Discutir Sócrates para não discutir o País

27-03-2010
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Não ponho em causa a importância do caso TVI/PT. Trata-se de um assunto de Estado. Ao contrário de muitos dos que agora vibram com ela, defendi desde a primeira hora uma comissão de inquérito em vez das absurdas audições propostas pelo PSD. Mas, quase a afogar-me nos rios de tinta que o tema já fez correr, talvez seja importante alguém dizer que este caso está longe de ser o problema que mais preocupa os portugueses.

Confesso o meu cansaço com a ausência de política na política. As guerras vazias do PSD dizem-me pouco e até a falha de carácter do primeiro-ministro me mobilizam apenas moderadamente. É que eu gosto de política. Do que ela tem de conteúdo. Quero (e tenho tentado) discutir o investimento público e os cortes na despesa ; a utilização do argumento da crise para a delapidação do Estado e para a privatização de empresas com funções sociais , que tantas vezes resultam em maus negócios ; a estratégia suicidária e desigual da "contenção salarial" na função pública e no privado ; os cortes no subsídio de desemprego e no RSI ; ou as deduções ficais e as incoerências do PS na matéria . Porque é em temas como estes que estão as grandes fracturas políticas que a democracia tem de resolver. E porque estou farto, apesar de perceber a sua relevância, de escândalos. Lamentavelmente, para além da indignação com o nosso primeiro e do incómodo com algum ambiente histeria, pouco posso acrescentar a esse debate.

Preferia, com toda a sinceridade, que se descobrisse que Sócrates não mentiu sobre os negócios da PT e que tudo resto não passou afinal de um equívoco. Não tenho esperanças que assim seja, mas achava muitíssimo melhor que fosse o que realmente conta para este país, que está em tão maus lençóis, que fizesse um dos piores governantes da nossa história recente abandonar o poder.

No plano partidário, há duas formas de fazer oposição este a governo: a fácil e a difícil. A fácil aposta num caso que põe o carácter do primeiro-ministro no centro do debate. Espera que alguma prova surja para que daí nasça uma moção de censura ou uma demissão. A difícil concentra-se no combate às propostas apresentadas pelo governo para, supostamente, sairmos da crise. Ou seja, concentra-se, neste momento, no Pacto de Estabilidade e Crescimento. É o debate que me interessa.

A primeira é fácil porque vive das falhas dos outros sem ter realmente de dizer nada sobre o que se quer . A segunda é difícil porque obriga à apresentação de alternativas e a uma contestação política que parta de escolhas claras. A primeira vive à sombra da ideia de que em Portugal já não se ganham eleições. Alguém as perde. A segunda faz por merecer a confiança dos cidadãos. A primeira aposta na descrença generalizado na política. A segunda aposta na inteligência e no debate democrático.

Não é por acaso que o PSD e os seus representantes na comunicação social têm apostado tudo no primeiro cavalo. É porque no essencial só têm uma coisa a dizer ao País: querem ser governo. Não sabem bem para quê, mas sabem que querem.

Na verdade, a oposição centrada nos problemas de carácter do primeiro-ministro permitirá a alternância para que alguma coisa mude ficando tudo na mesma. Já a oposição com conteúdo político exigiria um discurso mais claro e mobilizador.

Por mim, não o escondo, quero que este governo caia. Com a estratégia que nos apresentou para os próximos três anos levará o País para o abismo. Mas seria trágico que a sua queda se devesse exclusivamente ao caso PT/TVI. Porque o debate central para todos nós, aquele que terá efeitos duradouros nas nossas vidas, ficaria por fazer. E se o próximo governo não nascer de uma alternativa clara para vencer a crise económica e social será seguramente um mau governo.

Este é o debate que o PSD não quer fazer. Porque não tem nada a dizer sobre o assunto. E a demissão é tal que até se prepara para viabilizar o PEC, esperando que Sócrates acabe por cair por causa de uma mentira. Uma mentira grave, é certo. Mas não tão grave como a desgraça social para onde nos está a levar. E não tão grave como a eleição de um novo governo que se limite a seguir o mesmo caminho com uma cara nova.

