Lauro António Apresenta...: COM A DEVIDA VÉNIA

22-12-2009
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FERNANDO CHARRUA MENTIU E PARECE QUE NINGUÉM REPAROU (estava para escrever algo sobre o caso Charrua, quando li no DN este texto de João Miguel Tavares, que encerra (quase) tudo o que eu iria dizer. Por isso o transcrevo aqui, com a devina vénia, e um aceno de cumplicidade. Apenas acrescentaria a este triste caso uma nota: fala-se tanto em liberdade de expressão e em censura sem se procurar fazer da primeira um bom exercicio e sem se perceber o que é a segunda. Voltarei a tema. Por agora fiquemos com o texto de João Miguel Tavares.)A ministra de Educação enterrou o caso Charrua - paz à sua alma. Mas permitam-me um último dizer sobre o defunto. É que ando há vários dias a coçar as meninges diante deste bizarro silenciamento: será que ninguém reparou que o pobre e oprimido professor mentiu com os dentes todos? Se é verdade que o seu processo disciplinar é inadmissível e preocupante, não é menos verdade que o despacho de acusação - cujo conteúdo, sublinhe-se, não foi contestado nem por Charrua nem pela sua advogada - é claríssimo e desmente a versão que o professor sempre fez passar aos media - a de que se teria limitado a dizer uma piada sobre a licenciatura de José Sócrates. Chamar "filho da puta" ao primeiro-ministro (a frase exacta é: "somos governados por uma cambada de vigaristas e o chefe deles todos é um filho da puta") não é uma graçola inocente - é um insulto a Sócrates e à sua mãezinha.A mim, pessoalmente, a coisa chateia-me. Mas até agora quase não li uma linha sobre o assunto - apenas o martelar cego na tecla que se tornou dogma nas últimas semanas: somos governados por gente autoritária e arrogante. Não me entendam mal: nós somos mesmo governados por gente autoritária e arrogante. Só que uma opinião pública informada tem obrigação de separar o trigo do joio. É um facto que o caso Charrua se inicia com um acto de bufaria digno dos melhores tempos da PIDE. É um facto que uma qualquer figura miserável transformou o que se devia ter mantido como uma conversa de corredores em queixa formal e assunto de Estado. Mas é igualmente um facto que o heróico professor Charrua, que anda para aí a armar-se em vítima da liberdade de expressão, não teve coluna vertebral para assumir publicamente o que se passou e as palavras que proferiu. Fernando Charrua não precisava de vir para as televisões confessar "eu chamei filho da puta ao primeiro-ministro". Mas devia ter dito: "Quaisquer excessos de linguagem que tenha cometido aconteceram no decorrer de uma conversa privada e ninguém tem nada a ver com isso." Tivesse-o feito e mereceria todo o meu respeito. A partir do momento em que mentiu e andou pelas ruas a jurar que se limitara a soltar "um comentário em tom jocoso", o seu processo disciplinar não deixa por isso de ser uma vergonha - mas ele perde qualquer autoridade moral para andar agora a reivindicar indemnizações, reintegrações e a ameaçar processos contra o Estado. O professor Charrua pode ser uma vítima. Mas faltou-lhe a grandeza dos que, sendo acusados de forma injusta, assumem os seus actos e não inventam mentiras só para compor a fotografia. Infelizmente, ninguém sai bem desta história.Nota pessoal, preparatória de outras que hão-de vir:Alguém sabe o que é censura? Alguém sabe o que é a Liberdade de Expressão? Eis um bom tema de debate para um próximo dia, tanto mais que muita gente protesta com a "perseguição" a alguns blogues. Mas será que "Liberdade de Expressão" é deixar sair pela boca fora os maiores dislates e as provocações mais alarves sem dar conta disso a ninguém? Será mesmo uma "república das bananas" o que queremos? Quem procede de forma tão leviana ou é um irresponsável absoluto ou alguém que sistemáticamente procura descredibilizar a "Liberdade de Expressão" para impor uma ditadura.


