o tempo das cerejas*: Sobre os genéricos

19-12-2009
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Palavras de há seis anosA respeito dos recentes desenvolvimentos sobre os genéricos, gostava de afirmar secamente várias coisas, a saber: evidentemente que a decisão da ANF (com publicidade televisiva e tudo) não pode ser apoiada por se tratar de uma ostensiva violação da (errada e que o governo PS nunca quis rever, acrescento já) lei em vigor; entretanto, sejam quais forem os reais e conhecidos interesses que movem a ANF é, sem dúvida, a livre escolha pelos doentes o melhor príncipio, como aliás vigora pacificamentene em França; sinceramente, tenho razões concretas para supôr que nem todas as reservas de médicos sobre certos genéricos tenham origem em estarem «vendidos» à indústria farmacêutica mas o que aqui importa saber é se o Infarmed exerce um real controlo sobre a qualidade e eficácia terapêutica dos genéricosTirando isto, só quero acrescentar, sobretudo porque parece que o CDS se prepararia para «alinhar» pela escolha dos doentes, que esta é mais uma das matérias em que convém recapitular quem falou a tempo, ou seja quando um Governo PSD-CDS fixou em 2002 o actual regime, bastando revisitar as insistentes tomadas de posição do PCP. E, neste quadro, permito-me republicar abaixo um dos vários artigos ou crónicas que então dediquei ao assunto, mais precisamente a crónica que publiquei no Avante! de 20.3.2003.Ainda os genéricos«No passado dia 13, no «Telejornal» da RTP/1, o Ministro da Saúde, em apenas quinze palavras, ofereceu inadvertidamente ao país um exemplar retrato das estranhas concepções que lhe povoam a cabeça e comandam as decisões.Com efeito, estava-se no primeiro dia da entrada em vigor do novo regime de preços de referência dos medicamentos e o Ministro, depois de ter embalado na proclamação de baixas de preços, ainda que indirectamente não conseguiu fugir ao facto conhecido de, quando os médicos não autorizarem a substituição de medicamentos de marca por genéricos, os doentes passam a pagar mais do que pagavam anteriormente.E foi nesse implícito contexto que o Ministro da Saúde arrumou a questão declarando que «se o médico não receitou, então é uma questão entre o médico e o utente».Ou seja, ficámos a saber que Portugal tem hoje um Ministro da Saúde que não se importa de, com maior das displicências, projectar para a relação médico-doente um conflito sobre o preço dos medicamentos receitados, como se, além do mais, ele não soubesse que, na maioria dos casos ou situações, essa relação envolve uma parte dotada de particular autoridade e influência– o médico – e uma parte atingida pela reverência e pela fragilidade – o doente.Ficámos a saber que Portugal tem hoje um Ministro da Saúde que prefere dar sentenças destas a ter de explicar porque é que no preâmbulo do Dec-Lei 271/2002 proclamou que “os cidadãos (...) devem dispor da possibilidade de, no acto de fornecimento ou dispensa dos medicamentos, lhes ser proporcionada a opção pelo medicamento com a mesma substância activa, segurança e valor terapêutico, ao menor preço” e logo no artº 3º daquele diploma já estava a negar esta liberdade de opção dos cidadãos, ao conceder aos médicos a possibilidade de não autorizarem a substituição de medicamentos de marca por genéricos.Entendamo-nos: não há nenhuma razão para que o Estado fosse obrigado a suportar os custos financeiros derivados do facto de cidadãos, por atavismo ou pela mania de que o que é mais caro é necessariamente melhor, continuarem a preferir medicamentos de marca e não genéricos mais baratos.Mas, de igual modo, não há nenhuma razão nem justificação para que, como o Governo impôs, os cidadãos sejam financeiramente penalizados e prejudicados por decisões e escolhas que não são suas e que, exceptuando sinceras opiniões de recorte científico que podem existir, bem podem ter origem noutros atavismos e interesses.E é assim que, tudo visto, bem escusava o Ministro da Saúde de empurrar para os doentes o dever de coragem e firmeza que o seu Governo não sentiu face às pressões e posições da Ordem dos Médicos.»


