Governos civis: extinção, já...

19-12-2010
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Para melhor se aquilatar da (in) utilidade dos governos civis, útil será analisar a realidade dos outros países da UE

A continuidade ou não dos governos civis vem ciclicamente ocupando lugar na agenda política, sem, no entanto, ter propiciado uma discussão séria e rigorosa. Na actual conjuntura, aos argumentos do costume acresce o da crise que, evidentemente, deve ser levado em conta e merecer reflexão e decisão adequadas à s circunstâncias.

Nos termos constitucionais, a criação das regiões permite a extinção dos distritos e dos governos civis a eles associados. Algumas propostas de revisão constitucional em agenda visam antecipar o momento do fim destes, cavalgando argumentos risíveis e, nalguns casos, sinalizadores de má fé ou confrangedora ignorância.

A Região, que não deve ser mais adiada, no país mentor e prisioneiro do mais anquilosado e iníquo modelo concentracionista de toda a UE, com resultados bem visíveis, será uma autarquia de nível superior, com atribuições e competências a definir em lei da República. A Região será sinónimo de descentralização, só concebível como factor de racionalização de despesa, de progresso e desenvolvimento e nunca como instrumento de protesto ou multiplicador de bairrismos fúteis.

Os governos civis, com história e funções que muitos comentaristas ignoram e dignidade que outros tentam vilipendiar, exercem no Portugal democrático funções de representação do governo junto dos cidadãos. Corporizam relação de proximidade de uma entidade administrativa com poderes de polícia, competências na protecção civil e na segurança pública, que, como sabemos, constituem áreas de soberania não descentralizáveis para a vertente autárquica e que requerem uma malha de intervenção que se ajusta à escala territorial dos distritos.

A marcha seguida ao longo dos tempos vai no sentido do esvaziamento dos governos civis e da concentração progressiva dos serviços da administração do Estado, a par da transferência de algumas competências para as câmaras municipais. Todavia, defendo que esta tendência não se deve transformar em dogma ou determinismo acima de qualquer opinião ou análise crítica. Razões e exemplos práticos não faltam, como é patente no caso da segurança rodoviária, área em que os governos civis ainda exercem actividade. Nesta matéria, será útil questionar os resultados da actual concentração verificada na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, designadamente no que se relaciona com os processos de contra-ordenação. O mesmo se diga relativamente aos efeitos da transferência para as câmaras municipais dos licenciamentos de bares e discotecas que consubstanciam inadmissível postergação de direitos fundamentais dos cidadãos.

Quanto ao apregoado despesismo dos governos civis, refira-se que actividade destes é, em grande parte, financiada através de receitas provenientes dos serviços que prestam. São instituições com reduzida expressão na realização da despesa pública. Para além da despesa com pessoal, com pouco significado, também porque, infelizmente para eles, os funcionários não auferem salários elevados, a restante componente da despesa reflecte-se no apoio directo a instituições distritais de interesse público, designadamente aos bombeiros voluntários. É pois uma falácia e exercício de demagogia barata insinuar que através da extinção dos governos civis se poupará, moralizando na tarefa de redução da despesa pública.

Para melhor se aquilatar da (in) utilidade dos governos civis, útil será analisar a realidade dos outros países da União Europeia. Nestes, com o processo de regionalização cumprido há já vários anos, existem "governadores civis" nos espaços territoriais semelhantes aos nossos distritos, que coexistem com as Regiões, tendo como funções, entre outras, as de representação dos respectivos governos e de aproximação das administrações ao cidadão. Como é o caso do perfeito nos Departamentos, em França, ou do delegado junto das Províncias, em Espanha, aqui tão perto.

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Certo estava Vital Moreira, quando defendia, a propósito do Programa de Reestruturação da Administração do Estado: "Quanto aos distritos, foi já anunciado que os governadores civis não vão acabar, ao contrário do que foi proposto pela comissão que elaborou o PRACE. Há duas boas razões para essa opção governativa. Primeiro, a continuidade dos distritos está garantida na própria Constituição, pelo menos até à criação das regiões administrativas; segundo, existem serviços públicos que reclamam uma malha territorial mais fina do que as cinco regiões-plano, como sucede com as funções de segurança pública e protecção civil. A subsistência dos distritos arrasta a dos governadores civis, desde sempre associados à existência daqueles. Ponto é que, além da direcção dos referidos serviços do Estado e da representação local do governo, os governadores civis sejam incumbidos da tarefa que a Constituição expressamente lhes confere, a saber, o exercício das funções de tutela sobre as autarquias locais, funções que infelizmente não praticam."

