A doce fragrância de Wall Street

15-06-2011
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Todos deverão manifestar a indignação com um sistema que recompensa a ganância das elites a expensas dos cidadãos

Os longos cabelos cor de sol, os olhos azuis de céu esplendoroso, entre os tons rosados da face grave e pura como um mármore grego, a nobre elegância, suavidade e sensualidade tornavam Danielle Chiese uma doce fragrância nos círculos da alta finança e no centro das atenções como uma princesa cobiçada num reino de cortesãos. Danielle sabia-o e tirava vantagem, com mestria, da sua sexualidade no ultracompetitivo meio masculino dos edge funds do Wall Street. Deste modo, teve affairs com vários executivos, nomeadamente com Robert Moffatt, CEO da IBM, de quem obteve importantes informações confidenciais que lhe permitiram ganhar vários milhões de dólares na praça financeira de Manhattan. "Excita-me espremê-los e obter informações confidenciais dos corporate insiders", afirmou Danielle.

Todavia, ela era apenas um bom soldado numa sofisticada organização tentacular de milhares de informadores liderada por Raj Rajaratnam, CEO da trading Galleon, que diligentemente recolhiam informações secretas em cumplicidade com altos executivos das mais importantes instituições bancárias, empresas e experts da indústria financeira. Assim, foi possível à Galleon obter ganhos de muitos biliões de dólares em inside trading. Todavia, em resultado de uma das maiores investigações desenvolvidas pelo FBI, o Federal District Court em Manhattan, condenou Danielle e Rajaratnam, bem como grande parte dos membros deste inside trading network por fraude e conspiracão financeira. De acordo com Anil Kumar, trader da McKinseye, agora sob custódia das autoridades americanas: "era impossível resistir à oferta $500,000 de Rajaratnam para lhe providenciar inside information".

Muito embora esta possa parecer uma história incomum, a verdade é que o sr. Rajaratnam não é muito diferente de milhares de traders e information networks que orbitam e manipulam, em seu benefício, os mercados financeiros de todo o mundo, sendo que a maior parte nem sequer é investigada e muito menos descoberta. Nesta equação, o mais ultrajante é que os responsáveis da maior crise financeira mundial que se abateu em 2008 e cujas consequências continuam a ser devastadoras em todo mundo, atirando milhões de pessoas para o desespero e para a miséria (em particular nas economias abertas como a portuguesa), não só não foram incriminados judicialmente, com excepção dos manager traders Ralph Cioffi e Mathew Tannin do Bear Sterns (os quais foram, posteriormente, considerados não culpados por um júri de Brooklin), como também levaram nos bolsos, ilegalmente, biliões de dólares. Acresce que outros potenciais culpados, designadamente Joseph Cassano, CEO da AIG Financial Products; Angelo Mozilo, CEO da Contrywide Finantial; e Dick Fuld, CEO do Lehman Brothers, foram apenas simbolicamente multados.

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As pessoas estão revoltadas. Por conseguinte, um grupo denominado Onmay12.org, constituído por uma coligação de anónimos, estudantes universitários, académicos e grupos progressistas, catalisados pelos cortes sociais implementados pelo presidente da Câmara de Nova Iorque, Michael Bloomberg, manifestaram a sua indignação numa semana de concentrações de protesto em frente à sede do Goldman Sachs"s, em frente à sede do Bank of America e frente a Wall Street, exigindo aos banqueiros milionários que paguem os prejuízos causados. Em Portugal, a crise, consequência das decisões gananciosas de alguns banqueiros, não foi diferente. Assim, os responsáveis pela "brilhante" gestão de algumas instituições (tornadas insolventes), depois de terem recebido indemnizações que fariam corar os cleptocratas africanos, mordomias dignas de príncipes e reformas douradas, passeiam-se despudoradamente como se nada se tivesse passado.

Vale a pena lembrar que a estatização do BPN acrescentou ao défice público cerca de 0,5% (de 8,6% passou para 9,1%), isto é, cerca de três biliões de euros. Em consequência, enquanto uns pagam a "genial e talentosa" gestão destes banqueiros, outros vivem miseravelmente, não obtendo sequer os proventos necessários para alimentar aos seus fihos. E, embora não sendo os responsáveis da presente crise, são eles que, escandalosamente, irão pagar os prejuízos causados por aqueles "cérebros". Neste sentido, em face destes argumentos, no mínimo, aquilo que as autoridades judiciais e políticas envolvidas deveriam efectuar, num acto de responsabilidade social, seria informar os seus concidadãos sobre o resultado das investigações desenvolvidas, pois todos têm o direito de conhecer e compreender as razões pelas quais estes banqueiros foram deixados em liberdade. Sem esta informação, permanecerá sempre o sentimento de profunda injustiça, alimentando a enormíssima frustração e desacreditação do sistema judicial, político e financeiro.

