Pó dos Livros: Protesto livreiro

28-05-2010
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Se imaginarmos dois observadores, colocados em perspectivas diferentes perante um objecto com diversos contornos, e pedirmos a cada um deles que lhe tire uma fotografia, sabemos que, no final, teremos estampadas imagens necessariamente distintas. Depois, se pedirmos aos mesmos observadores que nos façam uma descrição do objecto que fotografaram, teremos obrigatoriamente duas visões discrepantes sobre o mesmo objecto e ambos estarão a dizer a verdade sobre o que vêem. Não consigo arranjar melhor exemplo para explicar o diferendo que divide, há anos, editores e livreiros (agora, cada vez mais, os pequenos e independentes livreiros) sobre os moldes em que devem ser realizadas as Feiras do Livro de Lisboa e Porto. Claro, temos, como em quase tudo, uma excepção à regra: se o objecto fotografado fosse uma esfera, mesmo com fotografias de perspectivas diferentes, seria sempre visto da mesma forma.Era mais ou menos isto que eu esperava que a nova direcção da APEL (Associação Portuguesa de Editores e Livreiros) fizesse em relação às Feiras do Livro - isto é, que fosse limando as arestas do objecto, para que ele se parecesse cada vez mais com uma esfera que agradasse à grande maioria dos diversos agentes do mercado do livro.Enganei-me, pelo menos até agora, sobre a nova direcção da APEL. Não alteraram em nada o que as anteriores direcções da associação já tinham feito. Como as perspectivas sobre as Feiras do Livro, entre editores e livreiros, continuam a ser divergentes, tal como um casal que não se entende acerca da forma como se deve relacionar e gerir os assuntos que lhe são comuns, acontece o que sempre acontece nestes casos (enquanto não culmina em divórcio): o mais forte dá uma paulada na cabeça do mais fraco, para que ele se cale, tendo o cuidado de não o matar, querendo apenas deixá-lo meio azamboado, até porque sabe que, de vez em quando, ele lhe é útil.Os efeitos das Feiras do Livro de Lisboa e Porto sobre as já debilitadas tesourarias dos pequenos livreiros, começam a fazer-se sentir muito antes do seu começo e prolongam-se muito para além do seu fim. A influência na captação de público não se limita a retirar clientes às livrarias de Lisboa e Porto, chegando a outras cidades, como por exemplo Caldas da Rainha, Setúbal, Torres Vedras, Braga e muitas outras. É por isso que levanto um protesto em relação ao adiamento da data de término da Feira do Livro de Lisboa, unilateralmente decidido pela direcção da APEL.Não vou aqui enumerar os argumentos sobre a necessidade da manutenção da existência de livreiros alternativos, até porque seria repetitivo e fastidioso para quem me lê e não pertence ao meio. Mas devo recordar que livrarias como a Trama, a Ler Devagar e a Pó dos Livros, só para dar três exemplos, fazem mais, proporcionalmente, pela divulgação da leitura, do livro e da cultura do que fazem outras grandes cadeias de livrarias pertencentes a grupos editoriais.Se só quisermos ter no mercado editorial e livreiro catálogos de livros que apenas a preguiça mental se sente lisonjeada em ler, então é este o caminho a seguir. Mas, por outro lado, se queremos que se mantenham livrarias de qualidade que dêem resposta aos interesses e necessidades de todos, inclusivamente das minorias, então teremos de ter mais cuidado nas decisões que tomamos, apressadamente, visando unicamente o lucro imediato. Foi este o caso da decisão da direcção da APEL sobre o prolongamento, por mais uma semana, da Feira do Livro de Lisboa, com pretensos pretextos de que o mau tempo, a visita do Papa, os festejos do Benfica e o diabo a sete teriam prejudicado em muito as suas vendas.O que diremos nós, pobres livreiros!?...Jaime Bulhosa


Se imaginarmos dois observadores, colocados em perspectivas diferentes perante um objecto com diversos contornos, e pedirmos a cada um deles que lhe tire uma fotografia, sabemos que, no final, teremos estampadas imagens necessariamente distintas. Depois, se pedirmos aos mesmos observadores que nos façam uma descrição do objecto que fotografaram, teremos obrigatoriamente duas visões discrepantes sobre o mesmo objecto e ambos estarão a dizer a verdade sobre o que vêem. Não consigo arranjar melhor exemplo para explicar o diferendo que divide, há anos, editores e livreiros (agora, cada vez mais, os pequenos e independentes livreiros) sobre os moldes em que devem ser realizadas as Feiras do Livro de Lisboa e Porto. Claro, temos, como em quase tudo, uma excepção à regra: se o objecto fotografado fosse uma esfera, mesmo com fotografias de perspectivas diferentes, seria sempre visto da mesma forma.Era mais ou menos isto que eu esperava que a nova direcção da APEL (Associação Portuguesa de Editores e Livreiros) fizesse em relação às Feiras do Livro - isto é, que fosse limando as arestas do objecto, para que ele se parecesse cada vez mais com uma esfera que agradasse à grande maioria dos diversos agentes do mercado do livro.Enganei-me, pelo menos até agora, sobre a nova direcção da APEL. Não alteraram em nada o que as anteriores direcções da associação já tinham feito. Como as perspectivas sobre as Feiras do Livro, entre editores e livreiros, continuam a ser divergentes, tal como um casal que não se entende acerca da forma como se deve relacionar e gerir os assuntos que lhe são comuns, acontece o que sempre acontece nestes casos (enquanto não culmina em divórcio): o mais forte dá uma paulada na cabeça do mais fraco, para que ele se cale, tendo o cuidado de não o matar, querendo apenas deixá-lo meio azamboado, até porque sabe que, de vez em quando, ele lhe é útil.Os efeitos das Feiras do Livro de Lisboa e Porto sobre as já debilitadas tesourarias dos pequenos livreiros, começam a fazer-se sentir muito antes do seu começo e prolongam-se muito para além do seu fim. A influência na captação de público não se limita a retirar clientes às livrarias de Lisboa e Porto, chegando a outras cidades, como por exemplo Caldas da Rainha, Setúbal, Torres Vedras, Braga e muitas outras. É por isso que levanto um protesto em relação ao adiamento da data de término da Feira do Livro de Lisboa, unilateralmente decidido pela direcção da APEL.Não vou aqui enumerar os argumentos sobre a necessidade da manutenção da existência de livreiros alternativos, até porque seria repetitivo e fastidioso para quem me lê e não pertence ao meio. Mas devo recordar que livrarias como a Trama, a Ler Devagar e a Pó dos Livros, só para dar três exemplos, fazem mais, proporcionalmente, pela divulgação da leitura, do livro e da cultura do que fazem outras grandes cadeias de livrarias pertencentes a grupos editoriais.Se só quisermos ter no mercado editorial e livreiro catálogos de livros que apenas a preguiça mental se sente lisonjeada em ler, então é este o caminho a seguir. Mas, por outro lado, se queremos que se mantenham livrarias de qualidade que dêem resposta aos interesses e necessidades de todos, inclusivamente das minorias, então teremos de ter mais cuidado nas decisões que tomamos, apressadamente, visando unicamente o lucro imediato. Foi este o caso da decisão da direcção da APEL sobre o prolongamento, por mais uma semana, da Feira do Livro de Lisboa, com pretensos pretextos de que o mau tempo, a visita do Papa, os festejos do Benfica e o diabo a sete teriam prejudicado em muito as suas vendas.O que diremos nós, pobres livreiros!?...Jaime Bulhosa

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