O Cachimbo de Magritte: Cegueiras ideológicas e restrições orçamentais

30-05-2010
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Agora que se brada por aí a plenos pulmões "o fim do capitalismo", acusa-se de "cegueira ideológica" todos os que manifestam dúvidas quanto a tamanho veredicto. Afinal, os comunistas impenitentes também não se rendem só porque caiu o muro de Berlim e o resto. A actual crise é equivalente à queda do Muro de Berlim. Por isso, tirem as consequências, ou deixem de ser "cegos", dizem-nos os arautos das novas épocas históricas. Afinal, é verdade que, em circunstâncias semelhantes, Keynes também anunciou o "fim do laissez-faire". Mas o "fim do laissez-faire" anunciado por Keynes não se articula facilmente na nossa era em que o "laissez-faire" é coisa da imaginação. Um dado que talvez valha a pena ter presente nesta discussão: no tempo de Keynes, as economias ocidentais não registavam uma presença do Estado sempre superior aos 40% do PIB, e em alguns casos, superior aos 50%. Longe disso. Há quem só goste de falar da realidade quando esta é lida pelos olhos dos nossos inimigos intelectuais, os tais dos libertários. Mas será bom "leitor" quem é também acusado de ser "cego"? Por outro lado, considera-se que as restrições económicas que anteriormente se colocavam às nossas escolhas, privadas e públicas, já não fazem sentido. Presumo que seja a isso que se chama a chegada de um "novo paradigma". O problema é que este entusiasmo padece dos mesmos defeitos de todas as outras formas de entusiasmo. Talvez seja essa a razão que leva alguém a censurar as críticas de Manuela Ferreira Leite aos planos de investimento público do actual governo como produto da irritante "diabolização do Estado". O que tem graça: Manuela Ferreira Leite "diaboliza o Estado". Não é para todos, de facto. Mas provavelmente a orientação de Manuela Ferreira Leite corresponde mais à sua estreiteza de contabilista, que sempre adverte, com uma vozinha rouca e trémula, que não se pode gastar o que não se tem, etc., etc. O curioso é que, seguidamente, se contraponha à "cegueira" de Manuela Ferreira Leite a sobriedade e sabedoria de Campos e Cunha. Diz o último que é importante, ou continua a ser importante, ter em conta a "rentabilidade futura" dos investimentos públicos. Tenho a sensação de ter escutado a mesma alusão nas críticas "cegas" do PSD ao governo de Sócrates, mas talvez isso se deva à "cegueira" da minha memória. Poderíamos ainda acrescentar que o grau de endividamento do País, interno e externo, deve ser tido em consideração juntamente com a previsão de rentabilidade futura dos investimentos. É que continua a haver o velho problema da sustentabilidade das finanças públicas e da dívida externa. Isso é especialmente válido para uma economia como a portuguesa em 2008.Depois vem o Krugman exortar ao investimento em infraestrutura pública. Mas, como a maioria sabe, a infraestrutura pública nos EUA (assim como no Canadá) está reconhecidamente envelhecida. O que quer dizer que a rentabilidade futura de investimentos públicos nessa área é, nos EUA (e no Canadá), bastante mais elevada do que aqui em Portugal (ou em Espanha ou em França, por exemplo). Eu sei que isto não passa de um conjunto vago de detalhes que empalidecem diante da grandeza das mudanças de paradigma e da chegada de novas eras. Mas, ao que parece, as velhas restrições ainda se aplicam. Ainda não foi desta que nos livrámos delas.


Agora que se brada por aí a plenos pulmões "o fim do capitalismo", acusa-se de "cegueira ideológica" todos os que manifestam dúvidas quanto a tamanho veredicto. Afinal, os comunistas impenitentes também não se rendem só porque caiu o muro de Berlim e o resto. A actual crise é equivalente à queda do Muro de Berlim. Por isso, tirem as consequências, ou deixem de ser "cegos", dizem-nos os arautos das novas épocas históricas. Afinal, é verdade que, em circunstâncias semelhantes, Keynes também anunciou o "fim do laissez-faire". Mas o "fim do laissez-faire" anunciado por Keynes não se articula facilmente na nossa era em que o "laissez-faire" é coisa da imaginação. Um dado que talvez valha a pena ter presente nesta discussão: no tempo de Keynes, as economias ocidentais não registavam uma presença do Estado sempre superior aos 40% do PIB, e em alguns casos, superior aos 50%. Longe disso. Há quem só goste de falar da realidade quando esta é lida pelos olhos dos nossos inimigos intelectuais, os tais dos libertários. Mas será bom "leitor" quem é também acusado de ser "cego"? Por outro lado, considera-se que as restrições económicas que anteriormente se colocavam às nossas escolhas, privadas e públicas, já não fazem sentido. Presumo que seja a isso que se chama a chegada de um "novo paradigma". O problema é que este entusiasmo padece dos mesmos defeitos de todas as outras formas de entusiasmo. Talvez seja essa a razão que leva alguém a censurar as críticas de Manuela Ferreira Leite aos planos de investimento público do actual governo como produto da irritante "diabolização do Estado". O que tem graça: Manuela Ferreira Leite "diaboliza o Estado". Não é para todos, de facto. Mas provavelmente a orientação de Manuela Ferreira Leite corresponde mais à sua estreiteza de contabilista, que sempre adverte, com uma vozinha rouca e trémula, que não se pode gastar o que não se tem, etc., etc. O curioso é que, seguidamente, se contraponha à "cegueira" de Manuela Ferreira Leite a sobriedade e sabedoria de Campos e Cunha. Diz o último que é importante, ou continua a ser importante, ter em conta a "rentabilidade futura" dos investimentos públicos. Tenho a sensação de ter escutado a mesma alusão nas críticas "cegas" do PSD ao governo de Sócrates, mas talvez isso se deva à "cegueira" da minha memória. Poderíamos ainda acrescentar que o grau de endividamento do País, interno e externo, deve ser tido em consideração juntamente com a previsão de rentabilidade futura dos investimentos. É que continua a haver o velho problema da sustentabilidade das finanças públicas e da dívida externa. Isso é especialmente válido para uma economia como a portuguesa em 2008.Depois vem o Krugman exortar ao investimento em infraestrutura pública. Mas, como a maioria sabe, a infraestrutura pública nos EUA (assim como no Canadá) está reconhecidamente envelhecida. O que quer dizer que a rentabilidade futura de investimentos públicos nessa área é, nos EUA (e no Canadá), bastante mais elevada do que aqui em Portugal (ou em Espanha ou em França, por exemplo). Eu sei que isto não passa de um conjunto vago de detalhes que empalidecem diante da grandeza das mudanças de paradigma e da chegada de novas eras. Mas, ao que parece, as velhas restrições ainda se aplicam. Ainda não foi desta que nos livrámos delas.

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