Não ponho em causa a importância do caso TVI/PT. Trata-se de um assunto de Estado. Ao contrário de muitos dos que agora vibram com ela, defendi desde a primeira hora uma comissão de inquérito em vez das absurdas audições propostas pelo PSD. Mas, quase a afogar-me nos rios de tinta que o tema já fez correr, talvez seja importante alguém dizer que este caso está longe de ser o problema que mais preocupa os portugueses.

Confesso o meu cansaço com a ausência de política na política. As guerras vazias do PSD dizem-me pouco e até a falha de carácter do primeiro-ministro me mobilizam apenas moderadamente. É que eu gosto de política. Do que ela tem de conteúdo. Quero (e tenho tentado) discutir o investimento público e os cortes na despesa ; a utilização do argumento da crise para a delapidação do Estado e para a privatização de empresas com funções sociais , que tantas vezes resultam em maus negócios ; a estratégia suicidária e desigual da "contenção salarial" na função pública e no privado ; os cortes no subsídio de desemprego e no RSI ; ou as deduções ficais e as incoerências do PS na matéria . Porque é em temas como estes que estão as grandes fracturas políticas que a democracia tem de resolver. E porque estou farto, apesar de perceber a sua relevância, de escândalos. Lamentavelmente, para além da indignação com o nosso primeiro e do incómodo com algum ambiente histeria, pouco posso acrescentar a esse debate.

Preferia, com toda a sinceridade, que se descobrisse que Sócrates não mentiu sobre os negócios da PT e que tudo resto não passou afinal de um equívoco. Não tenho esperanças que assim seja, mas achava muitíssimo melhor que fosse o que realmente conta para este país, que está em tão maus lençóis, que fizesse um dos piores governantes da nossa história recente abandonar o poder.

No plano partidário, há duas formas de fazer oposição este a governo: a fácil e a difícil. A fácil aposta num caso que põe o carácter do primeiro-ministro no centro do debate. Espera que alguma prova surja para que daí nasça uma moção de censura ou uma demissão. A difícil concentra-se no combate às propostas apresentadas pelo governo para, supostamente, sairmos da crise. Ou seja, concentra-se, neste momento, no Pacto de Estabilidade e Crescimento. É o debate que me interessa.

A primeira é fácil porque vive das falhas dos outros sem ter realmente de dizer nada sobre o que se quer . A segunda é difícil porque obriga à apresentação de alternativas e a uma contestação política que parta de escolhas claras. A primeira vive à sombra da ideia de que em Portugal já não se ganham eleições. Alguém as perde. A segunda faz por merecer a confiança dos cidadãos. A primeira aposta na descrença generalizado na política. A segunda aposta na inteligência e no debate democrático.

Não é por acaso que o PSD e os seus representantes na comunicação social têm apostado tudo no primeiro cavalo. É porque no essencial só têm uma coisa a dizer ao País: querem ser governo. Não sabem bem para quê, mas sabem que querem.

Na verdade, a oposição centrada nos problemas de carácter do primeiro-ministro permitirá a alternância para que alguma coisa mude ficando tudo na mesma. Já a oposição com conteúdo político exigiria um discurso mais claro e mobilizador.

Por mim, não o escondo, quero que este governo caia. Com a estratégia que nos apresentou para os próximos três anos levará o País para o abismo. Mas seria trágico que a sua queda se devesse exclusivamente ao caso PT/TVI. Porque o debate central para todos nós, aquele que terá efeitos duradouros nas nossas vidas, ficaria por fazer. E se o próximo governo não nascer de uma alternativa clara para vencer a crise económica e social será seguramente um mau governo.

Este é o debate que o PSD não quer fazer. Porque não tem nada a dizer sobre o assunto. E a demissão é tal que até se prepara para viabilizar o PEC, esperando que Sócrates acabe por cair por causa de uma mentira. Uma mentira grave, é certo. Mas não tão grave como a desgraça social para onde nos está a levar. E não tão grave como a eleição de um novo governo que se limite a seguir o mesmo caminho com uma cara nova.

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