Varanda do Chiado : Turistas profissionais

11-07-2010
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Turistas profissionais

Publicação: 11 June 10 10:00 AM

A China parece que deixa os ministros da Economia de Sócrates de olhos em bico.

Há um par de anos, Manuel Pinho foi crucificado por ter ido lá propagandear a mão-de-obra barata em Portugal como factor positivo para a competitividade e capacidade de atracção de investimento estrangeiro.

Agora, foi o também voluntarioso Vieira da Silva quem, em Xangai, resolveu atacar Cavaco Silva por exortar os portugueses a aproveitarem as férias para irem para fora cá dentro, porque, considerou o ministro, se todos os chefes de Estado resolvessem fazer semelhante apelo, Portugal ficaria a perder.

Nem Pinho nem Vieira da Silva disseram inverdade alguma. Simplesmente, um e outro foram absolutamente desastrados nas respectivas declarações.

Pinho já lá vai e já não importa, mas fica sempre mal a um responsável ministerial congratular-se com os baixos salários dos seus governados.

Vieira da Silva, além de ministro em funções, é político experiente e, por isso, devia saber medir as suas palavras, sobretudo tratando-se de reacção a afirmações proferidas pelo Presidente da República.

Porventura, Vieira da Silva achou que as declarações do Presidente se dirigiam aos próprios governantes, que andam numa roda viva pelo estrangeiro, tipo turistas profissionais, tentando convencer-nos de que a ‘diplomacia económica’ é a chave para a saída da crise.

E Sócrates vai à Venezuela de dois em dois anos assinar contratos que não saem do papel ou ao Brasil para, por junto, tomar café com Chico Buarque, seja lá a pedido de quem for; Teixeira dos Santos já parece que tem um part-time em Bruxelas para levar umas festas de Juncker na cabeça e uns valentes carolos dos comissários europeus nas Finanças e na Economia do país; e Vieira da Silva anda na China a dizer tontices...

Seja qual for a razão do ministro da Economia, o manifesto excesso da reacção enquadra-se, sim, na interminável espiral de disparates em que o Governo entrou e para a qual não se vislumbra bom termo.

De facto, mesmo que não pareça lá fora, o Governo tirou férias cá dentro.

E bem pode clamar Cavaco contra as ingerências da Comissão Europeia mais as suas recomendações – não fosse isso e não haveria esperança possível.

Este Governo já não governa ou, nos casos em que insiste governar, governa mal.

Sem timoneiro, os ministros e secretários de Estado andam completamente à deriva.

Semana após semana, tão depressa aparece um secretário de Estado a dizer coisa diferente do seu ministro (aconteceu com Bernardo Trindade, por exemplo, na questão do ‘vá para fora cá dentro’), como há ministros a desdizerem-se uns aos outros (veja-se como a flexibilização do Código Laboral pôs a ministra do Trabalho em clara contradição com o ministro das Finanças), já para não falar dos ministros que se negam a si próprios (é elucidativo o caso de Isabel Alçada e o fecha-não-fecha escolas com menos de duas dezenas de alunos – mais uma medida ou não-medida de incentivo à desertificação do condenado Interior).

É disparate e desgoverno a mais.

A crise não serve de desculpa para tudo.

Nem os cálculos ou tacticismos eleitorais.

O PSD está obviamente interessado em prolongar a agonia de Sócrates e em livrar-se do ónus eleitoral das inevitáveis medidas de austeridade.

Mas o Governo do PS vegeta ante o estado comatoso do país.

A situação política degrada-_-se dia após dia e já roça a insustentabilidade.

A crise económica financeira desaconselha a precipitação de eleições antecipadas.

Até porque ninguém está interessado nelas: nem o Presidente, nem obviamente o partido do Governo, nem o principal partido da oposição, nem até os mais pequenos (que, assim, ainda têm um peso relativo, que podem muito bem perder a avaliar pelas sondagens).

Ora, se, como dizem os chineses, a crise também é uma oportunidade, há que saber aproveitá-la.

Porque, sinceramente, não se vê solução no curto prazo.

