Ministro usa crise para "fugir" à Constituição nos impostos

07-06-2010
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Teixeira dos Santos admite a retroactividade no IRS e não exclui aumentar mais os impostos. Plano de austeridade avança com PS e PSD

Teixeira dos Santos deixou uma espécie de "esperemos que não" a meio do debate no Parlamento sobre o plano de austeridade e saiu. Atravessou os Passos Perdidos e não disse mais nada sobre um novo aumento de impostos este ano. A pergunta, directa, foi da deputada do CDS Assunção Cristas. A resposta foi tudo menos categórica. "Eu espero que sejam os últimos [aumentos] este ano", disse o ministro, num debate em que admitiu que há valores que se sobrepõem ao princípio constitucional da não-retroactividade dos impostos.

"Não é um princípio absoluto", apesar de estar "protegido pela Constituição". Há outros que se sobrepõem porque está "em causa a economia, o emprego e o futuro de todos nós". Por outras palavras: "A retroactividade é um princípio protegido na Constituição mas não é um princípio absoluto que se sobreponha ao bem público e ao carácter imprescindível e de emergência."

O debate foi longo e pela sala do plenário repetiram-se argumentos. O ministro insistiu na urgência das medidas, após o ataque especulativo ao euro e à divida soberana, elogiou o PSD pelo acordo para "a consolidação" orçamental, um "esforço repartido por todos", algo que toda a oposição contestou.

O CDS não poupou o parceiro do Governo neste aumento de impostos - "o maior de sempre", disse Paulo Portas - e questionou o PSD se iria apoiar a proposta para não haver retroactividade dos aumentos. O líder parlamentar, Mota Soares, leu uma frase do fiscalista Diogo Leite de Campos, vice-presidente de Passos Coelho, ao Correio da Manhã, em que dizia que a "a aplicação de uma taxa de imposto antes da sua entrada em vigor é retroactiva". Era a referência à publicação das tabelas de retenção na fonte do IRS, na semana passada, quando a lei está ainda no Parlamento. Foi ontem aprovada na generalidade, segue agora para o debate na especialidade e só no dia 9 de Junho terá a sua votação final global. Ao desafio de saber se apoiaria a proposta do CDS, o PSD respondeu com silêncio.

PSD desafina... pouco

A bancada "laranja" apresentou uma declaração de voto, mas houve mais duas. A de Pacheco Pereira, que não quis explicar as suas razões. E a de António Preto, que defende uma reflexão séria sobre a continuação dos benefícios fiscais. "As dificuldades do país exigem o esforço concertado de todos e justifica que nos interroguemos, de forma séria e rigorosa, sobre a manutenção ou revogação de alguns benefícios fiscais", lê-se no texto subscrito por António Preto.

A direcção da bancada foi informada destas duas declarações de voto. Ao que apurou o PÚBLICO, há um grupo de deputados que preferia a abstenção do partido no pacote ontem aprovado, a exemplo do que a ex-líder Manuela Ferreira Leite fez relativamente ao Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC). Assim, nas palavras de um desses deputados, evitar-se-ia que o PSD surgisse "ao lado" do Governo de Sócrates numa medida tão sensível como o aumento de impostos. No entanto, a expressão do desconforto ficou circunscrita às declarações de voto de Pacheco Pereira e António Preto.

De resto, o ministro das Finanças assumiu a impopularidade das medidas aprovadas e que o seu impacto no crescimento público será maior em 2011. Era a resposta de Teixeira dos Santos não só às questões do CDS, mas também da esquerda. Francisco Louçã, do Bloco, atirou que o plano aprovado pelo PS e PSD é "quanto pior melhor", é "um disparate político" e um ataque à economia. E atacou Passos Coelho por ter admitido o recurso ao Fundo de Emergência Europeu.

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Momento do debate com riso à mistura foi o de José Gusmão. O deputado do BE utilizou o encontro de Sócrates com Chico Buarque, no Rio de Janeiro, e a letra da Ópera dos Malandros para criticar o plano: "Para citar Chico Buarque, que o primeiro-ministro tentou, à força, transformar em seu admirador, "Os malandros com retrato na coluna social, os malandros com contrato, com gravata e capital, que nunca se dão mal", esses, dependendo do Governo, vão continuar a não se dar mal."

Pelo PCP, Honório Novo anotou "a rábula das divergências" entre PS e PSD e acusou os sociais-democratas de darem a mão, não ao país, como Passos Coelho disse para justificar o acordo com Sócrates, mas para "um aumento de impostos que penaliza os mais fracos". A crise, quem a paga é quem paga impostos, mas o sistema bancário e financeiro, "afinal alguns dos principais responsáveis pela crise", "não é beliscado". E lembrou a manifestação da CGTP de sábado em que o plano de austeridade foi "condenado nas ruas de Lisboa por 300 mil portugueses".

