XimPi

26-12-2009
marcar artigo


Presidências em França: A desforra da direita duraDias antes da segunda volta, as sondagens davam como certa a vitória de Nicolas Sarkozy mas, até ao último momento, a esquerda francesa aguardou por uma vaga de fundo capaz de derrotar o candidato da direita. Em vão.Sarkozy venceu com facilidade o duelo com Ségolène Royal, recolhendo 53,06 por cento dos votos contra 46,94 por cento registados pela candidata socialista. Tal como já tinha acontecido na primeira volta, em 22 de Abril, o sufrágio de domingo ficou marcado por uma elevada taxa de participação que se aproximou dos 84 por cento.A vitória da direita em França não é propriamente uma novidade. Desde a aprovação da Constituição da chamada V República, em 1958, que o palácio do Eliseu tem sido quase permanentemente ocupado por políticos de direita: Charles de Gaulle (1958-1969), Georges Pompidou (1969-1974), Valery Giscard d’Estaing (1974-1981), François Mitterrand (1981-1995) e Jacques Chirac (1995-2007). Embora com algumas diferenças entre si, o facto é que destes apenas Mitterrand foi eleito com base num programa socialista.Desta vez, porém, a direita surpreendeu ao apostar num discurso protofascista, tão demagógico quanto radical, recuperando alguns dos temas preferidos da extrema-direita, designadamente os respeitantes à imigração e segurança, (algo que Chirac, por exemplo, sempre descartou), e centrando toda a campanha nos valores conservadores da autoridade, do trabalho, da recompensa e do mérito.Em vez de tentar ocultar ou disfarçar o seu programa anti-social e antidemocrático, Sarkozy apresentou-o como a única solução possível, com a qual todos teriam algo a ganhar.Ao mesmo tempo que prometia ao patronato uma «ruptura» com a «rigidez» da legislação laboral e de todo o sistema de segurança e protecção social, Sarkozy acenava às massas trabalhadoras, criando a miragem de uma França transformada num «país de proprietários».Para tanto, prometeu deduções fiscais dos créditos para habitação e, sobretudo, a isenção de contribuições sociais e fiscais das horas de trabalho extraordinário, medida que mais não é do que o anúncio da revogação da conquista das 35 horas.E mesmo aos jovens dos bairros «difíceis» - exactamente aqueles que, durante os motins urbanos do Outono de 2005, ameaçou «limpar com uma Kärscher» (a marca alemã de lavadoras de alta pressão de água) – o enérgico Sarkozy prometeu um plano «Marshall 2», oferecendo formação e uma remuneração a quem se portar bem e penas de prisão agravadas para os reincidentes.Socialistas desorientadosA pesada derrota nas presidenciais voltou a expor profundas divergências no seio dos socialistas franceses, onde há muito se digladiam as alas esquerda, centrista e de direita. Laurent Fabius, ex-primeiro ministro, que se destacou pela sua oposição à Constituição Europeia, notando que Sarkozy «descomplexou a direita», sustenta que o «mesmo trabalho deve ser feito pela esquerda». «Isto quer dizer que temos de assumir de vez plenamente os nossos valores de esquerda».Em sentido oposto, o ex-ministro da Economia, Dominique Strauss-Kahn, recordando o mau resultado de Royal na primeira volta, conclui que «os franceses não querem que lhes apresentemos soluções que têm 20 anos» e exigiu «uma renovação social-democrata» para lançar «uma esquerda moderna».As divisões internas e o discurso de compromisso de Ségolène Royal parecem fornecer as condições propícias ao avanço da direita que procurará consolidar a sua vitória já nas próximas eleições legislativas, em duas voltas, marcadas para os dias 10 e 17 de Junho.Pelo contrário, é duvidoso que o PS consiga disputar esta batalha «de forma homogénea e muito unida», como garantiu, na segunda-feira, 7, Ségolène Royal, no final de uma reunião para análise dos resultados eleitorais.Adiando para depois do próximo sufrágio «a refundação ou reconstrução» do partido, como referiu o líder socialista, François Hollande, a sua direcção aposta agora na conciliação, tendo criado um «dispositivo de funcionamento colectivo» para as legislativas, organismo no qual terão assento Laurent Fabius e Dominique Strauss-Khan.Contudo, é o partido de Sarkozy (UMP) que desde já se apresenta como o principal favorito no escrutínio. Segundo uma sondagem realizada no domingo, pelo instituto CSA, a União para um Movimento Popular (UMP) recolhe 35 por cento das intenções de voto.O PS e seus aliados de esquerda chegam aos 30 por cento, enquanto o novo partido fundado por François Bayrou, que recolheu 18 por centos dos votos na primeira volta das presidenciais, surge com 15 por cento das preferências.A Frente Nacional de Le Pen não vai além dos oito por cento, ficando os demais partidos abaixo dos dois por cento.Declarações de Albano Nunes: «Má notícia para a Europa»Albano Nunes, membro da Comissão Política do PCP, considerou que a vitória de Nicolas Sarkozy nas presidenciais francesas «é uma má notícia para a França e para a Europa».