Por estas e outras razões, impõe-se clarificação política que garanta a dignificação e eficácia dos governos civis, ou que promova a sua rápida dispensa do quadro da organização administrativa do país, em função do real interesse nacional e não a reboque de pusilânimes argumentos de ocasião. Governador civil de Braga

Para melhor se aquilatar da (in) utilidade dos governos civis, útil será analisar a realidade dos outros países da UE

A continuidade ou não dos governos civis vem ciclicamente ocupando lugar na agenda política, sem, no entanto, ter propiciado uma discussão séria e rigorosa. Na actual conjuntura, aos argumentos do costume acresce o da crise que, evidentemente, deve ser levado em conta e merecer reflexão e decisão adequadas à s circunstâncias.

Nos termos constitucionais, a criação das regiões permite a extinção dos distritos e dos governos civis a eles associados. Algumas propostas de revisão constitucional em agenda visam antecipar o momento do fim destes, cavalgando argumentos risíveis e, nalguns casos, sinalizadores de má fé ou confrangedora ignorância.

A Região, que não deve ser mais adiada, no país mentor e prisioneiro do mais anquilosado e iníquo modelo concentracionista de toda a UE, com resultados bem visíveis, será uma autarquia de nível superior, com atribuições e competências a definir em lei da República. A Região será sinónimo de descentralização, só concebível como factor de racionalização de despesa, de progresso e desenvolvimento e nunca como instrumento de protesto ou multiplicador de bairrismos fúteis.

Os governos civis, com história e funções que muitos comentaristas ignoram e dignidade que outros tentam vilipendiar, exercem no Portugal democrático funções de representação do governo junto dos cidadãos. Corporizam relação de proximidade de uma entidade administrativa com poderes de polícia, competências na protecção civil e na segurança pública, que, como sabemos, constituem áreas de soberania não descentralizáveis para a vertente autárquica e que requerem uma malha de intervenção que se ajusta à escala territorial dos distritos.

A marcha seguida ao longo dos tempos vai no sentido do esvaziamento dos governos civis e da concentração progressiva dos serviços da administração do Estado, a par da transferência de algumas competências para as câmaras municipais. Todavia, defendo que esta tendência não se deve transformar em dogma ou determinismo acima de qualquer opinião ou análise crítica. Razões e exemplos práticos não faltam, como é patente no caso da segurança rodoviária, área em que os governos civis ainda exercem actividade. Nesta matéria, será útil questionar os resultados da actual concentração verificada na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, designadamente no que se relaciona com os processos de contra-ordenação. O mesmo se diga relativamente aos efeitos da transferência para as câmaras municipais dos licenciamentos de bares e discotecas que consubstanciam inadmissível postergação de direitos fundamentais dos cidadãos.

Quanto ao apregoado despesismo dos governos civis, refira-se que actividade destes é, em grande parte, financiada através de receitas provenientes dos serviços que prestam. São instituições com reduzida expressão na realização da despesa pública. Para além da despesa com pessoal, com pouco significado, também porque, infelizmente para eles, os funcionários não auferem salários elevados, a restante componente da despesa reflecte-se no apoio directo a instituições distritais de interesse público, designadamente aos bombeiros voluntários. É pois uma falácia e exercício de demagogia barata insinuar que através da extinção dos governos civis se poupará, moralizando na tarefa de redução da despesa pública.

Para melhor se aquilatar da (in) utilidade dos governos civis, útil será analisar a realidade dos outros países da União Europeia. Nestes, com o processo de regionalização cumprido há já vários anos, existem "governadores civis" nos espaços territoriais semelhantes aos nossos distritos, que coexistem com as Regiões, tendo como funções, entre outras, as de representação dos respectivos governos e de aproximação das administrações ao cidadão. Como é o caso do perfeito nos Departamentos, em França, ou do delegado junto das Províncias, em Espanha, aqui tão perto.

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Certo estava Vital Moreira, quando defendia, a propósito do Programa de Reestruturação da Administração do Estado: "Quanto aos distritos, foi já anunciado que os governadores civis não vão acabar, ao contrário do que foi proposto pela comissão que elaborou o PRACE. Há duas boas razões para essa opção governativa. Primeiro, a continuidade dos distritos está garantida na própria Constituição, pelo menos até à criação das regiões administrativas; segundo, existem serviços públicos que reclamam uma malha territorial mais fina do que as cinco regiões-plano, como sucede com as funções de segurança pública e protecção civil. A subsistência dos distritos arrasta a dos governadores civis, desde sempre associados à existência daqueles. Ponto é que, além da direcção dos referidos serviços do Estado e da representação local do governo, os governadores civis sejam incumbidos da tarefa que a Constituição expressamente lhes confere, a saber, o exercício das funções de tutela sobre as autarquias locais, funções que infelizmente não praticam."

Por estas e outras razões, impõe-se clarificação política que garanta a dignificação e eficácia dos governos civis, ou que promova a sua rápida dispensa do quadro da organização administrativa do país, em função do real interesse nacional e não a reboque de pusilânimes argumentos de ocasião. Governador civil de Braga

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