A Juventude Popular, liderada pela luminária que acusou Bernardino Soares de ser um dos responsáveis pela violência do PREC, decidiu aparecer novamente nas notícias. Desta vez foi para defender a abolição do salário mínimo, num comunicado de imprensa que mastiga vários lugares-comuns e que é contraditório naquilo que afirma. Lê-se:«(...) 'Este preço mínimo tem dois efeitos muito claros no mercado de trabalho: impedir de trabalhar quem estiver disponível para trabalhar por valor inferior a esse preço' (...) 'a fixação de um valor mínimo impede de operar todas as empresas e serviços que não tenham a capacidade de remunerarem aquele montante' (...) 'Não nos assusta o tradicional receio/argumento de que sem o salário mínimo as empresas irão pagar ainda menos', refere o comunicado, sublinhando que 'o paradigma da competitividade baseada nos baixos salários já mudou'.»Portanto, se o paradigma dos baixos salários já passou -- em que país? --, então também não existiriam empresas a remunerarem abaixo de um tecto depauperado de 426 euros e o propósito do comunicado de imprensa estaria anulado. Mas a JP ignora isso e outro facto elementar que deve ser lembrado: quem está «disponível» para trabalhar por menos do que o actual salário mínimo português já não tem qualquer escolha e é também a consciência disso que distingue uma direita que defende a total desestruturação do Estado social e uma esquerda que deve estar atenta às suas fragilidades, actuando para garantir a sua sustentabilidade. É uma esquerda que combate os dogmas da esquerda e da direita mais radicais.A legislação laboral portuguesa tem necessariamente de sofrer mudanças, mas ao contrário do que se lê por aí isso não significa, não pode significar, uma pulverização dos direitos dos trabalhadores. A legislação deve formalizar a flexibilização que já existe, respondendo aos falsos estágios profissionais, recibos verdes e outros expedientes conhecidos da maioria dos jovens portugues (menos os da JP, já se vê), equilibrando-se flexibilidade com segurança. A legislação laboral não existe para outra coisa que não seja a protecção da parte mais fraca da negociação, nomeadamente de dirigentes empresariais e políticos que pretendem transformar Portugal numa sombra de Pequim. Para quem não se recorda, cito as declarações de Paulo Nunes de Almeida, presidente presidente da Associação Têxtil e de Vestuário de Portugal: «(...) Além de preconizar a redução do número de feriados, e como forma de contrabalançar a subida do salário mínimo, a ATP reclamou a isenção dos descontos para a Segurança Social das horas suplementares, a limitação dos montantes globais das indemnizações por despedimento, bem como a alteração do pagamento do total do rendimento anual dos trabalhadores de 14 para 12 meses, ou seja, o fim dos subsídios de Natal e de férias.»É contra esta selvajaria que os socialistas devem bater-se. E podemos legitimamente perguntar à JP porquê, especificamente, determo-nos na abolição do salário mínimo? Se a JP acredita, sem mais adendas nem complexidade, «na liberdade contratual entre empresas e funcionários sem que o Estado imponha um salário», então deveria também pedir ao Estado que abolisse limites aos horários de trabalho, regras de qualidade, higiene e segurança, férias, turnos, legislação anti-discriminação, greves, entre muitas outras. Tudo isso tornaria as relações laborais mais «limpas», no mundo-redoma da JP, mas teria naturalmente o sério inconvienente de fazer Portugal retroceder ao século XIX.Quanto à relação entre salário mínimo e desemprego, é uma questão de crença e não de realidade empírica. E é normalmente um bom exemplo de uma Falácia Post Hoc. Podemos deter-nos no caso dos EUA, por exemplo, onde os salários baixos estão associados a bolsas duradouras de pobreza, a trabalhadores desqualificados e maioritariamente a imigrantes: a população sem escolha, portanto.:: Clicar para aumentar ::Pois nos EUA, como se pode ver neste estudo, verificou-se empiricamente que o desemprego baixou de forma mais significativa precisamente nos Estados que -- pasme-se a JP -- aumentaram o salário mínimo.:: Clicar para aumentar ::Diversos estudos que têm sido publicados sobre o salário mínimo demonstram a inexistência de um impacto negativo sobre o emprego, ou mitigam-no perante o impacto positivo sobre as condições de vida dos trabalhadores mais pobres. O Nuno Teles apresentou aqui alguns dados. Para lá da linha que separa claramente esquerda e direita neste tema, as estatísticas são o que são. Mas para a JP, enfim, nenhum dos postulados é verdadeiro: nem os dados que sustentam as suas políticas devem estar correctos, nem o mais importante dessas políticas é melhorar a vida das pessoas.:: Ler mais :: «Salário mínimo: para terminar com os argumentos de autoridade» (João Rodrigues) // «Tenho 426 argumentos» (Daniel Oliveira) // «Parem as máquinas. Salário mínimo impede patrões de pagar 200 euros a portugueses poupados e com aversão ao dinheiro» (Pedro Sales) // «Viva a liberdade negocial!» (Vital Moreira) // «Salário mínimo: combate teórico» (Nuno Teles) // «Salário mínimo: combate empírico» (Nuno Teles).
