Nesta hora: A publicidade e a propaganda não garantem um prazo de validade ilimitado e na política também há coisas efémeras

22-05-2011
marcar artigo


Começou a queda da casa de Sócrates«João Cravinho deu o tiro de partida: "o efeito Sócrates só por si já não chega". E de Santarém chegaram-nos imagens de um primeiro-ministro que sabe que a corrida já começou. Nem sequer é a corrida ao seu lugar. O que sempre seria um combate aberto. É sim este desmarcar-se. As derrotas nunca são bonitas de se ver e são ainda mais penosas as derrotas de um líder que em vez de apoiantes tem dependentes.O PS nunca apoiou Sócrates por aquilo que ele pensava ou defendia, mas sim porque ele lhes garantiu o poder. Sócrates não é para o PS um líder. Como diz Cravinho, Sócrates é um efeito. Um efeito que, valha a verdade, deu uma maioria absoluta ao PS. Mas, sem poder, Sócrates não tem qualquer préstimo para os socialistas - não tem o mundo internacional de Soares e dificilmente lhes pode trazer o prestígio da colocação numa agência internacional como aconteceu com Sampaio e Guterres. O PS está disposto a fechar os olhos a todos os equívocos de Sócrates enquanto existir poder. Assim que o poder se acabar, os socialistas serão os mais violentos nas críticas a tudo aquilo que até agora fizeram de conta que não viram. Sem poder, Sócrates é um embaraço. Por isso, ao primeiro sinal de que o efeito Sócrates se estava a extinguir, as cadeiras do Altis ficaram vazias.Desconheço que explicações deram ao líder do PS para o desastre dessa noite os muito celebrados especialistas em marketing político que terá contratado e que lhe têm sabido encher os pavilhões dos comícios e escolher o enquadramento em que deve surgir. Mas que muito provavelmente contribuíram para acentuar o seu afastamento das bases do partido e sobretudo para o tornar cada vez mais dependente dessa mesma máquina de propaganda. Durante algum tempo resultou, mas progressivamente o primeiro-ministro foi ficando em delay com o país. Tal como numa novela mexicana, em que os movimentos dos lábios não coincidem com as frases que ouvimos, também o país em que vivemos não coincide com o país de que fala José Sócrates.Esta captura do discurso político pelos especialistas do marketing levou a este desacerto entre o país real e o país do discurso governamental. Mas não só. Mais do que falar do país, dos seus problemas e discutir seriamente as soluções que propõe, José Sócrates passa de sessões de anúncio para sessões de anúncio, invariavelmente abrilhantadas com figurantes, e fala obsessivamente de notícias, jornalistas, directores de jornais... como se o seu mundo não fosse mais do que isso: ser um efeito. Mas agora que já se ouve que o "efeito Sócrates só por si já não chega" talvez seja o momento para que no Largo do Rato se passe para part time a agência de comunicação e se arranje tempo para ouvir os políticos.»Helena Matos. "Começou a queda da casa de Sócrates". Público: 11.Junho.2009.


Começou a queda da casa de Sócrates«João Cravinho deu o tiro de partida: "o efeito Sócrates só por si já não chega". E de Santarém chegaram-nos imagens de um primeiro-ministro que sabe que a corrida já começou. Nem sequer é a corrida ao seu lugar. O que sempre seria um combate aberto. É sim este desmarcar-se. As derrotas nunca são bonitas de se ver e são ainda mais penosas as derrotas de um líder que em vez de apoiantes tem dependentes.O PS nunca apoiou Sócrates por aquilo que ele pensava ou defendia, mas sim porque ele lhes garantiu o poder. Sócrates não é para o PS um líder. Como diz Cravinho, Sócrates é um efeito. Um efeito que, valha a verdade, deu uma maioria absoluta ao PS. Mas, sem poder, Sócrates não tem qualquer préstimo para os socialistas - não tem o mundo internacional de Soares e dificilmente lhes pode trazer o prestígio da colocação numa agência internacional como aconteceu com Sampaio e Guterres. O PS está disposto a fechar os olhos a todos os equívocos de Sócrates enquanto existir poder. Assim que o poder se acabar, os socialistas serão os mais violentos nas críticas a tudo aquilo que até agora fizeram de conta que não viram. Sem poder, Sócrates é um embaraço. Por isso, ao primeiro sinal de que o efeito Sócrates se estava a extinguir, as cadeiras do Altis ficaram vazias.Desconheço que explicações deram ao líder do PS para o desastre dessa noite os muito celebrados especialistas em marketing político que terá contratado e que lhe têm sabido encher os pavilhões dos comícios e escolher o enquadramento em que deve surgir. Mas que muito provavelmente contribuíram para acentuar o seu afastamento das bases do partido e sobretudo para o tornar cada vez mais dependente dessa mesma máquina de propaganda. Durante algum tempo resultou, mas progressivamente o primeiro-ministro foi ficando em delay com o país. Tal como numa novela mexicana, em que os movimentos dos lábios não coincidem com as frases que ouvimos, também o país em que vivemos não coincide com o país de que fala José Sócrates.Esta captura do discurso político pelos especialistas do marketing levou a este desacerto entre o país real e o país do discurso governamental. Mas não só. Mais do que falar do país, dos seus problemas e discutir seriamente as soluções que propõe, José Sócrates passa de sessões de anúncio para sessões de anúncio, invariavelmente abrilhantadas com figurantes, e fala obsessivamente de notícias, jornalistas, directores de jornais... como se o seu mundo não fosse mais do que isso: ser um efeito. Mas agora que já se ouve que o "efeito Sócrates só por si já não chega" talvez seja o momento para que no Largo do Rato se passe para part time a agência de comunicação e se arranje tempo para ouvir os políticos.»Helena Matos. "Começou a queda da casa de Sócrates". Público: 11.Junho.2009.

marcar artigo