FERNANDO CHARRUA MENTIU E PARECE QUE NINGUÉM REPAROU (estava para escrever algo sobre o caso Charrua, quando li no DN este texto de João Miguel Tavares, que encerra (quase) tudo o que eu iria dizer. Por isso o transcrevo aqui, com a devina vénia, e um aceno de cumplicidade. Apenas acrescentaria a este triste caso uma nota: fala-se tanto em liberdade de expressão e em censura sem se procurar fazer da primeira um bom exercicio e sem se perceber o que é a segunda. Voltarei a tema. Por agora fiquemos com o texto de João Miguel Tavares.)A ministra de Educação enterrou o caso Charrua - paz à sua alma. Mas permitam-me um último dizer sobre o defunto. É que ando há vários dias a coçar as meninges diante deste bizarro silenciamento: será que ninguém reparou que o pobre e oprimido professor mentiu com os dentes todos? Se é verdade que o seu processo disciplinar é inadmissível e preocupante, não é menos verdade que o despacho de acusação - cujo conteúdo, sublinhe-se, não foi contestado nem por Charrua nem pela sua advogada - é claríssimo e desmente a versão que o professor sempre fez passar aos media - a de que se teria limitado a dizer uma piada sobre a licenciatura de José Sócrates. Chamar "filho da puta" ao primeiro-ministro (a frase exacta é: "somos governados por uma cambada de vigaristas e o chefe deles todos é um filho da puta") não é uma graçola inocente - é um insulto a Sócrates e à sua mãezinha.A mim, pessoalmente, a coisa chateia-me. Mas até agora quase não li uma linha sobre o assunto - apenas o martelar cego na tecla que se tornou dogma nas últimas semanas: somos governados por gente autoritária e arrogante. Não me entendam mal: nós somos mesmo governados por gente autoritária e arrogante. Só que uma opinião pública informada tem obrigação de separar o trigo do joio. É um facto que o caso Charrua se inicia com um acto de bufaria digno dos melhores tempos da PIDE. É um facto que uma qualquer figura miserável transformou o que se devia ter mantido como uma conversa de corredores em queixa formal e assunto de Estado. Mas é igualmente um facto que o heróico professor Charrua, que anda para aí a armar-se em vítima da liberdade de expressão, não teve coluna vertebral para assumir publicamente o que se passou e as palavras que proferiu. Fernando Charrua não precisava de vir para as televisões confessar "eu chamei filho da puta ao primeiro-ministro". Mas devia ter dito: "Quaisquer excessos de linguagem que tenha cometido aconteceram no decorrer de uma conversa privada e ninguém tem nada a ver com isso." Tivesse-o feito e mereceria todo o meu respeito. A partir do momento em que mentiu e andou pelas ruas a jurar que se limitara a soltar "um comentário em tom jocoso", o seu processo disciplinar não deixa por isso de ser uma vergonha - mas ele perde qualquer autoridade moral para andar agora a reivindicar indemnizações, reintegrações e a ameaçar processos contra o Estado. O professor Charrua pode ser uma vítima. Mas faltou-lhe a grandeza dos que, sendo acusados de forma injusta, assumem os seus actos e não inventam mentiras só para compor a fotografia. Infelizmente, ninguém sai bem desta história.Nota pessoal, preparatória de outras que hão-de vir:Alguém sabe o que é censura? Alguém sabe o que é a Liberdade de Expressão? Eis um bom tema de debate para um próximo dia, tanto mais que muita gente protesta com a "perseguição" a alguns blogues. Mas será que "Liberdade de Expressão" é deixar sair pela boca fora os maiores dislates e as provocações mais alarves sem dar conta disso a ninguém? Será mesmo uma "república das bananas" o que queremos? Quem procede de forma tão leviana ou é um irresponsável absoluto ou alguém que sistemáticamente procura descredibilizar a "Liberdade de Expressão" para impor uma ditadura.

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