«As suas práticas autoritárias, que são conhecidas, e as suas posições liberais e pró-americanas, bem como os projectos para recuperar o chamado tratado constitucional europeu, constituem motivos de preocupação», salientou este dirigente do PCPEm declarações à Agência Lusa, no domingo, 6, Albano Nunes criticou ainda a candidata derrotada, Ségolène Royal, observando que «não é com piscadelas de olho à direita que se ganham eleições à esquerda». Nestas presidenciais, disse, «é evidente que faltou na disputa uma verdadeira alternativa de esquerda».O protesto nas ruasA eleição de Nicolas Sarkozy foi recebida com desagrado em várias regiões do país, onde milhares de pessoas saíram às ruas contestando o novo presidente e antecipando o agravamento da conflitualidade social que certamente irá marcar o próximo mandato presidencial.Segundo revelou, na segunda-feira, 7, a Direcção Geral da Polícia Nacional, na noite eleitoral foram detidas 592 pessoas e incendiados 730 veículos. Nos confrontos registados, 78 agentes policiais ficaram feridos.Manifestações e actos de violência tiveram lugar nas principais cidades francesas de Marselha, Nantes, Rennes, Lyon, Toulouse, Lille, Bordéus, entre outras.Na capital, a polícia utilizou gás lacrimogéneo e canhões de água para dispersar um grupo de manifestantes anti-Sarkozy na Praça da Bastilha.Os distúrbios continuaram na noite de segunda-feira, em Paris, onde cerca de 100 jovens foram detidos pela polícia depois de terem danificado equipamento urbano e cortado o trânsito na Praça da Bastilha.Também voltaram a registar-se concentrações noutras cidades francesas, caso de Lille, Lyon, Nantes, Marselha, Caen, Rennes e Tours.A polícia minimiza a importância dos incidentes, notando que, em média, são incendiados entre 70 a 100 veículos por noite em França.Artigo publicado na Edição Nº1745 AVANTE 2007.05.10


Presidências em França: A desforra da direita duraDias antes da segunda volta, as sondagens davam como certa a vitória de Nicolas Sarkozy mas, até ao último momento, a esquerda francesa aguardou por uma vaga de fundo capaz de derrotar o candidato da direita. Em vão.Sarkozy venceu com facilidade o duelo com Ségolène Royal, recolhendo 53,06 por cento dos votos contra 46,94 por cento registados pela candidata socialista. Tal como já tinha acontecido na primeira volta, em 22 de Abril, o sufrágio de domingo ficou marcado por uma elevada taxa de participação que se aproximou dos 84 por cento.A vitória da direita em França não é propriamente uma novidade. Desde a aprovação da Constituição da chamada V República, em 1958, que o palácio do Eliseu tem sido quase permanentemente ocupado por políticos de direita: Charles de Gaulle (1958-1969), Georges Pompidou (1969-1974), Valery Giscard d’Estaing (1974-1981), François Mitterrand (1981-1995) e Jacques Chirac (1995-2007). Embora com algumas diferenças entre si, o facto é que destes apenas Mitterrand foi eleito com base num programa socialista.Desta vez, porém, a direita surpreendeu ao apostar num discurso protofascista, tão demagógico quanto radical, recuperando alguns dos temas preferidos da extrema-direita, designadamente os respeitantes à imigração e segurança, (algo que Chirac, por exemplo, sempre descartou), e centrando toda a campanha nos valores conservadores da autoridade, do trabalho, da recompensa e do mérito.Em vez de tentar ocultar ou disfarçar o seu programa anti-social e antidemocrático, Sarkozy apresentou-o como a única solução possível, com a qual todos teriam algo a ganhar.Ao mesmo tempo que prometia ao patronato uma «ruptura» com a «rigidez» da legislação laboral e de todo o sistema de segurança e protecção social, Sarkozy acenava às massas trabalhadoras, criando a miragem de uma França transformada num «país de proprietários».Para tanto, prometeu deduções fiscais dos créditos para habitação e, sobretudo, a isenção de contribuições sociais e fiscais das horas de trabalho extraordinário, medida que mais não é do que o anúncio da revogação da conquista das 35 horas.E mesmo aos jovens dos bairros «difíceis» - exactamente aqueles que, durante os motins urbanos do Outono