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A Juventude Popular, liderada pela luminária que acusou Bernardino Soares de ser um dos responsáveis pela violência do PREC, decidiu aparecer novamente nas notícias. Desta vez foi para defender a abolição do salário mínimo, num comunicado de imprensa que mastiga vários lugares-comuns e que é contraditório naquilo que afirma. Lê-se:«(...) 'Este preço mínimo tem dois efeitos muito claros no mercado de trabalho: impedir de trabalhar quem estiver disponível para trabalhar por valor inferior a esse preço' (...) 'a fixação de um valor mínimo impede de operar todas as empresas e serviços que não tenham a capacidade de remunerarem aquele montante' (...) 'Não nos assusta o tradicional receio/argumento de que sem o salário mínimo as empresas irão pagar ainda menos', refere o comunicado, sublinhando que 'o paradigma da competitividade baseada nos baixos salários já mudou'.»Portanto, se o paradigma dos baixos salários já passou -- em que país? --, então também não existiriam empresas a remunerarem abaixo de um tecto depauperado de 426 euros e o propósito do comunicado de imprensa estaria anulado. Mas a JP ignora isso e outro facto elementar que deve ser lembrado: quem está «disponível» para trabalhar por menos do que o actual salário mínimo português já não tem qualquer escolha e é também a consciência disso que distingue uma direita que defende a total desestruturação do Estado social e uma esquerda que deve estar atenta às suas fragilidades, actuando para garantir a sua sustentabilidade. É uma esquerda que combate os dogmas da esquerda e da direita mais radicais.A legislação laboral portuguesa tem necessariamente de sofrer mudanças, mas ao contrário do que se lê por aí isso não significa, não pode significar, uma pulverização dos direitos dos trabalhadores. A legislação deve formalizar a flexibilização que já existe, respondendo aos falsos estágios profissionais, recibos verdes e outros expedientes conhecidos da maioria dos jovens portugues (menos os da JP, já se vê), equilibrando-se flexibilidade com segurança. A legislação laboral não existe para outra coisa que não seja a protecção da parte mais fraca da negociação, nomeadamente de dirigentes empresariais e políticos que pretendem transformar Portugal numa sombra de Pequim. Para quem não se recorda, cito as declarações de Paulo Nunes de Almeida, presidente presidente da Associação Têxtil e de Vestuário de Portugal: «(...) Além de preconizar a redução do número de feriados, e como forma de contrabalançar a subida do salário mínimo, a ATP reclamou a isenção dos descontos para a Segurança Social das horas suplementares, a limitação dos montantes globais das indemnizações por despedimento, bem como a alteração do pagamento do total do rendimento anual dos trabalhadores de 14 para 12 meses, ou seja, o fim dos subsídios de Natal e de férias.»É contra esta selvajaria que os socialistas devem bater-se. E podemos legitimamente perguntar à JP porquê, especificamente, determo-nos na abolição do salário mínimo? Se a JP acredita, sem mais adendas nem complexidade, «na liberdade contratual entre empresas e funcionários sem que o Estado imponha um salário», então deveria também pedir ao Estado que abolisse limites aos horários de trabalho, regras de qualidade, higiene e segurança, férias, turnos, legislação anti-discriminação, greves, entre muitas outras. Tudo isso tornaria as relações laborais mais «limpas», no mundo-redoma da JP, mas teria naturalmente o sério inconvienente de fazer Portugal retroceder ao século XIX.Quanto à relação entre salário mínimo e desemprego, é uma questão de crença e não de realidade empírica. E é normalmente um bom exemplo de uma Falácia Post Hoc. Podemos deter-nos no caso dos EUA, por exemplo, onde os salários baixos estão associados a bolsas duradouras de pobreza, a trabalhadores desqualificados e maioritariamente a imigrantes: a população sem escolha, portanto.:: Clicar para aumentar ::Pois nos EUA, como se pode ver neste estudo, verificou-se empiricamente que o desemprego baixou de forma mais significativa precisamente nos Estados que -- pasme-se a JP -- aumentaram o salário mínimo.:: Clicar para aumentar ::Diversos estudos que têm sido publicados sobre o salário mínimo demonstram a inexistência de um impacto negativo sobre o emprego, ou mitigam-no perante o impacto positivo sobre as condições de vida dos trabalhadores mais pobres. O Nuno Teles apresentou aqui alguns dados. Para lá da linha que separa claramente esquerda e direita neste tema, as estatísticas são o que são. Mas para a JP, enfim, nenhum dos postulados é verdadeiro: nem os dados que sustentam as suas políticas devem estar correctos, nem o mais importante dessas políticas é melhorar a vida das pessoas.:: Ler mais :: «Salário mínimo: para terminar com os argumentos de autoridade» (João Rodrigues) // «Tenho 426 argumentos» (Daniel Oliveira) // «Parem as máquinas. Salário mínimo impede patrões de pagar 200 euros a portugueses poupados e com aversão ao dinheiro» (Pedro Sales) // «Viva a liberdade negocial!» (Vital Moreira) // «Salário mínimo: combate teórico» (Nuno Teles) // «Salário mínimo: combate empírico» (Nuno Teles).