Almanaque Republicano

18-12-2009
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Sarmento Pimentel e o Fevereiro 1927 "[Norberto Lopes] ... Em que circunstâncias tomou parte no 3 de Fevereiro?- [Sarmento Pimentel] A convite de amigos e companheiros da Flandres. O Jaime Cortesão e o Jaime de Morais foram ao Porto falar comigo. Disse-lhes que só tomaria parte do movimento, se as coisas fossem organizadas com cabeça, se Lisboa secundasse o grito de revolta do Porto, onde tudo parecia estar bem preparado de modo a assegurar a vitória. Não aconteceu assim. Lisboa hesitou, não aderiu logo e a revolta falhou. Por culpa de quem? Dos conjurados de Lisboa, que não vieram logo para a rua, como estava combinado, e que comprometeram, assim, irremediavelmente, o levantamento do Norte. Por culpa dos tímidos, dos pusilânimes, dos cobardes e daqueles que viram que a revolução não servia os seus interesses, e, sendo republicanos, contrariaram o movimento. Arrependeram-se depois. Mas já era tarde. Quando o general Simas Machado me procurou, alegando que a minha adesão traria para o lado dos revolucionários dois amigos meus com influência decisiva na guarnição militar de Lisboa - o major Ribeiro de Carvalho e o capitão Francisco Aragão -, voltei a dizer que a revolta só podia triunfar se rebentasse simultaneamente em Lisboa e no Porto. Não aconteceu assim e a revolução perdeu-se. Ribeiro de Carvalho e Aragão não saíram, alegando que a revolta do Porto era nitidamente partidária, contra o exercito, e que, além disso, o momento não se prestava para tomarem qualquer atitude. Anos depois, tanto o Aragão, demitido e exilado, como o Ribeiro de Carvalho, que chegou a passar fome, tiveram a franqueza de me dizer que se haviam enganado e que a revolta do Porto se perdeu por falta de apoio dos republicanos de Lisboa. A capital acordou quatro dias depois, mas já não serviu de nada. Àquele levantamento tardio chamámos nós, mais tarde, 'a revolução do remorso'. Quando me encontrei com o Aragão no exílio, ele caiu-me nos braços a chorar, dizendo: 'Tu é que tinhas razão!' E eu limitei-me a responder-lhe: 'Agora é tarde e Inês é morta', como se dizia em Suçães quando se representava o drama da mísera e mesquinha ..."[in Sarmento Pimentel ou uma Geração Traída. Diálogos de Norberto Lopes com o autor das ‘Memorias do Capitão’ pref. de Vitorino Nemésio, Áster, 1976 - sublinhados nossos]J.M.M.


Sarmento Pimentel e o Fevereiro 1927 "[Norberto Lopes] ... Em que circunstâncias tomou parte no 3 de Fevereiro?- [Sarmento Pimentel] A convite de amigos e companheiros da Flandres. O Jaime Cortesão e o Jaime de Morais foram ao Porto falar comigo. Disse-lhes que só tomaria parte do movimento, se as coisas fossem organizadas com cabeça, se Lisboa secundasse o grito de revolta do Porto, onde tudo parecia estar bem preparado de modo a assegurar a vitória. Não aconteceu assim. Lisboa hesitou, não aderiu logo e a revolta falhou. Por culpa de quem? Dos conjurados de Lisboa, que não vieram logo para a rua, como estava combinado, e que comprometeram, assim, irremediavelmente, o levantamento do Norte. Por culpa dos tímidos, dos pusilânimes, dos cobardes e daqueles que viram que a revolução não servia os seus interesses, e, sendo republicanos, contrariaram o movimento. Arrependeram-se depois. Mas já era tarde. Quando o general Simas Machado me procurou, alegando que a minha adesão traria para o lado dos revolucionários dois amigos meus com influência decisiva na guarnição militar de Lisboa - o major Ribeiro de Carvalho e o capitão Francisco Aragão -, voltei a dizer que a revolta só podia triunfar se rebentasse simultaneamente em Lisboa e no Porto. Não aconteceu assim e a revolução perdeu-se. Ribeiro de Carvalho e Aragão não saíram, alegando que a revolta do Porto era nitidamente partidária, contra o exercito, e que, além disso, o momento não se prestava para tomarem qualquer atitude. Anos depois, tanto o Aragão, demitido e exilado, como o Ribeiro de Carvalho, que chegou a passar fome, tiveram a franqueza de me dizer que se haviam enganado e que a revolta do Porto se perdeu por falta de apoio dos republicanos de Lisboa. A capital acordou quatro dias depois, mas já não serviu de nada. Àquele levantamento tardio chamámos nós, mais tarde, 'a revolução do remorso'. Quando me encontrei com o Aragão no exílio, ele caiu-me nos braços a chorar, dizendo: 'Tu é que tinhas razão!' E eu limitei-me a responder-lhe: 'Agora é tarde e Inês é morta', como se dizia em Suçães quando se representava o drama da mísera e mesquinha ..."[in Sarmento Pimentel ou uma Geração Traída. Diálogos de Norberto Lopes com o autor das ‘Memorias do Capitão’ pref. de Vitorino Nemésio, Áster, 1976 - sublinhados nossos]J.M.M.

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