aforismos e afins: O reducionismo (holismo) em João Miranda (Galamba)

21-01-2011
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«Se se olhar para a sociedade como um grande novelo enredado e sem pontas em que tudo está relacionado com tudo, a única coisa que se conseguirá concluir é que a sociedade é um grande novelo enredado e sem pontas em que tudo está relacionado com tudo.»Há de facto esse perigo, e eu critico muitas vezes o João Galamba por isso. Porque o conhecimento precisa de simplificações e porque acredito que não nos podemos "resignar" a achar que pouco pode ser cognosível apenas porque o mundo é complexo. Claro que o JG não defende isto literalmente - estou a exagerar. Mas é isso que transparece muitas vezes nos textos (e até no tom com) que ele escreve. Estou constantemente a dizer-lhe isso.-Uma coisa bem diferente é achar que por existir esse perigo, se deve impor, mesmo que isso não seja verdade, que a realidade é simples e redutível. Isso é o que o João Miranda faz e critico-o também amiúde por esse excesso. Qual é o mais "perigoso"? Difícil responder. Ambos o são. Diria que a posição dogmática do JM é provavelmente mais perigosa, porque distorce a realidade, nega a sua complexidade, e toma um modelo redutor como uma representação fiel da realidade. As construções "mecanicistas" e "algorítmicos" que JM usa não são aceites por mais ninguém no mundo da ciência senão os fiéis seguidores do Human Action de Mises. Perdão, tenho que corrigir: não são mesmo aceites por ninguém no mundo da ciência, dado que a escola austríaca não é ciência, no sentido Popperiano do termo (isto é um "facto"). «"O todo é mais do que a soma das partes" é uma frase batida, mas totalmente vazia. Quem defende tal coisa anda a somar batatas com cebolas. Quem defende que o todo é maior que a soma das partes está a comparar dois objectos descritos a dois níveis de representação distintos. É por isso que a soma das partes pode parecer menos complexa e menos interessante que o todo, mas a diferença não se deve aos objectos em si mas à forma como a soma das partes e o todo são representados.»Parece-me, caro JM, que não se trata de um problema de representação. É mesmo um problema ontológico. Simplesmente, a natureza das partes, da soma das partes, e do todo, difere. A inclinação que o JM tem por achar que a sociedade é perfeita e totalmente interpretável à luz do conjunto de células ou bactérias diz bem da forma simplista como vê o comportamento humano. Acho fascinante essa "crença". Aliás, todas as crenças são fascinantes, porque requerem do crente a aceitação de premissas indemonstráveis, reveladas de forma mais ou menos mística ao mundo. Imagino que seja bem mais confortável simplificar tudo e viver num mundo perfeito e auto-coerente onde tudo faça sentido à luz de certas teorias irrefutáveis. Não digo que o faça por esse motivo, atenção. Muito menos que não tem direito a ter essa fé. Apenas acho que é uma muito curiosa forma de obscurantismo.


«Se se olhar para a sociedade como um grande novelo enredado e sem pontas em que tudo está relacionado com tudo, a única coisa que se conseguirá concluir é que a sociedade é um grande novelo enredado e sem pontas em que tudo está relacionado com tudo.»Há de facto esse perigo, e eu critico muitas vezes o João Galamba por isso. Porque o conhecimento precisa de simplificações e porque acredito que não nos podemos "resignar" a achar que pouco pode ser cognosível apenas porque o mundo é complexo. Claro que o JG não defende isto literalmente - estou a exagerar. Mas é isso que transparece muitas vezes nos textos (e até no tom com) que ele escreve. Estou constantemente a dizer-lhe isso.-Uma coisa bem diferente é achar que por existir esse perigo, se deve impor, mesmo que isso não seja verdade, que a realidade é simples e redutível. Isso é o que o João Miranda faz e critico-o também amiúde por esse excesso. Qual é o mais "perigoso"? Difícil responder. Ambos o são. Diria que a posição dogmática do JM é provavelmente mais perigosa, porque distorce a realidade, nega a sua complexidade, e toma um modelo redutor como uma representação fiel da realidade. As construções "mecanicistas" e "algorítmicos" que JM usa não são aceites por mais ninguém no mundo da ciência senão os fiéis seguidores do Human Action de Mises. Perdão, tenho que corrigir: não são mesmo aceites por ninguém no mundo da ciência, dado que a escola austríaca não é ciência, no sentido Popperiano do termo (isto é um "facto"). «"O todo é mais do que a soma das partes" é uma frase batida, mas totalmente vazia. Quem defende tal coisa anda a somar batatas com cebolas. Quem defende que o todo é maior que a soma das partes está a comparar dois objectos descritos a dois níveis de representação distintos. É por isso que a soma das partes pode parecer menos complexa e menos interessante que o todo, mas a diferença não se deve aos objectos em si mas à forma como a soma das partes e o todo são representados.»Parece-me, caro JM, que não se trata de um problema de representação. É mesmo um problema ontológico. Simplesmente, a natureza das partes, da soma das partes, e do todo, difere. A inclinação que o JM tem por achar que a sociedade é perfeita e totalmente interpretável à luz do conjunto de células ou bactérias diz bem da forma simplista como vê o comportamento humano. Acho fascinante essa "crença". Aliás, todas as crenças são fascinantes, porque requerem do crente a aceitação de premissas indemonstráveis, reveladas de forma mais ou menos mística ao mundo. Imagino que seja bem mais confortável simplificar tudo e viver num mundo perfeito e auto-coerente onde tudo faça sentido à luz de certas teorias irrefutáveis. Não digo que o faça por esse motivo, atenção. Muito menos que não tem direito a ter essa fé. Apenas acho que é uma muito curiosa forma de obscurantismo.

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