A escada de Penrose: O semi-presidente

18-12-2009
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O CASOEm resposta a afirmações de José Junqueiro e Vitalino Canas, referindo que assessores do presidente da república colaboram na elaboração do programa do PSD (o que é totalmente legítimo, mas eticamente, partindo de um órgão de soberania que se quer apartidário, pouco recomendável), uma fonte da presidência deixou escapar para a comunicação social (o termo inglês leak é muito mais certeiro) que, para alguém ter conhecimento de tal facto, isso significaria que a mesma teria que estar sob vigilância; o que, a ser verdade, só poderia ser ao serviço do Partido Socialista e conduzido, evidentemente, a partir do governo, que é quem tem os recursos para tal. Claro que em seguida se descobriu que o facto não era tão secreto assim, pois estava bem visível no site de campanha do PSD, Política de Verdade, onde se afirma que «Ferreira Leite faz o programa com Catroga e assessores de Belém».Perante isto, como pode a presidência reagir? É evidente que um comunicado sobre o assunto seria despropositado e resultaria num prolongar do triste episódio. Mas com não menos despropósito já o presidente se referiu ao incidente de Pinho no parlamento e aceitou visitar a Madeira proibido de ir à assembleia regional por Jardim. Adiante.Mas o que este caso revela é que a presidência da república lançou a primeira insinuação das muitas que por aí virão, daqui até 27 de Setembro, e, nesse sentido, tomou definitivamente posição no xadrez eleitoral; isto é, Cavaco Silva deixou de ser, como todos os eleitos para o cargo apregoam, presidente de todos os portugueses, para passar a ser presidente dos que o elegeram, ou de parte deles.O ENQUADRAMENTOFace à estrondosa derrota nas últimas legislativas, muitos na direita viram na posterior eleição de Cavaco Silva uma hipótese de regresso ao poder, tendo o seu centro de gravidade em Belém. Confesso que na altura a hipótese me pareceu absurda, até porque, apesar de estar impedido de votar nele por razões ideológicas, tinha o professor de economia como homem de Estado, e estava convencido de que, pelo menos durante o primeiro mandato, agiria de acordo com a imparcialidade que o cargo recomenda. Mas os sinais estavam lá. Desde logo a figura de Ramalho Eanes (apoiante da sua candidatura), que durante os seus mandatos tentou dirigir o país a partir de Belém, tendo por isso comprado guerras com Mário Soares e Sá Carneiro. De facto, Cavaco Silva é um homem de acção, e com dificuldade se remeterá ao papel que a constituição lhe reserva. Os resultados das eleições europeias abriram-lhe a janela de oportunidade perfeita, até porque dificilmente poderia num futuro próximo ter um líder do PSD que se prestasse tanto a esse papel de espelho como Manuela Ferreira Leite. O que Cavaco esquece, bem como quem com ele cavalga por essa senda, é que a constituição portuguesa define um regime tido como semi-presidencialista, e que o que os portugueses esperam do seu presidente é uma magistratura de influência pautada, evidentemente, pelos códigos ideológicos do titular do cargo, mas sem que o último use o seu magistério ao serviço dos primeiros.Esse comportamento será julgado na devida altura. Mas até lá, uma vez que o presidente parece ter abdicado de representar todos os portugueses, pondo-se ao serviço do interesse próprio e do de alguns, e ter esquecido que o regime português não é presidencialista, talvez devêssemos, em primeiro lugar, não contribuir com o nosso voto para essa estratégia, e em segundo, começar a referir-nos a ele como semi-presidente. Para pô-lo no devido lugar.


O CASOEm resposta a afirmações de José Junqueiro e Vitalino Canas, referindo que assessores do presidente da república colaboram na elaboração do programa do PSD (o que é totalmente legítimo, mas eticamente, partindo de um órgão de soberania que se quer apartidário, pouco recomendável), uma fonte da presidência deixou escapar para a comunicação social (o termo inglês leak é muito mais certeiro) que, para alguém ter conhecimento de tal facto, isso significaria que a mesma teria que estar sob vigilância; o que, a ser verdade, só poderia ser ao serviço do Partido Socialista e conduzido, evidentemente, a partir do governo, que é quem tem os recursos para tal. Claro que em seguida se descobriu que o facto não era tão secreto assim, pois estava bem visível no site de campanha do PSD, Política de Verdade, onde se afirma que «Ferreira Leite faz o programa com Catroga e assessores de Belém».Perante isto, como pode a presidência reagir? É evidente que um comunicado sobre o assunto seria despropositado e resultaria num prolongar do triste episódio. Mas com não menos despropósito já o presidente se referiu ao incidente de Pinho no parlamento e aceitou visitar a Madeira proibido de ir à assembleia regional por Jardim. Adiante.Mas o que este caso revela é que a presidência da república lançou a primeira insinuação das muitas que por aí virão, daqui até 27 de Setembro, e, nesse sentido, tomou definitivamente posição no xadrez eleitoral; isto é, Cavaco Silva deixou de ser, como todos os eleitos para o cargo apregoam, presidente de todos os portugueses, para passar a ser presidente dos que o elegeram, ou de parte deles.O ENQUADRAMENTOFace à estrondosa derrota nas últimas legislativas, muitos na direita viram na posterior eleição de Cavaco Silva uma hipótese de regresso ao poder, tendo o seu centro de gravidade em Belém. Confesso que na altura a hipótese me pareceu absurda, até porque, apesar de estar impedido de votar nele por razões ideológicas, tinha o professor de economia como homem de Estado, e estava convencido de que, pelo menos durante o primeiro mandato, agiria de acordo com a imparcialidade que o cargo recomenda. Mas os sinais estavam lá. Desde logo a figura de Ramalho Eanes (apoiante da sua candidatura), que durante os seus mandatos tentou dirigir o país a partir de Belém, tendo por isso comprado guerras com Mário Soares e Sá Carneiro. De facto, Cavaco Silva é um homem de acção, e com dificuldade se remeterá ao papel que a constituição lhe reserva. Os resultados das eleições europeias abriram-lhe a janela de oportunidade perfeita, até porque dificilmente poderia num futuro próximo ter um líder do PSD que se prestasse tanto a esse papel de espelho como Manuela Ferreira Leite. O que Cavaco esquece, bem como quem com ele cavalga por essa senda, é que a constituição portuguesa define um regime tido como semi-presidencialista, e que o que os portugueses esperam do seu presidente é uma magistratura de influência pautada, evidentemente, pelos códigos ideológicos do titular do cargo, mas sem que o último use o seu magistério ao serviço dos primeiros.Esse comportamento será julgado na devida altura. Mas até lá, uma vez que o presidente parece ter abdicado de representar todos os portugueses, pondo-se ao serviço do interesse próprio e do de alguns, e ter esquecido que o regime português não é presidencialista, talvez devêssemos, em primeiro lugar, não contribuir com o nosso voto para essa estratégia, e em segundo, começar a referir-nos a ele como semi-presidente. Para pô-lo no devido lugar.

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