Clube de Reflexão Política: Carlos Leone: A maioria absoluta e a charneira

22-01-2011
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Uma nota, tão breve quanto possível, sobre duas questões políticas mencionadas ontem [05.01.09].1. No Prós e Contras, Joaquim Aguiar disse que o PS actual perdeu a memória que Zenha teve durante o PREC quanto à função do PS. Segundo Aguiar, para Zenha o PS seria o partido-charneira que se aliaria ora à Esquerda, ora à Direita mas, agora, o PS quer todo o poder. Isto é uma dupla falsidade. Em primeiro lugar, o único partido (aliás, o único líder) que exigiu maioria absoluta foi Cavaco. Isto é factual. Em segundo lugar, a tese do partido charneira requer explicação histórica: o sistema eleitoral português foi desenhado para evitar a concentração de poderes e muitos (Zenha mas também Cardia, por exemplo) pensavam que a maioria absoluta era não só improvável como indesejável. Isso não significava uma redução política do PS à menoridade, ao contrário do que Aguiar sugeriu; significava sim que, como Cardia explicou em Socialismo Sem Dogma, o papel do PS neste «sistema anti-maiorias absolutas» seria o de formar maiorias, daí mesmo a charneira. Formava-as liderando, federando outros partidos em torno do seu projecto. A centralidade do PS na vida política portuguesa, partido de Esquerda como a maioria da população portuguesa e democrático como a maioria absoluta dessa população, era a condição do sucesso do PS e do próprio país.Escusado será dizer que tudo isso passou. A centralidade do PS está confirmada, mas ao contrário das teses de Cardia, a «democracia atrofiada» do cavaquismo foi capaz de gerar novas lideranças (lembro-me, em conversa privada de 2006, de o próprio Cardia reconhecer isso, justamente a respeito do PS). Ao contrário da política de Zenha, está provado que a função charneira do PS só funciona quando se apoia no centro direita, pois PCP e BE (já nem falo de PRD) nunca foram desejados no governo pelos portugueses nem, sequer, desejam governar. E o sistema político português, afinal, até permite maiorias absolutas monopartidárias, à Esquerda e à Direita.2. Por tudo isto, quando José Sócrates quis maioria parlamentar absoluta em 2005 e agora a quer de novo, não «esquece» coisa nenhuma do passado do PS. Ele sabe que coisas pensadas no passado como certas se revelaram erradas e sabe que nesta conjuntura CDS e PSD são tão pouco fiáveis como parceiros governativos como PCP e BE. A defesa dos méritos intrínsecos da maioria absoluta nesta conjuntura foi feita na entrevista nestes termos, não noutros. Nem as ameaças de Cavaco no passado nem a oposição à oposição que, essa sim, e mal, tem sido muitas vezes usada no PS nos últimos anos na forma (aliás, cavaquista) de «oposição impreparada para governar». A insinuação de Aguiar sobre perda de princípios e de interditos a respeito do PS é um rematado sofisma, sendo necessário evitar a desvalorização do adversário para o prevenir. E, como se viu ontem na entrevista, basta falar claro para conseguir passar a mensagem. Resta evitar o tom auto-satisfeito e permanentemente oficial, talvez assim se consiga mobilizar eleitorado tendencialmente abstencionista. Será útil ao PS e bom para a democracia.Carlos LeoneMembro do Clube de Reflexão Política a LinhaMembro do Clube do Chiado


Uma nota, tão breve quanto possível, sobre duas questões políticas mencionadas ontem [05.01.09].1. No Prós e Contras, Joaquim Aguiar disse que o PS actual perdeu a memória que Zenha teve durante o PREC quanto à função do PS. Segundo Aguiar, para Zenha o PS seria o partido-charneira que se aliaria ora à Esquerda, ora à Direita mas, agora, o PS quer todo o poder. Isto é uma dupla falsidade. Em primeiro lugar, o único partido (aliás, o único líder) que exigiu maioria absoluta foi Cavaco. Isto é factual. Em segundo lugar, a tese do partido charneira requer explicação histórica: o sistema eleitoral português foi desenhado para evitar a concentração de poderes e muitos (Zenha mas também Cardia, por exemplo) pensavam que a maioria absoluta era não só improvável como indesejável. Isso não significava uma redução política do PS à menoridade, ao contrário do que Aguiar sugeriu; significava sim que, como Cardia explicou em Socialismo Sem Dogma, o papel do PS neste «sistema anti-maiorias absolutas» seria o de formar maiorias, daí mesmo a charneira. Formava-as liderando, federando outros partidos em torno do seu projecto. A centralidade do PS na vida política portuguesa, partido de Esquerda como a maioria da população portuguesa e democrático como a maioria absoluta dessa população, era a condição do sucesso do PS e do próprio país.Escusado será dizer que tudo isso passou. A centralidade do PS está confirmada, mas ao contrário das teses de Cardia, a «democracia atrofiada» do cavaquismo foi capaz de gerar novas lideranças (lembro-me, em conversa privada de 2006, de o próprio Cardia reconhecer isso, justamente a respeito do PS). Ao contrário da política de Zenha, está provado que a função charneira do PS só funciona quando se apoia no centro direita, pois PCP e BE (já nem falo de PRD) nunca foram desejados no governo pelos portugueses nem, sequer, desejam governar. E o sistema político português, afinal, até permite maiorias absolutas monopartidárias, à Esquerda e à Direita.2. Por tudo isto, quando José Sócrates quis maioria parlamentar absoluta em 2005 e agora a quer de novo, não «esquece» coisa nenhuma do passado do PS. Ele sabe que coisas pensadas no passado como certas se revelaram erradas e sabe que nesta conjuntura CDS e PSD são tão pouco fiáveis como parceiros governativos como PCP e BE. A defesa dos méritos intrínsecos da maioria absoluta nesta conjuntura foi feita na entrevista nestes termos, não noutros. Nem as ameaças de Cavaco no passado nem a oposição à oposição que, essa sim, e mal, tem sido muitas vezes usada no PS nos últimos anos na forma (aliás, cavaquista) de «oposição impreparada para governar». A insinuação de Aguiar sobre perda de princípios e de interditos a respeito do PS é um rematado sofisma, sendo necessário evitar a desvalorização do adversário para o prevenir. E, como se viu ontem na entrevista, basta falar claro para conseguir passar a mensagem. Resta evitar o tom auto-satisfeito e permanentemente oficial, talvez assim se consiga mobilizar eleitorado tendencialmente abstencionista. Será útil ao PS e bom para a democracia.Carlos LeoneMembro do Clube de Reflexão Política a LinhaMembro do Clube do Chiado

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