Em Defesa do Benfica: O Presidente dos Presidentes

27-05-2011
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OPINIÃO              

Joaquim Ferreira Bogalho (1899 - 1977)

Quando se fazem biografias de personalidades com mais de cem anos, ou mesmo, se viveram há 50 anos, surge muitas vezes a ideia que os tempos eram outros. E eram. Mas há valores transversais a todas as sociedades e ao correr do tempo. São valores universais, de ontem, hoje e amanhã. Há valores intocáveis. Os únicos que podem ser questionados, são os referentes à idade, pois a entrada no mercado de trabalho tem tendência para ser cada vez mais tardia.
Entre todos os 32 presidentes da Direcção que já concluíram os seus mandatos nas gerências do “Glorioso”, Joaquim Ferreira Bogalho (20.º de sempre, em cronologia) merece destaque, por ser um exemplo para todos, em particular, para os presidentes da Direcção.  
Adepto fervorosoNasceu fora de Lisboa, na pequena Benedita, a 20 quilómetros, da sede de concelho – Alcobaça – em 11 de Dezembro de 1899. Pouco tempo depois de chegar a Lisboa, para viver e trabalhar, aos 18 anos (9 de Dezembro de 1918) entrou para associado. Disponibilizou-se para ajudar o Clube, como guarda-redes da 4.ª categoria. Com “carreira” efémera, aos domingos, corria atrás do futebol do Benfica, como espectador e adepto vigoroso.
Mesmo com dúvidas, acerca da viabilidade do projecto, passou a “Sócio Titular” aos 23 anos (1 de Junho de 1923) para financiar a construção do Estádio das Amoreiras. Se a decisão foi por maioria, em Assembleia Geral, cabia-lhe respeitá-la e, mesmo em esforço, contribuir para que fosse um sucesso.
Chegar-se à frentePara o acto eleitoral de 5 de Agosto de 1926, com 25 anos, não liderou a contestação à Direcção (liderada por Bento Mântua/ Cosme Damião) que se propôs à reeleição, mas chamado a fazer parte da “Lista da Oposição” aceitou para “Servir o Benfica”. Ou seja, quando foi necessário, hesitando ou não, avançou. Mesmo “contra um dos 24 fundadores, Cosme Damião”! Com a vitória, estreou-se como dirigente (vice-secretário para a Direcção). Os dirigentes procuravam, resolver o imbróglio dos empréstimos para pagar as Amoreiras e a necessidade de fazer regressar aos tempos gloriosos a equipa de futebol que não conquistava um título de campeão desde 1920. Crítico, soube ser digno, avançando, para fazer valer a sua frontabilidade – ainda que num cargo “secundário” (mas também importante numa Direcção que funcionava democraticamente por livre expressão) a bem da prosperidade do Clube.
“Águia de Oiro”Mantendo-se dirigente, com sufrágios democráticos secretos, directos e universais, anuais, tomou parte activa na resolução da “melindrosa questão financeira” sendo eleito como tesoureiro da Direcção. Coube-lhe a negociação, implacavel, da expropriação do Estádio das Amoreiras. Depois de aturadas, e desgastantes, negociações com o Ministério das Obras Públicas do engenheiro Duarte Pacheco, conseguiu a verba necessária para pagar “de vez” os empréstimos e juros para erguer o Estádio 15 anos antes e construir uma bancada de madeira em “três quartas-partes” do Estádio do Campo Grande, num espaço camarário expropriado pela CML para zona de expansão viária da cidade (2.ª circular), pagando o “Glorioso” à CML uma renda mensal “acessível”! Resultado?! Finalmente o Benfica, segundo ele: “livrava-se do cancro que nos consumiu durante mais de dez anos o dinheiro para ganharmos no futebol.” Resultado?! A atribuição, com 38 anos, da Águia de Ouro, em 31 de Julho de 1938.
