pipáterra: o meu bairro

23-01-2011
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a minha terra chama-se picheleira.o nome é habitualmente motivo de gozo porque as pessoas não podem ver, ouvir ou ler uma qualquer palavra que tenha uma qualquer relação com coisas sexuais - nem que seja no que respeita à sonoridade das palavras - que desatam logo com um nervoso miudinho, que as leva a expelir risinhos nervosos, fazendo-as ficar parecidas com um bando de hienas.sucede assim com a minha querida picheleira, com a buraca, com a própria picha, com a coina, com a venda da gaita, com o posto sanitário do rego, com essas coisas, não é?algumas pessoas - parvas e provincianas - têm pudor em referir-se à sua origem como sendo da picheleira. ou porque têm vergonha do nome, ou porque, bem sei, os interlocutores ficam logo com aquele ar de "ui, da picheleira? isso é barra pesada, não é?", ou porque no tempo dos meus pais os táxis nem à picheleira iam, ou porque a telepizza não entregava na picheleira, ou porque se sentem de algum modo inibidos porque não sabem sequer o significado duma origem. é a vida.a pior coisa que aconteceu aos habitantes do bairronunca me considerei "picheleirense". quanto muito era vitoriano, como um dia expliquei aqui.foi terem um dia vindo uns caterpillers amarelos abrir uns buracos lá para os lados dos prédios da mira fernandes e da rua larga num sítio que tinha uma serração, para servirem de caboucos a uns prédios que o presidente do benfica iria para lá construir. ora sucede que para essas bandas havia lá uma quinta que tinha umas olaias e, imaginem, chamava-se quinta das olaias. esses prédios cresceram, a urbanização ficou mais desenvolvida, fizeram um centro comercial todo catita e alguns parvos habitantes do meu bairro desataram a dizer que moravam nas olaias em vez de morarem na picheleira.conheciam uma gaja e "ah e tal, eu cá moro nas olaias." para dar aquela pala, não é?e depois, com medo do nome ou coisa que o valha, tudo passou a ser olaias. alguns autocarros passaram a dizer olaias, as indicações aos automobilistas no alcatrão passaram a dizer olaias e até construiu-se uma escola, bem longe da antiga quinta das olaias e chamaram-na de, claro, escola das olaias.depois há as variações. recordo-me de um gajo que andava a tocar aí em bares e que se a memória não me falha, é actor de novelas, que um dia me disse no atéquenfim:- eu moro nas olaias sul.- sul? - perguntei?- sim.- em que rua?- na faria de vasconcelos.- mas assim sendo, estás mais perto do casal do pinto que das olaias. quanto muito, caso não gostes do termo, dizes que moras no casal do pinto norte.reparei que não percebeu.ontem, olhei para a tv e no telejornal vi a minha escola da primária. levantei o som do aparelho e estavam a explicar que apanharam um pedófilo, carteiro, que mora em frente à escola e que a troco de uns euros, convocava a garotada para lá ir a casa mostrar uns filmes pornográficos e servir como modelos nuns outros filmes também. ora segundo a notícia, a coisa passou-se nas olaias.por muito que isto não me orgulhe, tenho de ser vertical para o bem e para o mal. por isso, a coisa não aconteceu nas olaias. daquele local às olaias, é quase tanto como, sei lá, do campo pequeno ao saldanha, ou do saldanha ao marquês de pombal. para mim, infelizmente, aconteceram na picheleira. ou, quanto muito, aconteceram na quinta dos embrechados.e lá estão vocês: ihhh que raio de nomes. picheleira, embrechados....pois, mas se for assim a linha do pensamento vejam lá que nome gostariam de ter ostentado na vossa morada, embrechados ou lapa?lapas. f., grande pedra ou laje que, ressaindo de um rochedo, forma um abrigo;gruta;cavidade;Zool., molusco gasterópode univalve que adere aos rochedos;pedra solta;calhau;pop., bofetada.embrechadodo Lat. * imbliculatu < imbriculas. m., ornato de conchas incrustadas nas paredes das cascatas e jardins;fam., pessoa considerada um empecilho;visita ou hóspede importuno; (no pl. ) embutidos.uma coisa gira, pertantes: ah e tal, eu moro mesmo ali ao lado da tia cinha, moro no bairo da lapa, perdão, da gruta ou da cavidade. ou mesmo da bofetada.que bonito viram?tenho saudades do raio de frase que durante anos foi uma espécie de grito de ipiranga, perante estas merdíces destes disfarces nas origens: a picheleira é linda!lá está, a picheleira!