O PSD actuou em dois momentos. Primeiro fez avançar Paulo Santos e Duarte Pacheco, para reafirmar a tese de "dar a mão" ao país, sem deixar de alertar para a necessidade de controlo no endividamento ou de cortes nas despesas do Estado. Miguel Macedo veio no fim, para dizer que, apesar da crise especulativa, a situação do país é grave porque Sócrates insistiu em "políticas erradas" durante os seus cinco anos de governação. Sem acordo Governo-PSD, o país estaria a caminho do abismo, de acordo com o texto da declaração de voto do PSD. com Ana Rita Faria

Teixeira dos Santos admite a retroactividade no IRS e não exclui aumentar mais os impostos. Plano de austeridade avança com PS e PSD

Teixeira dos Santos deixou uma espécie de "esperemos que não" a meio do debate no Parlamento sobre o plano de austeridade e saiu. Atravessou os Passos Perdidos e não disse mais nada sobre um novo aumento de impostos este ano. A pergunta, directa, foi da deputada do CDS Assunção Cristas. A resposta foi tudo menos categórica. "Eu espero que sejam os últimos [aumentos] este ano", disse o ministro, num debate em que admitiu que há valores que se sobrepõem ao princípio constitucional da não-retroactividade dos impostos.

"Não é um princípio absoluto", apesar de estar "protegido pela Constituição". Há outros que se sobrepõem porque está "em causa a economia, o emprego e o futuro de todos nós". Por outras palavras: "A retroactividade é um princípio protegido na Constituição mas não é um princípio absoluto que se sobreponha ao bem público e ao carácter imprescindível e de emergência."

O debate foi longo e pela sala do plenário repetiram-se argumentos. O ministro insistiu na urgência das medidas, após o ataque especulativo ao euro e à divida soberana, elogiou o PSD pelo acordo para "a consolidação" orçamental, um "esforço repartido por todos", algo que toda a oposição contestou.

O CDS não poupou o parceiro do Governo neste aumento de impostos - "o maior de sempre", disse Paulo Portas - e questionou o PSD se iria apoiar a proposta para não haver retroactividade dos aumentos. O líder parlamentar, Mota Soares, leu uma frase do fiscalista Diogo Leite de Campos, vice-presidente de Passos Coelho, ao Correio da Manhã, em que dizia que a "a aplicação de uma taxa de imposto antes da sua entrada em vigor é retroactiva". Era a referência à publicação das tabelas de retenção na fonte do IRS, na semana passada, quando a lei está ainda no Parlamento. Foi ontem aprovada na generalidade, segue agora para o debate na especialidade e só no dia 9 de Junho terá a sua votação final global. Ao desafio de saber se apoiaria a proposta do CDS, o PSD respondeu com silêncio.

PSD desafina... pouco

A bancada "laranja" apresentou uma declaração de voto, mas houve mais duas. A de Pacheco Pereira, que não quis explicar as suas razões. E a de António Preto, que defende uma reflexão séria sobre a continuação dos benefícios fiscais. "As dificuldades do país exigem o esforço concertado de todos e justifica que nos interroguemos, de forma séria e rigorosa, sobre a manutenção ou revogação de alguns benefícios fiscais", lê-se no texto subscrito por António Preto.

A direcção da bancada foi informada destas duas declarações de voto. Ao que apurou o PÚBLICO, há um grupo de deputados que preferia a abstenção do partido no pacote ontem aprovado, a exemplo do que a ex-líder Manuela Ferreira Leite fez relativamente ao Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC). Assim, nas palavras de um desses deputados, evitar-se-ia que o PSD surgisse "ao lado" do Governo de Sócrates numa medida tão sensível como o aumento de impostos. No entanto, a expressão do desconforto ficou circunscrita às declarações de voto de Pacheco Pereira e António Preto.

De resto, o ministro das Finanças assumiu a impopularidade das medidas aprovadas e que o seu impacto no crescimento público será maior em 2011. Era a resposta de Teixeira dos Santos não só às questões do CDS, mas também da esquerda. Francisco Louçã, do Bloco, atirou que o plano aprovado pelo PS e PSD é "quanto pior melhor", é "um disparate político" e um ataque à economia. E atacou Passos Coelho por ter admitido o recurso ao Fundo de Emergência Europeu.

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Momento do debate com riso à mistura foi o de José Gusmão. O deputado do BE utilizou o encontro de Sócrates com Chico Buarque, no Rio de Janeiro, e a letra da Ópera dos Malandros para criticar o plano: "Para citar Chico Buarque, que o primeiro-ministro tentou, à força, transformar em seu admirador, "Os malandros com retrato na coluna social, os malandros com contrato, com gravata e capital, que nunca se dão mal", esses, dependendo do Governo, vão continuar a não se dar mal."

Pelo PCP, Honório Novo anotou "a rábula das divergências" entre PS e PSD e acusou os sociais-democratas de darem a mão, não ao país, como Passos Coelho disse para justificar o acordo com Sócrates, mas para "um aumento de impostos que penaliza os mais fracos". A crise, quem a paga é quem paga impostos, mas o sistema bancário e financeiro, "afinal alguns dos principais responsáveis pela crise", "não é beliscado". E lembrou a manifestação da CGTP de sábado em que o plano de austeridade foi "condenado nas ruas de Lisboa por 300 mil portugueses".

O PSD actuou em dois momentos. Primeiro fez avançar Paulo Santos e Duarte Pacheco, para reafirmar a tese de "dar a mão" ao país, sem deixar de alertar para a necessidade de controlo no endividamento ou de cortes nas despesas do Estado. Miguel Macedo veio no fim, para dizer que, apesar da crise especulativa, a situação do país é grave porque Sócrates insistiu em "políticas erradas" durante os seus cinco anos de governação. Sem acordo Governo-PSD, o país estaria a caminho do abismo, de acordo com o texto da declaração de voto do PSD. com Ana Rita Faria

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