Chegar-se à frente (parte II)Depois de vários cargos, e também algum afastamento como dirigente, regressou à ribalta para voltar, com um grupo de associados, a contestar a decisão da Direcção presidida por Félix Bermudes que concordava com a proposta da CML para cedência de um terreno destinado à construção – definitiva – do “Novo Estádio”! Espaço exíguo e de localização pouco digna, bradaram os associados. Por maioria, a “Lista da Oposição” em 1946 (tal como em... 1926), venceu! Não quis protagonismo, pois considerava a sua passagem pela Secção de Futebol, pouco benéfica, em termos de resultados. Tinha 46 anos! Mas, não conseguia dizer “Não!” ao Benfica. Se esteve activo na mudança directiva, queria ajudar, onde fosse mais útil. Passou a integrar a “Comissão de Angariação de Fundos para a construção do Novo Estádio”.
“Presidente-Estádio”Com o “Processo Novo Estádio” a andar a passo de caracol, desde 1946, candidata-se a presidente da Direcção, aos 52 anos, em 15 de Março de 1952, com um objectivo bem definido: construir um Estádio digno da grandeza do Clube, ou seja, REAL, sem luxos, mas funcional. Eis o “Estádio da Luz” com dois anéis (com cerca de 30 mil lugares)! Apesar das pressões! E a Pista, senhor presidente!? E mais lugares, senhor presidente!? E o Plano da Cidade Desportiva, senhor Presidente!? “O Benfica merece um estádio digno, mas... o Estádio será o que os Benfiquistas quiserem e conseguirem. Nem mais, nem menos. Será construído por fases, à medida que os Benfiquistas forem contribuíndo. Quanto mais contribuirem, mas rápido terão o Estádio. Quando for inaugurado, terá de estar pago! Não deixarei encargos, nem um tostão de divida, para os Corpos Gerentes seguintes.” No dia 1 de Dezembro de 1954, o sonho tornava-se realidade. Foi inaugurada a “Catedral” – “A Primeira”, a “Inigualável”!
Ainda atalhou no mandato de 1954/55 – Um Futebol NovoE ainda decidiu contratar Otto Glória, para revolucionar o futebol do Benfica!
Descanso para um Magnífico BenfiquistaEm 30 de Março de 1957, aos 57 anos, deixava o cargo (e os cargos). Para trás ficava um passado de dirigente rico, riquíssimo. A fazer “escola”:
Para os jogadores de futebol (em particular, aos capitães) aconselhava: “De uma semana para a outra, de uma jornada para a seguinte, só mudam as cores dos equipamentos. O anti-Benfica é o mesmo. Vão criar-nos dificuldades. Depende se conseguem sair-se bem. E dependem de vocês darem “cabo deles!”
Para os funcionários (do Clube), técnicos e atletas (da Secção das Actividades Submarinas ao Xadrez) não tinha contemplações: “Respeitem, sempre, o dinheiro do Clube. É dinheiro de gente simples e humilde. É dinheiro do esforço de gente pobre que dá, porque gosta muito do Benfica. Sirvam-no. Não se sirvam dele! Depois do trabalho, jogo ou da competição, fiquem com a consciência tranquila! O Benfica é um Clube de gente laboriosa. Que merece ser respeitada por quem nele trabalha e do qual, recebe! Lembrem-se!”
Para os que se apresentavam como Benfiquistas, para conseguir emprego no Clube (de graça, segundo eles!), lugar numa modalidade (para ter bilhetes para o futebol à borla) ou posições para obter benefícios, rotulava-os de “BenfiQuistos”!
Nunca se serviu do Benfica (Só o serviu!) mas também não permitia que outros se servissem. É que por vezes os “danos” causados por terceiros, com consentimento dos presidentes é bem mais nocivo – por serem muitos – do que se fosse apenas um!
Faleceu, aos 77 anos, em 3º de Setembro de 1977.
Joaquim Ferreira Bogalho, um exemplo para o Benfiquismo.
Alberto Miguéns