E depois das presidenciais pode bem ser tarde demais.

Turistas profissionais

Publicação: 11 June 10 10:00 AM

A China parece que deixa os ministros da Economia de Sócrates de olhos em bico.

Há um par de anos, Manuel Pinho foi crucificado por ter ido lá propagandear a mão-de-obra barata em Portugal como factor positivo para a competitividade e capacidade de atracção de investimento estrangeiro.

Agora, foi o também voluntarioso Vieira da Silva quem, em Xangai, resolveu atacar Cavaco Silva por exortar os portugueses a aproveitarem as férias para irem para fora cá dentro, porque, considerou o ministro, se todos os chefes de Estado resolvessem fazer semelhante apelo, Portugal ficaria a perder.

Nem Pinho nem Vieira da Silva disseram inverdade alguma. Simplesmente, um e outro foram absolutamente desastrados nas respectivas declarações.

Pinho já lá vai e já não importa, mas fica sempre mal a um responsável ministerial congratular-se com os baixos salários dos seus governados.

Vieira da Silva, além de ministro em funções, é político experiente e, por isso, devia saber medir as suas palavras, sobretudo tratando-se de reacção a afirmações proferidas pelo Presidente da República.

Porventura, Vieira da Silva achou que as declarações do Presidente se dirigiam aos próprios governantes, que andam numa roda viva pelo estrangeiro, tipo turistas profissionais, tentando convencer-nos de que a ‘diplomacia económica’ é a chave para a saída da crise.

E Sócrates vai à Venezuela de dois em dois anos assinar contratos que não saem do papel ou ao Brasil para, por junto, tomar café com Chico Buarque, seja lá a pedido de quem for; Teixeira dos Santos já parece que tem um part-time em Bruxelas para levar umas festas de Juncker na cabeça e uns valentes carolos dos comissários europeus nas Finanças e na Economia do país; e Vieira da Silva anda na China a dizer tontices...

Seja qual for a razão do ministro da Economia, o manifesto excesso da reacção enquadra-se, sim, na interminável espiral de disparates em que o Governo entrou e para a qual não se vislumbra bom termo.

De facto, mesmo que não pareça lá fora, o Governo tirou férias cá dentro.

E bem pode clamar Cavaco contra as ingerências da Comissão Europeia mais as suas recomendações – não fosse isso e não haveria esperança possível.

Este Governo já não governa ou, nos casos em que insiste governar, governa mal.

Sem timoneiro, os ministros e secretários de Estado andam completamente à deriva.

Semana após semana, tão depressa aparece um secretário de Estado a dizer coisa diferente do seu ministro (aconteceu com Bernardo Trindade, por exemplo, na questão do ‘vá para fora cá dentro’), como há ministros a desdizerem-se uns aos outros (veja-se como a flexibilização do Código Laboral pôs a ministra do Trabalho em clara contradição com o ministro das Finanças), já para não falar dos ministros que se negam a si próprios (é elucidativo o caso de Isabel Alçada e o fecha-não-fecha escolas com menos de duas dezenas de alunos – mais uma medida ou não-medida de incentivo à desertificação do condenado Interior).

É disparate e desgoverno a mais.

A crise não serve de desculpa para tudo.

Nem os cálculos ou tacticismos eleitorais.

O PSD está obviamente interessado em prolongar a agonia de Sócrates e em livrar-se do ónus eleitoral das inevitáveis medidas de austeridade.

Mas o Governo do PS vegeta ante o estado comatoso do país.

A situação política degrada-_-se dia após dia e já roça a insustentabilidade.

A crise económica financeira desaconselha a precipitação de eleições antecipadas.

Até porque ninguém está interessado nelas: nem o Presidente, nem obviamente o partido do Governo, nem o principal partido da oposição, nem até os mais pequenos (que, assim, ainda têm um peso relativo, que podem muito bem perder a avaliar pelas sondagens).

Ora, se, como dizem os chineses, a crise também é uma oportunidade, há que saber aproveitá-la.

Porque, sinceramente, não se vê solução no curto prazo.

E depois das presidenciais pode bem ser tarde demais.

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