de 2005, ameaçou «limpar com uma Kärscher» (a marca alemã de lavadoras de alta pressão de água) – o enérgico Sarkozy prometeu um plano «Marshall 2», oferecendo formação e uma remuneração a quem se portar bem e penas de prisão agravadas para os reincidentes.Socialistas desorientadosA pesada derrota nas presidenciais voltou a expor profundas divergências no seio dos socialistas franceses, onde há muito se digladiam as alas esquerda, centrista e de direita. Laurent Fabius, ex-primeiro ministro, que se destacou pela sua oposição à Constituição Europeia, notando que Sarkozy «descomplexou a direita», sustenta que o «mesmo trabalho deve ser feito pela esquerda». «Isto quer dizer que temos de assumir de vez plenamente os nossos valores de esquerda».Em sentido oposto, o ex-ministro da Economia, Dominique Strauss-Kahn, recordando o mau resultado de Royal na primeira volta, conclui que «os franceses não querem que lhes apresentemos soluções que têm 20 anos» e exigiu «uma renovação social-democrata» para lançar «uma esquerda moderna».As divisões internas e o discurso de compromisso de Ségolène Royal parecem fornecer as condições propícias ao avanço da direita que procurará consolidar a sua vitória já nas próximas eleições legislativas, em duas voltas, marcadas para os dias 10 e 17 de Junho.Pelo contrário, é duvidoso que o PS consiga disputar esta batalha «de forma homogénea e muito unida», como garantiu, na segunda-feira, 7, Ségolène Royal, no final de uma reunião para análise dos resultados eleitorais.Adiando para depois do próximo sufrágio «a refundação ou reconstrução» do partido, como referiu o líder socialista, François Hollande, a sua direcção aposta agora na conciliação, tendo criado um «dispositivo de funcionamento colectivo» para as legislativas, organismo no qual terão assento Laurent Fabius e Dominique Strauss-Khan.Contudo, é o partido de Sarkozy (UMP) que desde já se apresenta como o principal favorito no escrutínio. Segundo uma sondagem realizada no domingo, pelo instituto CSA, a União para um Movimento Popular (UMP) recolhe 35 por cento das intenções de voto.O PS e seus aliados de esquerda chegam aos 30 por cento, enquanto o novo partido fundado por François Bayrou, que recolheu 18 por centos dos votos na primeira volta das presidenciais, surge com 15 por cento das preferências.A Frente Nacional de Le Pen não vai além dos oito por cento, ficando os demais partidos abaixo dos dois por cento.Declarações de Albano Nunes: «Má notícia para a Europa»Albano Nunes, membro da Comissão Política do PCP, considerou que a vitória de Nicolas Sarkozy nas presidenciais francesas «é uma má notícia para a França e para a Europa».«As suas práticas autoritárias, que são conhecidas, e as suas posições liberais e pró-americanas, bem como os projectos para recuperar o chamado tratado constitucional europeu, constituem motivos de preocupação», salientou este dirigente do PCPEm declarações à Agência Lusa, no domingo, 6, Albano Nunes criticou ainda a candidata derrotada, Ségolène Royal, observando que «não é com piscadelas de olho à direita que se ganham eleições à esquerda». Nestas presidenciais, disse, «é evidente que faltou na disputa uma verdadeira alternativa de esquerda».O protesto nas ruasA eleição de Nicolas Sarkozy foi recebida com desagrado em várias regiões do país, onde milhares de pessoas saíram às ruas contestando o novo presidente e antecipando o agravamento da conflitualidade social que certamente irá marcar o próximo mandato presidencial.Segundo revelou, na segunda-feira, 7, a Direcção Geral da Polícia Nacional, na noite eleitoral foram detidas 592 pessoas e incendiados 730 veículos. Nos confrontos registados, 78 agentes policiais ficaram feridos.Manifestações e actos de violência tiveram lugar nas principais cidades francesas de Marselha, Nantes, Rennes, Lyon, Toulouse, Lille, Bordéus, entre outras.Na capital, a polícia utilizou gás lacrimogéneo e canhões de água para dispersar um grupo de manifestantes anti-Sarkozy na Praça da Bastilha.Os distúrbios continuaram na noite de segunda-feira, em Paris, onde cerca de 100 jovens foram detidos pela polícia depois de terem danificado equipamento urbano e cortado o trânsito na Praça da Bastilha.Também voltaram a registar-se concentrações noutras cidades francesas, caso de Lille, Lyon, Nantes, Marselha, Caen, Rennes e Tours.A polícia minimiza a importância dos incidentes, notando que, em média, são incendiados entre 70 a 100 veículos por noite em França.Artigo publicado na Edição Nº1745 AVANTE 2007.05.10

marcar artigo