O Cachimbo de Magritte: Grandes e pequenas narrativas

29-05-2010
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Na primeira crítica a Sarah Palin que vai para além do "córror, camaradas, a gaja até caça/tem cinco filhos/é criacionista/é pro life/é muito mais gira que a Hillary Clinton" oferecida pela blogosfera de esquerda, o João Galamba diz ser "grotesco" compará-la a Obama (coisa que me atrevo a fazer aqui). Ideias vagas como hope e change têm que ser lidas no contexto da "grande narrativa" do sonho americano que Obama corporiza, enquanto o Partido Republicano está tomado pelo rasteiro populismo de Romney e pelo vil ultraconservadorismo de Palin.Ou seja, se Obama veste a pele de candidato "pós-racial", mas não perde a oportunidade de lembrar que seria o primeiro negro a governar a América, mas frequentou décadas uma igreja onde se qualificava a sida de doença criada pela CIA contra os negros, mas recebe a aclamação democrata no aniversário do mais famoso discurso de Luther King - isso é uma grande narrativa.Se Sarah Palin surge do nada como antiga mayor de uma cidadezinha de 7 mil habitantes nas berças que concorre a vice-presidente do país mais poderoso do mundo, e mãe de cinco filhos, um deles deficiente e outro que vai para o Iraque, e avó babada de um neto nascido fora do casamento, apesar de cristã devota, e defensora da "guerra ao terror", e apoiante do direito de ter armas, e admiradora de John McCain (quem diria?), e até, enfim (como direi?) republicana (pronto, já disse) - isso é demagogia. Escapa ao João que, para muitos eleitores (as sondagens dizem cerca de metade), a narrativa dona-de-casa-bimba-que-se-mete-na-política-para-pôr-aquilo-na-ordem-apesar-da-família-às-costas de Palin é a versão do sonho americano. Obama, o negro brilhante e certinho de Chicago que triunfa na vida e ainda tem tempo para pensar no povo, não lhes diz muito.Pois bem, tenho más notícias para o João. Essa gente existe. Essa gente vota. Essa gente é muita gente. Essa gente decide eleições. Mesmo que essa gente represente tudo o que o João e esquerda europeia odeiam na América.A esquerda europeia, que nas eleições americanas não existe, não vota, não conta e não decide nada, tem todo o direito de se render a Obama, como faz exultantemente a Dra. Ana Gomes. Mas podia aprender alguma coisa com o passado.Chamaram burro a Reagan e foi o que se viu.Entronizaram Al Gore antes das eleições e foi o que se viu. Chamaram outra vez burro a Bush contra Kerry e foi o que se viu.E há meses que dão a vitória de Obama por garantida e é o que se está a ver.Por mim, que tenho agora a cabeça em Castelo de Vide, é realmente digno de se ver. Com ou sem grandes narrativas.


Na primeira crítica a Sarah Palin que vai para além do "córror, camaradas, a gaja até caça/tem cinco filhos/é criacionista/é pro life/é muito mais gira que a Hillary Clinton" oferecida pela blogosfera de esquerda, o João Galamba diz ser "grotesco" compará-la a Obama (coisa que me atrevo a fazer aqui). Ideias vagas como hope e change têm que ser lidas no contexto da "grande narrativa" do sonho americano que Obama corporiza, enquanto o Partido Republicano está tomado pelo rasteiro populismo de Romney e pelo vil ultraconservadorismo de Palin.Ou seja, se Obama veste a pele de candidato "pós-racial", mas não perde a oportunidade de lembrar que seria o primeiro negro a governar a América, mas frequentou décadas uma igreja onde se qualificava a sida de doença criada pela CIA contra os negros, mas recebe a aclamação democrata no aniversário do mais famoso discurso de Luther King - isso é uma grande narrativa.Se Sarah Palin surge do nada como antiga mayor de uma cidadezinha de 7 mil habitantes nas berças que concorre a vice-presidente do país mais poderoso do mundo, e mãe de cinco filhos, um deles deficiente e outro que vai para o Iraque, e avó babada de um neto nascido fora do casamento, apesar de cristã devota, e defensora da "guerra ao terror", e apoiante do direito de ter armas, e admiradora de John McCain (quem diria?), e até, enfim (como direi?) republicana (pronto, já disse) - isso é demagogia. Escapa ao João que, para muitos eleitores (as sondagens dizem cerca de metade), a narrativa dona-de-casa-bimba-que-se-mete-na-política-para-pôr-aquilo-na-ordem-apesar-da-família-às-costas de Palin é a versão do sonho americano. Obama, o negro brilhante e certinho de Chicago que triunfa na vida e ainda tem tempo para pensar no povo, não lhes diz muito.Pois bem, tenho más notícias para o João. Essa gente existe. Essa gente vota. Essa gente é muita gente. Essa gente decide eleições. Mesmo que essa gente represente tudo o que o João e esquerda europeia odeiam na América.A esquerda europeia, que nas eleições americanas não existe, não vota, não conta e não decide nada, tem todo o direito de se render a Obama, como faz exultantemente a Dra. Ana Gomes. Mas podia aprender alguma coisa com o passado.Chamaram burro a Reagan e foi o que se viu.Entronizaram Al Gore antes das eleições e foi o que se viu. Chamaram outra vez burro a Bush contra Kerry e foi o que se viu.E há meses que dão a vitória de Obama por garantida e é o que se está a ver.Por mim, que tenho agora a cabeça em Castelo de Vide, é realmente digno de se ver. Com ou sem grandes narrativas.

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