a minha terra chama-se picheleira.o nome é habitualmente motivo de gozo porque as pessoas não podem ver, ouvir ou ler uma qualquer palavra que tenha uma qualquer relação com coisas sexuais - nem que seja no que respeita à sonoridade das palavras - que desatam logo com um nervoso miudinho, que as leva a expelir risinhos nervosos, fazendo-as ficar parecidas com um bando de hienas.sucede assim com a minha querida picheleira, com a buraca, com a própria picha, com a coina, com a venda da gaita, com o posto sanitário do rego, com essas coisas, não é?algumas pessoas - parvas e provincianas - têm pudor em referir-se à sua origem como sendo da picheleira. ou porque têm vergonha do nome, ou porque, bem sei, os interlocutores ficam logo com aquele ar de "ui, da picheleira? isso é barra pesada, não é?", ou porque no tempo dos meus pais os táxis nem à picheleira iam, ou porque a telepizza não entregava na picheleira, ou porque se sentem de algum modo inibidos porque não sabem sequer o significado duma origem. é a vida.a pior coisa que aconteceu aos habitantes do bairronunca me considerei "picheleirense". quanto muito era vitoriano, como um dia expliquei aqui.foi terem um dia vindo uns caterpillers amarelos abrir uns buracos lá para os lados dos prédios da mira fernandes e da rua larga num sítio que tinha uma serração, para servirem de caboucos a uns prédios que o presidente do benfica iria para lá construir. ora sucede que para essas bandas havia lá uma quinta que tinha umas olaias e, imaginem, chamava-se quinta das olaias. esses prédios cresceram, a urbanização ficou mais desenvolvida, fizeram um centro comercial todo catita e alguns parvos habitantes do meu bairro desataram a dizer que moravam nas olaias em vez de morarem na picheleira.conheciam uma gaja e "ah e tal, eu cá moro nas olaias." para dar aquela pala, não é?e depois, com medo do nome ou coisa que o valha, tudo passou a ser olaias. alguns autocarros passaram a dizer olaias, as indicações aos automobilistas no alcatrão passaram a dizer olaias e até construiu-se uma escola, bem longe da antiga quinta das olaias e chamaram-na de, claro, escola das olaias.depois há as variações. recordo-me de um gajo que andava a tocar aí em bares e que se a memória não me falha, é actor de novelas, que um dia me disse no atéquenfim:- eu moro nas olaias sul.- sul? - perguntei?- sim.- em que rua?- na faria de vasconcelos.- mas assim sendo, estás mais perto do casal do pinto que das olaias. quanto muito, caso não gostes do termo, dizes que moras no casal do pinto norte.reparei que não percebeu.ontem, olhei para a tv e no telejornal vi a minha escola da primária. levantei o som do aparelho e estavam a explicar que apanharam um pedófilo, carteiro, que mora em frente à escola e que a troco de uns euros, convocava a garotada para lá ir a casa mostrar uns filmes pornográficos e servir como modelos nuns outros filmes também. ora segundo a notícia, a coisa passou-se nas olaias.por muito que isto não me orgulhe, tenho de ser vertical para o bem e para o mal. por isso, a coisa não aconteceu nas olaias. daquele local às olaias, é quase tanto como, sei lá, do campo pequeno ao saldanha, ou do saldanha ao marquês de pombal. para mim, infelizmente, aconteceram na picheleira. ou, quanto muito, aconteceram na quinta dos embrechados.e lá estão vocês: ihhh que raio de nomes. picheleira, embrechados....pois, mas se for assim a linha do pensamento vejam lá que nome gostariam de ter ostentado na vossa morada, embrechados ou lapa?lapas. f., grande pedra ou laje que, ressaindo de um rochedo, forma um abrigo;gruta;cavidade;Zool., molusco gasterópode univalve que adere aos rochedos;pedra solta;calhau;pop., bofetada.embrechadodo Lat. * imbliculatu < imbriculas. m., ornato de conchas incrustadas nas paredes das cascatas e jardins;fam., pessoa considerada um empecilho;visita ou hóspede importuno; (no pl. ) embutidos.uma coisa gira, pertantes: ah e tal, eu moro mesmo ali ao lado da tia cinha, moro no bairo da lapa, perdão, da gruta ou da cavidade. ou mesmo da bofetada.que bonito viram?tenho saudades do raio de frase que durante anos foi uma espécie de grito de ipiranga, perante estas merdíces destes disfarces nas origens: a picheleira é linda!lá está, a picheleira!

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