Eduardo Vítor Rodrigues: Sociologia e Justiça

28-05-2010
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O JN publica que “O Parlamento tem seis meses para preparar um quadro legislativo concreto de combate à corrupção e "não um texto de sociologia". O desafio foi lançado, ontem, quarta-feira, por Jaime Gama na posse da comissão eventual para acompanhamento político da corrupção”.
Por outras palavras, o Dr. Jaime Gama pede leis em concreto, em vez de um texto de Sociologia. Pensará que a Sociologia é uma coisa abstracta, especulativa e dialéctica. Bem se sabe como estas dimensões (a abstracção, a especulação e a dialéctica) perturbam os espíritos detentores de verdades absolutas e convencidos que a ciência só existe para fornecer “receitas” e verdades positivistas. Mas a Sociologia não é isso, é muito mais do que isso.
Tem, por exemplo, permitido explicar, desconstruir e compreender muitos dos sistemas e sub-sistemas sociais, dessa forma promovendo a mudança. É a disciplina que enquadra o Observatório da Justiça, presidido pelo Sociólogo Boaventura Sousa Santos, e que tem diagnosticado o sistema de Justiça e proposto contributos bem concretos, que os políticos teimam em não assumir, vá-se lá saber porquê. O mesmo no Observatório das Desigualdades, e em muitas unidades de investigação onde temas fundamentais são estudados.
Sabe-se que muitas das reflexões sociológicas são incómodas, seja nos domínios da Educação, do combate ao crime e à corrupção, do diagnóstico sobre as desigualdades ou sobre os dualismos estruturais, dos (dis)funcionamentos da Justiça (que interessa a muita gente), dos comportamentos desviantes, da marginalização de minorias, entre muitas outras questões. Sabe-se também que a Sociologia tem permitido, pela compreensão dos fenómenos sociais, desenhar processos concretos de mudança social. E sabe-se como isso incomoda o establishment. Sabe-se como isso implica mexidas em interesses instalados, em dinâmicas estabelecidas, em poderes sedimentados.
O Dr. Jaime Gama foi infeliz na abordagem. O país não está farto de textos de Sociologia. Está é farto da presunção de “quadros legislativos concretos” que se amontoam de forma contraditória e sobreposta, nos quais a única virtualidade prática é nunca serem práticos de todo, mantendo as coisas como estão, apesar das ladainhas sobre as necessidades de mudança.

Eduardo Vítor Rodrigues
Sociólogo



O JN publica que “O Parlamento tem seis meses para preparar um quadro legislativo concreto de combate à corrupção e "não um texto de sociologia". O desafio foi lançado, ontem, quarta-feira, por Jaime Gama na posse da comissão eventual para acompanhamento político da corrupção”.
Por outras palavras, o Dr. Jaime Gama pede leis em concreto, em vez de um texto de Sociologia. Pensará que a Sociologia é uma coisa abstracta, especulativa e dialéctica. Bem se sabe como estas dimensões (a abstracção, a especulação e a dialéctica) perturbam os espíritos detentores de verdades absolutas e convencidos que a ciência só existe para fornecer “receitas” e verdades positivistas. Mas a Sociologia não é isso, é muito mais do que isso.
Tem, por exemplo, permitido explicar, desconstruir e compreender muitos dos sistemas e sub-sistemas sociais, dessa forma promovendo a mudança. É a disciplina que enquadra o Observatório da Justiça, presidido pelo Sociólogo Boaventura Sousa Santos, e que tem diagnosticado o sistema de Justiça e proposto contributos bem concretos, que os políticos teimam em não assumir, vá-se lá saber porquê. O mesmo no Observatório das Desigualdades, e em muitas unidades de investigação onde temas fundamentais são estudados.
Sabe-se que muitas das reflexões sociológicas são incómodas, seja nos domínios da Educação, do combate ao crime e à corrupção, do diagnóstico sobre as desigualdades ou sobre os dualismos estruturais, dos (dis)funcionamentos da Justiça (que interessa a muita gente), dos comportamentos desviantes, da marginalização de minorias, entre muitas outras questões. Sabe-se também que a Sociologia tem permitido, pela compreensão dos fenómenos sociais, desenhar processos concretos de mudança social. E sabe-se como isso incomoda o establishment. Sabe-se como isso implica mexidas em interesses instalados, em dinâmicas estabelecidas, em poderes sedimentados.
O Dr. Jaime Gama foi infeliz na abordagem. O país não está farto de textos de Sociologia. Está é farto da presunção de “quadros legislativos concretos” que se amontoam de forma contraditória e sobreposta, nos quais a única virtualidade prática é nunca serem práticos de todo, mantendo as coisas como estão, apesar das ladainhas sobre as necessidades de mudança.

Eduardo Vítor Rodrigues
Sociólogo

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