O Cachimbo de Magritte: A Fenomenologia do Nada

19-12-2009
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Nas últimas directas do PSD, escrevi um artigo no DN em que apontava a falta de densidade de Passos Coelho como uma das razões para votar em Manuela Ferreira Leite. Não é fácil definir esta densidade, mas nota-se logo quando falta. E notava-se.Infelizmente, o tempo só veio confirmar aquela impressão. Basta ler a entrevista de ontem à Pública para nos darmos conta de um esforço tão audível por construir a personagem que soa a oco. Eis alguém que começou a ter aulas de canto aos 30 anos, por brincadeira, mas ainda pensou em carreiras na ópera. Ou que, apesar de se ver médico toda a vida, só concorreu a Medicina em Lisboa porque era aqui que se fazia política (um caso agudo de vocação localizada, digamos assim). A esta soma de acontecimentos equívocos, uma jornalista atribuiu há tempos "a densidade da Montanha Mágica". Paulo Moura não vai tão longe, mas proporciona-nos um "momento violinos de Chopin", belo e involuntário como todos os violinos de Chopin, quando Passos Coelho conta ter lido Sartre e a Fenomenologia do Ser muito antes de Kafka. Muito antes, certamente. É que não existe nenhuma obra de Sartre com esse nome, recorda Pacheco Pereira. Existem coisas parecidas de Hegel, de Husserl, do próprio Sartre (O Ser e o Nada, com um subtítulo onde aparece a tal fenomenologia), mas nenhuma delas será uma leitura de Verão para adolescentes.Não que a falha seja grave. Há muita gente que nunca leu O Ser e o Nada, nem mesmo antes de Kafka. Eu, por exemplo. A diferença é que não dou entrevistas sobre livros que não existem, sobretudo se não os li. Aprendi com Sartre, acho eu, que a existência precede a essência, e talvez o contrário. O que me poupa lapsos freudianos, embora de Freud só tenha lido o Totem e Tabu (ou seria A Montanha e a Magia?). Em Passos Coelho, poucos lapsos serão mais freudianos do que trocar O Ser e o Nada por uma inexistente Fenomenologia do Ser.


Nas últimas directas do PSD, escrevi um artigo no DN em que apontava a falta de densidade de Passos Coelho como uma das razões para votar em Manuela Ferreira Leite. Não é fácil definir esta densidade, mas nota-se logo quando falta. E notava-se.Infelizmente, o tempo só veio confirmar aquela impressão. Basta ler a entrevista de ontem à Pública para nos darmos conta de um esforço tão audível por construir a personagem que soa a oco. Eis alguém que começou a ter aulas de canto aos 30 anos, por brincadeira, mas ainda pensou em carreiras na ópera. Ou que, apesar de se ver médico toda a vida, só concorreu a Medicina em Lisboa porque era aqui que se fazia política (um caso agudo de vocação localizada, digamos assim). A esta soma de acontecimentos equívocos, uma jornalista atribuiu há tempos "a densidade da Montanha Mágica". Paulo Moura não vai tão longe, mas proporciona-nos um "momento violinos de Chopin", belo e involuntário como todos os violinos de Chopin, quando Passos Coelho conta ter lido Sartre e a Fenomenologia do Ser muito antes de Kafka. Muito antes, certamente. É que não existe nenhuma obra de Sartre com esse nome, recorda Pacheco Pereira. Existem coisas parecidas de Hegel, de Husserl, do próprio Sartre (O Ser e o Nada, com um subtítulo onde aparece a tal fenomenologia), mas nenhuma delas será uma leitura de Verão para adolescentes.Não que a falha seja grave. Há muita gente que nunca leu O Ser e o Nada, nem mesmo antes de Kafka. Eu, por exemplo. A diferença é que não dou entrevistas sobre livros que não existem, sobretudo se não os li. Aprendi com Sartre, acho eu, que a existência precede a essência, e talvez o contrário. O que me poupa lapsos freudianos, embora de Freud só tenha lido o Totem e Tabu (ou seria A Montanha e a Magia?). Em Passos Coelho, poucos lapsos serão mais freudianos do que trocar O Ser e o Nada por uma inexistente Fenomenologia do Ser.

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