O Cachimbo de Magritte: Correio-Expresso: "a pior crise desde 1929"

30-05-2010
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Outro dos temas tratados hoje pelo Expresso é a crise económica, "provavelmente a pior desde 1929". Não sei se é a pior desde 1929 e já ouvi antes a frase. Desde o fim dos "gloriosos trinta anos" de crescimento contínuo do pós-guerra que o espectro da crise tem rondado o Ocidente: foi o choque petrolífero na década de 70, foi o desemprego na década de 80, agora é a bolha do crédito. E sempre ouvi os órfãos dos amanhãs que cantam proclamarem que afinal, agora sim, estava à vista de todos, Marx tinha razão, a história dava-lhe razão, o capitalismo iria sucumbir e o melhor era fazermos o que nos diziam ou vinha aí o apocalipse. Hoje, com a queda do Muro em cima das colectivíssimas cabeças, os órfãos já não falam assim. Andam mais modestos. Limitam-se a atirar, com escárnio, que Marx deve estar a rir-se no túmulo, nas palavras do camarada Manuel Alegre esta semana.Alguém devia explicar ao camarada Alegre, entretanto, que a política não se resume a um cortejo de bitaites sonantes. Dá jeito pensar um bocadinho antes de abrir a lírica matraca. Porque se há coisa que esta crise prova é que Marx não tinha razão nenhuma. Marx profetizou um "capitalismo" onde haveria um número cada vez maior de pobres, que seriam também cada vez mais pobres, enquanto o capital se concentraria nas mãos de um pequeno número de ricos cada vez mais ricos. Ora, como Popper lembrava à exaustão, não só o capitalismo retirou da pobreza milhões e milhões de "proletários", que hoje vivem comparativamente melhor do que alguma vez na história e vivem seguramente melhor do que em qualquer regime socialista, como difundiu a propriedade a uma escala nunca antes vista. A crise que vivemos desmente Marx no sentido mais exacto porque nasce da expectativa de sermos todos proprietários, mesmo que à custa do crédito. Expectativa talvez imprudente, a pedir sem dúvida regulação e responsabilidade aos vendedores de sonhos de Wall Street, mas que é a própria essência do capitalismo. Quem desconfia de Popper, esse vendido, que pergunte aos chineses, aos russos e aos angolanos se querem voltar ao doce regaço da economia planificada. E guardem Marx no túmulo porque não tenho vontade de rir.


Outro dos temas tratados hoje pelo Expresso é a crise económica, "provavelmente a pior desde 1929". Não sei se é a pior desde 1929 e já ouvi antes a frase. Desde o fim dos "gloriosos trinta anos" de crescimento contínuo do pós-guerra que o espectro da crise tem rondado o Ocidente: foi o choque petrolífero na década de 70, foi o desemprego na década de 80, agora é a bolha do crédito. E sempre ouvi os órfãos dos amanhãs que cantam proclamarem que afinal, agora sim, estava à vista de todos, Marx tinha razão, a história dava-lhe razão, o capitalismo iria sucumbir e o melhor era fazermos o que nos diziam ou vinha aí o apocalipse. Hoje, com a queda do Muro em cima das colectivíssimas cabeças, os órfãos já não falam assim. Andam mais modestos. Limitam-se a atirar, com escárnio, que Marx deve estar a rir-se no túmulo, nas palavras do camarada Manuel Alegre esta semana.Alguém devia explicar ao camarada Alegre, entretanto, que a política não se resume a um cortejo de bitaites sonantes. Dá jeito pensar um bocadinho antes de abrir a lírica matraca. Porque se há coisa que esta crise prova é que Marx não tinha razão nenhuma. Marx profetizou um "capitalismo" onde haveria um número cada vez maior de pobres, que seriam também cada vez mais pobres, enquanto o capital se concentraria nas mãos de um pequeno número de ricos cada vez mais ricos. Ora, como Popper lembrava à exaustão, não só o capitalismo retirou da pobreza milhões e milhões de "proletários", que hoje vivem comparativamente melhor do que alguma vez na história e vivem seguramente melhor do que em qualquer regime socialista, como difundiu a propriedade a uma escala nunca antes vista. A crise que vivemos desmente Marx no sentido mais exacto porque nasce da expectativa de sermos todos proprietários, mesmo que à custa do crédito. Expectativa talvez imprudente, a pedir sem dúvida regulação e responsabilidade aos vendedores de sonhos de Wall Street, mas que é a própria essência do capitalismo. Quem desconfia de Popper, esse vendido, que pergunte aos chineses, aos russos e aos angolanos se querem voltar ao doce regaço da economia planificada. E guardem Marx no túmulo porque não tenho vontade de rir.

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