É sempre, para mim, incompreensível a velocidade com que os media e os líderes políticos, mesmo em campanha eleitoral, se esquecem destes casos gritantes de injustiça social e não solicitem às autoridades responsáveis a actualização das investigações de forma a que estes processos não fiquem deliberadamente esquecidos no tempo e no fundo de uma qualquer gaveta à espera de prescrição. "O mundo pagou com dezenas de milhões de desempregados e biliões de dólares aos bancos, por isso, as pessoas têm o direito de ser informadas e de estarem revoltadas", afirmou Sarkozy em Davos, na Suíça. Neste sentido, todos deverão manifestar indignação com um sistema que recompensa a ganância das elites financeiras e políticas a expensas dos cidadãos anónimos e inocentes. Professor e investigador, Universidade do Texas - EUA/ Universidade Nova de Lisboa

Todos deverão manifestar a indignação com um sistema que recompensa a ganância das elites a expensas dos cidadãos

Os longos cabelos cor de sol, os olhos azuis de céu esplendoroso, entre os tons rosados da face grave e pura como um mármore grego, a nobre elegância, suavidade e sensualidade tornavam Danielle Chiese uma doce fragrância nos círculos da alta finança e no centro das atenções como uma princesa cobiçada num reino de cortesãos. Danielle sabia-o e tirava vantagem, com mestria, da sua sexualidade no ultracompetitivo meio masculino dos edge funds do Wall Street. Deste modo, teve affairs com vários executivos, nomeadamente com Robert Moffatt, CEO da IBM, de quem obteve importantes informações confidenciais que lhe permitiram ganhar vários milhões de dólares na praça financeira de Manhattan. "Excita-me espremê-los e obter informações confidenciais dos corporate insiders", afirmou Danielle.

Todavia, ela era apenas um bom soldado numa sofisticada organização tentacular de milhares de informadores liderada por Raj Rajaratnam, CEO da trading Galleon, que diligentemente recolhiam informações secretas em cumplicidade com altos executivos das mais importantes instituições bancárias, empresas e experts da indústria financeira. Assim, foi possível à Galleon obter ganhos de muitos biliões de dólares em inside trading. Todavia, em resultado de uma das maiores investigações desenvolvidas pelo FBI, o Federal District Court em Manhattan, condenou Danielle e Rajaratnam, bem como grande parte dos membros deste inside trading network por fraude e conspiracão financeira. De acordo com Anil Kumar, trader da McKinseye, agora sob custódia das autoridades americanas: "era impossível resistir à oferta $500,000 de Rajaratnam para lhe providenciar inside information".

Muito embora esta possa parecer uma história incomum, a verdade é que o sr. Rajaratnam não é muito diferente de milhares de traders e information networks que orbitam e manipulam, em seu benefício, os mercados financeiros de todo o mundo, sendo que a maior parte nem sequer é investigada e muito menos descoberta. Nesta equação, o mais ultrajante é que os responsáveis da maior crise financeira mundial que se abateu em 2008 e cujas consequências continuam a ser devastadoras em todo mundo, atirando milhões de pessoas para o desespero e para a miséria (em particular nas economias abertas como a portuguesa), não só não foram incriminados judicialmente, com excepção dos manager traders Ralph Cioffi e Mathew Tannin do Bear Sterns (os quais foram, posteriormente, considerados não culpados por um júri de Brooklin), como também levaram nos bolsos, ilegalmente, biliões de dólares. Acresce que outros potenciais culpados, designadamente Joseph Cassano, CEO da AIG Financial Products; Angelo Mozilo, CEO da Contrywide Finantial; e Dick Fuld, CEO do Lehman Brothers, foram apenas simbolicamente multados.

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As pessoas estão revoltadas. Por conseguinte, um grupo denominado Onmay12.org, constituído por uma coligação de anónimos, estudantes universitários, académicos e grupos progressistas, catalisados pelos cortes sociais implementados pelo presidente da Câmara de Nova Iorque, Michael Bloomberg, manifestaram a sua indignação numa semana de concentrações de protesto em frente à sede do Goldman Sachs"s, em frente à sede do Bank of America e frente a Wall Street, exigindo aos banqueiros milionários que paguem os prejuízos causados. Em Portugal, a crise, consequência das decisões gananciosas de alguns banqueiros, não foi diferente. Assim, os responsáveis pela "brilhante" gestão de algumas instituições (tornadas insolventes), depois de terem recebido indemnizações que fariam corar os cleptocratas africanos, mordomias dignas de príncipes e reformas douradas, passeiam-se despudoradamente como se nada se tivesse passado.

Vale a pena lembrar que a estatização do BPN acrescentou ao défice público cerca de 0,5% (de 8,6% passou para 9,1%), isto é, cerca de três biliões de euros. Em consequência, enquanto uns pagam a "genial e talentosa" gestão destes banqueiros, outros vivem miseravelmente, não obtendo sequer os proventos necessários para alimentar aos seus fihos. E, embora não sendo os responsáveis da presente crise, são eles que, escandalosamente, irão pagar os prejuízos causados por aqueles "cérebros". Neste sentido, em face destes argumentos, no mínimo, aquilo que as autoridades judiciais e políticas envolvidas deveriam efectuar, num acto de responsabilidade social, seria informar os seus concidadãos sobre o resultado das investigações desenvolvidas, pois todos têm o direito de conhecer e compreender as razões pelas quais estes banqueiros foram deixados em liberdade. Sem esta informação, permanecerá sempre o sentimento de profunda injustiça, alimentando a enormíssima frustração e desacreditação do sistema judicial, político e financeiro.

É sempre, para mim, incompreensível a velocidade com que os media e os líderes políticos, mesmo em campanha eleitoral, se esquecem destes casos gritantes de injustiça social e não solicitem às autoridades responsáveis a actualização das investigações de forma a que estes processos não fiquem deliberadamente esquecidos no tempo e no fundo de uma qualquer gaveta à espera de prescrição. "O mundo pagou com dezenas de milhões de desempregados e biliões de dólares aos bancos, por isso, as pessoas têm o direito de ser informadas e de estarem revoltadas", afirmou Sarkozy em Davos, na Suíça. Neste sentido, todos deverão manifestar indignação com um sistema que recompensa a ganância das elites financeiras e políticas a expensas dos cidadãos anónimos e inocentes. Professor e investigador, Universidade do Texas - EUA/ Universidade Nova de Lisboa

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