmente, publicava no Expresso. Um deles, titulado Um pouco mais de esquerda, desafiou a paciência dos socialistas: escreveu sobre a "descaracterização e a diluição ideológica e política" do PS, alertando para o "risco" de o partido "cair na lógica que tanto se criticou ao PSD - a da governamentalização do partido". "O que não é bom", continuava, "nem para o PS, nem para o Governo, nem para a democracia. Muito menos para uma perspectiva de esquerda em Portugal".

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