OPINIÃO              

Joaquim Ferreira Bogalho (1899 - 1977)

Quando se fazem biografias de personalidades com mais de cem anos, ou mesmo, se viveram há 50 anos, surge muitas vezes a ideia que os tempos eram outros. E eram. Mas há valores transversais a todas as sociedades e ao correr do tempo. São valores universais, de ontem, hoje e amanhã. Há valores intocáveis. Os únicos que podem ser questionados, são os referentes à idade, pois a entrada no mercado de trabalho tem tendência para ser cada vez mais tardia.
Entre todos os 32 presidentes da Direcção que já concluíram os seus mandatos nas gerências do “Glorioso”, Joaquim Ferreira Bogalho (20.º de sempre, em cronologia) merece destaque, por ser um exemplo para todos, em particular, para os presidentes da Direcção.  
Adepto fervorosoNasceu fora de Lisboa, na pequena Benedita, a 20 quilómetros, da sede de concelho – Alcobaça – em 11 de Dezembro de 1899. Pouco tempo depois de chegar a Lisboa, para viver e trabalhar, aos 18 anos (9 de Dezembro de 1918) entrou para associado. Disponibilizou-se para ajudar o Clube, como guarda-redes da 4.ª categoria. Com “carreira” efémera, aos domingos, corria atrás do futebol do Benfica, como espectador e adepto vigoroso.
Mesmo com dúvidas, acerca da viabilidade do projecto, passou a “Sócio Titular” aos 23 anos (1 de Junho de 1923) para financiar a construção do Estádio das Amoreiras. Se a decisão foi por maioria, em Assembleia Geral, cabia-lhe respeitá-la e, mesmo em esforço, contribuir para que fosse um sucesso.
Chegar-se à frentePara o acto eleitoral de 5 de Agosto de 1926, com 25 anos, não liderou a contestação à Direcção (liderada por Bento Mântua/ Cosme Damião) que se propôs à reeleição, mas chamado a fazer parte da “Lista da Oposição” aceitou para “Servir o Benfica”. Ou seja, quando foi necessário, hesitando ou não, avançou. Mesmo “contra um dos 24 fundadores, Cosme Damião”! Com a vitória, estreou-se como dirigente (vice-secretário para a Direcção). Os dirigentes procuravam, resolver o imbróglio dos empréstimos para pagar as Amoreiras e a necessidade de fazer regressar aos tempos gloriosos a equipa de futebol que não conquistava um título de campeão desde 1920. Crítico, soube ser digno, avançando, para fazer valer a sua frontabilidade – ainda que num cargo “secundário” (mas também importante numa Direcção que funcionava democraticamente por livre expressão) a bem da prosperidade do Clube.
“Águia de Oiro”Mantendo-se dirigente, com sufrágios democráticos secretos, directos e universais, anuais, tomou parte activa na resolução da “melindrosa questão financeira” sendo eleito como tesoureiro da Direcção. Coube-lhe a negociação, implacavel, da expropriação do Estádio das Amoreiras. Depois de aturadas, e desgastantes, negociações com o Ministério das Obras Públicas do engenheiro Duarte Pacheco, conseguiu a verba necessária para pagar “de vez” os empréstimos e juros para erguer o Estádio 15 anos antes e construir uma bancada de madeira em “três quartas-partes” do Estádio do Campo Grande, num espaço camarário expropriado pela CML para zona de expansão viária da cidade (2.ª circular), pagando o “Glorioso” à CML uma renda mensal “acessível”! Resultado?! Finalmente o Benfica, segundo ele: “livrava-se do cancro que nos consumiu durante mais de dez anos o dinheiro para ganharmos no futebol.” Resultado?! A atribuição, com 38 anos, da Águia de Ouro, em 31 de Julho de 1938.
