"Há dois problemas de que os conservadores sempre tiveram aguda consciência. O primeiro é o das consequências indesejadas - de que, dada a complexidade e a inter-relação das coisas, quando se inicia um processo de mudança a grande escala põe-se em marcha muito mais do que tinha em mente o iniciador e o resultado pode ser muito diferente daquele que se pretendia. Assim, nas palavras de Burke, 'Esquemas muito plausíveis com começos muito amáveis têm frequentemente consequências vergonhosas e lamentáveis". Para acabar com a matança dos elefantes proibiu-se o tráfico de marfim. A medida tornou o marfim escasso. Os preços subiram e aumentou portanto o estímulo para a caça furtiva. Mais gente se dedicou a ela - e mataram-se mais elefantes do que antes da proibição.O segundo problema é o da função latente. Para além das suas funções aparentes, as instituições muitas vezes desempenham outras, funções ocultas de natureza muito importante - o que pode não se tornar visível senão depois de se terem desmantelado essas instituições. No seu livro de 1959 Political Man, geralmente considerado um clássico do género, Seymour Martin Lipset observa "o facto" aparentemente "absurdo" de que 10 das 12 mais estáveis democracias Europeias e Anglófonas sejam monarquias. Isto, no entender de Lipset, não podia acontecer por acaso. A explicação que dá é a seguinte: durante as mudanças sociais e económicas rápidas e profundas dos cem anos anteriores, que aparentemente tinham ido tornando cada vez mais irrelevante a monarquia, a instituição desempenhara o papel crucial de conservar a lealdade dos grupos que saíam a perder dessas alterações: a aristocracia, os tradicionalistas, os sectores clericais e rurais. A persistência da instituição central dava-lhes o reconforto de que o mundo que conheciam não estava totalmente perdido, de que era possível adaptarem-se à nova ordem social e política. Em contrapartida, nos países que se tinham desfeito da Monarquia (p.e. a França, a Alemanha e o Império dos Habsburgos depois da I Guerra Mundial), a concórdia e aestabilidade provaram ser um bem muito mais escasso. Assim, conclui Lipset, as mudanças que aparentemente tornavam a monarquia mais anacrónica na realidade aumentaram a sua relevância como "uma importante instituição tradicional integrativa num período de transição'. "Owen Harries, "What Conservatism Means", The American Conservative, Novembro de 2003
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"Há dois problemas de que os conservadores sempre tiveram aguda consciência. O primeiro é o das consequências indesejadas - de que, dada a complexidade e a inter-relação das coisas, quando se inicia um processo de mudança a grande escala põe-se em marcha muito mais do que tinha em mente o iniciador e o resultado pode ser muito diferente daquele que se pretendia. Assim, nas palavras de Burke, 'Esquemas muito plausíveis com começos muito amáveis têm frequentemente consequências vergonhosas e lamentáveis". Para acabar com a matança dos elefantes proibiu-se o tráfico de marfim. A medida tornou o marfim escasso. Os preços subiram e aumentou portanto o estímulo para a caça furtiva. Mais gente se dedicou a ela - e mataram-se mais elefantes do que antes da proibição.O segundo problema é o da função latente. Para além das suas funções aparentes, as instituições muitas vezes desempenham outras, funções ocultas de natureza muito importante - o que pode não se tornar visível senão depois de se terem desmantelado essas instituições. No seu livro de 1959 Political Man, geralmente considerado um clássico do género, Seymour Martin Lipset observa "o facto" aparentemente "absurdo" de que 10 das 12 mais estáveis democracias Europeias e Anglófonas sejam monarquias. Isto, no entender de Lipset, não podia acontecer por acaso. A explicação que dá é a seguinte: durante as mudanças sociais e económicas rápidas e profundas dos cem anos anteriores, que aparentemente tinham ido tornando cada vez mais irrelevante a monarquia, a instituição desempenhara o papel crucial de conservar a lealdade dos grupos que saíam a perder dessas alterações: a aristocracia, os tradicionalistas, os sectores clericais e rurais. A persistência da instituição central dava-lhes o reconforto de que o mundo que conheciam não estava totalmente perdido, de que era possível adaptarem-se à nova ordem social e política. Em contrapartida, nos países que se tinham desfeito da Monarquia (p.e. a França, a Alemanha e o Império dos Habsburgos depois da I Guerra Mundial), a concórdia e aestabilidade provaram ser um bem muito mais escasso. Assim, conclui Lipset, as mudanças que aparentemente tornavam a monarquia mais anacrónica na realidade aumentaram a sua relevância como "uma importante instituição tradicional integrativa num período de transição'. "Owen Harries, "What Conservatism Means", The American Conservative, Novembro de 2003