Dias com árvores: Virgem mãe

19-12-2009
marcar artigo


Limonium sinuatumA lavanda-do-mar tem algo a acrescentar sobre o polémico dogma cristão que algumas religiões celebram neste mês, e por isso regressa hoje ao palco. A maioria das cerca de 300 espécies do género Limonium são capazes de criar sementes sem terem sido fertilizadas. As sementes só contêm informação genética da mãe, o que é desvantajoso num mundo competitivo que privilegia a diversidade, mas o processo pode também estabilizar características individuais interessantes. Este método é distinto da clonagem, em que o descendente é exactamente igual à mãe; por apomixia nascem indivíduos cuja diferença genética é determinada pelo material contido nos óvulos da mãe, mas não são necessariamente gémeos ou idênticos ao progenitor.A reprodução assexuada com intervenção apenas feminina é frequente nas famílias Rosaceae e Asteraceae (por exemplo, a amoreira silvestre e o dente-de-leão são apomíticos). Neste capítulo, a novidade do século é a descoberta de plantas, como o cipreste do deserto Saara (Cupressus dupreziana), que produzem sementes exclusivamente do pólen, isto é, da componente masculina da planta que lhes serve apenas de colo.A versão animal da maternidade assexuada é o nascimento de crias só com a intervenção genética de uma mãe-virgem: é a chamada partenogénese, que difere do hermafroditismo por não haver autofecundação. Eliminada a angústia da falta de varões, é contudo honesto referir que o triunfo é relativo: nas espécies em que o género é determinado por um par de cromossomas, este tipo de reprodução produz uma população monogénica, com baixa potencialidade para gerar variações genéticas e por isso, em princípio, com menor probabilidade de perdurar. Por exemplo, entre as abelhas domesticadas, a rainha é a única da colmeia que é fértil; se ela morre, as abelhas-mestras podem pôr ovos mas, como não acasalam, são mães-virgens de machos - que recusam sobranceiramente fertilizar uma abelha operária. Resultado: em pouco tempo, os trabalhadores desta colmeia extinguem-se e só restam zangões.Mas há animais que podem alternar a reprodução sexuada com a partenogénese, o que lhes permite aumentar a biodiversidade e sobreviver ao problema ocasional da ausência de pais. São óbvios os benefícios, e o poder, deste esquema de procriação, por isso não nos surpreende que estes monólogos reprodutivos tenham sido incorporados em culturas, mitologias e religiões. A capacidade de certas divindades conceberem sem pecado é, afinal, uma virtude terrena.


Limonium sinuatumA lavanda-do-mar tem algo a acrescentar sobre o polémico dogma cristão que algumas religiões celebram neste mês, e por isso regressa hoje ao palco. A maioria das cerca de 300 espécies do género Limonium são capazes de criar sementes sem terem sido fertilizadas. As sementes só contêm informação genética da mãe, o que é desvantajoso num mundo competitivo que privilegia a diversidade, mas o processo pode também estabilizar características individuais interessantes. Este método é distinto da clonagem, em que o descendente é exactamente igual à mãe; por apomixia nascem indivíduos cuja diferença genética é determinada pelo material contido nos óvulos da mãe, mas não são necessariamente gémeos ou idênticos ao progenitor.A reprodução assexuada com intervenção apenas feminina é frequente nas famílias Rosaceae e Asteraceae (por exemplo, a amoreira silvestre e o dente-de-leão são apomíticos). Neste capítulo, a novidade do século é a descoberta de plantas, como o cipreste do deserto Saara (Cupressus dupreziana), que produzem sementes exclusivamente do pólen, isto é, da componente masculina da planta que lhes serve apenas de colo.A versão animal da maternidade assexuada é o nascimento de crias só com a intervenção genética de uma mãe-virgem: é a chamada partenogénese, que difere do hermafroditismo por não haver autofecundação. Eliminada a angústia da falta de varões, é contudo honesto referir que o triunfo é relativo: nas espécies em que o género é determinado por um par de cromossomas, este tipo de reprodução produz uma população monogénica, com baixa potencialidade para gerar variações genéticas e por isso, em princípio, com menor probabilidade de perdurar. Por exemplo, entre as abelhas domesticadas, a rainha é a única da colmeia que é fértil; se ela morre, as abelhas-mestras podem pôr ovos mas, como não acasalam, são mães-virgens de machos - que recusam sobranceiramente fertilizar uma abelha operária. Resultado: em pouco tempo, os trabalhadores desta colmeia extinguem-se e só restam zangões.Mas há animais que podem alternar a reprodução sexuada com a partenogénese, o que lhes permite aumentar a biodiversidade e sobreviver ao problema ocasional da ausência de pais. São óbvios os benefícios, e o poder, deste esquema de procriação, por isso não nos surpreende que estes monólogos reprodutivos tenham sido incorporados em culturas, mitologias e religiões. A capacidade de certas divindades conceberem sem pecado é, afinal, uma virtude terrena.

marcar artigo