Chegar-se à frente (parte II)Depois de vários cargos, e também algum afastamento como dirigente, regressou à ribalta para voltar, com um grupo de associados, a contestar a decisão da Direcção presidida por Félix Bermudes que concordava com a proposta da CML para cedência de um terreno destinado à construção – definitiva – do “Novo Estádio”! Espaço exíguo e de localização pouco digna, bradaram os associados. Por maioria, a “Lista da Oposição” em 1946 (tal como em... 1926), venceu! Não quis protagonismo, pois considerava a sua passagem pela Secção de Futebol, pouco benéfica, em termos de resultados. Tinha 46 anos! Mas, não conseguia dizer “Não!” ao Benfica. Se esteve activo na mudança directiva, queria ajudar, onde fosse mais útil. Passou a integrar a “Comissão de Angariação de Fundos para a construção do Novo Estádio”.
“Presidente-Estádio”Com o “Processo Novo Estádio” a andar a passo de caracol, desde 1946, candidata-se a presidente da Direcção, aos 52 anos, em 15 de Março de 1952, com um objectivo bem definido: construir um Estádio digno da grandeza do Clube, ou seja, REAL, sem luxos, mas funcional. Eis o “Estádio da Luz” com dois anéis (com cerca de 30 mil lugares)! Apesar das pressões! E a Pista, senhor presidente!? E mais lugares, senhor presidente!? E o Plano da Cidade Desportiva, senhor Presidente!? “O Benfica merece um estádio digno, mas... o Estádio será o que os Benfiquistas quiserem e conseguirem. Nem mais, nem menos. Será construído por fases, à medida que os Benfiquistas forem contribuíndo. Quanto mais contribuirem, mas rápido terão o Estádio. Quando for inaugurado, terá de estar pago! Não deixarei encargos, nem um tostão de divida, para os Corpos Gerentes seguintes.” No dia 1 de Dezembro de 1954, o sonho tornava-se realidade. Foi inaugurada a “Catedral” – “A Primeira”, a “Inigualável”!
Ainda atalhou no mandato de 1954/55 – Um Futebol NovoE ainda decidiu contratar Otto Glória, para revolucionar o futebol do Benfica!
Descanso para um Magnífico BenfiquistaEm 30 de Março de 1957, aos 57 anos, deixava o cargo (e os cargos). Para trás ficava um passado de dirigente rico, riquíssimo. A fazer “escola”:
Para os jogadores de futebol (em particular, aos capitães) aconselhava: “De uma semana para a outra, de uma jornada para a seguinte, só mudam as cores dos equipamentos. O anti-Benfica é o mesmo. Vão criar-nos dificuldades. Depende se conseguem sair-se bem. E dependem de vocês darem “cabo deles!”
Para os funcionários (do Clube), técnicos e atletas (da Secção das Actividades Submarinas ao Xadrez) não tinha contemplações: “Respeitem, sempre, o dinheiro do Clube. É dinheiro de gente simples e humilde. É dinheiro do esforço de gente pobre que dá, porque gosta muito do Benfica. Sirvam-no. Não se sirvam dele! Depois do trabalho, jogo ou da competição, fiquem com a consciência tranquila! O Benfica é um Clube de gente laboriosa. Que merece ser respeitada por quem nele trabalha e do qual, recebe! Lembrem-se!”
Para os que se apresentavam como Benfiquistas, para conseguir emprego no Clube (de graça, segundo eles!), lugar numa modalidade (para ter bilhetes para o futebol à borla) ou posições para obter benefícios, rotulava-os de “BenfiQuistos”!
Nunca se serviu do Benfica (Só o serviu!) mas também não permitia que outros se servissem. É que por vezes os “danos” causados por terceiros, com consentimento dos presidentes é bem mais nocivo – por serem muitos – do que se fosse apenas um!
Faleceu, aos 77 anos, em 3º de Setembro de 1977.
Joaquim Ferreira Bogalho, um exemplo para o Benfiquismo.
Alberto Miguéns

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