A sua voz é tranquila. O relato compassado. "Começou a chover dez qui- lómetros depois de passarmos a fron- teira de Espanha com Marrocos", recorda. A caravana de cinco autocarros rumava a Tétuan para uma excursão de compras. "Foi então que o primeiro autocarro começou aos ziguezagues, atravessou a estrada e capotou, ficou com as rodas para o ar", prossegue João Paulo. "O nosso autocarro parou mais à frente, disseram-nos para não sairmos, mas corremos para o local do acidente", continua: "Quando chegámos já lá estavam marroquinos que tinham partido os vidros, desligado o motor e começavam a tirar as pessoas."
Primeiro os feridos ligeiros, depois outros mais graves. Finalmente os mortos. "Um estava na parte da frente e outros quatro viajavam atrás", relembra: "Estendemos os corpos na relva, demos água aos sobreviventes que, entre choros, chamavam pelos seus acompanhantes." Os turistas desdobravam-se no auxílio: "Quem ti- nha, dava comprimidos para as dores a quem estava aleijado". João Paulo não corrobora críticas quanto ao atraso da ajuda. "Os socorros, a polícia e as ambulâncias não chegaram muito tarde", assegura.
Depois, foi o caminho inverso. O regresso ao Porto de Ceuta. "O autocarro número dois regressou com feridos ligeiros", continua. Não foi fácil a viagem: "Um senhor de cerca de 50 anos chorou todo o caminho, a mãe tinha morrido e ele dizia que não tinha mais ninguém na vida... tentámos confortá-lo." Ultrapassados os primeiros momentos de tensão do acidente, João Paulo recorda episódios: "Uma senhora de 60 anos, que no domingo vinha do Porto para em- barcar em Lisboa no mesmo autocarro que eu e deu bolachas ao meu filho, faleceu, não posso esquecer a sua imagem."
O relato é interrompido por um sinal sonoro dos altifalantes do paquete Funchal. Uma voz feminina, em tom suave, chega claramente pelo telefone: "Senhores passageiros das cabines número... favor dirigirem-se à recepção." João Paulo explica: "Estão a chamá-los para darem informações sobre os seus familiares." Os seus, os pais e os quatro filhos que o acompanhavam no cruzeiro a Gibraltar, Málaga e Ceuta, estão bem. Mas o professor reconhece que são momentos difíceis: "Ainda estamos todos em estado de choque."
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A sua voz é tranquila. O relato compassado. "Começou a chover dez qui- lómetros depois de passarmos a fron- teira de Espanha com Marrocos", recorda. A caravana de cinco autocarros rumava a Tétuan para uma excursão de compras. "Foi então que o primeiro autocarro começou aos ziguezagues, atravessou a estrada e capotou, ficou com as rodas para o ar", prossegue João Paulo. "O nosso autocarro parou mais à frente, disseram-nos para não sairmos, mas corremos para o local do acidente", continua: "Quando chegámos já lá estavam marroquinos que tinham partido os vidros, desligado o motor e começavam a tirar as pessoas."
Primeiro os feridos ligeiros, depois outros mais graves. Finalmente os mortos. "Um estava na parte da frente e outros quatro viajavam atrás", relembra: "Estendemos os corpos na relva, demos água aos sobreviventes que, entre choros, chamavam pelos seus acompanhantes." Os turistas desdobravam-se no auxílio: "Quem ti- nha, dava comprimidos para as dores a quem estava aleijado". João Paulo não corrobora críticas quanto ao atraso da ajuda. "Os socorros, a polícia e as ambulâncias não chegaram muito tarde", assegura.
Depois, foi o caminho inverso. O regresso ao Porto de Ceuta. "O autocarro número dois regressou com feridos ligeiros", continua. Não foi fácil a viagem: "Um senhor de cerca de 50 anos chorou todo o caminho, a mãe tinha morrido e ele dizia que não tinha mais ninguém na vida... tentámos confortá-lo." Ultrapassados os primeiros momentos de tensão do acidente, João Paulo recorda episódios: "Uma senhora de 60 anos, que no domingo vinha do Porto para em- barcar em Lisboa no mesmo autocarro que eu e deu bolachas ao meu filho, faleceu, não posso esquecer a sua imagem."
O relato é interrompido por um sinal sonoro dos altifalantes do paquete Funchal. Uma voz feminina, em tom suave, chega claramente pelo telefone: "Senhores passageiros das cabines número... favor dirigirem-se à recepção." João Paulo explica: "Estão a chamá-los para darem informações sobre os seus familiares." Os seus, os pais e os quatro filhos que o acompanhavam no cruzeiro a Gibraltar, Málaga e Ceuta, estão bem. Mas o professor reconhece que são momentos difíceis: "Ainda estamos todos em estado de choque."