Palavras de há seis anosA respeito dos recentes desenvolvimentos sobre os genéricos, gostava de afirmar secamente várias coisas, a saber: evidentemente que a decisão da ANF (com publicidade televisiva e tudo) não pode ser apoiada por se tratar de uma ostensiva violação da (errada e que o governo PS nunca quis rever, acrescento já) lei em vigor; entretanto, sejam quais forem os reais e conhecidos interesses que movem a ANF é, sem dúvida, a livre escolha pelos doentes o melhor príncipio, como aliás vigora pacificamentene em França; sinceramente, tenho razões concretas para supôr que nem todas as reservas de médicos sobre certos genéricos tenham origem em estarem «vendidos» à indústria farmacêutica mas o que aqui importa saber é se o Infarmed exerce um real controlo sobre a qualidade e eficácia terapêutica dos genéricosTirando isto, só quero acrescentar, sobretudo porque parece que o CDS se prepararia para «alinhar» pela escolha dos doentes, que esta é mais uma das matérias em que convém recapitular quem falou a tempo, ou seja quando um Governo PSD-CDS fixou em 2002 o actual regime, bastando revisitar as insistentes tomadas de posição do PCP. E, neste quadro, permito-me republicar abaixo um dos vários artigos ou crónicas que então dediquei ao assunto, mais precisamente a crónica que publiquei no Avante! de 20.3.2003.Ainda os genéricos«No passado dia 13, no «Telejornal» da RTP/1, o Ministro da Saúde, em apenas quinze palavras, ofereceu inadvertidamente ao país um exemplar retrato das estranhas concepções que lhe povoam a cabeça e comandam as decisões.Com efeito, estava-se no primeiro dia da entrada em vigor do novo regime de preços de referência dos medicamentos e o Ministro, depois de ter embalado na proclamação de baixas de preços, ainda que indirectamente não conseguiu fugir ao facto conhecido de, quando os médicos não autorizarem a substituição de medicamentos de marca por genéricos, os doentes passam a pagar mais do que pagavam anteriormente.E foi nesse implícito contexto que o Ministro da Saúde arrumou a questão declarando que «se o médico não receitou, então é uma questão entre o médico e o utente».Ou seja, ficámos a saber que Portugal tem hoje um Ministro da Saúde que não se importa de, com maior das displicências, projectar para a relação médico-doente um conflito sobre o preço dos medicamentos receitados, como se, além do mais, ele não soubesse que, na maioria dos casos ou situações, essa relação envolve uma parte dotada de particular autoridade e influência– o médico – e uma parte atingida pela reverência e pela fragilidade – o doente.Ficámos a saber que Portugal tem hoje um Ministro da Saúde que prefere dar sentenças destas a ter de explicar porque é que no preâmbulo do Dec-Lei 271/2002 proclamou que “os cidadãos (...) devem dispor da possibilidade de, no acto de fornecimento ou dispensa dos medicamentos, lhes ser proporcionada a opção pelo medicamento com a mesma substância activa, segurança e valor terapêutico, ao menor preço” e logo no artº 3º daquele diploma já estava a negar esta liberdade de opção dos cidadãos, ao conceder aos médicos a possibilidade de não autorizarem a substituição de medicamentos de marca por genéricos.Entendamo-nos: não há nenhuma razão para que o Estado fosse obrigado a suportar os custos financeiros derivados do facto de cidadãos, por atavismo ou pela mania de que o que é mais caro é necessariamente melhor, continuarem a preferir medicamentos de marca e não genéricos mais baratos.Mas, de igual modo, não há nenhuma razão nem justificação para que, como o Governo impôs, os cidadãos sejam financeiramente penalizados e prejudicados por decisões e escolhas que não são suas e que, exceptuando sinceras opiniões de recorte científico que podem existir, bem podem ter origem noutros atavismos e interesses.E é assim que, tudo visto, bem escusava o Ministro da Saúde de empurrar para os doentes o dever de coragem e firmeza que o seu Governo não sentiu face às pressões e posições da Ordem dos Médicos.»

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